27/9/2013, [*] Pepe
Escobar, Asia Times Online – The
Roving Eye
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Terroristas da Frente al-Nusra /al-Qaeda armados e pagos pelos EUA e Arabia Saudita |
Se
ainda faltasse alguma prova extra para destroçar o mito de uma luta
“revolucionária” para alguma futura Síria “democrática”, as manchetes da semana
acabaram com qualquer dúvida remanescente.
11,
13 ou 14 brigadas “rebeldes” (o número varia conforme a fonte) já fizeram
descarrilar o tal Conselho Nacional Sírio, dito “moderado” e mantido pelos EUA,
e o nada livre Exército Sírio Livre. Os líderes do bando são os
jihadistas dementes da Frente al-Nusra – mas o bando inclui outras
imundícies, como as brigadas Tawhid e Tajammu Fastaqim Kama Ummirat em Aleppo,
algumas imundícies das quais eram, até recentemente, parte do Exército Sírio
Livre, já em pleno colapso.
Na
prática, os jihadis ordenaram que a miríade de “moderados” se
submetessem, que se “unificassem num quadro claramente islamista” e que jurassem
fidelidade a uma Síria futura na qual a lei da Xaria seja “a fonte única da
legislação”.
Ayman al-Zawahiri |
Um
certo Ayman al-Zawahiri deve estar em festa, dançando em seu esconderijo
confortável, à prova de drones, em algum ponto dos Waziristões. Não só
porque sua conclamação para uma jihad multinacional – à moda do
Afeganistão nos anos 1980s – está funcionando; também porque o Conselho Nacional
Sírio comandado pelos EUA já está exposto como o roedor desdentado que de fato
é.
E
fatos em campo só fazem comprovar exatamente isso. O Estado Islâmico do Iraque e
do Levante, promovido pela al-Qaeda, acaba de tomar uma cidade próxima do ponto
de passagem de Bab al-Salam na fronteira com a Turquia, que estava sob controle
do Exército Sírio Livre, porque o Exército Sírio Livre foi acusado de lutar por
“democracia” e de manter laços com o Ocidente. Errado. O Exército Sírio Livre
deseja esses laços com o ocidente, sim; mas sob regime controlado pela
Fraternidade Muçulmana. E o Estado Islâmico do Iraque e do Levante – do qual a
Frente al-Nusra é o principal membro sírio – deseja um Siriastão talibanizado.
As
gangues de jihadis linha duríssima na Síria somam cerca de 10 mil
jihadistas; mas correspondem a cerca de 90% dos combates pesados, porque são os
únicos com real experiência de combate (incluindo iraquianos que combateram
contra norte-americanos, e chechenos que combateram contra russos).
Bandar bin Sultan |
Paralelamente,
e não por acaso, desde que o príncipe Bandar bin Sultan, codinome Bandar Bush,
foi nomeado pelo rei saudita Abdullah para comandar a jihad síria, com
instruções para não deixar nem levar prisioneiros vivos, o Conselho Nacional
Sírio dito “moderado” e aliado da Fraternidade Muçulmana do Qatar passou a ser
cada dia mais deixado de lado.
Cortem
a cabeça desses “pacifistas”
E,
em matéria de descarrilamento catastrófico, nada se compara à desculpa do
governo Obama para uma “estratégia”, a qual, teoricamente, se resume a armar e
treinar extensivamente o elo mais fraco – gangues selecionadas do Exército Sírio
Livre infiltradas por agentes da CIA – e que “impediriam” que as armas caíssem
em mãos de jihadistas. Como se a CIA tivesse inteligência local confiável sobre
as fontes do Golfo que garantem dinheiro e apoio logístico aos milhares de
jihadistas.
O
Conselho Nacional Sírio, o Exército Sírio Livre e o chamado “Comando Militar
Supremo” (de exilados) comandado pelo grandiloquente general Salim Idriss já não
passam, hoje, de piada.
A
coisa toda aconteceu enquanto o presidente da Coalizão de Oposição Síria [Ahmed
Asi] Al-Jerba, estava na Assembleia Geral da ONU em New York – onde se encontrou com o
secretário de Estado John ("Assad é como Hitler”) Kerry. Kerry não falou sobre
armas, mas sobre mais “ajuda” e futuras negociações na perenemente adiada
Conferência Genebra-2. Al-Jerba ficou furioso. E, para piorar, várias das
gangues do seu Exército Sírio Livre declaradamente bandearam-se para a al-Qaeda.
A Frente al-Nusra/al-Qaeda executa civis na região de Aleppo (Síria) |
Por
quê? Sigam o dinheiro. É assim que funciona. Pelo menos metade das “brigadas” do
Exército Sírio Livre são mercenários – financiados do exterior. Lutam onde os
patrões – que lhes pagam e lhes fornecem armas – mandam lutar. O “Comando
Supremo” controla, no máximo, 20% das brigadas. E essa gente sequer vive na
Síria; têm bases do lado turco ou jordaniano da fronteira.
Mas
esses jihadis mercenários combatem em tempo integral. Eles são a efetiva
força combatente, recebem salários em dia e suas famílias são protegidas e
mantidas.
Assim
sendo, trata-se hoje de guerra entre o Exército Sírio Árabe e um bando de
jihadistas. Claro: nada disso será JAMAIS bem explicado pela imprensa-empresa à
opinião pública ocidental.
Imaginem,
então, se esses degoladores, comedores de fígados, fãs da Xaria, teriam algum
desejo de aparecer na conferência Genebra-2 para negociar um cessar-fogo com o
governo sírio e um possível acordo de paz com o eixo OTAN-Casa de Saud.
Evidentemente nunca acontecerá – como Bandar Bush deixou bem claro,
pessoalmente, em Moscou, para o presidente Vladimir Putin.
O
pior, do ponto de vista de Washington, é que não há como explicar por que não
pode acontecer nenhuma negociação significativa. Até os mais descerebrados
infiéis que habitam os círculos do poder em Washington já viram que há conexão
direta entre todas as hordas de “rebeldes”, e também, é claro, com os “rebeldes”
sírios que abraçaram a al-Qaeda imediatamente depois que o grupo al-Shabaab
atacou o shopping center Westgate em Nairobi.
Os degoladores da Frente al-Nusra/al Qaeda (financiados e armados pelos EUA via Arabia Saudita, Jordânia e Turquia) distribuem fotos e vídeos de seus "feitos e conquistas" na internet |
Nem
é preciso dizer que Bagdá entrou em surto, ante esses desenvolvimentos. O Estado
Islâmico do Iraque e do Levante já aumentou os atentados com carros-bomba e
homens-bomba no próprio Iraque – porque o governo de al-Maliki, “apóstata”
xiita, é tão alvo preferencial quando o governo do secular Bashar al-Assad.
Quase
nem acredito que há apenas cinco meses, eu mesmo escrevi sobre o advento do Emirado Islâmico do Siriastão. Agora já
está bem claro que e como o “invisível” al-Zawahiri e o esperto Bandar Bush se
apropriaram da “estratégia” de Washington para chegar, realmente, onde querem
chegar.
[*]
Pepe Escobar (1954)
é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica
exclusivamente em inglês. Mantém coluna (The Roving Eye) no Asia Times
Online; é também analista e correspondente das redes Russia
Today, The Real News Network Televison e Al-Jazeera.
Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de
Tradutores da Vila Vudu, no
blog
redecastorphoto.
Livros
- Globalistan:
How the Globalized World is Dissolving into Liquid
War, Nimble Books, 2007
- Red
Zone Blues: A Snapshot of Baghdad During the Surge, Nimble Books, 2007
- Obama
Does Globalistan, Nimble Books, 2009
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