Pepe Escobar |
9/11/2011, Pepe
Escobar, Asia Times Online
Tradizido pelo
pessoal da Vila
Vudu
Preparem-se para
uma chuva de informes de “inteligência”, no formato de imagens de satélites nas
quais todos os modelos de armazém fotografados em território iraniano serão
freneticamente descritos como segmentos de linha de montagens de bombas
atômicas. (Lembram a famosa “instalação atômica secreta” localizada na Síria, há
alguns anos? Era uma fábrica de tecidos).
Preparem-se para
uma chuva de diagramas mal desenhados e imagens de objetos de ar sempre muito
suspeito, ou dos contêineres onde teriam sido escondidos, todos capazes de
atingir a Europa em 45 minutos.
Preparem-se para
uma chuva de “especialistas” nos canais Fox, CNN e BBC, empenhados em dissecação
sem fim de todas aquelas mal traçadas linhas travestidas como se fossem
“provas”. Por exemplo, o ex-inspetor de armas da ONU, David Albright, agora
empregado do Institute for Science and
International Security (ISIS), já conseguiu escapar do mundo das almas
mortas e já voltou à telinha, exibindo suas credenciais de “bombardear o Irã”,
acrescidas de diagramas e inteligência de satélite.
Esqueçam o Iraque.
Fora de moda, tãããããão 2003. O novo
groove está aí. É guerra
contra o Irã já.
Virar japonês
Para começar,
convoquem algum senso comum.
Se o Irã estivesse
construindo uma bomba atômica, teria de ter desviado urânio para essa
finalidade. O relatório divulgado essa semana pela Agência Internacional de
Energia Atômica [International Atomic Energy Agency (IAEA)] – por mais
politicamente enviesado que seja – nega absolutamente qualquer desvio de
urânio.
Se o Irã estivesse
desenvolvendo uma bomba atômica, os inspetores da ONU a serviço da IAEA teriam
sido expulsos do país.
OK. Em 2002 o
Iraque não tinha programa de armas nucleares. E, mesmo assim, foi chocado e
apavorado. O mesmo argumento vale também para o Irã.
Teerã deve ter
feito, isso sim – se merecem algum crédito as informações de inteligência super
enviesadas usadas para o relatório da IAEA – muitos experimentos e simulações em
computador. Todo o mundo faz – inclusive países que desistiram da bomba, como o
Brasil e a África do Sul.
O Corpo dos
Guardas Islâmicos Revolucionários [ing.
Islamic Revolutionary Guards Corps (IRGC)] – encarregado do
programa nuclear civil – quer, sim, com certeza, uma força de contenção.
Quer dizer: eles
querem poder construir uma bomba nuclear, para o caso de virem a enfrentar
ameaça confirmada e inequívoca de mudança de regime induzida, mais
provavelmente, por ataque militar ou invasão pelos EUA.
Há
muitas dúvidas sobre a competência – ou a imparcialidade – do novo presidente da
Agência Internacional de Energia Atômica, o submisso Yukya Amano, japonês. A
melhor resposta sobre isso está num telegrama Wikivazado, de 2010 [1].
Quanto à origem de muito do que tem sido apresentado
pela IAEA como inteligência “confiável”, até o
New York Times já foi
obrigado a noticiar que “parte daquelas informações foram enviadas à IAEA por
EUA, Israel e Europa”. Gareth Porter já destruiu definitivamente a credibilidade
daquele relatório [2].
Além do mais,
preparem-se para pressão máxima contra a CIA, para que desminta o crucial 2007 National Intelligence Estimate
(NIE), que estabeleceu – de forma irrefutável – que Teerã encerrou seu
programa nuclear para armas atômicas há muito tempo, em 2003.
Tudo isso
encaixa-se perfeitamente com os latidos dos cães de guerra, que já começaram a
latir.
Os fantoches
europeus podem ser incompetentes até para vencer uma guerra na Líbia (só
conseguiram, depois que o Pentágono assumiu o comando da inteligência via
satélites).
Podem ser
incompetentes até para dar solução ao desastre financeiro da Europa. Mas França,
Alemanha e UK já começaram a latir – exigindo sanções mais duras contra o
Irã.
Nos EUA,
Democratas e Republicanos juntos exigem não só sanções; os Republicanos pirados
(evidente oxímoro) clamam por nova versão da Operação Choque e Pavor.
Nunca é pouco
repetir como funcionam as coisas em Washington. O governo de Benjamin Netanyahu
em Israel diz ao poderoso AIPAC (American Israel Public Affairs
Committee) o que fazer; e o
AIPAC transmite as ordens
ao Congresso dos EUA.
Por isso a
Comissão de Relações Exteriores da Câmara de Deputados dos EUA já está
analisando um projeto de lei a ser apresentado pelos dois partidos e que, de
fato, é declaração de guerra ao Irã.
Nos termos da lei
em discussão, nem o presidente Barack Obama, nem a secretária de Estado Hillary
Clinton, nem, de fato, nenhum diplomata dos EUA, poderá manter qualquer tipo de
contato ou relação diplomática com o Irã – a menos que Obama obtenha, “das
comissões apropriadas do Congresso”, uma declaração de que não falar com o Irã
implicaria “ameaça extraordinária a interesses vitais da segurança dos
EUA.”
“Comissões
apropriadas do Congresso” é exatamente a Comissão de Relações Exteriores da
Câmara de Deputados dos EUA, que recebe ordens de marcha marcial diretamente de
Bibi, em Israel, via o AIPAC, em
Washington.
Tentem dizer a
qualquer daqueles hiper-Israel-acima-de-tudo no Congresso dos EUA quais são as
reais consequências imediatas de atacar o Irã: o Irã, em minutos, fechará o
Estreito de Ormuz, com o que serão cortados 6 milhões de barris de petróleo, da
economia mundial (que já está em recessão no norte industrializado), o que
elevará o preço do barril de petróleo para 300, 400 dólares. De nada adiantará:
eles não sabem juntar lé com cré.
Preparem-se. E
nenhum passo fora da agenda
Começam a aparecer
boatos de que o Corpo dos Guardas Revolucionários Islâmicos (IRGC) teria dito,
segundo a agência de notícias Fars, que bastam quatro mísseis iranianos para
deter Israel.
Esse mísseis
talvez sejam – e talvez não sejam – os mísseis nucleares cruzadores soviéticos
Kh-55 da Ucrânia e da Bielorrússia, com alcance máximo de 2.500 km , e que o Irã
talvez tenha comprado, há anos, no mercado negro.
O IRGC, claro,
mantém-se em silêncio. O que só faz aumentar o nevoeiro da (pré) guerra –,
porque ninguém sabe coisa alguma sobre a qualidade das defesas do Irã.
Segredo que todos
conhecem em Washington é que a ‘mudança de regime’ no Irã é jogo de guerra que
já vem sendo jogado desde, no mínimo, 2004.
Ainda se aplica o
mapa do caminho favorito dos neoconservadores, de 2002; os alvos são Iraque,
Síria, Líbano, Irã, Somália e Sudão – pontos chaves do “arco de instabilidade”
inventado pelo Pentágono.
Imaginem esses
PhDs em matanças e guerras examinando o tabuleiro de xadrez. O Iraque já está
devidamente chocado e apavorado (apesar de os EUA estarem sendo chutados de lá).
A Síria é jogo duro demais para os incompetentes da OTAN. O Líbano (o Hezbollah)
só será derrotado se a Síria cair antes. A Líbia foi vitória (esqueçam que a
guerra civil na Líbia que durará muito tempo). A Somália pode ser contida com
Uganda e aviões-robôs tripulados à distância, os drones. E o Sudão do Sul já está no
saco.
O que deixa aberta
– para os adeptos linha dura da doutrina da Dominação de Pleno Espectro –, a
tentação sedutora de um ataque bem-sucedido contra o Irã, como o ápice de um
movimento radical de destruição, que redistribuiria todas as cartas, do Oriente
Médio à Ásia Central. O “arco de instabilidade” estaria, afinal,
desestabilizado.
Como fazer? É
simples – do ponto de vista dos dedicados servidores da morte e da guerra. Basta
convencer Obama de que, em vez de infernizar-lhe a vida, os conservadores
beijarão o chão que ele pisa e o canonizarão como o salvador ressuscitador da
economia dos EUA... se Obama concordar com, só, começar mais uma guerra.
Alguém aí está
interessado em Occupy Irã – literalmente?
Notas dos
tradutores
[1]
“New UN chief is
'director general of all states, but in agreement with us” [Novo diretor da
IAEA-ONU é "diretor geral de todos os estados", mas em acordo conosco] –
16/10/2009, Telegrama
CONFIDENCIAL VIENNA 000478, WikiLeaks, em
Guardian, UK, 2/12/2010
(trechos que
o Guardian assinala como “mais
importantes”):
“O novo diretor
geral designado da IAEA, Yukiya Amano, em reunião com o embaixador, agradeceu o
apoio dos EUA a sua candidatura e muito enfatizou que apoia todos os objetivos
estratégicos dos EUA na condução da Agência.
Amano disse ao Embaixador em
várias ocasiões que terá de fazer concessões ao G-77 que, acertadamente, exige
que aja de modo justo e independente, mas que concorda enfaticamente com os EUA
e jogará conosco em todas as decisões estratégicas chaves, desde a indicação do
pessoal de alto nível, até o modo como manobrar o chamado programa nuclear do
Irã [itálicos no telegrama
original].
3. (SBU) Amano
partilhou com o embaixador Davies sua posição pública sobre o papel da Agência
Internacional de Energia Atômica e a contribuição a Agência nas questões globais
cruciais da proliferação [de armas atômicas], segurança, energia, saúde humana e
administração da água. Mais sincero, Amano observou a importância de manter uma
certa “ambiguidade construtiva” sobre seus planos, até, pelo menos, que ele
assuma o posto que hoje é de ElBaradei, o que acontecerá em dezembro [fim do
excerto] .
[2]
9/11/2011, Gareth
Porter, “IAEA's "Soviet Nuclear
Scientist" Never Worked on Weapons” [Os “cientistas nucleares
soviéticos” da IAEA jamais trabalharam em programas de armas], IPS News, (em
inglês).
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