sexta-feira, 5 de julho de 2013

“Tamarod” egípcio: Ação política com prazo de validade

4/7/2013, Al-Ahram Weekly, Cairo
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

[*] Tamarod  será a primeira vítima de seu sucesso, disse Mohamed Abdel-Baky. Nada poderia agradar mais aos seus organizadores!

Manifestantes do grupo Tamarod em 30/6/2013
Quando o obstetra Ayman Zein perguntou à mulher que acabava de dar à luz uma criança na Praça Tahrir, que nome daria a ela, a mulher respondeu: “vai-se chamar Tamarod [ar. “rebelde”]”.

A campanha que serviu como gatilho para os protestos contra o presidente Mohamed Mursi nunca previu que seria o primeiro passo que levaria milhões de egípcios comuns às ruas, para exigir a renúncia do presidente. Lançada por um grupo de jovens ativistas, o abaixo-assinado “Tamarod” obteve, segundo o movimento, mais de 22 milhões de assinaturas, em apenas dois meses de campanha na qual exigiram que Mursi renunciasse e que as eleições fossem antecipadas.

Mahmoud Badr
Duas semanas antes dos protestos marcados e programados para 30 de junho, Mahmoud Badr, cofundador da campanha, disse ao jornal Al-Ahram Weekly que, tão logo o movimento Tamarod alcançasse seu objetivo, não haveria motivo para manter a campanha.

Tamarod, diz o analista político Abdallah Helmi, não parece interessado em converter-se em partido político:

Os 22 milhões de pessoas que assinaram o abaixo-assinado de Tamarod são cidadãos egípcios comuns, que não querem que a Fraternidade Muçulmana governe o Egito. Esse é o único item de programa com o qual todos concordar. Absolutamente não são membros potenciais de algum partido político – diz Helmi.

Amr Bakli, comentarista, enquanto discute o futuro político da campanha e dos nomes a ela associados, destaca que o sucesso que obtiveram na mobilização popular inevitavelmente terá algum impacto na formatação do mapa do caminho para o período de transição que virá depois da queda do governo de Mursi.

Bakli prevê que o movimento Tamarod desapareça suavemente da cena política, embora preveja novos confrontos, no caso de a Fraternidade Muçulmana tentar obter, dos militares, para os “irmãos”, qualquer tipo de privilégio.

Líderes da campanha entendem que ninguém deve coisa alguma à Fraternidade Muçulmana e que ceder nesse campo apenas facilitará o processo que os Irmãos conhecem bem, de manobrar para obter favores para eles mesmos – diz Bakli.

Mohamed Mursi
O movimento Tamarod já rejeitou a última oferta feita por Mursi, que propôs um diálogo nacional; responderam que o povo egípcio já deixara bem claro que deseja o fim do governo Mursi.

Não é hora de ceder coisa alguma. A única coisa é fazer é encerrar de forma pacífica o governo da Fraternidade Muçulmana e garantir que nossa revolução possa recomeçar, diz o porta-voz do movimento, Hassan Shahin.

O movimento Tamarod – não controla os milhões de egípcios que se manifestam nas ruas. A única coisa que podemos fazer é ouvir o que dizem e repetir o que dizem. A campanha não pode ceder em nenhuma de suas exigências, porque ceder nisso é andar contra as expectativas dos egípcios, diz Shahin

Agora, para Badr, o papel mais importante do movimento-campanha é manter a pressão sobre a Fraternidade Muçulmana, para que cedam, saiam do governo e abram caminho para um novo processo democrático. O movimento Tamarod procura agora ajudar a oposição a unir-se com eles, nas negociações que tenham de fazer com os militares, em futuro próximo. Para isso, o movimento, no domingo, ajudou a lançar a “Frente 30 de junho”, que reúne o movimento Tamarod e todos os grupos de oposição, inclusive a Frente de Salvação Nacional.

Mohamed El-Baradei 
Na 3ª-feira, a Frente anunciou que escolhera Mohamed El-Baradei como seu representante e negociador oficial.

El-Baradei coordenará esforços com instituições do Estado, para ajudar a construir um mapa do caminho para o governo de transição concebido pelos grupos de oposição ao longo dos últimos dias – disse a Frente, em declaração.

A Frente também decidiu ontem (3ª feira) que o líder da oposição será seu principal negociador, no contato com os militares, durante a transição.

O exército mostrou boas intenções, e está protegendo o desejo do povo. Nosso papel é dar ao exército o mapa do caminho que construímos há três semanas, em cooperação com as forças de oposição, para que seja implantado – disse o porta-voz da Frente.

O mapa do caminho proposto pelo movimento Tamarod dia 26/6 inclui a indicação de um primeiro-ministro independente, que represente a Revolução de 25 de Janeiro; o desmonte do Conselho da Shura; a suspensão da atual Constituição e a elaboração de nova Constituição. Segundo esse mapa do caminho, o primeiro-ministro convocará um Conselho de Defesa Nacional, encarregado de prover e defender a segurança.

Praça Tahrir no Cairo (noite de 1/7/2013)
Enquanto alguns analistas manifestaram temores de que o sucesso do movimento Tamarod possa abrir caminho para que outros grupos de oposição tentem sequestrar a segunda fase da revolução egípcia, Badr não parece temeroso. O movimento Tamarod, diz ele, é constituído de pessoas comuns, egípcios absolutamente comuns, não de políticos.

Todo mundo no Egito sabe que o sucesso da Revolução 30 de Junho é sucesso do povo egípcio, não do Tamarod ou de qualquer dos outros grupos de oposição – disse.



[*] Perfil do grupo egípcio TAMAROD  

1/7/2013, BBC, Londres
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Manifestante exibe cartaz do grupo Tamarod em 30/6/2013 
Tamarod” [ar. “rebelde”] é um novo movimento de base, surgido no Egito, e que parece ter servido como catalisador do movimento popular nacional contra o presidente Mohammed Mursi, um ano depois de ter sido eleito à presidência, na primeira eleição que o Egito conheceu em toda sua história moderna.

Esse grupo que se autodenominou “Rebelde”, diz que recolheu mais de 22 milhões de assinaturas num abaixo assinado que exige o fim do governo do presidente Mursi, para que se realizem novas eleições no Egito.

Depois das massivas demonstrações do domingo, das quais participaram milhões de egípcios nas ruas do Cairo e de outras cidades, o grupo Tamarod deu ao presidente um ultimatum, para que renunciasse até as 17h (15h GMT) da 3ª-feira, ou enfrentaria companha de “total desobediência civil”.

O mesmo ultimatum exigia que “instituições do Estado, inclusive Exército, Polícia e Judiciário, se alinhassem imediatamente ao desejo do povo, manifestado pelas multidões nas ruas”.

Foi o grupo Tamarod que rejeitou a oferta do presidente Mursi, para um diálogo nacional.

Não há como aceitarmos meias medidas – o grupo declarou. – A única via possível é pôr termo pacífico ao poder da Fraternidade Muçulmana e de seu representante, Mohamed Mursi.

Muitos manifestantes acusaram o presidente de pôr os interesses da Fraternidade Muçulmana, poderoso grupo político-islamista ao qual Mursi pertence, à frente dos interesses do país como um todo. Os defensores de Mursi rejeitaram as acusações.

“Surpreendente”

O grupo Tamarod foi fundado no final de abril, por membros do Movimento Egípcio pela Mudança [orig. Egyptian Movement for Change] mais conhecido pelo slogan Kefaya (“Basta!”), que exigia uma reforma política no Egito ainda sob governo do ex-presidente Hosni Mubarak em 2004 e 2005. Embora o movimento Kefaya tenha participado dos protestos de massa que levaram à renúncia de Mubarak, em 2011, não chegou a ter papel muito destacado.

Abaixo assinado do grupo Tamarod (Rebelde)
Tamarod organizou-se para recolher assinaturas num abaixo-assinado em que o grupo denuncia:
 
·       A segurança nunca foi restaurada desde a revolução de 2011;
·       Os pobres “não têm lugar” na sociedade;
·       O governo teve de “implorar” ao Fundo Monetário Internacional (FMI) por um empréstimo de $4,8bn (£3,15bn) para fazer frente às despesas do Estado;
·       Não há “justiça” para os que foram assassinados por forças de segurança durante o levante e os manifestos contra o governo que aconteceram depois do levante;
·       “Os egípcios estão obrigados a sobreviver sem dignidade” no seu próprio país;
·       A economia “colapsou”, o crescimento é baixo, e a inflação é alta;
·       O Egito “segue atrás, nas mesmas pegadas dos EUA”.

Os ativistas do movimento Tamarod tornaram-se imagem frequente e familiar nas ruas do Egito, bloqueando o trânsito para distribuir panfletos e recolher assinaturas para seu abaixo-assinado. O grupo também recolheu assinaturas em sua página Internet, pelo Facebook e Twitter.

Tamarod diz que as assinaturas de seu abaixo-assinado foram verificadas nos registros eleitorais oficiais. E outros grupos de oposição rapidamente jogaram seu peso político a favor da campanha, oferecendo apoio logístico e escritórios.

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No final de junho, o movimento Tamarod anunciou que reunira 15 milhões de assinaturas, as quais, insistem eles, foram verificadas nos registros eleitorais recentes do Ministério do Interior. Cada signatário assina, com número de identidade e endereço da província onde resida.

Fraternidade Muçulmana 
O Partido Liberdade e Justiça, da Fraternidade Muçulmana contestou os números do abaixo-assinado e disse que o movimento Tamarod não recolhera mais que 170 mil assinaturas.

No sábado – um dia antes dos protestos de massa que o movimento convocou para marcar o 1º aniversário do governo de Mursi – o movimento anunciou que alcançara 22 milhões de assinaturas, mais de ¼ da população do Egito.

Um dos fundadores do movimento Tamarrod avaliou como “surpreendente” o sucesso do abaixo-assinado. “Não sei quantos membros temos por aí. Posso imaginar que milhões de egípcios são membros” – disse Ahmed al-Masry à Agência Associated Press. – “Num dado momento, o povo desistiu [de Mursi]. Não se ouvia outra voz que não fosse do presidente e sua tribo.”


6 comentários:

  1. Comentário de Philippe Mischkowsky enviado por e-mail e postado por Castor (Parte 1)

    Enquanto o site na Internet da Irmandade Muçulmana anuncia a mobilização total dos membros da confraria para defender a legitimidade eleitoral de Mohamed Morsi, bem como uma « marcha popular » (em 4 de julho) no final do dia a fim de recusar o golpe de Estado, o diário liberal Al-Maasri Al Yun anuncia divisões no seio da organização. O objetivo, segundo o jornal, consistiria em evitar a dissolução da estrutura internacional da confraria após o desmonoramento da organização mãe no Egito.

    "Houve divisão quanto a maneira de tratar as manifestações populares contra o presidente Morsi. » Um grupo no interior da Irmandade defendeu que seria necessário dar seguimento às demandas da oposição. Este grupo de moderados é dirigido por Rached Ghannouchi, líder do partido Ennahda tunisiano. Ele teria proposto aos Irmãos Muçulmanos organizar eleições presidenciais antecipadas..

    Este ponto de vista moderado não impediu Ghannouchi de recusar estabelecer um paralelo entre Egito e Tunísia. Com efeito, ele declarou ao jornal saudita Asharq Al-Awsat que « certos jovens sonhadores poderiam pensar que o que se passa no Egito poderia ser transportado para a Tunísia ». Ora, acrescentou, é impossível, levando-se em conta a diferença entre os dois países. É preciso, outrossim, levar em consideração que o Ennahda « fez numerosas concessões a fim de evitar a polarização » que acabou se produzindo no Egito.

    A atualidade egípcia não ressoa somente na Tunísia. Um comentário em particular suscitou muitas reações. Trata-se de um post no Facebook da militante revolucionária iemenita Tawakkol Karman, Prêmio Nobel da Paz em 2011 e ele mesma, membro do maior partido de oposição – União Iemenita pela Reforma – afiliada à Irmandade Muçulmana. Ela critica acerbamente seus camaradas egípcios ::

    "Caros Irmãos Muçulmanos, não fui eu que me aliei aos militares no dia seguinte da queda do regime de e contra meus companheiros da revolução, nem eu que enfraqueci a revolução e pôs seu projeto em perigo », escreveu, reprovando a Irmandade Muçulmana por seu oportunismo que a levou a privilegiar os arranjos em segredo com o exército em vez de corresponder ao elã revolucionário da rua.

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    1. Agradecemos ao Max Altman que nos enviou este comentário. Castor

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  2. Comentário de Philippe Mischkowsky enviado por e-mail e postado por Castor (Parte 2)

    "Vossa política os meteu num isolamento completo. Voces não nogtaram que todos os partidos, entre eles os partidos religiosos, as organizações da sociedade civil, os meios de comjunicação, a Universidade Al-Azhar e a Igreja Copta, que todos, absolutamente todos, estão contra vocês ? Quem é o responsável por este colapso ? O que vocês estavam esperando ? »

    Nos países do Golfo Pérsico, nos Emirados Árabes Unidos « os adeptos da Irmandade Muçulmana locais estão chocados » relata o site saudita Elaph. « A queda da Irmandade no Egito afasta definitivamente o sonho dos Irmãos de chegar ao poder em qualquer país do Golfo, seja ele quem for » acrescentando que se trata do « segundo golpe em menos de 40 horas ». Com efeito, nesse mesmo momento, 64 membros de uma « célula secreta dos Irmãos Muçulmanos nos Emirados » foram condenados a penas de prisão entre 7 e 15 anos.

    Outras reações da parte de militantes da oposição no Golfo são nitidamente contrários à Irmandade Muçulmana egípcia. « A Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos e a Jordânia saúdam a intervenção do exército » escreve Tarek Al-Moutairi, ex-membro dos Irmãos no Kuwait e hoje militante político em favor de uma monarquia constitucional.

    Notou que « um militar destituiu um presidente civil », que « canais de televisão pertencentes à Irmandade foram fechados e seus jornalistas presos » e que a religião foi instrumentalizada por intermédio « do presidente da Universidade Al-Azhar e do papa copta », que assistiram ao discurso do general Abdelfattah Al-Sissi, chefe das Forças Armadas, anunciando a destituição do presidente egípcio. Admitindo que « o bolo será repartido entre eles », avalia que a atualidade remete ao primweiro plano um velho debate árabe : em que se pode alicerçar a legitimidade dos regimes políticos nesta região do mundo ?

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    1. Agradecemos ao Max Altman que nos enviou este comentário. Castor

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  3. Nota traduzida do PCF (Partido Comunista Francês) enviada por e-mail e postada por Castor

    Ao lado do povo egípcio

    Como ele havia anunciado, o exército egípcio por termo ao poder da Irmandade Muçulmana, contra a qual milhões de egípcios se levantaram, exigindo sua partida. Esse poder havia perdido toda legitimidade ao virar as costas aos objetivos da Revolução.

    Hoje o Egito entra em nova etapa de sua história. Iniciada e impulsionada pelo movimento Tamarod, o roteiro discutido e adotado pelo conjunto da oposição, de autoridades religiosas e do exército, é um plano que não suscita ambiguidade : instalação de um governo provisório sob a chefia do Presidente da Alta Corte Constitucional, encarregado de preparar as futuras eleições presidenciais e a elaboração de uma nova Constituição.

    Esse processo deve ser levado até as últimas consequências para permitir que o povo egípcio retome a palavra e que possa livremente decidir o seu destino.

    É um primeiro avanço. Porém, resta tudo a ser feito. Com efeito, as urgências sociais em matéria de luta contra a pobreza e o desemprego são consideráveis. A necessidade de reativação da economia deve ser prioritária. É necessário ajudar o povo egípcio a sair do marasmo atual marcado a um só tempo pela incúria da Irmandade Muçulmana e as políticas neoliberais.

    O Partido Comunista Francês está ao lado do povo egípcio, das forças democráticas e progressistas, por « Pão, Liberdade, Justiça Social » e por um Egito democrático e soberano.

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    1. Agradecemos ao Max Altman que nos enviou esta Nota do PCF. Castor

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