25-27/7/2014, [*] Andrew Levine, Counterpunch
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Entreouvido
quiosque “Xicnoúrtimo” na Vila Vudu: Este artigo é excelente
leitura, para um domingo em que o ex-FHC e atual NADA e autoproclamado “príncipe”
da sociologia brasileira [só rindo!], escreve n’O Estado de S.Paulo (27/7/2014)
que a presidenta Dilma “é uma cabra cega”. O ex-FHC e atual NADA é Clintonista
sub-do-sub, neoliberal de segunda-mão, udenista golpista histórico. Nenhum
candidato do ex-FHC, nunca será eleito em 2016 à presidência do Brasil.
NUNCA. Never. Núncaras.
Presidentes dos EUA |
Não há políticos norte-americanos cujas
ideias sobre política mereçam análise séria por qualquer outra razão que não o
poder que tenham. E tem sido assim, só com mínimas exceções (e há muito
tempo!), desde depois dos pais fundadores dos EUA.
Por convicção sincera (embora quase
sempre irrefletida), ou para melhorar as possibilidades eleitorais ou promover
interesses pecuniários, vez ou outra os políticos esforçam-se para exibir
maquiagem “ideológica”. Mas não trabalham com ideias ou teorias ou práticas
políticas para desasnar seus eleitores. Nem saberiam como fazer.
Por essa razão, dentre outras, a
expressão “Reaganismo” é expressão errada. É conveniente e frequentemente
usada, mas dá excessiva importância a ator ruim, que não conseguia manter duas
ideias simultaneamente ativas no cérebro.
“Neoliberalismo” seria expressão melhor,
exceto por sugerir foco exclusivo em questões de economia política. O
Reaganismo não trata só de economia; é também importante fenômeno de ativo atrasamento
político dos povos.
A expressão denota uma teoria e uma
prática que poucos ainda celebram, sempre os mesmos poucos ainda (auto)
celebrados, mas super-super (auto) superestimados economistas e politólogos [Taí! Taí! Alguém conhece economista mais super-super-super
(auto) estimado que o Graciano?! E politólogo mais super-super-super (auto)
estimado que o ex-FHC e atual NADA?! 8-))] convocados
para reviver linhas já há muito tempo dormentes do pensamento liberal clássico.
É empreitada fracassada de antemão, sem densidade e peso intelectuais e sem
apelo moral.
Mas, por artes e vicissitudes do
capitalismo tardio, ainda sobrevive em programas de televisão e redações de “jornais”
impressos ou televisivos (a chamada “mídia”).
Ronald Reagan |
Nos anos 1970s, com a reconstrução
pós-guerra e a fase de crescimento do capitalismo chegadas ao fim, sob o peso
de excesso de produção e capacidade produtiva, tornou-se óbvio – sobretudo para
capitalistas à procura de oportunidades de investimentos – que os velhos
péssimos modos de operar teriam de mudar.
O resultado foi um crescimento na influência
política do setor financeiro e um declínio no poder do trabalho organizado.
Esses desenvolvimentos pavimentaram o
caminho para a chamada “Revolução Reagan”.
Nada mais de desenvolvimento capitalista
que, apesar do mal que fez, pelo menos melhorou materialmente a vida de
bastante gente; e nada mais, sequer, de qualquer semelhança, ainda que remota,
de justiça e equidade na distribuição do benefício e da carga do crescimento
econômico.
O Reaganismo iniciou um novo “contrato
social” – segundo o qual um pequeno punhado de gente no topo ganharia
faustosamente, ao mesmo tempo em que o resto todo da pirâmide ganharia muito
menos.
Aumentar o endividamento pessoal e a
pronta disponibilidade de produtos de baixa qualidade feitos longe de casa,
além de outras medidas paliativas, mascararam a nova realidade por algum tempo;
e uma série de bolhas econômicas mantiveram a economia à tona.
Mas não há como negar o fato de que a
condição econômica de muita gente estagnou ou deteriorou, e que a esfera
pública, sem fundos, declinou ainda mais rapidamente. Isso é o que faz o
Reaganismo.
E, porque a ideia de que o governo seria
o problema, não a solução, é um dos núcleos da doutrina Reaganista, o
Reaganismo também milita contra programas públicos para melhorar as condições
de vida e contra todos os remédios que o estado de bem-estar provê. Para
substituir tudo isso, o Reaganismo oferece as trampas e ilusões da teologia do
livre mercado.
Com sociedades mais ricas, a maioria
contudo se via cada vez mais pobre – em relação não só aos hiper-ricos ou a
como estariam numa ordem econômica mais racional, mas em relação ao que estavam
acostumados.
Não é tudo culpa de Reagan, que teve
muito menos a ver com o Reaganismo do que a maioria supõe. A presidência de
Reagan [foi presidente de 1981 a 1989 (NTs)] foi mais efeito, que causa.
Reagan fez pouco, se é que fez alguma
coisa, para modelar a doutrina Reaganista, e não foi muito bem-sucedido, sequer,
na aplicação da doutrina. No máximo, acreditava na doutrina; e pôs seus talentos
de comunicador a serviço de promovê-la.
O Reaganismo tomou conta de tudo quase
imediatamente depois da virada na trajetória do capitalismo. Jimmy Carter [foi
presidente de 1977 a
1981 (NTs)], portanto,
foi o primeiro presidente Reaganista. E Carter não abraçou a causa com paixão,
mas bastante desanimadamente; e só nos anos finais de sua presidência.
Reagan: "Você ainda é meu padrinho na Europa" |
Reagan não foi sequer o líder Reaganista
mais importante nos primeiros dias. Essa duvidosa honra cabe a Margaret
Thatcher [primeira-ministra britânica de 1979 a 1990 (NTs)]. Foi durante o governo dela na
Grã-Bretanha que a teoria e a prática Reaganistas tomaram plena forma.
Por isso é que, no mundo anglófono fora
dos EUA, o Reaganismo é chamado de Tatcherismo.
Os norte-americanos são paroquiais no seguir modas, mas essa
não é a única razão para terem dado ao fenômeno o nome do Gipper [Nome de um personagem que Reagan fez no filme Knute Rockne,
All American (NTs)]. Desde
o final da IIª Guerra Mundial, a Grã-Bretanha se mantivera como parceira júnior
– incapaz de, por meios seus, liderar qualquer grande mudança no curso dos
eventos mundiais. Nem a Dama de Ferro teria conseguido, sozinha, causar todo o
dano que causou ao mundo, se os ianques não a tivessem ajudado. E assim
aconteceu que a coisa ficou conhecida como Reaganismo.
No começo, o sofrimento ficou confinado
sobretudo à Grã-Bretanha e aos EUA. Para infelicidade do resto do mundo, a
coisa não tardou a alastrar-se. E, hoje, todos os políticos capitalistas são
Reaganistas.
Os políticos norte-americanos ainda
aparecem puxando a fila. Os presidentes dos EUA merecem ter todo um círculo
especial reservado só para eles, no Inferno. E, dado que esses presidentes são
feitos do mesmo pano Reaganista, não faz sentido inventar algum outro “−ismo”
para colar aos seus nomes. A família Bush agachou-se pela Casa Branca por mais
tempo que os Reagans, mas nem por isso se fala de “bushismo”. E por que se
falaria?
Bush Pai foi Reaganista “mais bondoso,
mais gentil”; é o que ele próprio conta. E, não fosse Carter, teria sido o
melhor (o menos ruim) presidente que os EUA conheceram, desde que o Reaganismo
emergiu. Se por mais não for, sua presidência foi a última, nos EUA, na qual os
assuntos internacionais foram conduzidos com um mínimo de competência e
decência.
"Vamos primeiro falar de Economia" |
Mas foi tedioso, previsível. Seu
principal problema era o que ele chamava de “a coisa da visão”. Era presidente
quando o comunismo ruiu, e a URSS implodiu; para ele, essa “nova ordem mundial”
era a velha ordem, só que sem a União Soviética. Nada haveria, em lugar algum,
que deixasse qualquer marca duradoura.
Bush Filho, esse, deixou inúmeras marcas
muito duradouras. Mas ninguém, em juízo perfeito, reivindicaria como feitos
seus, os feitos de Bush.
Os neoconservadores aos quais Bush Filho
entregou o comando do show desencadearam catástrofes que ainda estão
tendo desdobramentos. O homem, afinal, estava em mar tão mais profundo do que
sabia enfrentar que é quase injusto culpá-lo pelos tais desdobramentos. Mas é
claro que é preciso responsabilizá-lo; era nominalmente o presidente. De
qualquer modo, Dick Cheney e Donald Rumsfeld foram, no mínimo, tão culpados
quanto o presidente.
Num mundo justo, George W. Bush e seus
servidores não estariam tendo hoje vida mansa. No nosso mundo, graças à
magnanimidade do Advogado Geral do presidente que sucedeu Bush, escaparam todos
de serem condenados por assassinato – e, de fato, até por crimes piores que
assassinato. Não há “-ismo” que diga tudo isso.
“Bushismo” portanto não funciona, não
importa o Bush que se tenha em mente. Mas “Clintonismo” [Clinton
foi presidente de 1993 a
2001 [NTs]), aí, sim,
já é outra coisa!
A expressão já está em circulação há
algum tempo. As pessoas sabem usá-la porque, como o juiz Potter Stewart disse
da obscenidade, você reconhece quando vê o Clintonismo.
Mas o que, exatamente, significa o
Clintonismo? Essa é questão longe de esclarecida – principalmente porque a
relação entre Reaganismo e Clintonismo é sutil e complicada.
Com Hillary Clinton em rota para
concorrer à presidência em 2016 – e com alta probabilidade de ser eleita se
concorrer, dado que o Velho Grande Partido (orig. inglês: Great Old Party − GOP)
dos Republicanos não consegue achar candidato crível – já não se sabe com
clareza nem se a palavra aplica-se ao marido ou à esposa.
Na verdade, nem interessa a quem se
aplique. Como poderia dizer um meio metafísico meio piadista: “Clinton” nomeia
uma entidade supraindividual que recobre duas formas interdependentes mas
analiticamente distintas.
Bill é, de longe, o mais colorido,
porque tarado e patife, do tipo que transpira o mais meretrício charme. (...) Para gente de certa idade,
com certeza Bill lembra uma versão crescidinha, não casta do personagem de
Eddie Haskell na série de TV “Leave It To Beaver”.
Bill Clinton Lewinski |
Se aquela série fosse revivida uma
década ou duas mais tarde, é muito provável que a trama evoluísse em torno dos
problemas de Eddie com princesas hot do estacionamento de trailers e variedades
judeu-norte-americanas; e que seus arranjos com os ricos e famosos, para lucro
e prazer fosse tema recorrente.
Entrementes, Hillary usa paletozinhos e
calças e diz imbecilidades – muito imbecis, até pelos padrões de Joe Biden. Em
matéria de dizer imbecilidades máximas, Biden já perdeu o concurso.
Hillary não é sequer vil, em sentido
interessante: o personagem é raso demais. Não surpreende que os criadores da
Idade de Ouro da televisão jamais tenham dado qualquer atenção a uma personagem
que evoca ninguém e coisa alguma, como ela.
Questões de caráter à parte, Bill
Clinton foi o mais perfeito presidente Reaganista de toda a história – não o
mais visionário, não o que selecionou subordinados mais competentes, mas o mais
efetivo. Ninguém, não com certeza o próprio Reagan, fez mais que Bill Clinton
para privatizar e desregular e descontrolar, e para desfazer programas
governamentais que existiam para cumprir funções relevantes, úteis e
proveitosas.
Reagan propôs, em proposta que ficou
famosa, “matar de fome o monstro” [orig. “starving the monster”]. Foi o
que Bill Clinton fez. Enquanto isso, o verdadeiro monstro prosperava no governo
Clinton, como já prosperara no governo Reagan. Os militares e o estado de
segurança nacional que já começava a inchar operaram como gangues de bandidos.
É provável que Clinton jamais tenha
investido o coração em pôr em prática o Reaganismo. Era – como é até hoje – um
oportunista, não um homem de crenças, de verdadeira fé. Mas, no Partido
Democrata, conseguiu neutralizar a oposição e, até, seduzi-la para o seu barco.
Pôde assim realizar plenamente o que, para Reagan e o pessoal que o cercava,
foram sonhos e nada mais.
Essa é uma das razões pelas quais é
difícil ver com clareza o que é o Clintonismo. Parece próximo demais do
Reaganismo para poder auto-ostentar-se como “-ismo” autônomo, por mérito
próprio.
Bill e Hillary Clinton |
O Clintonismo escapa a qualquer
caracterização fácil, porque os Clintons, aliados a outros Democratas de
direita, efetivamente expurgaram o partido deles de toda a ala esquerda que lá
havia. Por isso é difícil distinguir a política Clintonista da política dos
Democratas, em termos gerais.
Seja como for, o Clintonismo é conceito
útil. O que o Bushismo nunca foi. Nem, tampouco, para não deixar de falar dele,
algum Obamismo algum dia teve alguma utilidade.
Claro que ainda é possível que Obama
tais e tantas ainda faça, que ainda erre mais, e tão impressionantemente, que
“Obamismo” ou expressão assemelhada, venha a ganhar entrada no léxico político.
Mas se acontecer, a palavra não designará qualquer traço político distintivo.
Será uma espécie de forma taquigráfica para gigantíssima incompetência.
Ou para designar quem cometa erros ainda
mais desastrosos que os de George W. Bush. Pode acontecer, por exemplo, se os
Clintonistas que venham a assumir a política externa dos EUA inventem, mesmo,
uma nova Guerra Fria. Estão trabalhando precisamente para isso.
Contudo, no curso normal dos eventos –
onde “normal” inclui permitir que um governo israelense brutal e ilegal
massacre palestinos em Gaza – não haverá Obamismo.
Quando o Reaganismo ainda estava tomando
forma, Bertram Gross escreveu sobre o que chamou de “fascismo amigável” [orig. “friendly
fascism”]. Ao falar de “fascismo”, Gross explica que o Reganismo abraçara
um objetivo fundamentalmente fascista – acabar com o movimento trabalhista e,
na sequência, reconfigurar a relação entre a Grande Finança e o Estado, de modo
a garantir interesses desses dois lados.
Com o adjetivo “amigável”, Gross diz que
o Reaganismo fez o que fez sem o antiliberalismo acintoso e a violência
organizada associados aos movimentos fascistas do período entre-guerras (e
posteriores). O ar amistoso e amável de Ronald Reagan ajudou, mas esse não foi
o ponto central.
Barack Obama por Latuff |
Obama dá prosseguimento a essa tradição
de fascismo amigável. E, construindo sobre os fundamentos lançados por George
Bush e Dick Cheney, Obama comanda uma virada relacionada, na política dos EUA.
Bom nome para o que Obama faz é “totalitarismo amigável”.
Bush e Cheney pegaram o trem andando,
mas Obama será lembrado por ter feito dos EUA estado de vigilância total, 24/7,
e por ter reduzido a trapos todos os direitos à privacidade e ao devido
processo legal. Será também lembrado por continuar guerras velhas e iniciar
novas. São coisas que andam juntas: guerras perpétuas são indispensáveis em
estado totalitário.
Obama fez tudo isso sem agredir a
amicabilidade que daria legitimidade, que identificou no grande projeto
Reaganista. Vivemos hoje mais ferozmente espionados do que nunca antes, mas
não, supomos nós, por estado policial; e temos o exército mais poderoso que o
mundo jamais conheceu, mas não temos atitudes e instituições militaristas...
Reunindo tudo, essa ordem totalitária
amigável é realização equivalente a alcançar objetivos do fascismo, pela via
Reaganista ostensivamente benigna.
Nem assim se justifica acrescentar um
“-ismo” ao nome de Obama. Como no caso de Bush, decisões erradas e inaptidão
não bastam para gerar algum novo tipo de política.
Diferente seria se houvesse realizações
positivas pelas quais Obama pudesse receber os louros. Mas, exceto por ser
preto que “chegou lá”, Obama nada fez. Falar de “esperança” e depois de
“mudança” absolutamente não conta.
Com os Clintons é diferente: eles
merecem os créditos por terem desenvolvido uma forma específica de Reaganismo, muito
especialmente deletéria.
O que os Clintons urdiram é difícil de
definir, mas é fácil reconhecer e opor-se “àquilo”.
Oposição ao Clintonismo não é a mesma
coisa que antipatia pelos Clintons. A oposição ao Clintonismo é rampante em
todo o mundo, segundo a ex-Primeira Dama: “uma vasta conspiração da direita”
(contra a dupla). Supondo-se que Hillary saiba do que fala, a questão é: por
quê? Não há, nem remotamente, qualquer resposta política satisfatória. Na
direita, Reagan é cultuado como deus; e, embora as conexões entre Reagan e o
Reaganismo possam não ser tão diretas como se supõe por aí, é certo que faz
diferença que o Clintonismo seja Reaganismo na prática.
Republicanos tentam derrubar Hillary Clinton |
Pergunta melhor é por que há mais
antipatia contra os Clintons nos acampamentos liberais? Não há dúvidas de que
fizeram por merecer.
Mas o que mais pesa é a antipatia contra
o Clintonismo. Entre os quadros do próprio Partido Democrata praticamente não
há. Mas, sim, há muita antipatia contra o Clintonismo entre os eleitores do
Partido Democrata. O anti-Clintonismo teve papel importante na vitória de Obama
sobre Hillary Clinton, nas primárias de 2008.
A esperança, naquele momento, de vários
eleitores de Obama era que uma vitória de Obama conseguiria des-Clintonizar o
Partido Democrata. Para quem acompanhasse de perto a campanha, não era caso de
esperança, mas de delírio. De qualquer modo, Obama ganhou com folga.
Não surpreendentemente, a ilusão
rapidamente evanesceu. A desilusão já crescia antes do dia da posse, desde as
primeiras notícias sobre os nomeados para postos chaves. Pode-se dizer que
começara bem antes – desde quando Obama acolheu Joe Biden para candidato à
vice-presidência.
Quando Obama nomeou Hillary Clinton para
o cargo de Secretária de Estado – posto para o qual ela absolutamente nunca
apresentou as qualificações mínimas indispensáveis, e todo mundo via que não –
já não havia como não ver o que o futuro traria.
Na sequência, veio plena e total
Restauração Clintonista. No campo da política externa, o único sinal de “novidade”
apareceu adiante – com a nomeação de imperialistas “humanitárias” do tipo de
Susan Rice e Samantha Powers. E aí já se via em ação a mão de Hillary.
Se o impulso para fazer reviver a Guerra
Fria é ideia saída diretamente dela, ou não, não há dúvidas de que é ideia
saída de seus protegidos e coligados: e ela nunca para de dar-lhes cada vez
mais corda.
Sabe-se lá por que Hillary e outros
tanto querem embarcar nesse negócio tão arriscado. Será que estão sentindo que
a “guerra ao terror”, ou tenha lá o novo-nome que tenha na novilíngua recente
de Obama, não está rendendo tudo que se esperava para o estado do complexo
militar de segurança nacional?
Ou talvez percebam que meteram de tal
modo os pés pelas mãos, tão profundamente, no Oriente Médio, que já não há
lugar para eles por lá e terão de puxar o carro – rumo a outras aventuras. Faria
sentido, mais é pouco provável que pensem, pode-se dizer, tanto. É
reflexão que exigiria um grau de autoconhecimento e de autocompreensão que está
muito além do capacidade dela e deles.
De fato, chega a ser espantoso o quanto
é pouco o que eles, pode-se dizer, entendem. Será que se dão conta de o quanto
uma Guerra Fria contra a Rússia – e contra a China também – pode ser perigosa?
Como podem não saber?
Putin: "Olha o que Obama me mandou!" |
Essa, afinal, é uma questão psicológica:
a resposta pode variar de pessoa a pessoa. Mas num nível político, os contornos
gerais de uma resposta já aparecem suficientemente claros.
Essa resposta é que isso, precisamente,
é o que acontece quanto o espírito do Reaganismo toma conta de descendentes
ideológicos dos anticomunistas da Guerra Fria!
Por quase 40 anos depois do fim da IIª
Guerra Mundial, sempre houve liberais que foram levados, por simpatias e
convicções, a apoiar o movimento trabalhista e outras forças populares de
pensamento assemelhado, o que sempre serviu de freio contra o impulso inerente
e incansável do capitalismo para enriquecer os capitalistas à custa de todo o
resto da população.
Aqueles liberais eram tão devotados ao
capitalismo quanto qualquer outro setor da classe política, mas eram menos
inclinados que os demais a só promover os interesses dos principais
beneficiários do capitalismo.
Essa sensibilidade começou a evanescer
quando os Reaganistas chegaram ao poder; em pouco tempo, já sumira
completamente. Ao mesmo tempo o liberalismo social continuou e até avançou, com
o avanço de atitudes da sociedade.
Como reação, o zero-liberalismo social
endureceu na direita. Em pouco tempo, discordâncias sobre valores, mais do que
sobre valores materiais, passaram a ser a principal linha divisória a rachar a
política norte-americana.
Disso trata, precisamente, o
Clintonismo.
É liberalismo Reaganizado; é liberalismo
anticomunista de Guerra Fria, sem a dimensão econômica progressista.
Os Clintonistas ainda estão
comprometidos com tolerância e outros valores liberais não econômicos, mas nas
questões econômicas, não há nenhuma diferença entre eles e seus adversários
Republicanos.
Essa é a mais perfeita descrição de
Hillary Clinton. Disseque-se sua persona pública, e está tudo lá: o
liberalismo social, mas também o neoliberalismo econômico e, sobretudo, a
insuperável animosidade contra a Rússia – e contra a China – herdada do passado
da Guerra Fria.
Ninguém pode acusar Bill Clinton de ser
presidente “transformador” no sentido em que Obama pensa que Ronald Reagan foi.
Mas Reagan e sua primeira dama sim, transformaram o Partido Democrata – e de
tal modo, em tal extensão, que já não há redenção possível.
Richard Nixon [foi
presidente dos EUA de 1969 a
1974 (NTs)] conseguiu
levar com ele os Republicanos e a ala direita dos Democratas quando abriu relações
diplomáticas com a China – porque era homem da direita que provara inúmeras
vezes as suas credenciais.
Mas o pessoal que levou com ele, esses,
nunca mudaram. Eram doentiamente anticomunistas antes e eram doentiamente
anticomunistas depois de Nixon os levar à China. Foi questão de fazer uma
escolha estratégica, não de mudar corações e mentes.
Governo de Bill Clinton |
Bill Clinton, por outro lado, não levou
com ele seus companheiros Democratas quando decidiu promover o Reaganismo. Ele
os modificou fundamentalmente; conseguiu que assumissem a agenda Reaganista,
como se fosse sua própria agenda. Isso, agora, é o que Hillary Clinton fará – o
que ela, de fato, já começou a fazer. E por isso a possibilidade de que ela
venha a comandar o Partido Democrata é tão apavorante.
Converter os Democratas em direitistas
já foi ruim que chegue sob o comando do Clinton marido, há uma geração.
Imaginem as consequências disso agora, depois de décadas de deriva à direita e
de oito anos de Barack Obama e sob comando de Hillary!
O Clintonismo é pior que simples
Reaganismo, para os Democratas. É como um vírus Reaganista, dirigido contra os
Democratas. Quando entra no sistema, dissemina-se como um vírus: e corrompe sem
parar; só faz corromper.
Como em geral no trato com outros vírus,
o melhor modo de lidar com ele é mantê-lo à distância. Se for impossível, o
Plano B é salvar e restaurar o mais que se consiga salvar e restaurar.
É possível que já seja tarde demais.
Tendo já iniciado a virada Clintonista, o Partido Democrata – que, afinal,
nunca foi nenhuma maravilha – pode já estar danificado demais para ser salvo.
Mais ou menos em meados do próximo ano,
como agora, ano que vem, com a campanha presidencial de 2016 já em andamento,
já saberemos com certeza.
[*] Andrew Levine é professor sênior do Institute for
Policy Studies, e autor de THE AMERICAN IDEOLOGY (Routledge) e POLITICAL KEY WORDS (Blackwell), bem como de muitos outros livros e
artigos em filosofia política. Seu livro mais recente é In Bad Faith: What’s Wrong With the Opium of the People. Foi professor de Filosofia) na University of Wisconsin-Madison e professor pesquisador (filosofia) na University of Maryland-College Park. Foi
também co-autor de Hopeless: Barack Obama and the Politics of Illusion (AK Press).
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