28/7/2014, [*] Patrick Cockburn,
Counterpunch
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Entreouvido
na viela Oco do Mundo na Vila Vudu: Os “jornalistas” e “analistas” da imprensa-empresa ocidental − especialmente os vira-latas do grupo
GAFE (Globo, Abril, FSP, Estado) e congêneres − seguem caninamente o “Dicionário de Linguagem
Global do Projeto Israel 2009”
do Dr. Luntz! E não sigam...
Foto tirada dia 13/7/2014 pelo jornalista dinamarquês Allan Sorrensen, na cidade israelita de Sderot – roubada aos palestinos − perto da fronteira de Gaza): Um grupo de israelenses, reunidos para assistir ao bombardeio da faixa de Gaza como se estivessem assistindo a um jogo de futebol. Umas cinquenta pessoas, em cima de uma colina, sentados em cadeiras de jardim e algumas comendo pipocas, comentam excitados os bombardeios, aplaudindo cada explosão. “É muito legal”, diz um jovem que vive em Jerusalém, a 150 km daqui, e que veio expressamente assistir aos bombardeios; é formidável estar aqui, podem-se ouvir os trovões e ver os foguetes, é muito excitante". Enviada por Harfang. |
Os
porta-vozes israelenses já têm muito trabalho tentando explicar como os
israelenses assassinaram mais de 1.000 palestinos em Gaza, a maioria dos quais
civis, em comparação com apenas 3 civis mortos em Israel por foguetes e fogo de
morteiro do Hamás. Mas pela televisão e pelo rádio e pelos jornais, porta-vozes
do governo israelense hoje, como Mark Regev, parecem menos enroladores e menos
agressivos que predecessores, que eram muito mais visivelmente indiferentes ao
número de palestinos mortos.
Há pelo menos
uma boa razão para esse “aprimoramento” das capacidades de Relações Públicas
dos porta-vozes de Israel. A julgar pelo que se os veem dizer, já estão
trabalhando conforme um estudo feito por profissionais, bem pesquisado e
confidencial, sobre como influenciar a mídia e a opinião pública nos EUA e na
Europa.
Redigido pelo
especialista em pesquisas e estrategista político dos Republicanos, Dr. Frank
Luntz, aquele estudo foi encomendado há cinco anos por um grupo chamado “The
Israel Project” [Projeto Israel], que mantém escritórios nos EUA e em Israel,
para ser usado “por todos que estão na linha de frente da guerra midiática a
favor de Israel”.
Cada uma das
112 páginas do folheto é marcada com “proibido distribuir ou publicar” [orig. “not
for distribution or publication”], e é fácil entender por quê. O relatório
Luntz – oficialmente intitulado “Dicionário de Linguagem Global do Projeto
Israel 2009”
[orig. “The
Israel project’s 2009 Global Language Dictionary”] vazou quase imediatamente
para Newsweek Online, mas até hoje só muito raramente mereceu atenção, e
sua verdadeira importância ainda mão foi devidamente considerada.
Dr. Frank Luntz |
Deveria ser
leitura obrigatória para todos, sobretudo para jornalistas interessados em
conhecer a política de Israel, por causa da lista de “Faça/diga X” e “Nunca
faça/diga Y” dirigida aos porta-vozes de Israel.
Aquelas duas
listas são altamente iluminadoras para que se compreenda a distância imensa que
separa o que funcionários e políticos israelenses pensam e creem, e o que eles
dizem; o que eles dizem é modelado por pesquisa mantida ativa minuto a minuto,
para detalhar o que os norte-americanos desejam ouvir. Com certeza, nenhum
jornalista deveria arriscar-se a entrevistar qualquer porta-voz de Israel sem
conhecer muito bem aquele manual e ter-se preparado para contra-perguntar sobre
os muitos temas – e sempre com as mesmas palavras e frases – que se ouvem hoje
da boca do Sr. Regev e seus colegas.
O panfleto é
cheio de saborosos conselhos sobre como eles devem modelar suas respostas, para
diferentes audiências. Por exemplo, o estudo diz que:
(...) os norte-americanos aceitam que “Israel
tem direito a ter fronteiras defensáveis”. Mas Israel não tem vantagem alguma
em definir com precisão que fronteiras são essas. Evitem falar em fronteiras em
termos de pré- ou pós-1967, porque isso só faz relembrar aos norte-americanos o
passado militar de Israel. Essa expressão prejudica os israelenses, sobretudo
no campo da esquerda. Por exemplo, o apoio da direita israelense a fronteiras
defensáveis cai de 89% para menos de 60% sempre que vocês falam em termos de
1967.
E quanto ao
direito de retorno dos refugiados palestinos que foram expulsos ou fugiram em
1948 e nos anos seguintes, e que nunca mais puderam retornar às próprias casas
e terras? Aqui, o Dr. Luntz é muito sutil nos conselhos que dá aos porta-vozes
israelenses; diz que
(...) o direito de retorno é questão difícil para que os israelenses falem dela
com eficácia, porque praticamente toda a linguagem israelense soa muito semelhante
à fala de “separados, mas iguais” dos racistas segregacionistas dos anos 1950s
e dos defensores do Apartheid nos anos 1980s. De fato, os norte-americanos não
gostam, não acreditam nisso e não aceitam o conceito de “separados, mas iguais”.
Projeto dedicado às população dos EUA, Alemanha, Inglaterra e França |
Assim sendo,
como devem os porta-vozes enfrentar questões que até o manual considera “difíceis”?
Recomendam que a coisa seja chamada de “demanda” – porque os norte-americanos
detestam gente que faz demandas. O manual ensina:
Digam portanto: “os palestinos não estão
satisfeitos com o estado que têm. Agora, estão demandando mais territórios
dentro de Israel”.
Outras
sugestões para resposta israelense efetiva incluem dizer que o direito de
retorno deve ser item de um acordo final “algum dia, no futuro”.
O Dr Luntz observa
que os norte-americanos em geral temem qualquer imigração em massa para dentro
dos EUA,
portanto falem sempre de “imigração palestina
em massa para dentro de Israel” – e os norte-americanos sempre rejeitarão a
ideia. Se mais nada funcionar, digam que a volta dos palestinos faria “descarrilhar
o esforço para alcançar a paz”.
O relatório
Luntz foi redigido logo depois da Operação Chumbo Derretido em dezembro de 2008
e Janeiro de 2009, quando morreram 1.387 palestinos e nove israelenses.
Um capítulo
inteiro é dedicado a:
Isolar o Hamás, apoiado pelo Irã, como
obstáculo à paz.
Israel assassina crianças jogando futebol na praia |
Infelizmente,
agora, quando está em curso a Operação Fio Protetor, iniciada dia 6 de junho de
2014, e nova matança de palestinos, há um problema grave para a propaganda de
Israel, porque o Hamás está rompido com o Irã por causa da guerra na Síria e
está completamente sem contato com Teerã. Só reataram relações amistosas há
poucos dias – e por causa da invasão israelense.
Muitos dos
conselhos do Dr Luntz tratam do tom e do modo de expor o pensamento de Israel.
Diz que é absolutamente crucial mostrar vastíssima simpatia pelos palestinos:
Os persuasíveis [sic] não dão importância ao
que você saiba, até que se convençam de que você lamenta muito, do fundo do
coração, toda a situação. Mostre empatia PELOS DOIS LADOS!
Isso
provavelmente explica por que tantos porta-vozes israelenses vão praticamente
às lágrimas quando falam do sofrimento dos palestinos bombardeados por bombas e
mísseis israelenses.
Em frase
escrita em negrito, sublinhada e toda em maiúsculas, o Dr Luntz diz que os
porta-vozes ou líderes políticos israelenses NÃO DEVEM, NÃO PODEM, nunca, de
modo algum, justificar
o massacre deliberado de mulheres e crianças
inocentes,
e devem
reagir agressivamente contra qualquer voz que acuse Israel por tal crime.
Vários porta-vozes israelenses esforçaram-se muito para seguir esse conselho na
5ª-feira passada (24/7/2014), quando 16 palestinos foram mortos num abrigo da
ONU em Gaza.
Há uma lista
de palavras e frases a serem usadas e uma lista de palavras e frases a serem
evitadas. Há de tudo, p. ex.:
O melhor meio, o único meio, para alcançar paz
duradoura, é alcançar respeito mútuo
O mais
importante é que o desejo de paz de Israel com os palestinos tem de ser sempre
enfatizado, porque é o que os norte-americanos mais querem que aconteça. Mas se
se observarem pressões para que Israel realmente faça alguma paz, a pressão
deve ser imediatamente reduzida; nesse caso, os israelenses devem dizer:
(...) um passo de cada vez, um dia depois do
outro.
Expressões
que serão facilmente aceitas como abordagem de bom senso, para a equação:
Deem-nos A TERRA, que lhes damos a paz.
O Dr Luntz
cita como exemplo de “pegada israelense
muito eficaz” a seguinte frase:
Quero muito particularmente falar às mães
palestinas que perderam seus filhos. Nenhum pai ou mãe deveria ter de enterrar
suas crianças.
O estudo
admite que o governo israelense não quer, de fato, qualquer solução de dois
estados, mas diz que isso não pode ser declarado publicamente, porque 78% dos
norte-americanos são favoráveis àquela solução. Devem-se enfatizar sempre as
muitas esperanças de que os palestinos progridam economicamente.
Israel vence a Copa do Mundo do GENOCÍDIO |
O
primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é citado com elogios, por ter dito que:
Já é hora de alguém perguntar ao Hamás: o que,
afinal, estão fazendo para melhorar a vida de seu povo?!
A hipocrisia,
aí, é inacreditável: é Israel, com os sete anos de bloqueio econômico que impõe
a Gaza, quem reduziu Gaza ao estado de pobreza e miséria em que vive hoje.
Em todos os
casos e ocasiões, o modo como porta-vozes israelenses apresentam os fatos é
planejado para dar a norte-americanos e a europeus a impressão de que Israel
desejaria muito a paz com os palestinos e estaria disposta a ceder para chegar
à paz. Todas as evidências, e também o Manual do Dr. Luntz, sugerem que tudo
aí, são MENTIRAS. Embora não tenha sido requisitado ou produzido com essa
finalidade, poucos estudos mais reveladores foram jamais escritos sobre a
Israel contemporânea, em tempos de guerra e paz.
[*] Patrick Cockburn (nasceu 5/3/1950) é um
jornalista irlandês que tem sido correspondente no Oriente Médio desde 1979
para o Financial Times e, atualmente, The
Independent. Está entre os comentaristas mais experientes no
Oriente Médio; escreveu quatro livros sobre a história recente do Iraque. Recebeu o vários prêmios por seu
trabalho incluindo o Prêmio Gellhorn Martha em 2005, o Prêmio James Cameron em
2006 e o Prêmio Orwell de Jornalismo em 2009. Cockburn escreveu três livros
sobre o Iraque: One, Out of the Ashes: The Resurrection of Saddam Hussein,
escrito em parceria com seu irmão Andrew Cockburn, antes da guerra no Iraque. O
mesmo livro foi mais tarde re-publicado na Grã-Bretanha com o título: Saddam
Hussein: An American Obsession. Mais dois foram escritos por Patrick
sozinho após a invasão dos EUA e após a sua reportagem premiada do Iraque. Escreve
também para CounterPunch e London Review of Books.
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