quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Conexões: Ameaça de calote dos EUA e desestabilização da Ucrânia


5/2/2014, Nikolai MALISHEVSKI, Strategic Culture
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

É muito provável que a implementação do plano de “mudança de regime” na Ucrânia aconteça dia 7/2. É dia de dois eventos significativos: início dos Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi e término da moratória que o Congresso deu ao presidente Obama para equacionar a questão da dívida interna dos EUA.

John Kerry saúda os "novos dirigentes" da Ucrânia na Conferência de Munique
Na Conferência de Segurança de Munique a oposição ucraniana e os EUA concordaram em implementar um plano para forçar a capitulação de Viktor Yanukovich. Arseniy Yatsenyuk contou do seu projeto de ação, que foi desenvolvido com a participação direta de representantes do ocidente, depois de uma reunião com o secretário de Estado John Kerry dos EUA e funcionários da União Europeia. 

Ao mesmo tempo em que a ‘praça Europa’ vai-se enchendo de barracas, para mostrar que ali está e ali ficará, o Departamento de Estado já conhece a data em que a operação ‘mudança de regime’ estará concluída: 24 de março. 

É o que se lê em mensagem publicada no website oficial do Departamento de Estado dos EUA, dia 24 de janeiro:

Clique na imagem para visualizar o trecho traduzido logo abaixo


ALERTA DE VIAGENS PARA A UCRÂNIA
O Departamento de Estado dos EUA alerta os cidadãos norte-americanos para os riscos de viajar à Ucrânia, por causa da agitação política e dos violentos confrontos entre policiais e manifestantes. A violência relacionada aos protestos, sobretudo em Kiev, aumentou de forma aguda desde 19 de janeiro, e já resultou em vários mortos e centenas de feridos. Os manifestantes ocuparam a Praça da Independência e inúmeros prédios do governo em Kiev e em outras cidades na Ucrânia. Grupos de jovens, conhecidos como “titushky,” já atacaram jornalistas e manifestantes e cometeram atos indiscriminados de violência em Kiev e outras cidades.
Recomendamos que cidadãos norte-americanos evitem todos os protestos, manifestações e grandes comícios. Cidadãos norte-americanos hospedados em hotéis ou residentes em áreas próximas de onde ocorrem os protestos devem abandonar essas áreas ou permanecer dentro de casa, provavelmente por vários dias, no caso de ocorrerem confrontos.
Este alerta de viagem expira dia 24/3/2014.

É muito provável que a implementação do plano de “mudança de regime” na Ucrânia aconteça dia 7/2. É dia de dois eventos significativos:

(I) - início dos Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi; e
(II) - término da moratória que o Congresso deu ao presidente Obama para equacionar a questão da dívida interna dos EUA. 

Hoje, como há seis meses, quando a situação na Síria deteriorou abruptamente e todos esperavam o início de ataque militar dos EUA contra aquele país, os patrões do dólar do Federal Reserve e o governo dos EUA mais uma vez enfrentam o mesmo dilema autodestrutivo: ou dão calote na dívida e declaram a falência dos EUA, ou aumentam o limite da dívida mais uma vez e aplicam medidas ainda mais duras de “austeridade”. Na arena internacional, esse dilema está diretamente ligado à necessidade de reavaliar o status e o papel da moeda norte-americana.

Os patrões do dólar não sabem resolver o problema que torna tão dolorosamente difícil a vida dos norte-americanos. Já há vários anos nada fazem além de adiar qualquer solução, o que têm conseguido, sempre, inventando cataclismos para distrair a atenção do mundo e desviar os olhos de todos para bem longe da dramática situação da moeda norte-americana. Agora, outra vez a reignição do mesmo problema ficará adiada até fevereiro. 

É situação muito similar à que se viu no outono passado, com os eventos dramáticos que atraíram todas as atenções do mundo para a Síria: foi quando terroristas islamistas instigados por aliados dos EUA infiltrados entre eles forjaram um “ataque químico”, em agosto de 2013. A atenção da mídia mundial está sendo desencaminhada também hoje.

Agora, o agente “para distrair” são agitações e pogroms nas ruas de Kiev e outras cidades ucranianas. (...)

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Compare estas duas ilustrações, elas são idênticas. Na ilustração emoldurada em vermelho estão as instruções em árabe desenvolvidos por especialistas norte-americanos durante a primeira fase do «protesto popular» na Síria (2011). Emoldurado em amarelo estão as instruções em ucraniano para ativistas da Praça Maidan de Kiev

O problema do calote norte-americano apareceu como problema grave pela primeira vez em 2008, logo depois de Moscou anunciar que a Rússia passava a trabalhar para a integração econômica dos países da Eurásia. 

Daquela vez, os norte-americanos conseguiram burlar a atenção do mundo, desviando-a para o massacre na Ossetia Sul, iniciado ali pelos fantoches dos EUA na Georgia, no mesmo dia da abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim; e para o que a imprensa-empresa ocidental chamou de “início da crise econômica global”.

O calote da “superpotência global” e o colapso do sistema monetário e do dólar não acontecerá tampouco imediatamente depois de 7 de fevereiro, apesar da crise econômica e financeira mais aguda que o mundo conheceu desde a Grande Depressão e das proporções astronômicas da dívida agregada dos EUA. Os patrões do dólar norte-americano já iniciaram a produção de várias crises que podem dar algum fôlego extra ao dólar.

A crise mais “promissora”, dessa vez, foi criada em torno da Ucrânia, para cujo litoral os EUA já se preparam para enviar navios de guerra, sob o pretexto dos Jogos Olímpicos de Sochi. Na fumaça criada em torno do que se passa na Ucrânia, desaparecem de vista fatos chaves que, se bem examinados, comprovariam os problemas pelos que passa a economia dos EUA. Na mesma fumaça, a imprensa-empresa encontra material para encher páginas e páginas, sem precisar falar do dólar norte-americano; e sem ter de falar, tampouco, por exemplo, da extensão da queda da renda familiar disponível [orig. real disposable income (RDI): a renda disponível para cada família, depois de pagos os impostos] dos norte-americanos desde 1974 (é o que se vê no gráfico seguinte):

Clique na imagem para aumentar até ficar perfeitamente legível

Esses eventos também afetam a Europa.

Mesmo políticos poloneses pró-EUA como o ex-presidente da Polônia A. Kwasniewski, representante do Parlamento Europeu na Ucrânia para o caso Tymoshenko, já dá sinais de alarme:

A situação na Ucrânia, diz Kwasniewski, pode ficar completamente incontrolável e ter consequências extremamente trágicas não só para os ucranianos, mas também para a União Europeia (...). O fato de gente inocente estar sendo morta na Ucrânia pode gerar uma onda de migração e de problemas econômicos. (...) Há risco real de uma grande tragédia. Acho que diplomatas europeus, de países vizinhos e da Polônia, devem mostrar-se sensíveis a esses assuntos. Isso pode resultar numa espiral de eventos que nós não conseguiremos conter para sempre.

Além da crise na Ucrânia, que está distraindo a opinião pública para que não dê atenção à futura batalha de vida ou morte que se travará no Congresso dos EUA, outras três “crises” estão em construção ou em andamento: na Tailândia, no Egito e na Síria. 

Nikolai Malishevski
Na véspera da abertura dos Jogos de Sochi, Damasco tem de apresentar um relatório sobre a liquidação de suas armas químicas. O plano adotado em novembro previa que todas as armas estariam fora da Síria no dia 5/2. Sabe-se que o processo está atrasado, na Síria. Mas, de fato, Damasco cumprir ou não cumprir o prometido (vale dizer, desarmar-se ante agressor potencial, ou recusar-se a desarmar-se) são situações que pouco alteram os planos de Washington, que sempre conseguirá obter algum outro pretexto para escalar suas ações contra a Síria – a última fronteira russa no Oriente Médio.

Não por acaso, na Conferência de Segurança de Munique, os EUA mais uma vez tentaram falar com a Síria em tom de ultimatum. E os islamistas radicais do Emirado do Cáucaso, que se uniram aos ‘rebeldes’ sírios contra o governo de Bashar al-Assad, já se preparam para entrar em ação também na Ucrânia, depois da recente convocação para que todos os militantes partam “em Jihad” ao mesmo tempo na Síria e no Norte do Cáucaso.




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