21/2/2014, [*] Pepe Escobar, Asia Times Online – The Roving
Eye
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Caia fora, Peter O’Toole! Chegou o
Charles da Arábia. O príncipe Charles entrou em modo Lawrence, quando fofocava
e dançava
em Riad, 3ª-feira passada (18/2/2014), com os nativos. E, certinho como
relógio, dia seguinte a empresa BAE
Systems – principal fabricante de armas da Europa – já anunciava que a
Grã-Bretanha e a Casa de Saud haviam acertado “novos preços” em negócio
extremamente sumarento: 72 jatos Eurofighter Typhoon.
O jato Eurofighter é concorrente direto do espetacularmente invendível Rafale francês e dos extraordinariamente
caros F-35s e F-16s norte-americanos. A Associated
Press incluiu devidamente na notícia – repetida em praticamente todos os
jornais impressos do planeta – o meme impingido por Washington segundo o qual
(...) a Arábia Saudita e outros países do Golfo estão reforçando suas
capacidades militares para fazer frente à ameaça já identificada, de rivais regionais,
especialmente do Irã.
Como se Teerã fosse bombardear a Casa de
Saud amanhã cedo.
Eurofighter Typhoon totalmente armado |
O Eurofighter,
porém, já foi usado contra irmãos árabes – por exemplo, no bombardeio
humanitário contra a Líbia, pela Organização do Tratado do Atlântico Norte,
OTAN, até converter a Líbia em estado arruinado. Está aberto o debate sobre se
a Casa de Saud pode ser tentada a usá-lo também contra o inimigo interno:
mulheres em luta para obter licença para dirigir.
Brandindo a desculpa oficial de que o
quase nonagenário rei Abdullah não teve condições de saúde que lhe permitissem
recebê-lo, Charles da Arábia não discutiu com a Casa de Saud a situação
escandalosa dos direitos das mulheres, dos direitos dos trabalhadores
migrantes, e, no que tenha a ver com direitos, de todos os direitos humanos no
reino. Claro que não. Só se fala de direitos humanos quando se trata de
demonizar Rússia, China e/ou Irã.
François Hollande |
Além do mais, Charles da Arábia não
poderia mesmo agitar demais as penas, porque os franceses também se estão
posicionando como concorrentes no jogo-show de “aconchegue-se-aí-com-um-saudita”,
do complexo industrial-militar (total de mais de US$70 bilhões, só nos anos
mais recentes). O presidente francês, François Hollande – nulidade abissal em
casa, mas Grande Libertador da África e da Síria – visitou Riad em dezembro,
tentando empenhadamente roubar dos anglo-americanos uma fatia significativa do
mercado. O problema de Hollande é que ninguém, no perfeito usufruto das
próprias faculdades mentais, jamais cogitaria, que fosse, de comprar um Rafale.
Aí está a grana. Passe p’rá cá a minha
bomba
Significa que a Casa de Saud está
armazenando toneladas de armas. OK. O príncipe saudita da Arábia, Bandar bin
Sultan, codinome Bandar Bush,
continua solto, financiando/armando seu exército sempre crescente de
mercenários no Levante. OK. E a Casa de Saud está arquitetando alguma com seu
aliado Paquistão. OK.
Apenas um dia antes de Charles da Arábia
desembarcar em Riad, o ministro da Defesa saudita – e, o que é importantíssimo,
príncipe coroado – Salmam bin Abdul Aziz estava em Islamabad. A alma do negócio
foi – e o que mais poderia ser – um “pacto
de defesa”.
Ministro da Defesa da Arábia Saudita, Salman Bin Abdul Aziz e o Primeiro Ministro, Nawaz Sharif do Paquistão em 18/2/2014 em Islamabad |
Crucialmente importante, há também aí
uma reverberação para o Oleogasodutostão. Em meados de 2013, o
primeiro-ministro do Paquistão, Nawaz Sharif, andava excitadíssimo por causa do
gasoduto Iran-Paquistão (IP) que, teoricamente, entraria em operação em 2015.
Agora, já não tem muita certeza. Não é preciso ser o perspicaz Charles da
Arábia para farejar pegadas dos sauditas em tudo isso – desmontando ativamente
a parceria energética Irã-Paquistão.
Rei Abdullah |
A paranoia da Casa de Saud em torno do
Irã não tem similar no sistema solar; e a “mudança de regime” na Síria é
elemento chave no cenário da retribuição. Por mais que Washington
negue-sem-negar, sempre repetindo o mote do “não estamos envolvidos”, a rede de
Bandar Bush em breve já estará
fornecendo armamento antiaéreo às gangues mercenárias no Levante.
E adivinhem quem está correndo nas
pegadas de Charles da Arábia rumo a Riad, mês que vem? Ele. O presidente Barack
Obama. Como parte do ataque de vários braços pela Casa de Saud, o rei Abdullah
praticamente suplicará a Obama (da Arábia?) que dê um empurrão decisivo para a “mudança
de regime” na Síria.
Entrementes, a Casa de Saud tenta reunir
a maior quantidade possível de “conselheiros” paquistaneses, para treinar seus
paus alugados na Síria. A negativa-sem-negar oficial do Paquistão é que eles não
mandarão aqueles exércitos à Síria.
Mas, numa operação remix do Afeganistão durante a jihad dos
anos 1980s, um pequeno punhado de “conselheiros” experientes será mais que
suficiente.
E há também a cena nuclear da Casa de
Saud. Já em 2012 andaram anunciando o ímpeto para construir nada menos que 16
reatores comerciais, que começariam a operar em 2030 e, como se não bastasse,
foi assinado um acordo de cooperação técnica com Pequim.
Bandar Bush bin Sultan |
A Casa de Saud gastou muito dinheiro no
programa de armas atômicas do Paquistão. Não se trata sequer de “adquirir
tecnologia nuclear” contra o Irã (demoraria tempo demais). Dependendo do
resultado das conversações do grupo P5+1 com o Irã, a hiper paranoica Casa de
Saud pode fazer chover cataratas de dinheiro sobre os cofres hiper quebrados de
Islamabad e, simplesmente, comprar uma daquelas bombas atômicas.
Afinal, Riad acaba de oferecer secos 3
bilhões de dólares ao exército libanês, para que compre armas da França –
movimento que franceses super excitados interpretaram imediatamente como um
“divórcio tático” dos sauditas, separando-se do governo Barack Obama.
Seja qual for o ângulo pelo qual se
examine tudo isso, há inferno provocado pelos sauditas, aí, logo à frente. Até
em Teerã já há preocupação em torno da (in)sanidade dos sauditas – e o gabinete
do Supremo Líder Aiatolá Khamenei sabe tudo o que há para saber sobre a
paranoia cósmica, o velho rei Abdullah, 89, encaminhando-se rumo ao ocaso, a
furiosa guerra pelo trono que advirá em seguida e, daqui até lá, a furiosa
ofensiva de guerra de Bandar Bush.
Charles da Arábia e a Dança das Espadas |
O que nos leva de volta ao perspicaz
Charles da Arábia. Ele com certeza percebeu que há um continuum direto
que liga o wahabismo medieval e um certo Osama bin Laden. Até recentemente,
todos e quaisquer líderes de qualquer gangue de islamistas linha-duríssima
partilhavam três traços comuns: estudaram na Arábia Saudita; foram financiados
por fontes sauditas (pública ou privada); e alcançaram a “maturidade” no
Afeganistão. Hoje, a paisagem jihadi está mais diversificada. Cabe então
a Bandar Bush arregimentar a nova
geração jihadi-Google, para suas “Frentes Islâmicas”.
Mas para a Casa de Saud, a agenda nunca
muda: demonizar o Irã; fazer o serviço de menino de recados da superpotência e
de “poderes” menores ocidentais; e comprar quantidades oceânicas de armas. Não
surpreende que Charles da Arábia tenha dançado tão satisfeito, conforme aquela
música; afinal, aqueles bons velhos amigos são os “nossos” filhos-da-puta
medalha de ouro.
[*] Pepe Escobar 1954) é jornalista,
brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em
inglês. Mantém coluna (The Roving Eye) no Asia Times Online; é também analista de política do blog Tom
Dispatch e correspondente/ articulista das redes Russia
Today, The
Real News Network Televison e Al-Jazeera. Seus artigos podem
ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu
e João Aroldo, no blog redecastorphoto.
Livros:
− Globalistan:
How the Globalized World is Dissolving into Liquid War, Nimble Books, 2007.
− Red Zone Blues: A Snapshot of Baghdad During the Surge, Nimble Books, 2007.
Hey!
ResponderExcluirwatch the daily pakistani talk shows on A1.
Thanks.
M.Saqib Qureshi