28/9/2013, Elizabeth Dwoskin e Frances Robinson, The Wall Street Journal (ed.
EUA)
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
As empresas
Google
Inc. GOOG-0.05%, Facebook
Inc.
FB-1.97%
e outras companhias norte-americanas de tecnologia entraram em modo defensivo,
quando começou a ser divulgado o material de Edward Snowden sobre a
vigilância, pelo governo dos EUA, no tráfego de Internet. Fora dos EUA, alguns
governos e algumas empresas viram aí uma oportunidade.
Três
dos maiores provedores de e-mail da Alemanha, inclusive a semiestatal Deutsche
Telekom
DTE.XE-0.60%
rapidamente se organizaram para oferecer um novo serviço, Email Made in
Germany. As empresas prometem que, se os servidores alemães passarem a
encriptar as mensagens, em estrito respeito às leis alemãs, as autoridades
norte-americanas não conseguirão, com a mesma facilidade de antes, invadir a
privacidade dos usuários. Mais de 100 mil usuários alemães já contrataram esse
serviço, desde que passou a ser oferecido, em agosto.
Edward Snowden |
Fora
dos EUA, vários governos já cuidam de fazer aprovar novas leis, decorrentes das
revelações feitas por Edward Snowden.
“Podemos
dizer que protegemos mensagens de correio eletrônico conforme as leis alemãs” –
diz Jorg Fries-Lammers, porta-voz de uma das empresas alemãs, a 1&1 Internet
AG. – “Não há dúvidas de que temos programa campeão de vendas”.
A
Agência de Segurança Nacional dos EUA reconheceu que recolhe dados de mensagens
de
e-mails
sobre norte-americanos, através das empresas de telefonia e prestadoras
de serviços de internet. Empresas do Vale do Silício apressaram-se a esclarecer
que não fornecem acesso total aos dados dos usuários, mas que estão impedidas de
oferecer maiores detalhes.
Envolvidos
e estimulados pela controvérsia, vários países já se mobilizam para usar leis de
proteção à privacidade como vantagem competitiva – um meio para estimular
empresas locais, que há muito tempo lutam em condições de desigualdade contra as
empresas Google,
Microsoft
Corp. MSFT+0.03%
e outros tech-gigantes norte-americanos.
“Os
países estão competindo para ser as Ilhas Caimã da privacidade de dados” – diz
Daniel Castro, analista sênior do instituto Information Technology and Innovation
Foundation, um
think-tank não partidário, com sede em Washington,
D.C., mantido por doações da indústria de tecnologia.
Embora
a criação dessas ilhas de privacidade possa ser boa alavanca de marketing, as
iniciativas enfrentam algumas dificuldades. Leis que exijam que os dados sejam
armazenados nos respectivos países podem servir de poderoso estímulo para as
empresas provedoras locais, mas também podem fazer subir os preços para os
usuários.
E
criar fronteiras domésticas para os serviços online colide contra uma dura
realidade.
“É
medida que ignora, basicamente, a totalidade da Internet” – diz Ronaldo Lemos,
diretor do Instituto Technology &
Society,
think-tank com sede no Rio de Janeiro. “Esses dados têm
de circular. São mandados para Miami, para a Europa. Os dados não ficam
parados”.
Mesmo
assim, governos europeus começam a falar novamente sobre a necessidade de uma
“euro nuvem”, na qual os dados dos usuários possam sem partilhados dentro da
Europa, mas não para fora da região. O Brasil trabalha com rapidez para fazer
votar uma lei, até há poucos dias deixada de lado, e que exige que dados sobre
brasileiros sejam armazenados em servidores dentro do país. E a Índia planeja
proibir que empregados do estado e do governo usem serviços de e-mail das empresas Google e Yahoo.Inc.
YHOO-1.13%.
As
empresas norte-americanas assistem a essa movimentação com ansiedade.
Sheryl Sandberg |
“Temos,
mesmo, de estar muito nervosos, se vários países começarem a impor exigências
caras às empresas, como condição para prestarmos serviços aos cidadãos daqueles
países” – diz Sheryl
Sandberg,
Operadora Chefe da empresa Facebook. “Significa fragmentar a Internet e criar
ameaças para as oportunidades econômicas e sociais que a Internet cria”.
A
empresa Google disse que não comentaria o assunto; e a empresa Yahoo não
respondeu aos nossos pedidos de entrevista.
Ainda
é prematuro falar de alguma grande tendência em formação. Mas a Fundação Information Technology and Innovation
estima que os desdobramentos das revelações sobre a espionagem da Agência de
Segurança Nacional dos EUA possam custar ao Vale do Silício a perda de até $35
bilhões anuais dos lucros anuais, a maior parte dos quais corresponderiam a
negócios perdidos em outros países. Pesquisa feita esse verão pela Cloud Security Alliance, grupo da
indústria, concluiu que 56% de usuários não norte-americanos declararam que a
preocupação com a segurança tornava menos provável que viessem a usar serviços
de nuvem com base nos EUA. 10% declararam que já haviam cancelado pelo menos um
contrato de serviços.
“Conversamos
com nossos agentes de vendas, que estão em contato diário com os usuários, e,
sim, é possível que a confiança dos usuários tenha sido consideravelmente
abalada em todo o mundo” – diz John Frank, vice-conselheiro geral na Microsoft.
A
verdade é que as empresas norte-americanas enfrentarão dificuldades para reparar
qualquer dano, sobretudo porque ainda não se sabe a extensão de todas as
atividades da Agência de Segurança Nacional, e outras nações já estão criticando
os EUA.
Na
3ª-feira, a presidenta Dilma Rousseff do Brasil, em discurso na ONU, denunciou a
espionagem norte-americana contra seu país. Na semana anterior, ela já cancelara
uma visita oficial a Washington.
Neelie Kroes |
A
vice-presidenta da Comissão Europeia, Neelie Kroes, que supervisiona o portfólio
digital da União Europeia, também está encorajando as empresas do bloco a
investir na proteção da privacidade. “A privacidade não é apenas direito
fundamental” – ela disse na Estônia, nesse verão. – “Pode ser também uma
vantagem competitiva”.
Para
as empresas alemãs pequenas, que concorrem contra grandes empresas – como as
gigantes Symantec Corp. SYMC+0.08%
e Amazon.com
Inc., AMZN-1.07% provedoras
de serviços de nuvem – as revelações sobre a espionagem norte-americana “são
presente caído do céu”, diz Oliver Dehning, diretor executivo da empresa AntispameuropeGmbH, que vende programas
de proteção anti-spam. “É uma oportunidade para reagir e começar a proteger
nosso mercado nacional”.
Dehning
converteu as revelações de Snowden em campanha de marketing, tuitando sobre o
noticiário, e em conferências e palestras para a indústria, em que indica como
os alemães podem proteger-se contra espionagem.
As
empresas Symantec e Amazon recusaram-se a responder nossas perguntas, quando
preparávamos esse artigo.
Frances Robinson |
Mas
algumas das promessas sobre ilhas seguras de dados podem ser mais difíceis de
cumprir, que de prometer.
Muitas
das novas leis propõem que as informações sobre cidadãos sejam armazenadas nos
respectivos países, mas esquecem que os dados podem ter de ser transferidos
também para outros países.
E
leis que exijam hospedagem doméstica podem aumentar os preços da computação. “Os
hospedeiros locais enfrentarão dificuldades concorrenciais na competição com a
economia de escala que beneficia as gigantes norte-americanas”, diz Jim Reavis,
presidente da Cloud Security
Alliance. “Além do fato de que pode ser menos caro usar um centro de dados
em outro país, que construir um centro doméstico”.
Por
outro lado, a computação por país também pode gerar preocupações com a
privacidade. Alguns países – o Brasil, por exemplo – não protege a privacidade
dos dados de internet dos cidadãos. Implica que os usuários não estarão
protegidos contra a vigilância pelo próprio estado brasileiro. Segundo a empresa
Facebook, o Brasil já requereu dados de 715 usuários, no primeiro semestre de
2013.
Elizabeth Dwoskin |
Graças
a leis estritas de proteção à privacidade já vigentes na Alemanha, o movimento
Email Made in Germany diz que os
usuários que enviem mensagens de e-mail para outros usuários da mesma rede
protegida podem ter certeza de que nem o governo dos EUA nem o governo alemão
conseguirão espioná-los. O usuário vê um sinal de “protegido” em verde
brilhante, ao lado de mensagens enviadas a outros assinantes do sistema
protegido. E veem um sinal em cor cinza, ao lado de mensagens recebidas de
outros provedores. Significa que os alemães podem garantir o respeito à
privacidade só dos
e-mails
de usuários em território alemão.
E
até algumas das empresas que procuram lucrar com o medo da invasão de
privacidade pelos espiões norte-americanos já reconhecem que agências oficiais,
em outros países, já estão fazendo o possível para ‘copiar’ as capacidades de
Washington.
“No
longo prazo, não haverá diferença alguma entre os espiões norte-americanos,
alemães, franceses ou britânicos” – diz Roberto Valerio, cuja empresa alemã de
armazenamento em nuvem, a CloudSafe
GmbH, já registrou aumento de 25% em suas vendas, desde as primeiras
revelações sobre a espionagem norte-americana.
“Até
o fim do dia, alguma agência de espionagem, de algum governo, conseguirá
espionar você” – diz ele.