por Paul Craig Roberts
[*]
Resenha do
livro“The Bubble and Beyond” de Michael Hudson
Alguns
leitores por vezes pedem-me para recomendar um livro no qual possam aprender
teoria econômica (economics).
O problema em
ler um livro para aprender a teoria económica que é ensinada nas universidades e
praticada em Washington é que a mesma é agora um assunto altamente formalizado
baseado em modelos e suposições abstratas e que foram matematizadas.
Não é que
seja totalmente inútil sem qualquer aplicabilidade a problemas do mundo real. O
problema, antes, é que a disciplina tanto se retarda perante um mundo sempre em
mudança como entende algumas coisas erradamente desde o princípio.
Consequentemente,
aprender teoria econômica coloca uma pessoa dentro de uma caixa onde algumas das
ferramentas e o entendimento proporcionado estão ultrapassados e
incorretos.
Por exemplo:
Todo manual desenhará um quadro da agricultura como o exemplo perfeito de
mercados competitivos nos quais “nenhuma quantidade produzida por produtores é
suficientemente grande para afetar o preço”. Isto fazia sentido quando um terço
da força de trabalho dos EUA estava em quintas familiares.
Hoje , a agricultura americana é dominada por corporações e agrobusiness. Além disso, parte da
desastrosa desregulamentação financeira pressionada por economistas que não
pensam e interesses especiais foi a remoção de limites de posição sobre os
especuladores. Antigamente, os especuladores suavizavam a agricultura e os
mercados de commodities pela compra e
venda a fim de estabilizar preços nos períodos em que a oferta e a procura
estavam desequilibradas. Agora os especuladores podem dominar os mercados e
manipular preços em benefício dos seus lucros.
Há muitos
exemplos assim em que a teoria econômica já não corresponde ao mundo real.
Dois outros
bastarão:
A maior parte
das pessoas inteligentes está consciente que os recursos naturais são finitos,
incluindo a capacidade do ambiente de absorver os resíduos ou a poluição
resultante de atividades produtivas (ver por exemplo, Jared Diamond, Colapso , 2005). Mas poucos economistas têm a
percepção disso, por assumirem que o capital feito pelo homem é um substituto
perfeito para o capital da natureza. Esta suposição implica que não há limites
ambientais finitos para um crescimento econômico infinito. Perdidos em tal mundo
imaginário, economistas ignoraram o custo pleno da produção e não podem dizer se
o valor dos aumentos no PIB é maior ou menor do que o custo pleno para
produzi-lo.
Economistas
quase universalmente têm confundido a deslocalização (offshoring) de
empregos com o livre comércio. Economistas conseguiram mesmo produzir “estudos”
destinados a mostrar que uma economia interna é beneficiada por ser transformada
no PIB de algum outro país.
Economistas
conseguiram fazer esta declaração mesmo quando o seu absurdo é óbvio para aquilo
que resta da força de trabalho da indústria manufatureira, industrial e de
trabalho qualificado (engenheiros de software, por exemplo) e para as cidades e
estados cujas bases fiscais foram devastadas pelo movimento de exportação de
empregos estadunidenses.
Os poucos
economistas que têm a inteligência de reconhecer que a exportação de empregos é
a antítese do livre comércio são despedidos como "protecionistas". Economistas
são tão dogmáticos acerca do livre comércio que construíram mesmo o mito
folclórico de que a ascensão da economia dos EUA foi baseada no livre comércio.
Como provou Michael Hudson, um economista capaz de pensar fora da caixa, não há
a mínima evidência que corrobore este mito folclórico (ver America's
Protectionist Takeoff 1815-1914 ).
O meu
conselho aos leitores que pretendem desenvolver a sua compreensão econômica é
começar com os economistas fora da caixa que estão a tratar das questões reais.
Exemplo: For the Common
Good , de Herman E. Daly e John B. Cobb é acessível a leitores
comuns que se disponham a fazer o esforço de pesquisar no Google as definições
de termos não familiares. Entretanto, o mais importante desenvolvimento na
teoria do comércio não está ali. Global
Trade and Conflicting National Interests , de Ralph E. Gomory e
William J. Baumol (MIT Press, 2000) aparentemente está muito acima das cabeças
de economistas profissionais, que preferem antes tagarelar de forma ignorante
acerca dos “benefícios do livre comércio” do que aprender aquilo que devem
saber. No entanto, os leitores deveriam entender que a defesa do livre comércio
nunca mais será a mesma após a sua dissecação por Gomory e Baumol.
Michael Hudson |
Com esta
introdução, volto-me agora para o assunto principal: o economista Michael
Hudson.
Hudson está
totalmente fora da matriz na qual economistas se aprisionam a si próprios.
Hudson não vive na realidade artificial de economistas ou de sócios apostadores
para corporações e a Wall
Street.
Pode-se aprender um bocado com
Hudson. O seu livro Trade,
Development and Foreign Debt (2009) explica como o comércio
exterior e o desenvolvimento econômico tem sido utilizados para concentrar poder
econômico nas mãos dos países dominantes. O que está realmente a acontecer é
[habitualmente] encoberto com verborreia e modelos formais. Na realidade, o
comércio e o desenvolvimento são meios de colonizar países que pensam serem
independentes. (Outro bom livro sobre este assunto é The Globalization of
Poverty, de Michel Chossudovsky).
Talvez o melhor livro
para começar seja o mais recente de Hudson, The Bubble and
Beyond, que estará
disponível dentro em breve.
Neste livro Hudson trata tanto da
crise na economia como da crise na disciplina da ciência económica. A partir do
mesmo poderá entender não só a crise mas também porque economistas a
diagnosticaram mal e estão a aplicar remédios incorretos.
Hudson mostra que um dos problemas
centrais é o fato de a teoria econômica ignorar o papel da dívida na economia. A
teoria econômica também pretende que a política econômica, como a política
monetária do Federal Reserve, serve o interesse do público ao invés dos
interesses dos privados poderosos.
Tal como Lenine e outros previram,
o capitalismo industrial transformou-se em capitalismo financeiro.
O capitalismo financeiro não financia ou cria novos
investimentos reais tais como instalações manufatureiras. Ao invés disso, o
capitalismo financeiro funciona como um rentista (rentier). Ele alavanca
dívida e extrai pagamentos de juros (e hoje salvamentos dos contribuintes pelas
suas apostas super-alavancadas).
O capitalismo financeiro floresce
ao converter cada vez mais recursos da sociedade em pagamentos para si
próprio.
Um resultado disso é que os
mercados cessam de expandir-se e as economias cessam de crescer quando a
austeridade é imposta ao serviço da acumulação de dívida. A austeridade deprime
as economias pois o consumo e o investimento são reduzidos a fim de servir a
dívida. Hudson conclui que o resultado é que banqueiros agora recebem as rendas
(uma forma de rendimento não merecido) que outrora afluíam para a aristocracia
fundiária. Ao contrário da aristocracia, que foi desapossada das suas rendas, os
banqueiros não o foram.
Hudson conhece a história do
pensamento econômico e história econômica. A leitura de The Bubble and Beyond
permite aos leitores verem como as ideias econômicas desenvolveram-se por
caminhos que deixam economistas incapazes de perceberem o caráter real dos
problemas que os desafiam. Aprisionados no molde que construíram para si
próprios, economistas são incapazes de criar soluções.
Hudson escreve que as economias
ocidentais estão num ponto de viragem. O crescimento do PIB consiste cada vez
mais de acumulação de encargos financeiros. Os ganhos de riqueza são ganhos de
papel, não ganhos de instalações e equipamentos reais, e estão cada vez mais
concentrados nas mãos do um por cento. Os ganhos financeiros são extraídos dos
ganhos de capital tangível e do trabalho. Matt Taibbi detectou o ponto essencial
com a sua imagem da Goldman Sachs como “um grande polvo vampiro envolvendo a
humanidade, a sugar implacavelmente o seu sangue canalizando qualquer coisa que
cheire a dinheiro”.
A minha sugestão é que leia Hudson
juntamente com Griftopia, de Taibbi; It Takes A Pillage, de Nomi Prin; Reckless Endangerment, de Gretchen Morgenson e Joshua
Rosner; e For the Common Good, de Daly e Cobb. A seguir, se estudar
teoria econômica, estará protegido e não ficará preso à matriz que produz
economistas para serem sócios apostadores do capitalismo financeiro, ou para a
destruição ambiental e a deslocalização da economia.
Toda a gente quer sempre uma
solução. Hudson apresenta sugestões de como reconstruir a economia a fim de que
ela sirva às necessidades dos 99% ao invés de servir apenas os 1%.
Comece a trabalhar. Ler estes
livros fará para si muito maior bem do que brincar com jogos vídeo, ver TV ou
frequentar bares. Nosso país precisa de uma geração mais jovem e mais bem
informada para substituir a menos bem informada geração mais velha.
31/Julho/2012
[*]
Antigo secretário assistente do Tesouro dos EUA e editor associado do Wall
Street Journal. Seu último livro, Wirtschaft am Abgrund (Economias em
colapso) , acaba de ser publicado.
O artigo original, em
inglês, encontra-se em: “Michael
Hudson's "The Bubble and Beyond" - Escape From Economics”
Esta
tradução foi extraída do sítio Resistir e
ligeiramente adaptada pela redecastorphoto
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