Publicado em 17/10/2010 por Eliakim Araujo
Tem a Igreja o direito de imiscuir-se na vida política do país? Para Dom Aldo Pagotto, arcebispo da Paraíba, não. Mas, na prática, não foi isso que ele pregou em discurso de quase 15 minutos que foi disparado esta semana pelas tropas serristas na frente de combate da internet.
Foram dois vídeos de religiosos que se espalharam pelas correios eletrônicos esta semana, pedindo abertamente que suas ovelhas não votassem na candidata do PT sob o surrado argumento de ser a favor do "assassinato de criancinhas", como esbravejou Monica Serra, ela mesma apanhada em flagrante por confidência que fez às suas alunas, em 1992, de que tinha feito um aborto no inicio de sua vida de casada com José Serra, quando ainda viviam no Chile. Mas esse é um direito dela que deve ser respeitado e pelo qual ela não merece ser condenada, como também não tem ela o direito de ofender os que defendem a descriminalização do aborto.
Mas o que interessa mesmo à coluna deste domingo é o discurso de Dom Pagotto em que ele acusa o PT de possuir em seu programa a completa legalização do aborto.
Com um retrato do Papa na parede diante da qual lê o discurso, Dom Pagotto começa dizendo que "engana-se quem pensa que esteja em jogo apenas o dilema da escolha do candidato ou do partido". E mais adiante, para entrar no tema do aborto: "os conceitos de vida e de dignidade humana estão ameaçados no mundo de hoje como nunca se viu". A partir daí, Pagotto desce o pau no PT e na candidata Dilma: "Em 2003, desde que chegou ao poder, o PT assumiu como projeto de governo a completa legalização do aborto no Brasil". E já no encerramento, Pagotto assinala que "não cabe à Igreja imiscuir-se em política partidária, mas é dever alertar os cidadãos na hora de votar...os bispos de São Paulo, a quem aplaudo veementemente, estão seguindo a comunhão profética da Igreja em comunhão com o Papa".
Depois disso parte para o gran finale: "estamos diante de um partido nitidamente comprometido com a instalação da cultura da morte em nosso país e que se utiliza da mentira para enganar eleitores sobre seus verdadeiros propósitos". De fato, Pagotto tem razão: isso não é imiscuir-de em politica, isso é simplesmente fazer da Igreja um partido politico, em perfeita sintonia com a grande imprensa que assumiu com a maior desfaçatez o compromisso de derrotar a candidatura Dilma.
Se alguém quiser assistir o vídeo de Dom Pagoto ( Veja o vídeo ), embora fortemente eu não recomende. O bispo lê mal, gagueja, tropeça nas palavras e o som é péssimo.
Felizmente, como na mídia, há os setores progressitas que não aceitam essa intromissão indevida e oportunista de alguns religiosos na decisão livre e soberana dos eleitores. E as reações não tardaram. Destaco aqui uma delas, o belo e emocionado depoimento de um professor da USP, católico, que deixo para a relfexão dos leitores neste domingo, a duas semanas do pleito.
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A CNBB virou comitê central de campanha?
por Emílio Carlos Rodriguez Lopez*
À Dom Luciano Mendes de Almeida, o amigo verdadeiro dos pobres.
Durante cinco anos fui coordenador do projeto de formação política e comunicação da região Leste 1. Na década de 80, ajudei na campanha de Plínio de Arruda Sampaio a deputado federal e a governador, participei da campanha de Chico Whitacker para vereador e do Plenário Pro Participação Popular na Constituinte e na campanha contra a revisão da Constituição. Também fui um dos coordenadores da Juventude Universitária Católica.
Tenho dois filhos lindos consagrados à Nossa Senhora de Fátima e agradeço a intercessão de Nossa Senhora Aparecida por salvar a vida da minha filha, que com sete dias de existência passou por uma cirurgia cardíaca e mais quarenta e cinco dias na UTI. Por tudo isso e, ainda amar a vida, sempre fui contra o aborto.
Nos últimos tempos, estou assistindo atônito e envergonhado o apoio ostensivo de bispos paulistas ao candidato à Presidente da República, José Serra. O pretexto de tal apoio seria a posição deste cidadão ser contrário ao aborto e defensor da vida. Oras, mesmo para defender esta causa santa não há a necessidade de tanto alarde e exploração mal intencionada do assunto, visto que os quatro principais candidatos têm posição contrária a esta prática.
Recentemente, a Regional Sul-1 da CNBB lançou um manifesto anti-Dilma, acusando-a de defender o aborto. A complacência da CNBB fez com que setores conservadores usassem a autoridade eclesiástica para cercear o direito ao voto dos católicos e, além dos mais, permitiu que se espalhassem boatos maldosos e caluniosos contra uma pessoa.
Esta campanha foi organizada pela Opus Dei, que funciona como um partido clandestino dentro da Igreja Católica contra o PT e Dilma e a favor de Serra. Esse grupo tem como premissa à defesa da vida. Para eles, a Opus Dei, o ato de viver se resume a nascer. Desse modo, para a Opus Dei reduzir a miséria e melhorar as condições de vida de milhões de brasileiros não é promover a vida. Assim como, para eles, também não é promover a vida dar condições para o povo comer carne e ter emprego.
Esta concepção restrita da defesa da vida esconde a intenção da Opus Dei de usar a religião para fins políticos eleitorais e transformar o altar em local de comício para dominar o Brasil. A Opus Dei é uma organização católica de extrema direita que não aceita pobres entre seus membros e que apoiou a ditadura fascista na Espanha e em muitas outras partes do mundo, inclusive no Brasil. Além dos tentáculos econômicos poderosos que levaram a práticas de lavagem de dinheiro no Banco Ambrosiano – caso da Máfia da P2 -, domina Faculdades na Espanha e tem representantes em diversos veículos da mídia, inclusive da brasileira
Por tudo isso, não é possível tolerar que falsos democratas e amantes de ditaduras façam da defesa da vida um pretexto para atacar da forma mais vil um ser humano, lançando sobre uma mulher um leque de grosserias e inverdades.
Essa cabala, aliás, age como o arcebispo de Recife ao excomungar uma menina de 9 anos de idade que foi violentada e daria luz a uma criança. Ocorre que se tivesse o bebê ela poderia falecer durante o parto, visto que fisicamente não tem condições de ter uma criança. Essa menina que já havia sofrido enorme violência ao ser estuprada foi excomungada pelo religioso, assim como toda a equipe médica. Este drama humano mostra a hipocrisia de uma Igreja mais preocupada em punir do que em amar ao próximo. Se a menina morresse, não seria também atentar contra a vida? Quantas mulheres não passam por essa difícil situação e não encontram uma só palavra de amor. Provavelmente só ouvem rancor e ódio, além de sentir o preconceito.
Quem age contra uma criança excomungando-a também age inquisitoriamente contra uma mulher, cujo único pecado é amar os pobres e querer continuar o trabalho do atual presidente que está gerando a prosperidade para os brasileiros e concretizando a vida em abundância, ou seja, concretizar o ideal bíblico da terra onde corre leite e mel. Isto a Opus Dei, uma organização elitista, voltada para os ricos, não perdoa. Por isso, odeiam tanto o Lula e o PT.
Por último, há uma diferença entre o Cristo que carrego dentro de mim e o desta gente. A Opus Dei e setores elitistas da Igreja são os continuadores dos fariseus, doutores da lei, que segundo Jesus Cristo usavam a religião como arma de dominação sobre os mais pobres. Eles se esquecem que Jesus vivia no meio dos mais pobres e humildes, nasceu na manjedoura e não em berço de ouro. Por que será que um simples pescador foi o sucessor de Cristo? E não se esqueçam de que as mulheres, as mais oprimidas naquele tempo, ficaram com Jesus até o fim, entre elas estava uma prostituta, Maria Madalena. Ah, não foram os sumos sacerdotes e os fariseus que condenaram Jesus a morrer na cruz?
Enfim, coberto de cinzas, para expressar a minha vergonha como católico praticante, pergunto que religião é esta que semeia o ódio e não o amor, como manda Jesus?
Observação:
Se quiserem me excomungar, como ameaçou o padre da Canção Nova (ele pensa que estamos na Idade Média), excomunguem. Ao menos, saberei que estou seguindo os passos de outros santos, como São Francisco que sofreu processo de heresia pelo Papado na Idade Média, por pedir uma Igreja simples e despojada de bens materiais.
P.S. - Participo de movimentos na Igreja Católica, desde 1979. Primeiro, na Pastoral de Juventude, onde me tornei coordenador da região Leste 1 da Arquidiocese de São Paulo, na ocasião coordenada por Dom Paulo Evaristo Arns. Lá conheci Dom Luciano Mendes de Almeida e o vi, muitas vezes, ceder a sua cama para um mendigo dormir ou repartir o pão. Este homem foi durante os anos críticos do final da ditadura um exemplo de moderação, o que falta hoje entre os atuais bispos.
*Emílio Carlos Rodriguez Lopez, mestre em História Social pela Universidade de São Paulo
Extraído do Direto da Redação