2/9/2013, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
A valsa diplomática pela Síria já
parece mais uma quadrilha. Uma infinita variedade de variações está aparecendo.
A mais recente é a forte possibilidade, noticiada pelo Los Angeles Times
hoje, que cita altos funcionários em Londres, da Casa dos Comuns britânica, que
está considerando uma segunda votação sobre a participação na “ação limitada” do
presidente Obama dos EUA contra a Síria. Os jornais britânicos
repetem, em geral, que pode existir essa possibilidade.
Ed Miliband |
Fala-se
de um consenso que estaria em construção entre o primeiro-ministro David Cameron
e Ed Miliband, líder da oposição. E há base suficiente para construir um
consenso, porque, se Cameron perdeu a votação de 5ª-feira, Miliband passou a enfrentar fogo
cerrado e foi
empurrado para a defensiva por vozes do próprio partido, por ter precipitado uma
divergência entre Grã-Bretanha e EUA, numa questão chave, que empurra a
Grã-Bretanha para uma posição menor, se for enquadrada num cisma com os EUA, num
grande projeto internacional de consequências imensas, que pode, é claro, expor
a insignificância da Grã-Bretanha no tabuleiro global.
Voltemos
por um instante ao memorável discurso de Miliband na 5ª-feira. É útil lembrar
que ele também é favorável à ação militar contra o regime sírio, mas abraçou uma
posição segundo a qual é indispensável um “mapa do caminho” para os
desenvolvimentos posteriores na Síria. Ora! E se Cameron estiver aberto a essa
sugestão? Claramente, os que dançam no salão estão-se movendo lateralmente. Isso
é uma coisa.
Em
segundo lutar, circula uma avaliação precipitada segundo a qual Obama estaria
“recuando”. Bem. Obama não está recuando. Está como jogador de basquete que só
vê a bola síria, e está agudamente consciente de que está embaixo da rede, na
área restritiva onde não pode permanecer por muito tempo.
Ora,
ao levar a matéria ao Congresso, Obama ganha tempo para contatar os aliados
europeus, além de ganhar tempo também para cobrir seus flancos no plano da
política doméstica dos EUA. Quanto a esse último ponto, Mark Mardell, editor de
EUA da BBC avalia, acertadamente:
Mark Mardell |
Alguns
dirão que isso mostra que Obama está fraco. Mas isso só mostra que está jogando
com cartas fracas. (...) Decidir-se por uma ação impopular, com uma coalizão
internacional vacilante e relutância doméstica não é posição forte. Mas Obama
mostrou sensibilidade a essa situação real e movimentou-se de modo a partilhar a
responsabilidade por uma ação impopular com outros políticos: exatamente o que
fizeram os senadores que assassinaram Cesar. E espertamente, encontrou via para
‘'adocicar'’ um Congresso muito amargo. Haverá quem diga que, numa democracia,
essa é a atitude mais certa a tomar.
Além
disso, não há dúvidas de que o Congresso aprovará a ação militar contra a Síria.
Os lobbies israelense e saudita no Capitólio encarregar-se-ão de garantir
a aprovação.
Assim,
portanto, o que pode afinal acontecer é que a “ação limitada” venha, sim, a
assumir proporções muito maiores de intervenção militar e terá de basear-se em
algum tipo de “mapa do caminho”, como o que Miliband propôs – especialmente se o
Parlamento francês entrar em formação, o que é altamente provável, dados que
socialistas e verdes que comandam a maioria no parlamento francês apoiam, ambos,
a ação militar contra a Síria, com a esquerda intelectual francesa garantindo o
estímulo indispensável na opinião pública.
Em
resumo, estamos caminhando para uma intervenção à moda Kosovo na Síria? Sim, é
alta a probabilidade de que aconteça. Na verdade, essa parece ser a única saída
possível para a arapuca da “linha vermelha” que Obama armou desnecessariamente
para ele mesmo na questão das armas químicas – a menos que surja algum tipo de
fórmula de compromisso, talvez com a “comunidade internacional” assumindo o
controle sobre os arsenais químicos, na reunião do G-20, 5ª-feira próxima. Mas
isso exigirá que os russos aceitem fazer uma enorme concessão.
A
questão é, se a “ação limitada” dos EUA foi militarmente desafiada pela Síria
e/ou pelo Irã e Hezbollah, ela se metamorfoseará, da noite para o dia, em “ação
ilimitada”, com os EUA forçados a responder com força muito superior. (A
considerar que os EUA continuam a aumentar sua armada militar no leste do
Mediterrâneo).
EUA-OTAN bombardearam a cidade de Slika na Sérvia (ex-Iugoslavia) |
Não
se pode esquecer nem por um momento que tudo começou com “ação limitada” de
ataques aéreos contra a Iugoslávia dia 24/3/1999, e inicialmente os iugoslavos
puseram em “combate” seus MiGs. Mas quando a chamada Operação “Nobel Anvil” [bigorna] afinal terminou,
dia 10/6/1999, uma missão da ONU em Kosovo navegava para lá.
O
que não se deve deixar de considerar, do ponto de vista geopolítico, é que Obama
simplesmente não tem a opção de não agir na Síria. Ou os dias dos EUA como
top gun estariam acabados no Oriente Médio – as relações com a Arábia
Saudita estariam sob estresse jamais visto, a segurança de Israel estaria
gravemente afetada, o Irã cresceria como potência regional e na questão síria; e
os EUA estariam forçados a negociar com Teerã a partir de posição de fraqueza.
Em resumo, a posição dos EUA no Oriente Médio sofreria golpe letal, da qual só
se recuperaria com muita dificuldade. A maré viraria também na Primavera Árabe e
estaria desencadeada uma sequência de convulsões em vários fronts (o futuro do Egito, Iraque,
Líbano, o problema palestino e daí por diante).
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[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do Irã,
Afeganistão e Paquistão e escreve
sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais The
Hindu,Asia Times Online e
Indian Punchline. É o
filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
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