Publicado em 05/06/2012 por Mário Augusto
Jakobskind*
Em meio a crise que assola a
Europa, da Grécia a Espanha, passando por Portugal e Irlanda, os jovens, também
no continente americano, saem as ruas para manifestar o desagrado com a
austeridade pregada por governos de seus países.
Até a mídia de mercado teve de se
curvar diante da realidade, ou seja, noticiar as movimentações que se espalham
pelo mundo. Jovens no Canadá, na Espanha, nos Estados Unidos e no Chile estão
dando o recado, apesar da (não) resposta dos respectivos governos, que reprimem
com violência os manifestantes.
O Chile, no continente
latinoamericano, vale um capítulo a parte. Da ditadura à democracia formal que
desembocou na Concertación e mais
recentemente em Sebastian Piñera, o Chile até hoje vem sendo considerado pelos
defensores do neoliberalismo como um exemplo a ser seguido. Fernando Henrique
Cardoso que o diga.
Mas quando eles apresentam as
análises sobre o país andino omitem o principal, ou seja, quem detém o poder
econômico. Omitem também as condições de vida em que se encontra a maioria dos
chilenos.
Pouco se noticia aqui no Brasil
que a distribuição de riqueza contempla cinco grupos econômicos, sendo um deles
o dos Piñeras, que tem como integrante um adepto da ditadura de Pinochet, hoje
na Presidência da República.
Segundo dados oficiais, as cinco
famílias detêm 50 bilhões de dólares das riquezas chilenas, o equivalente a 20%
do produto interno bruto. .
Tanto Piñera como os anteriores
governos da Concertación
administraram o Chile sempre de forma a não contrariar os interesses dos cinco,
Sebastian Piñera nem se fala. Na prática legisla até em causa
própria.
Nestas circunstâncias, os jovens,
que por sinal nem eram nascidos na época da ditadura que Piñera apoiou e
participou, saem as ruas para dizer basta. Motivos não faltam, como, por
exemplo, exigir que o ensino não continue sendo na base dos shopings centers que se transformaram os
estabelecimentos de ensino no Chile.
Para se ter uma ideia de como anda
o setor educacional, vale uma comparação. No ano passado, a indústria mineira,
portanto os barões do setor, obtiveram benefício de 35 bilhões de dólares, o
que, segundo o economista Marcel Claude, representa três vezes mais o orçamento
na área educacional e ainda 12 vezes mais do que os subsídios para o setor de
moradia.
E aí, diante dos protestos que se
irradiaram para vários setores sociais, Piñera decidiu conceder migalhas para o
setor educacional e assim sucessivamente. Os jovens recusaram a oferta que o
governo Piñera imaginava seria acatado.
Trocando em miúdos, o que acontece
no Chile com seus desequilíbrios cada vez mais acentuados e políticas econômicas
que contemplam os ricos, vem desde a época da ditadura. Deram uma maquiada, até
porque a ditadura ao estilo sangrento como no período Pinochet ficou superada
para o capital.
Em essência, os benefícios
econômicos do setor continuaram como antes. Os defensores do modelo, de Fernando
Henrique Cardoso a colunistas de sempre, apresentavam (continuam a apresentar)
como justificativa para o apoio o falso argumento de que os gigantescos
complexos econômicos eram responsáveis por empregos. Mentira, porque esses
gigantes oferecem a nível nacional apenas 20% dos empregos. A maioria, aí sim,
da oferta vem da pequena e média empresa.
E como se tudo isso não bastasse,
vale assinalar também que os lucros dos cinco grandes no Chile se devem
sobretudo ao arrocho salarial.
Guardando-se as especificidades de
cada país, as políticas de austeridades defendidas pelo Fundo Monetário
Internacional estão sendo aplicadas não só no Chile como em países da Europa
onde, sob o pretexto de sair da crise, o capital financeiro é contemplado em
detrimento dos assalariados. Angela Merkel que o diga.
Por falar em jovens, os destas
bandas estão dando o ar de sua graça. Os integrantes do Levante Popular da
Juventude, como os chilenos, não eram nascidos na época da ditadura, mas isso
não impede de hoje sair as ruas e promover o esculacho na porta da residência de
torturadores e assassinos da época da ditadura ainda vivos. Muitos vizinhos que
desconheciam o fato ficaram sabendo.
MILICANALHA do "Poder Moderador" |
No mais, os jornalistas autores do
livro reportagem Memórias de uma guerra suja garantem que conhecem pelo menos
mais seis delegados do gênero Claudio Guerra , de quem colheram o
depoimento, Ou seja, Marcelo Netto e Rogério Medeiros garantem que outros
agentes do Estado terrorista de pós-64 poderão fazer revelações importantes para
a Comissão da Verdade, ajudando assim o Brasil passar a limpo uma página infeliz
de sua história.
Em suma: quando os jovens se
manifestam é sinal que o país está vivo, Felizmente a paz dos cemitérios
propugnada pelos que tomaram o poder a força em abril de 64 não tem mais guarita
aqui e nos demais países do Cone Sul.
Em tempo: a idolatrada BBC cometeu
uma tremenda gafe recentemente. Colocou no canal e no site uma imagem de 2003 correspondente
ao Iraque como se fosse hoje na Síria. O autor da foto, o repórter fotográfico
Di Lauro da agência de fotografías Getty Images reconheceu o seu trabalho feito
por ocasião da invasão e posterior ocupação do Iraque por forças militares
estadunidenses.
A BBC teve de pedir desculpas pela
mancada que talvez continuasse se o próprio autor da foto não reclamasse. Se tal
fato aconteceu na BBC imaginem o que pode estar acontecendo em outros canais sem
a credibilidade da emissora britânica.
Mário Augusto
Jakobskind* é correspondente no Brasil
do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de
São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho
Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América
que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes -
Fantástico/IBOPE.
Enviado por Direto da Redação
Ilustrações extraídas da internet pela redecastorphoto
Charge catada no Blog do Nassif
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