Publicado em 24/09/2013 por [*] Mário Augusto Jakobskind
Glenn Greenwald |
A
recente espionagem feita pelos serviços de inteligência estadunidense no Brasil
e na América Latina, reveladas graças, entre outros, a figuras como Edward
Snowden, Julian Assange e Glenn Greenwald, não chegam a se constituir em fato
novo propriamente dito. O que mudou apenas foi a tecnologia utilizada. Em
décadas anteriores, arapongas da CIA e maus brasileiros que ajudavam no serviço
faziam o jogo.
Muitos
dos apoiadores de então, ou já estão ardendo no inferno ou, impunes,
aproveitando a aposentadoria pelos serviços prestados como mercenários. Um ou
outro segue até ocupando espaços midiáticos com a mesma linguagem de ódio da
época da Guerra Fria, Tem alguns residindo próximo da área onde se localiza a
sede da CIA, em Richmond, na Virgínia.
Na
história contemporânea são vários os países que sofreram com a ação da CIA,
entre os quais o Irã, em 1953, com a derrubada do nacionalista Mohammed
Mossadegh, que ficou em prisão domiciliar para o resto da vida. O líder iraniano
é lembrado em livros de história e com a revelação dos documentos da época
confirmou-se a intervenção da CIA, do serviço secreto inglês e israelense no
golpe de estado.
Edward Snowden |
Uma
figura importante daquela época, embora não tão conhecida como Mossadegh é a do
então Ministro dos Negócios Estrangeiros daquele governo, o jornalista Hossein
Fatimi, um dos idealizadores do projeto de nacionalização do petróleo iraniano.
Ele foi fuzilado por ordem do preposto dos EUA, o Xá Rheza Parlevi, que ainda
chegou a manter relações amistosas com alguns ditadores brasileiros, como
Castelo Branco, Costa e Silva e Médici que hoje, já se sabe oficialmente com os
arquivos revelados, tomaram o poder com a ajuda da CIA.
O
Brasil não esteve de fora das artimanhas da CIA, presentes em 1954 com seus
arapongas e mercenários que levaram Getúlio Vargas ao suicídio. Hoje se sabe
também que depois da negativa de Vargas em mandar tropas brasileiras para lutar
na Coreia em ajuda aos EUA, somado à criação da Petrobras, os quinta-colunas
destas bandas intensificaram ações de desestabilização do governo eleito pelo
povo.
Julian Assange |
O
golpe de abril de 1964, que provocou a ruptura constitucional e lançou o Brasil
em uma longa noite escura, só foi possível acontecer com o respaldo logístico e
financeiro da CIA. Quase 50 anos depois, as informações sobre esse período
nefasto são maiores do que as de 1954. É possível até que os pesquisadores não
se debruçaram tanto para certificar muitas ocorrências até hoje não totalmente
esclarecidas.
Nem
tudo, entretanto, ainda foi revelado. Recentemente, por exemplo, o jornalista
Continentino Porto, autor do livro JK
segundo a CIA e SNI, teve mais acesso a documentos da CIA que
comprovam a participação de um agente secreto a serviço dos EUA acompanhando em
um hospital militar o então Ministro da Guerra (na época tinha essa
denominação), Jair Dantas Ribeiro, que se afastara do cargo dias antes do golpe
de 64 por motivo de saúde. O araponga da CIA produzia relatórios diários, que
provavelmente eram repassados para os golpistas militares e civis
brasileiros.
Tais
fatos, que fazem parte da memória deste país continente, devem ser sempre
lembrados, porque se alguém imagina que a CIA e outros serviços de inteligência
deixaram o Brasil sossegado, enganam-se redondamente. Quanto mais o país ganha
importância no cenário internacional, o que aconteceu, sobretudo, nos últimos 10
anos, maior a ação dos serviços secretos estrangeiros por estas
bandas.
Nesse
sentido, os brasileiros devem ficar atentos para não caírem em armadilhas
sofisticadas gestadas por grupos que historicamente sempre estiveram vinculados
aos interesses de potências como Estados Unidos.
Antes
do golpe que derrubou o Presidente constitucional João Goulart, a CIA encheu com
muitos milhões de dólares as comportas de institutos como o IBAD (Instituto
Brasileiro de Ação Democrática) e o IPES (Instituto de Pesquisas Econômicas e
Socais). O objetivo do IBAD era formar uma bancada que defendesse os interesses
norte-americanos e consequentemente divulgar a catilinária anticomunista da
época da Guerra Fria. O IPES, capitaneado pelo então coronel Golbery do Couto e
Silva, procurava também fazer cabeças preparando-as para o apoio incondicional
ao golpe de 64.
Aaron Swartz |
Tais
fatos não chegam a ser uma grande novidade, porque depois de tantos anos
decorridos, o que muitos já sabiam, através de indícios ou pesquisas de campo,
os arquivos públicos informativos a respeito deixam
claros.
Nos
dias de hoje, o grande mérito dos personagens mencionados no início desta
reflexão é que eles revelaram (e devem continuar revelando mais fatos)
antecipadamente muitas informações que se tornariam públicas, se é que se
tornariam, daqui a 30, 40 ou 50 anos.
Por
estas e muitas outras pode ser explicado o ódio do establishment estadunidense a figuras
como Snowden, Assange, Manning e Swartz,. que na sexta-feira (20) foram
homenageados com o Prêmio Internacional de Direitos Humanos instituído pela
Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da Associação
Brasileira de Imprensa (ABI).
___________________________________
[*]
Mário Augusto Jakobskind é
correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do
Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da
Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor,
entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes -
Fantástico/IBOPE.
Enviado por Direto da Redação
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