31/1/2012, *MK
Bhadrakumar, Indian
Punchline
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
A
expressão popular “Me segurem!”, que os israelenses usam muito, é útil quando,
numa briga de rua, você pede que os amigos o segurem e impeçam que você dê uns
sopapos no grandão que o desafia e que tem boa chances de, se quiser, pôr você a
nocaute.
Israel
aprendeu a manobrar a expressão “Me segurem!” com perfeito timing. O timing é importante, porque, a menos que você grite
“Me segurem!” a tempo, você estará à frente do grandão, sem opção de fuga; e
ameaçado de ser visto como arrogante, que finge que é o que não é e que pode o
que não pode.
Mais uma vez, Israel está requentando a “ameaça” de que
estaria à beira de atacar o Irã.
Al-Jazeera publicou um interessante artigo de MJ Rosenberg,
conhecido comentarista judeu-norte-americano, que oferece o histórico de muitas
ameaças israelenses desse tipo, na história recente [1]. Claro
que nenhuma das ameaças recentes foi cumprida. Por quê? É simples: o establishment militar e de segurança israelense é
constituído de seres racionais, que conhecem bem as próprias potências e
fragilidades e que não se deixarão arrastar por políticos ensandecidos.
Assim
sendo, por que Israel insiste em fazer, dessas ameaças verbais ocas, meio de
vida? De fato, as ameaças não são completamente ocas: têm excelente lógica e
objetivo claro. Israel está enviando sua mensagem aos políticos em Washington:
“Façam mais alguma coisa, além do que estão fazendo no front iraniano”.
Também nesse caso, o timing é importante. Nada horroriza mais Israel que
a possibilidade de se reiniciarem negociações sobre a questão nuclear iraniana.
O espectro de recomeçarem as negociações “5+1” e de avançarem provoca pânico em Israel.
Portanto, Israel trabalha dedicadamente para boicotar qualquer via
política/diplomática. Israel sabe que, mais cedo ou mais tarde, se se seguir a
via diplomática, os passos lógicos seguintes porão frente a frente os diplomatas
iranianos e norte-americanos.
Então,
Israel recomeçou, aos gritos de “Me segurem!”. Vale a pena ler o despacho
(hilário) da Associated Press
[2], sobre
o desespero que cresce entre os israelenses. Mas o grito de guerra dos
israelenses já começa a ecoar em Washington. O pessoal no Capitólio que recebe
generosa contribuição do lobby
israelense já está exigindo mais ação contra o Irã. Parece que já se estuda
outro conjunto de sanções a serem impostas pelos EUA [3]
ao
Irã.
O governo dos EUA tem um problema a resolver. E tem
também de prestar atenção ao que diz o influente canal Fox News: que o Irã pode vir a ser o
coringa que decidirá as eleições presidenciais de 2012 [4]. O
presidente Barack Obama sabe que a eleição será disputa apertada – a menos que
os Republicanos indiquem Newt Gingrich para fazer-se de idiota na campanha, em
comparação ao qual o atual presidente parece candidato infinitamente
melhor.
O
desafio para Obama é conseguir surfar a onda da histeria de guerra que Israel
tenta inflar; e extrair daquela histeria o maior número possível de votos
conservadores durante a campanha; mas sem ter de atacar o Irã (ação para a qual,
como Obama sabe melhor que qualquer um no planeta, os EUA não têm nem motivação
nem capacidade).
Do
ponto de vista de Obama, o melhor dos mundos seria poder ordenar ataque militar
limitado contra o Irã (como fez Bill Clinton, que disparou velhos mísseis contra
Kandahar, mantendo-se bem longe, em distância segura). Mas essa não é opção
hoje, a menos que houvesse total, absoluta, completa garantia, 100% garantido,
que Teerã não retaliará. Essa garantia, evidentemente, não existe.
Felizmente, Obama conta com os préstimos de um político
experimentado: seu secretário de Defesa Leon Panetta. Panetta entrou logo em
ação [5].
Desdisse tudo o que dissera antes e passou a dizer que o Irã tem capacidade para
construir uma bomba no prazo de um ano, se resolver ter bomba; que se isso
acontecer, e se a inteligência dos EUA apresentar provas de que o Irã persiste
em seu programa nuclear, ele, nesse caso, não descartaria nenhuma opção, para
impedir o avanço do Irã. Muito bem posto! Nesses termos, o Irã não precisa
preocupar-se demais. E, ao mesmo tempo, Panetta consegue não desmentir nem
contradizer Israel... apesar de ter lançado boa água fria na histeria israelense
contra o Irã.
Simultaneamente,
o Pentágono despachou mais navios de guerra para o Golfo Persa. O maior risco
dessa encenação é que de repente, sem que nenhum dos hábeis protagonistas
desejem, surja uma faísca que pode, em pouco tempo, desencadear conflagração
apocalíptica.
Não
é descabido o medo dos israelenses, de serem condenados a viver em planeta
deserto, dada a alta competência dos iranianos no front diplomático. O Irã é mestre consumado das
artes da diplomacia e confia nos próprios talentos para servir, na máxima
amplidão, aos interesses centrais do país. A saga pós-Iraque depois de 2003 é
exemplo brilhante.
Como
bem se poderia prever, o Irã já começou a extrair importantes dividendos
políticos da visita que os inspetores da Agência Internacional de Energia
Atômica (AIEA) fazem a Teerã. A equipe inclui dois inspetores de armas
cuidadosamente selecionados os quais, muito provavelmente, já saíram de Viena
com ordens de não voltar de Teerã sem alguma coisa que prove que a bomba
existe.
Pois os iranianos sugeriram que os inspetores prolonguem
a visita, prevista para três dias, até depois de 30/1, [6]
para
que os inspetores possam visitar mais instalações nucleares no Irã e conversar o
quanto queiram com cientistas iranianos, até que se convençam de que não existe
programa iraniano para construir bombas
atômicas.
Notas
dos tradutores
[2] 30/1/2012, Washington
Post, em “Israeli
officials say the window of opportunity to strike Iran narrowing
fast”
[5] 30/1/2012, Radio Free Europe
- Radio Liberty em “Panetta Says
Iran Could Develop Nuclear Weapon
Within A Year”
*MK Bhadrakumar foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre
temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais
The
Hindu,
Asia
Online e Indian Punchline.
É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
Ilustração Blog do Charque