Traduzido pelo
pessoal da Vila Vudu
(Entreouvido no quisque da Pregafrôxa na Vila Vudu: Esse Nuridini é analista tão isento quanto quarqué vilas, manholis, sardimburgs ou wackas, ora bolas!).
Ben Bernanke, o destruidor do sonho neoliberal |
Pesquisa
recente da ONG Transparência Internacional põe a Somália no topo do ranking
da corrupção no mundo. Engraçado. A Somália lá está, no topo, pelo menos em
parte, por causa da ação de pirataria dos piratas somalianos.
Pirataria é
confisco de riqueza mediante força bruta. Imprimir dinheiro falso também é
confisco de riqueza, e fraudes financeiras em geral, também. Bernie Madoff foi
condenado a dez anos de cadeia, exclusivamente porque fraude financeira é
crime; as vítimas de Madoff perderam o dinheiro que haviam confiado a Madoff.
Pois mesmo apesar disso tudo, o presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke que agora se prepara para deixar o
cargo, imprime mensalmente US$85 bilhões, dinheiro que, de fato, ele tira da
cartola, e essa “mágica” é considerada virtude – por mais que seja confisco
forçado de riqueza. Dá à coisa nome de “estímulo” econômico, porque, segundo os
mágicos, faria avançar a economia e todos estaríamos andando na direção do
pleno emprego, cá nos EUA.
Bernanke
deixa o posto no final desse mês, depois de anos de destruição, durante os
quais só fez avançar o caos financeiro, o desemprego em massa, a inflação, o
confisco de riqueza e a miséria, nos EUA e noutros locais.
Os EUA viviam
em grande prosperidade antes de Bernanke fazer de nós país de desolação. Seu
turno como propositor de políticas e presidente do Fed ficará na história como era de mentiras e de anarquia. Suas
políticas monetárias não ortodoxas e taxas de juro quase-zero ajudaram a
realizar os piores pesadelos do período do pós-Segunda Guerra Mundial;
destruíram os bancos norte-americanos; e levaram a desvalorização da moeda para
outros países industrializados.
Ignorando a
Constituição dos EUA e agindo como se dinheiro fosse brinquedo de moleque,
Bernanke reinou com poderes absolutos para destruir dinheiro. Comparando-se
2000, pouco antes de Bernanke passar a integrar o grupo de diretores do Fed em
2002, e 2013, vê-se logo que Bernanke muito mereceu o título de “Helicopter
Ben” [ganhou o apelido quando disse que “jogaria dinheiro de helicóptero em
Wall Street para evitar a repetição do desastre dos anos 1930s” (NTs)].
O crédito do Fed subiu, de US$0,5
trilhão para $4 trilhões (foi multiplicado por 8). A dívida pública dos EUA
chega hoje a $17 trilhões; era de $3,4 trilhões, antes de ele chegar ao Fed. O barril de petróleo custa hoje
$100; antes, custava $18; o ouro subiu, de $250 para $1.300 a onça. A comida
custa hoje, no mínimo, quatro vezes mais cara. Os preços de ações bateram todos
os recordes em 2013. Mas a renda per-capita real é hoje, nos EUA, muito
menor que em 2000. Eis a herança de caos que Bernanke deixa ao país.
"Helicopter Ben" |
Bernanke crê
numa teoria que estipula que “jogar dinheiro (de helicóptero)” seria o segredo
da prosperidade e do pleno emprego. Tão alucinada é essa teoria, que causou
susto, nos EUA, entre políticos e acadêmicos. E é falácia de tal magnitude, que
muitos anos de injeção de vastas quantidades de dinheiro na economia ainda não
nos fizeram chegar nem perto do pleno emprego; só se vê caos.
Se a tal
teoria fosse correta, o pleno emprego seria quase instantâneo. Ao contrário de
ciências nas quais as relações são exatas, pode acontecer de teorias econômicas
jamais serem confirmadas por fato algum. Em ciências exatas, há uma relação
imutável entre a temperatura e a expansão do mercúrio, por exemplo, o que nos
permite medir temperaturas com precisão. Na economia, não há tal relação exata
entre juro zero e pleno emprego. Se tal relação existisse, Bernanke teria
chegado ao pleno emprego já há muitos anos.
A única coisa
que fez foi encorajar a especulação intensiva com patrimônio, o que criou
desordem financeira e empobrecimento. Claro que, nisso, Bernanke não está
sozinho – muitas teorias econômicas ditas exatas por seus proponentes, como o
comunismo e o keynesianismo, falharam
miseravelmente e geraram desastres onde foram aplicadas. Agora se pode acrescentar
o bernankismo a essa lista de teorias
desonradas.
Quando os
piratas somalianos obtêm dinheiro de resgate por navio que tenham sequestrado,
não há dúvidas de que esse dinheiro fará aumentar a demanda por bens e serviços
entre os piratas; e reduzirá a demanda por bens e serviços entre os que tenham
sido sangrados para pagar o resgate. O emprego de pirata é incerto e a própria
pirataria tem a ver exclusivamente com redistribuição de riqueza – não com
criação de riqueza.
É a parábola
da janela quebrada: a necessidade de gastar dinheiro para instalar uma nova
janela reduzirá a demanda por outros bens. A simples teoria do comércio afirma
que um agricultor troca trigo por sapatos: nesse caso há criação de valor e de
riqueza. O agricultor precisa dos sapatos, e o sapateiro precisa de trigo;
criam-se empregos, porque o trabalho do agricultor é trocado pelo trabalho do
sapateiro. Na fraude de Bernanke, como na pirataria dos somalianos, quem recebe
o dinheiro ganha riqueza, mas sem que qualquer trabalho tenha sido trocado por
trabalho; claro que, nem a fraude de Bernanke, nem a pirataria criam empregos.
Nos dois casos, alguém está ganhando sapatos e trigo sem qualquer trabalho.
Ainda que a criação de trabalho fosse virtuosa, nem a fraude de Bernanke nem a
pirataria podem ser toleradas, nem criam empregos.
O dinheiro
que Bernanke joga “de helicóptero” não é maná caído do céu. Bernanke tinha
poder para confiscar, mas tinha poder-zero para criar riqueza. Fabricar
dinheiro “do nada”, é redistribuir dinheiro em estado puro. Bernanke injetou
perto de $3,5 trilhões. Mas não criou um grama de trigo nem criou um pé de
sapato.
Ben Bernanke imprime SEM LASTRO US$ 85 bilhões por mês (Quantitative Easing) Inconstitucionalidade flagrante! |
A jogada, aí,
é jogo de soma zero: há os que se beneficiam da riqueza ampla, total e
irrestrita (efeito estímulo) e há os que só perdem (efeito desolação). O
dinheiro do helicóptero de Bernanke nada fez na direção do pleno emprego; em
vez disso, criou inflação de dois dígitos desde 2002 – por mais que Bernanke
diga que não há inflação.
Pior, a montanha
de dinheiro despejado “de helicóptero” pressionará fortemente a inflação, por
muitos anos à frente.
A inflação
beneficia alguns grupos e pesa dolorosamente sobre outros grupos. Ações subiram
30% em 2013 num contexto de economia aleijada, excessivos déficits fiscal e
externo e desemprego em massa. Essa inflação de preços teria sido impossível,
sem o dinheiro “de helicóptero” de Bernanke. Indica furiosa transferência de
riqueza mediante o preço de ações que excedem em muito o PIB dos EUA.
Barack Obama |
O presidente
Barack Obama pode até estar indignado com a desigualdade de renda nos EUA – mas
não está absolutamente preocupado com a massiva transferência de renda à moda
Bernanke, em favor de alguns sortudos beneficiários e à custa de muitos
infelizes que só perdem e perdem. Como num sistema feudal, a riqueza tornou-se
monstruosamente concentrada via confisco, não pela geração.
Comprando
hipotecas, Bernanke tornou-se o maior comprador de casas nos EUA, o que elevou
o preço da moradia em 14% em 2013. Para os políticos, não é inflação... apesar
de essa elevação ser impossível sem as taxas de juros quase-zero, de Bernanke.
Eles chamam a coisa de “forte” recuperação do setor de moradias – apesar de
outra “forte” recuperação, semelhante à atual, em 2003-2008, ter levado a
milhões de despejos. A recuperação da moradia à moda Bernanke intensificará a
especulação, tornará impossível a casa própria e aumentará dramaticamente a
arrecadação de impostos sobre a propriedade, com os proprietários vendo suas
casas reavaliadas e os impostos a pagar aumentando ao ritmo de taxas de dois
dígitos.
Bernanke e
seus apoiadores não dão a mínima, à lei constitucional; decidiram
independentemente, totalitariamente, quanto dinheiro inventar, a taxa de juros,
os preços de patrimônio e de commodities. Foram obcecadamente
doutrinários. Creram, com fé de fanáticos, que destruir o dólar norte-americano
seria a chave para o pleno emprego e a prosperidade, por mais desastres que sua
política provocasse, dois dos quais, e nem foram os maiores desastres, foram o
colapso financeiro de 2008 e a subsequente grande depressão.
A
Constituição dos EUA condena severamente o dinheiro sem lastro e só reconhece
como dinheiro a prata e o ouro. Muitos eminentes cientistas alertaram contra a
emissão de dinheiro à moda Bernanke. No início do século 16, o astrônomo
Copérnico dedicou ao rei da Polônia o seu tratado Monetae Cudendae Ratio [Proporção
da cunhagem da moeda], [1] que abre
com essa declaração ampla:
Nicolau Copernico |
Apesar de serem inúmeros os desastres que
causam a decadência dos reinos, principados e repúblicas, penso que os mais
importantes são estes quatro: a discórdia, a mortalidade, a esterilidade da
terra e a desvalorização da moeda. Os três primeiros são tão evidentes, que
ninguém ignora que assim é; mas o quarto, o que tem a ver com a moeda, poucos,
só os mais sensatos, se preocupam com ele. Isso, porque destrói as repúblicas,
não de repente, mas aos poucos, por certo mecanismo que age escondido. (p.103).
(...)
Bernanke e seus apoiadores, loucos por inventar dinheiro “do nada”, arruinaram
o pleno emprego e o crescimento nos EUA. Se os EUA não tivéssemos sido tungados
pelas falácias de Bernanke, teríamos preservado o pleno emprego. Melhor ainda:
nem a crise financeira de 2008 teria acontecido.
Bernanke
conseguiu travar os EUA em sua taxa de juro quase-zero, queimando dinheiro e
fraude massiva; assim ficaremos ainda por muito tempo, por décadas! O pleno
emprego tão buscado por Bernanke e apoiadores é louvável, sim. Infelizmente, o
dinheiro não foi inventado para ser ferramenta de políticas. Dinheiro é meio de
troca. A relação entre dinheiro e emprego é distante e irrelevante. Pior, e
sobretudo: criar dinheiro do nada é taxação sem representação.
Bernanke
promoveu sua destruição da moeda com pleno apoio e sob os cuidados do Congresso
dos EUA. Senadores e deputados norte-americanos firmemente acreditam no absurdo
by Bernanke de que taxas de juro-zero “geram” pleno emprego, apesar de,
por anos e anos e anos, essa relação jamais se ter materializado.
Agora,
firmemente aderido aos absurdos de Bernanke, o presidente Obama indicou Janet
Yellen, apoiadora obcecada de Bernanke, que essa semana foi confirmada para
sucedê-lo como nova presidenta do Fed
e levar avante as falácias de Bernanke.
E com Janet Yellen a "Farra-do-Dólar" vai continuar... |
O futuro será
mera extrapolação do passado: inflação e mais inflação, como efeito retardado
da gigantesca fabricação de dinheiro, mais especulação e mais instabilidade. As
falácias de Bernanke prevalecerão ainda por décadas, até que o dólar seja
completamente extinto.
Moedas
hiper-inflacionadas desaparecem quando ninguém mais se interessa por elas e
muita gente deixa de aceitá-las. Passarão gerações antes que percebam que
pirataria ‘legal’ de Bernanke, vale dizer, a fraude financeira, não é via que
leve nem ao pleno emprego nem ao crescimento. Quanto mais engodo e mais
inflação, mais cresce a especulação; e mais a depressão ataca a economia.
Nota dos tradutores
[1] COPÉRNICO, Nicolau. Sobre a
moeda. [1526] Curitiba: Segesta, 2004, 117p.
_____________________
[*] Noureddine
Krichene é economista com
Ph.D. pela U.C.L.A. e autor de Islamic
Capital Markets: Theory and Practic (London: Wiley, 888 pp.,
jan. 2013, ISBN: 978-1-118-24713-6). Lecionou finanças islâmicas na Global
University, INCEIF, na Malásia, e foi um economista do International Monetary Fund Economist Program
1986-2009. De 2005 a
2007, foi assessor do Islamic Development
Bank da Arábia Saudita. Suas áreas de especialização são o sistema
de pagamentos internacionais, as políticas macroeconômicas, finanças, energia e
economia da água. Foi assessor econômico do governo da
Arábia Saudita.
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