quinta-feira, 28 de março de 2013

Xi e os partidos de esquerda


(da Índia e ôtrospelaí no Brasil)

28/3/2013, MK Bhadrakumar*, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Xi Jinping
Xi, o enigma, o recém eleito novo presidente da China, continua a hipnotizar por aí, pelo planeta afora – e especialmente a esquerda. Já nos habituáramos ao ‘'socialismo com características chinesas'’. Mas o discurso histórico de Xi, dia 17 de março, sobre o “Sonho Chinês” dá ao socialismo chinês nova direção, rumo a um admirável/valente novo mundo [orig. a Brave New World] [1]. Não há dúvidas de que continuará a reverberar por muito tempo e, sim, será acolhido como proveitoso desenvolvimento da teoria marxista.

Xinhua noticiou que o People’s Daily, que vinha publicando uma série de artigos, ao longo das últimas semanas, dissecando o “Sonho Chinês”, saiu-se com surpreendente editorial na 4ª feira [27/3] em que enfatiza, dentre outras coisas, que o “Sonho Chinês” é composto essencialmente de cada novo, vívido, sonho individual. O que o povo busca: condições de vida mais próspera, que inclui boa educação e assistência médica, trabalho estável, renda satisfatória, segurança social confiável e casas confortáveis, são a parte mais vital do “Sonho Chinês”. [2]

O Editorial do People’s Daily acrescenta: “Todos têm direito iguais de buscar seu sonho e de ser o construtor dos próprios sonhos”. E “converter essas aspirações em realidade é precondição para alcançar o sonho do país”.

Hummmmm. Não mais o bem comum. Nada de luta de classes. Pensávamos que o marxismo fosse totalizante e que, assim individualizante, só a teoria burguesa. Pensávamos em totalidades sociais e rejeitávamos os que propunham o individualismo metodológico. Pois é. E Xi parece sonhar com reconstruir o socialismo, pelo modelo individualista.

Diz Xinhua: “A pujante história da China moderna é prova de que só país próspero e forte pode promover o renascimento nacional com prosperidade para o povo comum”.

O Editorial avalia que o sucesso do Partido Comunista Chinês advém de ter “promovido um milagre de crescimento econômico”, o qual, por sua vez, baseou-se em “conquistar o apoio do povo, respeitando as iniciativas do povo” e, assim inspirando “a criatividade pública”. 

Escrevi recentemente num semanário malaio, em comentário sobre o legado de Hugo Chávez e a Revolução Bolivariana, que os partidos comunistas em Kerala precisam urgentemente se repensar. O que Marx pensou pode ser relevante e ajudar a bem encaminhar soluções adequadas aos problemas de nosso país, se e somente se for objeto de engajamento crítico – o que a esquerda evita.

Sim, veem-se hoje cartazes, em Kerala, que mostram Che Guevara, Narayana Guru e Swami Vivekananda lado a lado com Karl Marx e Lênin – e Stálin. Mas não passa de “política burguesa” com objetivos eleitorais, e nem chega perto do “rejuvenescimento” que Xi tem em mente.

Claro que a esquerda e seus companheiros de jornada na Índia têm pela frente a tarefa gigantesca – e não fazem outra coisa, há 25 anos, além de tentar adiá-la e adiá-la – de reinventar o socialismo com características indianas.

É isso, ou parecerão dogmáticos, arcaicos, mais irrelevantes a cada dia. Isso explica também por que tão rapidamente vão perdendo espaço para identidades políticas organizadas em partidos que se constituem em torno de carisma pessoal, afinidades familiares ou de castas; é o “Sonho Indiano”.
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Notas de rodapé

[1]  Título de romance de Aldous Huxley, BRAVE NEW WORLD, de 1931, ambientado em Londres no ano 2540 (632 A.F. – “After Ford”/pós-Ford). Pode ser lido em português – Admirável Mundo Novo - tradução de Vidal de Oliveira e Lino Vallandro, Ed. Globo, Porto Alegre, 1979, 5ª Ed..

[2] 27/3/2013, Xinhua, Editorial People’s Daily China, em: “Chinese dream” driven by individuals [“Sonho chinês” conduzido por indivíduos].
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MK Bhadrakumar* foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The HinduAsia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

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