quarta-feira, 13 de março de 2013

Paul Craig Roberts: “Hugo Chávez”


 12/3/2013, Paul Craig RobertsInstitute for Political Economy
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Paul Craig Roberts
Dia 5 de março de 2013, morreu Hugo Chávez, Presidente da Venezuela e líder mundial contra o imperialismo. Os imperialistas em Washington e as prostitutas e prostitutos  que os servem na imprensa-empresa e nos think-tanks distribuíram alegres suspiros de alívio, como boa parte da descerebrada população dos EUA: foi-se um “inimigo dos EUA”.

Chávez nunca foi inimigo dos EUA. Foi inimigo do domínio de Washington sobre outros países, inimigo da aliança que Washington mantém com as claques governantes pelo mundo, que roubam do povo ao qual negam sustento e direitos. Foi inimigo da injustiça que Washington semeia pelo mundo, da política externa de Washington, só de mentiras, de agressões militares, de bombas, de invasões.

Washington não é os EUA. Washington é cidade natal do Diabo.

A Venezuela acompanhou pelas ruas de Caracas o funeral de Hugo Chávez
Chávez foi amigo da verdade e da justiça, o que basta para torná-lo impopular em todo o mundo ocidental onde os líderes políticos consideram a verdade e a justiça como ameaças diretas contra eles.

Chávez foi líder mundial. Diferente dos políticos norte-americanos, Chávez era respeitado em todo o mundo não ocidental. Recebeu títulos de doutor honorário da China, da Rússia, do Brasil e de muitos outros países, mas não de Harvard, Yale, Cambridge e Oxford.

Chávez foi um milagre. Foi um milagre porque não se vendeu aos EUA, nem às claques governantes da Venezuela. Se se tivesse vendido, Chávez teria enriquecido dos lucros do petróleo, como a família real saudita, e teria sido honrado nos EUA, do modo como Washington honra seus fantoches: com visitas à Casa Branca. Teria sido ditador vitalício, por tanto tempo quanto quisesse, desde que se mantivesse vendido a Washington.

Cada um dos fantoches de Washington, da Ásia à Europa e ao Oriente Médio, espera ansiosamente o convite que comprova a satisfação de Washington ante sua servidão, ante a rendição à potência imperialista global – que ainda ocupa o Japão e a Alemanha, 68 anos depois da 2ª Guerra Mundial e a Coreia do Sul, 60 anos depois do fim da Guerra da Coreia, e que mantém tropas e bases militares em vasto número de outras nações “soberanas”.

Nada teria sido mais fácil, para Chávez, do que se vender politicamente. Bastaria manter a mesma retórica populista, promover seus aliados no exército, oferecer mais benefícios aos mais pobres do que outros ditadores jamais fizeram... e partilhar o que sobrasse da riqueza do petróleo com as corruptas elites venezuelanas.

Mas Chávez era gente real, um homem real, como Rafael Correa, reeleito para o terceiro mandato como presidente do Equador, que também enfrentou os EUA e garantiu asilo político a Julian Assange. E como Evo Morales, o primeiro presidente indígena da Bolívia, desde a conquista espanhola. A maioria dos venezuelanos entenderam que Chávez era real. Elegeram-no quatro vezes e mais vezes o elegeriam, enquanto Chávez vivesse. O que Washington mais odeia é gente real, que não pode ser comprada.

Quanto mais os políticos ocidentais corruptos e a imprensa prostituída demonizaram Chávez , mais os venezuelanos o amaram. Os venezuelanos entenderam completamente que alguém que Washington deteste sempre será presente de Deus ao mundo.

Não é fácil, nem barato, enfrentar Washington. Todos os que tenham coragem para fazê-lo são demonizados. Correm risco de ser assassinados ou derrubados do poder em golpe organizado pela CIA – como Chávez, em 2002. Quando elites venezuelanas instruídas pela CIA deram seu golpe e sequestraram Chávez, o golpe foi derrotado, em horas, pelo povo venezuelano que tomou as ruas e por elementos do exército, que agiram antes de Chávez ser assassinado pelas elites venezuelanas controladas pela CIA – e elites que só escaparam com suas vidas venais, porque, diferente delas, Chávez sempre foi um humanista, um homem de bem. O povo venezuelano levantou-se em massa e instantaneamente na defesa pública de Chávez – e fez calar as mentiras da Casa Branca de Bush, de que Chávez seria um ditador.

Sem vergonha de expor sua mais sórdida corrupção, o New York Times assumiu a defesa dos golpistas, aquele punhado de elitistas antidemocráticos, contra Chávez democraticamente eleito, e declarou que a derrubada de Chávez, por aquele pequeno grupo de ricos e de agentes da CIA, significaria que “a democracia venezuelana já não está ameaçada por nenhum ditador em potencial”.

As mentiras e a demonização continuam, depois da morte de Chávez. Jamais será perdoado por não se ter rendido. Nem Correa nem Morales – dois nomes que, ninguém duvide, já estão nas “listas de matar” de Obama.

CounterPunch, Fairness & Accuracy in Reporting, e outros veículos e comentaristas recolheram exemplos de obituários dos quais pingava veneno, escritos e publicados na imprensa ocidental prostituída, sobre Chávez. De fato, festejavam que a morte tivesse silenciado a voz mais valorosa do ocidente.

A voz mais absurda foi a da repórter da Associated Press, Pamela Sampson, para quem Chávez desperdiçava a riqueza do petróleo da Venezuela em “programas sociais, inclusive em mercadões estatais de alimentos, benefícios em dinheiro para os pobres, clínicas gratuitas de saúde e educação de graça”, mau uso do dinheiro, é claro, que deveria ser usado para construir arranha-céus como o “prédio mais alto do mundo em Dubai e filiais dos museus Louvre e Guggenheim em Abu Dhabi”.

Para as dezenas de milhões de vítimas de Washington em todo o mundo – o povo do Afeganistão, do Iraque, da Líbia, do Sudão, do Paquistão, do Iêmen, da Somália, da Síria, da Palestina, do Líbano, do Mali, com Irã, Rússia, China e América do Sul esperando no corredor para que os EUA os ataquem com sanções, desestabilização, conquista ou reconquista ou ocupação, o discurso de Chávez, dia 20/9/2006 à Assembleia Geral da ONU, durante o governo de George W. Bush, ficará para sempre, como o maior discurso político do início do século 21.

Chávez fez barba e cabelo do leão, quero dizer, do Diabo, ali mesmo, na própria toca do Diabo:

Ontem, o Diabo em pessoa esteve aqui, nessa tribuna, falando como se fosse dono do mundo. O ar ainda cheira a enxofre.

Deve-se chamar um psiquiatra, para analisar o que disse ontem o presidente dos EUA. Como porta-voz do imperialismo, veio nos impingir seus remédios de charlatão, tentando preservar o atual padrão de dominação, exploração e pilhagem dos povos do mundo. Alfred Hitchcock bem poderia usar aquela fala. Proponho o título do filme: “A receita do Diabo”.


A Assembleia Geral da ONU jamais antes ouvira coisa semelhante, nem nos tempos em que ali estava presente a militarmente poderosa União Soviética. Viram-se sorrisos de solidariedade e aprovação. Mas ninguém se atreveu a aplaudir: estava em jogo o dinheiro, muito dinheiro, dos EUA, para aqueles países acovardados.

Delegados dos EUA e do Reino Unidos deixaram a sala – vampiros que fugiam da réstia de alho e da cruz, ou lobisomens, da bala de prata.

Chávez falou sobre a falsa democracia das elites que se impõem pela força, “pelas armas, pelo fogo e pelas bombas”. Chávez perguntou:

Que tipo de democracia vocês impõem pelo mundo, com Marines e bombardeio?

Olhe para o lado que olhar, disse Chávez, George W. Bush só vê extremistas. Olha para você, meu irmão, vê a cor de sua pele e diz oh, yes, mais um extremista. Evo Morales, o valoroso presidente da Bolívia, aos olhos de George W. Bush, tem cara de extremista. Os imperialistas veem extremistas em toda parte. Mas não somos extremistas. Não se trata disso. Trata-se, isso sim, de que o mundo está despertando. Por todos os cantos, o mundo desperta. E os povos puseram-se de pé.

Em frase curta, cerca de 20 palavras, Chávez definiu por séculos e séculos adiante a Washington desse início do século 21:

O império teme a verdade, morre de medo de vozes independentes. Por isso nos chamam de extremistas. Os extremistas são eles!

Na América do Sul e em todo o mundo não ocidental, a morte de Chávez está sendo atribuída a crime de Washington. Os sul-americanos lembram bem das audiências no Congresso dos EUA, nos anos 1970s, quando a Comissão Church [1] investigou e trouxe à luz as várias tentativas da CIA para envenenar Fidel Castro.

O documento oficial apresentado ao presidente John F. Kennedy pelo Comandante do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas dos EUA, conhecido como Projeto Northwoods, permanece acessível online.

O Projeto Northwoods consistiu num plano para ataque de militares norte-americanos contra cidadãos norte-americanos, que em seguida seria atribuído a Cuba, de modo a induzir a opinião pública e a comunidade internacional a aceitar que os EUA invadissem Cuba e impusessem ali a “troca de regime” de praxe. O presidente Kennedy rejeitou a proposta, que implicaria trair todos os seus compromissos com a moralidade e a transparência no governo dos EUA.

Alastra-se pela América Latina a suspeita de que Washington, mestra das mais odiosas tecnologias para matar, teria contaminado Chávez com algum tipo de doença incurável, para, assim, remover esse específico obstáculo ao controle da América do Sul. Aí está suspeita que jamais desaparecerá, mesmo que jamais se confirme: Washington assassinou Chávez, o maior comandante latino-americano desde Simón Bolívar. Verdade ou não, a suspeita já se implantou. Mas verdade indiscutível e já confirmada é que quanto mais Washington e a globalização operem para destruir mais e mais países, mais precária se torna a vida, não dos Chávez do mundo, mas das elites.

O presidente Franklin Delano Roosevelt compreendeu bem que para que haja segurança para os ricos é preciso que haja segurança econômicas para os pobres. Roosevelt estabeleceu nos EUA uma modalidade fraca de social-democracia que políticos europeus já haviam entendido que seria indispensável para que houvesse coesão social e política e estabilidade econômica.

Os governos Clinton, Bush e Obama cuidaram sempre de minar a estabilidade que Roosevelt obtivera, enquanto Thatcher, Major, Blair e o atual Primeiro-Ministro britânico, Cameron, cuidaram de romper o acordo social que havia entre as classes no Reino Unido. No Canadá, Austrália e Nova Zelândia, os políticos também cometeram o erro de entregar o poder a elites privadas e privatizantes, mesmo que ao preço da estabilidade social e econômica.

Gerald Celente prevê que as elites não sobreviverão ao ódio, à fúria, à ira que estão atraindo sobre elas mesmas. Suspeito que esteja certíssimo. A classe média norte-americana está sendo destruída. A classe trabalhadora já é um proletariado; e o sistema de bem-estar social está sendo destruído para reduzir o déficit de orçamento causado pela perda de arrecadação resultante da exportação de postos de trabalho e das despesas com guerras, bases militares  em terras distantes e resgate de bancos e financeiras falidos. O povo norte-americano está sendo forçado a padecer, para que as elites preservem suas agendas.

As elites nos EUA já pressentiram o que as espera. Por isso, precisamente, criaram um Ministério do Interior de estilo nazi-fascista, chamado Segurança da Pátria  [orig. Homeland Security], armado com munição suficiente para matar cinco vezes cada cidadão norte-americano e com tanques em quantidade suficiente para neutralizar qualquer direito que a 2ª Emenda garanta aos norte-americanos.

Pistolas e rifles nada podem contra tanques, como os davidianos descobriram em Waco, Texas. A necessidade de proteger um pequeno punhado de membros da elite, contra a ira dos cidadãos norte-americanos que eles oprimem, é o que explica também a crescente militarização da polícia, e motivo pelo qual as polícias estão sendo postas sob direto comando de Washington e serão armadas com drones suficientemente potentes para assassinar os verdadeiros líderes do povo dos EUA – que não estão nem no Legislativo, nem no Executivo, nem no Judiciário: estão nas ruas. Campos de concentração de prisioneiros nos EUA  já parecem ser realidade, sem teoria da conspiração.Vídeo a seguir:


A ameaça que o governo dos EUA impõe contra o povo dos EUA já foi detectada e registrada dia 7/3/2013, por dois senadores (Republicanos), Ted Cruz (TX) e Rand Paul (KY), que apresentaram projeto de lei para impedir que o governo dos EUA assassine os próprios cidadãos:

O governo federal não pode assassinar cidadão norte-americano que esteja nos EUA, a menos que a pessoa represente ameaça iminente de morte ou grave ferimento corporal a outra pessoa. Nada deve ser introduzido no texto dessa lei para sugerir que a Constituição poderá autorizar seja como for o assassinato de cidadão dos EUA sem o devido processo legal.

O “povo indispensável” com seus presidentes Bush e Obama inauguraram o século 21 com morte e violência: é o legado deles, seu único legado. A morte e a violência que Washington desencadeou para todo o mundo voltarão sobre Washington e sobre todas as elites corruptas em todo o mundo. Como diz Gerald Celente, a primeira grande guerra do século 21 já começou.



Nota dos tradutores
[1] Comissão do Senado dos EUA que investigou as atividades da CIA, presidida pelo sen. Frank Church (D-ID), em 1975. A comissão investigou várias atividades ilegais da CIA e do FBI (de experiências ilegais em seres humanos à invasão de moradias sem autorização legal, interceptação de comunicações sem autorização judicial, assassinatos e outras atividades) trazidas à tona pelo chamado “escândalo de Watergate”. Leia todos os relatórios da Comissão Church.
Podem ser lidos também todos os resultados de investigações sobre inúmeros complôs da CIA para assassinar governantes e líderes políticos no exterior.  

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