26/1/2014, [*] Peter Lee, China Matters
Traduzido pelo pessoal da
Vila Vudu
Vista noturna e parcial da Praça Maidan em Kiev, Ucrânia (17/1/2014) |
Como parte
da campanha desse blog China Matters, para retificar nomes e o
significado de palavras, que já retificou o nome da política externa do Japão –
a qual deve ser referida doravante como “Restauração
Militar do Japão” – EU DECRETO que os eventos em curso no Egito, na
Tailândia e na Ucrânia não são revoluções: são putsches.
Uma “revolução”,
como a palavra diz, implica o fim de um sistema de governo existente, quase
sempre autoritário, em favor de sistema de governo novo, usualmente mais
democrático.
Um putsch,
por outro lado, envolve grupo vociferante que usa a ação de rua para derrubar
governo eleito que os vociferantes considerem desagradável.
Manifestantes atiram coquetéis Molotov na polícia que cerca a Praça Maidan em Kiev, Ucrânia (26/1/2014) |
Egito-2013
foi um putsch contra governo eleito, por massa considerável de gente nas
ruas e na caserna que não quis passar pela inconveniência de esperar um, dois
anos, para chegar ao poder pelas urnas.
Esse feio
estado de coisas provocou dano cerebral grave em pessoas embriagadas ou cegas
pela própria visão de massas liberais, heroicas, amantes da democracia, que derrubam
governos autoritários.
Juan Cole
está insistindo em vender a derrubada do governo de Mursi no Egito como um
“revo-golpe-ção” [orig. revocouption], metendo à força uma certa dose de
legitimidade no golpe dos militares; declarando que o golpe seria continuação
da revolução original, graças às manifestações de rua contra Mursi e à redação
de uma nova constituição – e, assim, excluindo da história revolucionária
oficial o papel da Fraternidade Muçulmana na derrubada do governo Mubarak.
Praça Tahrir, Cairo, Egito em janeiro de 2011 |
Ah, não!
Não cá p’rô meu lado, Sr. Promotor-divulgador-propagandista da intervenção na
Líbia, a qual, me parece, pode ser rebatizada, “matar-arrebentar-tudo” [orig. “fuckupalotaboomboom”],
com a queda daquela nação, agora, no caos mais absoluto.
Atualmente,
o mandato popular para o putsch contra Mursi repousa sobre um
precaríssimo cálculo, segundo o qual cerca de 5% de egípcios a mais votaram
no referendo constitucional de 2014 que a FM boicotara, que no referendo de
2012 que os anti-FM boicotaram.
Situação
semelhante vê-se na Ucrânia, onde a oposição decidiu que um putsch é
preferível a esperar por outra eleição, sobretudo quando o ocidente trabalha
tão empenhadamente a favor das forças antigoverno.
O empenho
enviesado de Europa e EUA para fazer avançar seus interesses geoestratégicos à
custa de desmoralizar até eleições seria cômico, não fosse o fato de que grupos
neonacionalistas estão sendo usados como tropas de choque para abalar o governo
da Ucrânia. Será interessante ver até que ponto irão os “analistas”, no
trabalho de elogiar e boquiabrir-se ante as imagens da cidade atacada por
coquetéis Molotov e quebradeira geral, por “ativistas” contra “o governo”. Como
Belle Waring escreveu e depois desescreveu no blog
Crooked Timber – quando começam a entender que as
cenas podem facilmente ser reencenadas em seus próprios países.
Manifestação dos "Camisa Amarela" (anti-governo) em Bangcoc, Tailândia em 12/1/2014 |
Quanto à
Tailândia, os Camisa Amarela especificamente desejam:
(a) derrubar o governo;
(b) vedar completamente qualquer
possibilidade de novas eleições que eles quase com certeza perderiam; e
(c) convencer o exército de que tem de
intervir ao lado dos supracitados Camisa Amarela.
Nada, no
mundo, poderá ser jamais mais golpista-putchista, que isso!
Manifestação dos "Camisa Vermelha" (pró-governo) em Bangcoc, Tailândia (14/1/2014) |
Quando eu
estava na escola, em período muito mais ingênuo e mais declaradamente otimista
da história, ensinaram-me a respeitar eleições. Todos tinham de respeitar
eleições: os que venciam e os que perdiam. Se todos deixassem de respeitar
eleições, o país andaria rapidamente diretamente para o brejo... como está
acontecendo no Egito, na Ucrânia e na Tailândia (e, p’rôs que se interessem,
aconteceu também nos EUA em 1860). [E aconteceu no Brasil com o Golpe MILICANALHA de 1964
(Nota da redecastorphoto)]
Por mais
que eu tenha considerado corrompido todo o processo da recontagem de votos nas
eleições presidenciais, do primeiro momento até a decisão da Suprema Corte no
processo Bush vs. Gore, depois que a Suprema Corte se manifestou dei o
caso por encerrado.
Felizmente
Al Gore não exigiu que eu fosse para a praça, com meu capacete e minha
balaclava de motociclista, com meu taco de beisebol, com minha garrafa de
gasolina misturada com lava-louças, para derrubar o governo Bush. (Mas, sim,
sim: compreendo que milhões de pessoas atacadas, feridas e mortas pelo governo
terrorista de Bush, a começar pelo povo do Iraque, pensem diferente de mim.) Alguns
anos depois, os Democratas afinal chegaram à presidência. Assim, os Democratas
tiveram oportunidade legal e legítima para foder tudo & todos à sua própria
maneira personalizada. E a tentação de gerar tumultos de ruas e putsches
para derrubar governos continua a ser
obsessão com poucos adeptos dentro dos EUA.
Egito, grupo de "Black Bloc" pró Golpe Militar que derrubou o Presidente Mursi (eleito) |
Mas no
além-mar e, no geral, fora dos EUA, a coisa é diferente.
O atual
trio de putsches que estão em andamento no mundo não gerou nenhum tipo
de chilique ou grunhido do tipo “temos de respeitar o processo eleitoral”:
silêncio total nessa direção, tanto no governo dos EUA quanto nos “especialistas”
de mídia (especialistas-midiáticos-cracia).
Na Ucrânia,
a sanha dos EUA a favor do movimento antigoverno é palpável; no Egito, não
queremos cutucar o exército e pôr em risco o pilar egípcio do acordo de paz com
Israel; e na Tailândia, não entendo nada. Talvez os EUA só estejamos
interessados em nos manter ao lado do bom exército do pessoal lá.
Resumo da
ópera, acho eu, é a ideia de não há diferença alguma entre “revolução colorida”
e putsch; tumultos políticos locais são sempre mais uma ferramenta a ser
usada para promover e proteger interesses locais dos EUA. [(no
Brasil não é diferente com a ação dos “Black Blocs” – copiados do Egito – e dos
vândalos do “não vai ter Copa) Nota da redecastorphoto].
Fusca incendiado pelos "Black Bloc"(copiados do Egito) em manifestação em SP |
Mas sempre
dão alguma munição extra à República Popular da China, que pode argumentar que
os EUA não têm interesse algum em democracia alguma (pode-se contra-argumentar
que os EUA são REPÚBLICA, não DEMOCRACIA, distinção que 200 anos de proteção só
para os ricos e ao direito de propriedade, e limites de jure e de
facto contra a soberania popular, já comprovaram que não é distinção
trivial) – nem em eleição alguma; os EUA só têm interesses nos próprios
interesses.
[*] Peter Lee é jornalista norte americano de origem chinesa que escreve
sobre assuntos dos países do sul e leste da Ásia e a intersecção de negócios
entre essa região e os EUA. Além de articulista de várias publicações anima o
blog China Matters.
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