22/12/2012, *MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Hilária Clinton |
Em
conversas privadas, os amigos russos volta e meia manifestam ceticismo, sobre as
relações EUA-Rússia; para eles, a secretária Hillary Clinton representou sempre
mais o governo de Clinton, que o de Obama. Bill Clinton sempre procurou,
incansavelmente, arrancar vantagens de uma Rússia fraca, que lutava para sair
das ruínas da União Soviética; e, nisso, sempre foi impiedoso.
Políticos
chave, como Strobe Talbott e sua bagagem de pensamento da guerra-fria, jamais
conseguiu ocultar o tom de triunfalismo; para eles a URSS foi chutada como
cachorro morto, para a lata do lixo da história.
Hillary Clinton, nessa linha, jamais manifestou qualquer empatia com a
Rússia, e, em vários sentidos, retomou a linha do governo Bill Clinton. Gente
como Talbott com certeza trabalhou com ela, nos bastidores.
Mas
Obama mais de uma vez deu sinais de que tinha outra percepção sobre a Rússia e
os laços que ligam aquele país e os EUA. De fato, voltamos sempre à mesma
questão: Obama terá agenda de transformação para a política exterior dos EUA,
para seu segundo mandato? As indicações para os postos chaves do novo gabinete
podem dar algumas pistas.
John Kerry |
Por
isso a indicação
do Senador John Kerry
ao posto
de secretário de Estado ganha especial interesse.
A “popularidade” de Kerry entre os congressistas americanos é vantagem para
Obama, se estiver realmente buscando inovar na política exterior. Isso, para
começar.
Em
segundo lugar, Kerry é figura bem conhecida na comunidade internacional. Em
terceiro, não é jejuno, no mundo da diplomacia: já presidiu a Comissão de
Relações Exteriores do Senado, e já cumpriu funções diplomáticas, como quando
foi várias vezes encarregado de missões para “apagar incêndios” em Kabul e
Islamabad , fosse frente ao temperamental Hamid Karzai ou os
recalcitrantes generais paquistaneses.
Mas
o aspecto mais importante da indicação de Kerry é que, agora, Obama afinal cobre
a ravina que, durante o mandato de Hillary Clinton, separava a Casa Branca e o
Departamento de Estado. Kerry é homem que joga para a equipe (aprendeu no
Exército); e Clinton, presa de insaciadas ambições presidenciais, trabalhou
muito, também, para ela mesma, ao longo dos últimos quatro anos. Obama lhe fará
alguns elogios, mas não lamentará a partida de Clinton, com quem não teve
relacionamento fácil.
E
que tipo de secretário de Estado será Kerry?
Claro: é homem cauteloso, do mesmo figurino de Obama. Como explicou em detalhe,
em artigo revelador na revista Foreign
Policy em setembro,
não é
homem de deixar ponta sem nó.
Vê,
como Obama, que a questão da mudança climática deve ser uma das prioridades da
diplomacia dos EUA. Sem dúvida, é dos senadores mais “pró-Israel”. Obama, sim,
está sinalizando para os israelenses que seu governo continuará a garantir forte
apoio à centralidade da parceria EUA-Israel, no centro da estratégia dos EUA
para o Oriente Médio.
Quanto
à candente questão iraniana, Kerry tem posição nuançada – oposição veemente a
qualquer programa de armas; e, simultaneamente, aversão a qualquer provocação
contra os iranianos. Vê os líderes iranianos como seres racionais, com os quais
os EUA podem negociar; e considera a opção militar como muito remota, a última a
ser considerada.
Kerry
tem visão ainda mais nuançada em relação ao relacionamento sino-americano – com
inúmeros interesses partilhados e espaço para cooperação e laços comerciais de
longo prazo. Interessante: votou contra vincular o comércio com a China e a
atuação dos chineses no plano do respeito aos direitos humanos.
David Ignatius |
Para
Kerry, o melhor que os EUA têm a fazer, ante o desafio da ascensão chinesa, é
promover o renascimento econômico nos EUA, sem considerar a opção do confronto
militar. Kerry foi citado, ao dizer que “economia não é guerra. Nós [EUA e
China] podemos avançar muito mais do que já avançamos até agora”.
Em
resumo, como David
Ignatius escreveu recentemente no
Washington
Post,
temos
em Kerry alguém que “sabe apreciar a importância da diplomacia em calma,
sobretudo nos tempos que correm”.
Será
emissário no qual Obama poderá confiar para construir uma transição política na
Síria, explorando o desmonte do impasse histórico entre EUA e Irã, pondo fim
à guerra afegã
e
cimentando a confiança mútua entre os EUA e o Paquistão (prerrequisito crucial,
para o acordo afegão).
Mas
não se deve perder de vista que Obama é homem intrigante e complexo, além de
político esperto. O alcance total de suas motivações para indicar Kerry só
poderá ser avaliado depois que Obama divulgar o nome do secretário da Defesa. Se
se confirmar a indicação do senador Chuck Hagel (citado hoje como o preferido na
disputa pelo posto), Obama estará enviando mensagem muito significativa, se vier
a escolher esses nomes para os dois postos mais importantes do seu segundo
mandato, no que tenha a ver com política exterior.
Chuck Hagel |
O
que Hagel significa? Basta dizer que se opõe com unhas e dentes a qualquer tipo
de ataque militar contra o Irã; que quer os soldados norte-americanos fora do
Afeganistão JÁ!; que defende cortes drásticos nos gastos do Pentágono (apesar da
Síria, do Irã, da Coreia do Norte, de “pivoteamento” para a Ásia e tudo; que é
pacifista, contra
todas as guerras e sempre
(como
Kerry, também é veterano da guerra do Vietnã); e quer acomodar a emergência de
novas potências, como China, Índia e Brasil, com os EUA assumindo a liderança
para constituir uma nova ordem mundial baseada na reforma das organizações
internacionais.
_________________________
Embaixador *MK
Bhadrakumar
foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista
em questões do
Afeganistão e Paquistão e escreve
sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais
The
Hindu
e
Asia
Online.
É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
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