Conversações em
Paris
18/12/2012, MK Bhadrakumar*, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Entreouvido na Vila Vudu: Foi só a Hilária Clinton tropeçar,
bater a cabeça, desmaiar e sumir do mapa, que as coisas começam a tomar melhor
rumo. Impressionante o mal que os EUA espalham pelo planeta!
Vai e vem, o fiapo de luz que
percebi há dez dias [1] no final do túnel afegão já
cresceu consideravelmente e é hoje do tamanho de uma bola de tênis.
Conselho de Segurança da ONU |
Na
2ª-feira, o Conselho de Segurança da ONU em New York decidiu aliviar as sanções
impostas a algumas figuras selecionadas dos Talibã, para que possam viajar a
Paris para participar de conferência com representantes do governo afegão e
grupos da Aliança do Norte [orig. Northern Alliance (NA)]. A Conferência
em Paris, prevista para durar três dias, deve começar na 4ª-feira, 19/11.
Laurent Fabius |
Conceitualmente, é um evento
“Track II” [Trilha II] [2], organizado pela Fundação para
Pesquisa Estratégica, think tank com sede em Paris, onde os afegãos
“conversarão livremente, portas fechadas”. Os Talibã dizem que seus delegados só
conversarão, não negociarão, com outros grupos afegãos, e a Aliança do Norte diz
que estão indo a Paris só para ouvir, não para negociar. O ministro francês de
Relações Exteriores, Laurent Fabius, deu a melhor pista a seguir, ao dizer que
os grupos afegãos manterão discussões, não negociações. [3]
Sofismices
à parte, a realidade política é que o gelo começa a ser quebrado no diálogo
intra-afegão, o que é prerrequisito vital para qualquer acordo duradouro.
Mullah Abdul Ghani Baradar |
Assim
também, segundo o jornal paquistanês Daily Times, Islamabad concordou em
libertar da detenção o ex vice-chefe Talibã, Mullah Abdul Ghani Baradar.
Obviamente, Baradar será figura chave nas negociações intra-afegãs.
Washington,
é claro, está excitadíssima, com esse vetor crucial que se vai constituindo no
que parecia paisagem plena de incertezas, já quase sem qualquer esperança. O
porta-voz do Departamento de Estado falou de “conversas afegãs-afegãs” como “o
melhor modo de andar adiante (...) Vamos ver a que isso levará”.
De fato, é um toma-lá-dá-cá.
[4] Um governo norte-americano grato
está pagando mais de $688 milhões ao Paquistão, e, dessa vez, os Congressistas
no Capitólio que cuspiram veneno ao avaliar a liderança militar em Rawalpindi,
não estão refugando. (O que provavelmente explica o aplomb do trote do
ministro do Interior do Paquistão, Rehman Malik [5] em Nova Delhi).
Rehman Malik |
O aceno de concordância no
Conselho de Segurança da ONU [6] implica que, certamente, as
grandes potências – Rússia e China, sobretudo – estão no mesmo barco. A reunião
em Paris acontecerá entre vinte participantes, entre os quais os líderes
tadjiques, Ahmed Zia Massoud e Yunus Qanooni, o líder hazara xiita, Mohammed
Mohaqiq e o líder uzbeque, Faizullah Zaki – todos eles “inimigos” implacáveis do
Talibã – que a Rússia apoiou nos anos 1990s.
É
prova bem sólida de que a Aliança do Norte está querendo conversar seriamente
com os Talibã. Não surpreendentemente, o ministro russo das Relações Exteriores,
Sergey Lavrov, viajou às pressas para Tashkent [7] para visita não agendada. O papel
do Uzbequistão torna-se crucial no período que virá.
Os Talibã serão representados por
Maulvi Shahabuddin Dilawar, diplomata experiente, que foi embaixador no
Paquistão e na Arábia Saudita nos anos 1990s e esteve envolvido nas fracassadas
conversações com os EUA no Qatar, no ano passado. A presença de Dilawar sugere
fortemente, como escreveu o jornal al-Arabiya, que os Talibã aproximam-se
cautelosamente da mesa da paz. [8]
Notas:
[1] 10/12/2012, RIR, M.K.
Bhadrakumar em: “Light at the end of Afghan
tunnel”
[2] Diplomacia “Track
I” [trilha I] é termo que se refere à diplomacia oficial, “técnica de
ação de estado, processo mediante o qual comunicação de um governo vai
diretamente ao aparelho decisor de outro governo”; em oposição a isso, fala-se
também de “diplomacia ‘Track II” [trilha II], de interações entre especialistas,
entre cidadãos, entre ONGs ou empresários; são contatos não oficiais.
[NTs].
[4] 17/12/2012, NYTimes,
Eric Schimitt e David E.Sanger em: “In
Sign of Normalization, Pentagon to Reimburse Pakistan $688
Million”
[5] 16/12/2012, YahooNews, ANI em: “Rehman Malik
blames Indian agencies for failure to prevent 26/11”
[6] 18/12/2012, Khaleej Times, AFP em: “UN helps
blacklisted Taleban travel for peace talks”
[7] 17/12/2012, Radio Free Europe & Radio Liberty
em: “Russian Foreign
Minister In Uzbekistan For Talks”
[8] 17/12/2012, Al Arabiya
News em: “In French countryside, Taliban edges towards peace
table”
________________________
Embaixador *MK
Bhadrakumar
foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do
Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e
segurança para várias publicações, dentre as
quais The
Hindu e Asia
Online.
É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
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