12/3/2012, Emmanuel
Karagiannis (entrevista a Yekaterina Kudashkina, Voice of
Russia)
Traduzido
pelopessoal da Vila Vudu
Emmanuel
Karagiannis
é
professor do Departamento de Estudos Eslavos, dos Bálcãs e Orientais da Universidade de Macedônia,
Tessalônica, Grécia [1].
Entreouvido
na Vila Vudu:
Não
é IMPRESSIONANTE que ninguém saiba de nada disso, em língua portuguesa do
Brasil?! Daqui a pouco a bispa-aquela
ou o bispo-aquele-lá decidem fazem aqui o Califato lá deles... E quem vai saber conversar com eles?!
E
olhem que os muçulmanos do Hizb-ut-Tahrir são INTELECTUAIS e não compram redes de
televisão! (E os bispos-lá são
analfabetos e já compraram ou alugaram).
Hizb-ut-Tahrir: the new face of Islam
Yekaterina Kudashkina
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12.03.2012, 14:58
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Source: Voice of Russia.
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Emmanuel Karagiannis |
Voice
of Russia:
Tendo
em mente que os desdobramentos da Primavera Árabe de algum modo trouxeram os
árabes para o centro da paisagem política, se se considera a Primavera Árabe é
uma coisa; mas se se consideram outras organizações islâmicas que operam na Ásia
Central, as coisas mudam. Uma das organizações que operam nessas regiões é
o Hizb-ut-Tahrir – que é ator muito importante, mas
praticamente desconhecido do grande público. Que tipo de organização é? Pode-se
dizer que é uma rede internacional?
Karagiannis: O
movimento Hizb-ut-Tahrir,
“Partido da Liberdade”, é movimento transnacional que atualmente tem encontrado
muito apoio entre jovens muçulmanos na Ásia Central, na Europa Oriental, no
Oriente Médio, na Austrália e até nos EUA. Em minha opinião é um desafio difícil
tanto para governos ocidentais como para governos muçulmanos, porque o Partido
prega a unificação de todos os países muçulmanos num único Califato, mas,
simultaneamente, tem rejeitado, até agora, a luta armada como instrumento
político de mudança. E não se sabe muito sobre a organização, que é muito
fechada. Pode-se no máximo especular sobre o tamanho do movimento. A única coisa
que sei com certeza é que é movimento fortemente
transnacional.
Voice
of Russia: Mas quais são seus métodos? O senhor disse que
não prega a violência como método. Como trabalham para expandir-se e
fixar-se?
Karagiannis: O programa que o Hizb-ut-Tahrir já mostrou prevê três fases de ação,
modelado pelos três estágios da experiência do Profeta Maomé, quando tentou
estabelecer o estado islâmico. O primeiro estágio implica recrutar membros; o
grupo tem feito isso de vários modos; por exemplo, distribuem panfletos em
mesquitas e bazares, ou tentam recrutar pessoas em universidades. O primeiro
estágio, portanto, é de recrutamento. O segundo estágio, basicamente, é convocar
a sociedade a abraçar o Islã, em outras palavras, islamizar a sociedade; é o que
está fazendo atualmente, em certo sentido: está tentando divulgar suas crenças,
sua ideologia. E o terceiro estágio, que implica tomar o poder e fazer o Islã
conhecido fora das áreas de grandes populações já
muçulmanas.
Esse
terceiro estágio ainda soa vago aos especialistas, quero dizer, sabe-se pouco,
porque eles falam pouco sobre isso. Parece que talvez pensem em algum tipo de
tomada revolucionária, com várias ações civis – manifestações, comícios. Esse
parece ser o cenário no qual o
Hizb-ut-Tahrir conta com
tomar o poder político e estabelecer um estado islâmico.
Voice
of Russia: Que
tipo de Islã pregam?
Karagiannis: Hizb-ut-Tahrir
apresenta-se
como grupo islâmico não sectário, embora sejam, de fé, marcadamente sunitas;
quase todos os líderes têm origem palestina. Não rejeitam, evidentemente, os
xiitas, como membros, mas é bem claro que o grupo tem orientação sunita. Não
recrutam muçulmanos de confissões religiosas minoritárias, como ahmadia ou
druzos ou alawitas; recrutaram alguns xiitas do Irã, mas não têm conseguido
atrair muitos não sunitas. Eu diria que é grupo de clara orientação
sunita.
Voice
of Russia: E sobre a atividade social do grupo? São
envolvidos em programas sociais, oferecem assistência social às populações
locais?
Karagiannis: Hizb-ut-Tahrir
é
diferente do Hamás e do Hezbollah; não tem programas sociais muito avançados.
Mas há sinais de que, no plano local, membros do partido têm oferecido o zakat em algumas mesquitas que se supõe que
controlem; o zakat é dever dos muçulmanos, pagar o zakat, às
6as-feiras.
Quero
dizer que, sim, parece haver indicações de que podem estar trabalhando para dar
assistência aos pobres e aos mais velhos, em alguns locais. Mas, em teoria, não
dizem que trabalham para ajudar desse modo o progresso social. O que buscam,
basicamente, é islamizar a sociedade e divulgar suas crenças e sua ideologia.
Não há dúvidas de que sua ideologia visa a restaurar o Califato – é o que querem
fazer: unir todos os muçulmanos e restaurar o Califato.
Portanto,
não estão trabalhando como a Fraternidade Muçulmana trabalha no Egito, ou o
Hezbollah no Líbano, ou o Hamás em Gaza. Não patrocinam creches ou escolas
infantis, não limpam as ruas, como faz o Hamás em Gaza. Apresentam-se, de fato,
mais, como movimento intelectual.
Voice
of Russia: E de
onde recebem dinheiro?
Karagiannis: O
que se sabe sobre isso é sempre
especulação. Parece que vivem de doações dos membros e de seguidores ricos do
Golfo Persa. Há rumores também de que mantêm seus próprios negócios. Quando
estive na Ásia Central, ouvi rumores de que o
Hizb-ut-Tahrir teria
empreendimentos próprios, negócios próprios, de modo que poderiam, basicamente,
se autossustentar.
Voice
of Russia: O senhor considera razoável a previsão de
que esse grupo, que já parece bem estabelecido em alguns países da Ásia Central,
poderia ser usado como combustível para deflagrar alguma espécie de insurgência
islâmica na Ásia Central? E o que se diz – que teriam já estabelecido laços com
os Talibã?
Karagiannis: Essa é
questão ainda controversa entre os especialistas. Pessoalmente, como
especialista, parece-me que o
Hizb-ut-Tahrir não possa
ser usado sem se aliaria a movimentos de
jihad, para fazer guerra ao ocidente, porque é movimento de
ideias, movimento intelectual. Pelos padrões ocidentais, é organização
extremista, como são os partidos comunistas em muitos países
ocidentais.
Mas,
sim, o Hizb-ut-Tahrir divulga uma ideologia que, em certa medida,
pode contribuir na direção em que trabalha o Movimento Islâmico do Uzbequistão,
ou, mesmo, organizações ligadas à Al-Qaeda. Eles podem ajudar a disseminar
ideias assemelhadas, digamos, de modo mais fácil. Não é absolutamente
organização terrorista; é partido extremista. Já criticaram os Talibã e o
Movimento Islâmico do Uzbequistão por não estudarem a doutrina, por não buscarem
o avanço intelectual. Por sua vez, ambos, os Talibã e o Movimento Islâmico do
Uzbequistão, também criticaram o
Hizb-ut-Tahrir, por não passarem de um grupo de estudiosos, de
intelectuais.
Mas
evidentemente há algumas similaridades, mesmo com grupos jihadistas. Todos eles querem
restaurar o Califato, com diferenças apenas de método. Do ponto de vista do Hizb-ut-Tahrir, a via certa é a que o
Profeta Maomé seguiu, e foi via pacífica para a tomada do poder. Para os Talibã
e o Movimento Islâmico do Uzbequistão e outras organizaçõesjihadistas, a
via certa é declarar guerra contra católicos e outros crentes. Mas outra vez
estamos no terreno da especulação. Pelo que se sabe, o Hizb-ut-Tahrir não tem qualquer vínculo com os Talibã
nem com o Movimento Islâmico do Uzbequistão.
Voice
of Russia: E há
quanto tempo existe?
Karagiannis: Foi
criado em 1953.
Voice
of Russia:
É
antigo!
Karagiannis: Sim.
Surgiram em Jerusalém Leste e não mudaram o discurso ao longo dos últimos 60
anos. Orgulham-se disso, quero dizer: consideram-se o único grupo islâmico que
há no mundo. Para eles, essa credibilidade no plano intelectual é muito
importante, razão pela qual sempre relutaram a aliar-se a grupos jihadistas ou a ajudar, de qualquer modo,
organizações jihadistas. Além do
quê, se o tivessem feito, teriam criado riscos extraordinários para eles mesmos,
pelo menos para os ramos do partido que operam em países ocidentais. Afinal,
sabem como são as coisas no ocidente e sabem que se ultrapassarem a linha
vermelha, se declararem guerra, se de algum modo se associarem a grupos jihadistas, terão de enfrentar as
agências de segurança ocidentais.
De
fato, têm sido muito cautelosos nesse sentido. Por isso falei, no início, que é
organização extremista, como os partidos comunistas em vários países, mas
claramente não é organização terrorista.
Voice
of Russia: O
senhor disse, noutra ocasião, que a sede do Partido funciona em Londres. É
isso?
Karagiannis: Há
muitos indícios de que o centro logístico do Partido esteja instalado em
Londres, e a liderança internacional está localizada, provavelmente, ou na
Jordânia ou no Líbano. Sabe-se pouco sobre a liderança internacional. Mas, sim,
o centro logístico parece estar instalado em
Londres.
Voice
of Russia: O
senhor já teve contato com eles?
Karagiannis: Sim,
encontrei-me com alguns membros do
Hizb-ut-Tahrir na Ásia
Central, alguns também no Líbano, e também tive encontros com alguns membros na
Grã-Bretanha. Pude discutir com alguns deles algumas questões de método. Como
sempre, pouco se obtém nesse tipo de conversa, porque são muito cuidadosos nos
contatos com gente externa ao grupo. Mas não há dúvidas de que o grupo produz
grande quantidade de literatura – muitos livros, muitos panfletos –, embora seja
difícil acompanhar seus movimentos.
Voice
of Russia: Quanto ao crescimento global do Hizb-ut-Tahrir, são ativos na Rússia?
Karagiannis:Hizb-ut-Tahrir
tem
obtido alguma popularidade em territórios da Federação Russa de população
muçulmana, como, por exemplo, o Tartaristão, mas não são conhecidos no Norte
do Cáucaso. Isso, porque ali competem com outros grupos muçulmanos já
tradicionalmente estabelecidos. O
Hizb-ut-Tahrir está
ativo, pode-se dizer, e só no
Tartaristão, talvez por efeito do modo como os tártaros entendem o Islã.
O islamismo tártaro é muito moderado, pode-se dizer, distendido. E a penetração
do Hizb-ut-Tahrir foi mais fácil ali, que no Norte do
Cáucaso, onde os salafitas ganharam terreno. É difícil para o Hizb-ut-Tahrir disputar influência com
salafitas.
Voice of Russia: Não sei se estou certa, mas o Islã salafita não é o mesmo Islã que houve inicialmente no Norte do Cáucaso?
Voice of Russia: Não sei se estou certa, mas o Islã salafita não é o mesmo Islã que houve inicialmente no Norte do Cáucaso?
Karagiannis: Você
está absolutamente certa. O Islã salafita é estranho ao Norte do Cáucaso. A
maioria dos muçulmanos no Norte do Cáucaso segue o Islã hanafita. O Islã hanafita penetrou no Norte do Cáucaso
logo depois da primeira guerra da Chechenia, de 1994 a 1996. Depois daqueles trágicos
eventos, a organização salafita ganhou espaço e estabeleceu-se no Norte do
Cáucaso, sobretudo no Daguestão e na Chechenia, menos em Kabardino Balkariya e
em outras repúblicas muçulmanas autônomas do Norte do
Cáucaso.
Voice
of Russia: Quer
dizer então que o
Hizb-ut-Tahrir não
avançou muito no Norte do Cáucaso, como avançou no Tartaristão, onde é evidente
que se estabeleceu como se sabe. Por isso as autoridades russas, que baniram o
grupo, prenderam vários crentes do
Hizb-ut-Tahrir no
Tartaristão. Pela lógica, o
Hizb-ut-Tahrir
dificilmente conseguiria ganhar espaço em países como a Albânia, por
exemplo.
Karagiannis: Sim.
O Hizb-ut-Tahrir em crescido na Ásia Central, na Indonésia,
em alguns países do Oriente Médio, como a Jordânia, mas não tem conseguido
entrar nas áreas mais populosas dos Bálcãs, como Kosovo, Bósnia. Isso, porque os
membros muçulmanos locais do
Hizb-ut-Tahrir parecem
“árabes demais”, talvez se possa dizer assim, se você me entende – os líderes de
origem palestina, quase todos os mais velhos, são ou árabes ou sul-asiáticos.
Para os muçulmanos dos Bálcãs, acho que o
Hizb-ut-Tahrir parece
“partido estrangeiro”, “árabes demais”, naquele cenário. Isso não implica dizer
que, em algum momento, o
Hizb-ut-Tahrir não ganhe
popularidade na Bósnia ou no Kosovo. De fato, eles têm sido muito bem sucedidos
de várias formas, em vários espaços. Em anos recentes, conseguiram fixar-se em
regiões de grandes populações muçulmanas também na China, como em
Xinjiang…
Voice
of Russia: Na
comunidade uigure.
Karagiannis: Exatamente.
Claro que não é fácil competir com os grupos uigures nacionalistas. E, sim, as
autoridades chinesas estão acompanhando de perto a situação. Mas a julgar pela
página que o Hizb-ut-Tahrir
mantém na internet, e pelo espaço que dedicam à China, e considerando outras
informações que há sobre Xinjiang e a população muçulmana que vive ali – sim, se
pode facilmente conclui ir que o
Hizb-ut-Tahrir conseguiu
estabelecer-se na China.
Voice
of Russia: E
também na Escandinávia?
Karagiannis: O ramo escandinavo é muito ativo, produzem
muita literatura. O líder do
Hizb-ut-Tahrir na
Dinamarca foi preso há poucos anos, por ter feito ameaças a judeus
dinamarqueses. Pelo menos, é o que se divulgou. Não tenho informações sobre
o Hizb-ut-Tahrir na Noruega, Finlândia ou Suécia. Tudo
leva a crer que a Dinamarca seja sua principal base no
Norte.
Nota
dos tradutores
[1]
Mais
sobre isso em KARAGIANNIS, Emmanuel, “Political
Islam in Central Asia: The Challenge of Hizb ut-Tahrir”,
Europe-Asia Studies, Volume 64, Issue 1, 2012, acessível para assinantes.
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