14/9/2014, [*] MK Bhadrakumar,
Indian Punchline − rediff BLOGS
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
John Kerry no Voice of America (11/9/2014) |
A complexa palavra que o Presidente dos
EUA, Barack Obama, não pronunciou sequer uma vez no discurso da 4ª-feira (10/9/2014)
em que expôs sua “estratégia” para combater o Estado Islâmico foi “Irã”. A
ambiguidade estratégica que Washington quer preservar é autoevidente. Obama
permanece em silêncio, mas o Secretário de Estado, John Kerry, fala pelos
cotovelos pela rádio estatal Voice
of America.
Kerry disse, ainda em Bagdá, na
4ª-feira (10/9/2014), pouco antes de Obama falar em Washington, que os
iranianos “estão sozinhos” [por conta própria] na luta contra o Estado Islâmico, mas
os EUA “não cooperamos militarmente ou de qualquer outro modo – nem temos
qualquer intenção nesse processo de fazê-lo – com o Irã”. Hmm. Categórico
demais, muito, além da conta.
Mas interessante é que tampouco Kerry
desaprovou o envolvimento político-militar do Irã contra o Estado Islâmico no
Iraque. Por outro lado, Voice of
America publicou comentário logo no dia seguinte da fala de Kerry
em Bagdá, cuja autora argumenta persuasivamente, que a “coalizão de vontades”
comandada pelos EUA para lutar contra o Estado Islâmico “tem de incluir o Irã”.
O comentário revelou que o Vice-Secretário
de Estado dos EUA, William Burns, “já levantou a questão do Iraque em reunião
com funcionários iranianos pelo menos em duas ocasiões”.
Aiatolá Ali Khamenei e Hassan Rouhani (d) |
Verdade é que também há especulações de
que o Irã pode vir a ser convidado para participar da chamada ‘conferência
internacional’ a realizar-se na 2ª-feira (15/9/2014) em Paris, convocada pela
França. Não há dúvidas de que Washington examinou e “autorizou” a lista de
convidados.
Enquanto esse jogo de sombras
prossegue, Obama aparentemente apresentou pedido ao Congresso dos EUA de autorização para treinar um exército de rebeldes
sírios em bases do exército na Arábia Saudita. De fato, na fala da 4ª-feira
(10/9/2014), Obama jurou que se livrará do regime sírio, “de uma vez por
todas”.
A ideia geral em Washington parece ser
que as forças da “oposição” síria – o chamado Exército Sírio Livre – possam ser
modeladas até se converterem em força de combate com real capacidade para
derrotar as forças do governo legal. Kenneth Pollack, um dos mais citados
especialistas norte-americanos em Oriente Médio, expôs, em longo artigo na
revista Foreign
Affairs,
“uma estratégia plausível para vitória a custo aceitável”, com a qual os EUA “podem
pôr fim à guerra civil síria em temos que interessam aos EUA (...) e sem
envolver soldados norte-americanos em solo”.
Netanyahu fez discurso instruindo seu "poodle" Obama |
Qual afinal é o plano de jogo de Obama
no que tenha a ver com o papel do Irã? Para começar, Obama não pode ser visto
em conversas com a liderança iraniana: Israel não gostaria. O primeiro-ministro
Benjamin Netanyahu fez importante
discurso no qual
(a)
avisou Obama de que os esforços dos EUA para enfraquecer radicais sunitas não
devem resultar em fortalecer “o Irã extremista”;
(b)
repetiu que o Estado Islâmico e o Hezbollah são ramos da mesma árvore;
(c) um
Irã com armas atômicas será, em todos os casos, o terror máximo;
(d)
muitos estados árabes sunitas (leia-se: a Arábia Saudita) avaliaram sua relação
com Israel — “Entendem que Israel não é inimiga deles, mas aliada na luta
contra esse inimigo comum”;
(e)
Israel apoia integralmente a conclamação que Obama fez, de ações unidas contra
o Estado Islâmico – “Algumas das coisas são conhecidas; outras são menos
conhecidas”.
É bem claro que a demanda de Netanyahu
é que Obama não fique muito íntimo de Teerã, não importa o quão “grave'’ seja a
ameaça que o Estado Islâmico implique.
Em segundo lugar, Obama não pode meter
os dois, Arábia Saudita e Irã, na sua tenda. A Arábia Saudita nunca
alivia nas diatribes contra
as políticas do Irã. E, afinal, a Arábia Saudita, a quem caberá pagar a guerra
contra o Estado Islâmico, é que é a aliada indispensável aos EUA.
Em terceiro lugar, Obama não poderá
recompensar positivamente qualquer contribuição que receba do Irã na luta
contra o Estado Islâmico. Teerã espera alguma boa vontade dos EUA, pelo menos, na questão
nuclear; mas Obama está com as mãos atadas e, simplesmente, não tem o capital
político necessário para conter a oposição que vem de Netanyahu.
Por outro lado, Obama quer toda a ajuda
que o Irã lhe possa dar militarmente e politicamente, para a guerra contra o
Estado Islâmico – desde, é claro, que a ajuda venha sem condições. Por que
Obama não poderia aceitar ajuda do Irã, se for grátis?
Os presidentes Assad (Síria) e Putin (Rússia) |
Pode-se supor que, ao preservar tão
atentamente a
ambiguidade estratégica na fala da 4ª-feira (10/9/2014), Obama também espera fazer
pressão sobre o governo sírio e, também, sobre Moscou. De fato, comentários russos recentes têm chamado a atenção para a
importância de todos se manterem em alerta contra as tentativas, pelos EUA, de
meterem uma cunha entre Moscou e Teerã.
Acima de tudo, o governo Obama parece
trabalhar sobre a premissa de que haveria um cisma dentro do governo iraniano
entre conservadores e reformistas, e que a luta surda pela supremacia
aproxima-se de um momento de definição. Washington já não responde à retórica
dos elementos “linha duríssima” em Teerã.
Na verdade, a declaração
iraniana em nível do Ministério de Relações Exteriores distribuída
no final da 5ª-feira (11/9/2014) parecia vazada em termos duros, mas evitava
cuidadosamente qualquer referência direta à fala de Obama, da véspera.
Fazia uma crítica “genérica” e não
contraditava a declaração explícita de Obama de seu projeto para atacar a
Síria. Diferente disso, as declarações russa e síria denunciavam, em termos
muito claros, que qualquer ataque dos EUA contra a Síria caracterizaria
“agressão” e violação da lei internacional.
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[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Oriente Médio, Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de geopolítica, de energia e de segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu e Ásia Times Online, Al Jazeera, Counterpunch, Information Clearing House, e muita outras. Anima o blog Indian Punchline no sítio Rediff BLOGS. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala, Índia.
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