26/12/2012, Lawrence Davidson, Consortium News
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Lawrence Davidson |
Evidentemente,
a questão da violência nos EUA é muito mais ampla que o incidente
em Newtown,
Connecticut. A violência está em toda parte, nas ruas, como nas
escolas; e parece que, afinal, obrigou Obama a agir.
Pode-se
especular sobre por que a violência nos EUA – assaltos com armas de todos o
tipos – alcançou as proporções que se veem hoje. Bem visivelmente há aí, ativo,
um aspecto cultural.
Frederick Jackson Turner e sua obra |
Em
1893, Frederick Jackson Turner escreveu ensaio famoso sobre “o fechamento da
fronteira norte-americana”. Escreveu que, tendo sido sociedade de fronteiras
desde que os primeiros colonos ingleses chegaram da Europa, o caráter
norte-americano guardou para sempre um aspecto de mentalidade de fronteira.
Turner
associou essa mentalidade de raízes culturais a um duplo impulso, tanto de
liberdade pessoal, como de expansão do território nacional. Mas há um outro
aspecto nas fronteiras, esse, cultural, que parece ser a mais duradoura
contribuição dos EUA para o ocidente.
Em
termos históricos, o que é viver numa fronteira? Praticamente sempre é viver em
risco, sem qualquer lei que reja o dia a dia. No caso dos EUA, a fronteira era
espaço semimilitarizado, com algum inimigo sempre à vista, vindo do horizonte,
violência dos dois lados; e armas, praticamente uma arma para cada colono.
Nesse
ambiente, floresceu o ideal pervertido de poder e liberdade encarnados no
“indivíduo durão”, que usa a força (literalmente: a força que se armazena nos
barris de pólvora) para domesticar um mundo “não civilizado” e, assim, conseguir
tudo de que precisa e proteger o que tenha. Esse passado pode explicar em parte
por que, numa população (como em 2011) de quase 312 milhões, haja cerca de 270
milhões de armas de fogo em mãos de civis.
A cultura da arma foi parte
essencial da cultura de fronteira e ainda oferece, para muitos norte-americanos,
uma representação simbólica da própria liberdade pessoal. Mas, bem feitas as
contas, a arma não passa de ferramenta pela qual se acumula poder pessoal; e
esse é o poder ao qual os norte-americanos mais aspiram. É seu “destino
manifesto” [Para mais informações leia o original Manifest
destiny, em inglês].
Norte-americanos
demais se veem, eles mesmos, como excepcionais: abençoados por Deus,
empreendedores atilados da livre empresa, e povo que, acima de todos os demais
no planeta, sabe realmente o que significam os direitos e a liberdade. E, no
processo de usar o poder para demonstrar esse destino excepcional, todos – os
indivíduos e a nação – praticamente sempre, fazem do dia a dia um mar de sangue.
Usar
o poder
Cá
nos EUA, as armas matam cerca de 17 mil pessoas por ano, das quais
aproximadamente 3.000 são crianças. É suficientemente horrível, mas o quadro
real é de fato muito pior.
A
quantidade de mortes que são o preço que custa a tendência, entre os civis nos
EUA, de não impedir que seus surtos de sensação de poder manifestem-se mediante
a violência nada é, se comparada à carnificina que os EUA promovem, pela ação de
seus militares e de outras modalidades de força bruta, fora do país.
Servindo-se
de pistolas, armas mecanizadas e armas químicas no Vietnã, os EUA manifestaram
seu poder e mataram algo entre 500 mil e 2 milhões de civis. Não é possível
saber quantos desses mortos eram crianças, mas não há dúvida que lá foram
mortas, no mínimo, dezenas de milhares de crianças.
Para
o Iraque, os EUA desenvolveram novo tipo oficial de arma, que se provou
altamente mortal, sobretudo contra crianças. A nova arma chama-se “sanções”. As
tais sanções fazem ver ao mundo que os EUA têm poder para manipular grande parte
da economia mundial, contra os inimigos dos EUA.
No
Iraque, as sanções operaram como uma espécie de Agente Laranja. Desfoliaram a
infraestrutura social do Iraque, sem parar, durante 13 anos. As sanções foram
impostas em 1990, como consequência por o Iraque ter invadido o Kuwait, e foram
mantidas até depois do fim da 1ª Guerra do Golfo.
Consequência
daquelas sanções, remédios vitalmente importantes, partes de reposição dos
equipamentos para purificação de água e para o sistema de esgotos e outros itens
também vitalmente necessários, foram proibidos de chegar ao Iraque. As cerca de
350 mil crianças iraquianas mortas (a menor dentre várias estimativas), a
maioria das quais com menos de 5 anos, podem ser direta ou indiretamente
associadas a esse regime de sanções impostas pelos EUA. As sanções só foram
removidas em 2003, quando os EUA invadiram o Iraque.
Há
também as mortes provocadas por armas, como efeito da 2ª Guerra do Golfo
(2003 a
2011), lançada sob alegações falsas, mentiras inventadas pelo governo Bush
Filho. Estimativas realistas falam de mais 600 mil a 1 milhão de novas mortes no
Iraque (adultos e crianças) até o atual estado das operações.
O
derradeiro alvo
Agora,
os jornais noticiam que Washington, mais uma vez servindo-se da arma das
sanções, está novamente criando condições para matar mais gente, crianças,
jovens, todos os mais vulneráveis. Dessa vez, o alvo é o Irã.
Trita Parsi |
Segundo
Trita Parsi, presidente do Conselho Nacional Iraniano-Norte-americano [orig.
National Iranian American Council], as sanções norte-americanas já
começam a ter impacto na saúde de civis iranianos evidentemente inocentes. A
capacidade de o Irã comprar remédios e equipamento hospitalar está sendo
reduzida pelas sanções norte-americanas; por causa disso, há mais mortes a
contabilizar.
Mesmo
assim, deputados e senadores dos EUA, como sen. Robert Menendez, Democrata de New Jersey, conseguiram fazer aprovar
mais sanções contra o Irã: “Minha opinião é que temos de esgotar todas as armas
do nosso arsenal de sanções, e rapidamente, antes que o Irã invente jeito para
sair da crise atual”.
Por
que Menendez e tantos como ele, no Congresso dos EUA, fazem o que fazem? Por
causa de um suposto programa de armas atômicas? É claro que não. As sanções
contra o Irã, que nunca param de aumentar, provam que o problema não é algum
programa de armas atômicas que já se sabe que, pelo menos hoje, o Irã não tem.
Desde
a derrubada do Xá, em 1979, Washington vê o Irã como inimigo e, portanto, como
alvo legítimo contra o qual se deve manifestar o poder norte-americano. Pode-se
supor que o senador Menendez saiba perfeitamente o custo humano, no Irã, das
políticas dos EUA. Mas, como a ex-secretária de Estado, Madeleine Albright, ante
as consequências desastrosas das sanções contra o Iraque, Menendez também parece
crer que o resultado compensaria todo o horror.
Muitos
americanos estão hoje horrorizados, e têm mesmo de estar, ante o massacre
doméstico de crianças norte-americanas. São pequenos cadáveres bem perto de casa
e, assim, os norte-americanos estão sendo obrigados a ver, porque a mídia
(embora jamais mostre os pequenos cadáveres) não pára de falar “da violência”. E
os norte-americanos estão sem saber o que fazer, porque, para muitos
norte-americanos, armas e liberdade são sinônimos.
Todas
as demais instâncias da violência – os assassinatos nas áreas pobres de vilas e
cidades por todo o país, as pilhas de cadáveres de adultos e crianças no Vietnã
e no Iraque – são, em larga medida, mantidas longe das vistas do país.
As
consequências, sobre a opinião pública média no Irã, de o governo dos EUA
manifestar tão desmesuradamente o poder de matar que ainda lhe resta, também são
atentamente ocultadas nos EUA, de forma a que não se gere nenhuma empatia,
nenhuma solidariedade humana.
Os
norte-americanos saibam ou não e estejam ou não prestando atenção, os seus
governantes, os seus representantes eleitos, continuam a agir para que os EUA
continuem “projetados” sobre todo o planeta, “projetando” o poder nacional dos
EUA, usando, para isso, o arsenal nacional de armas e sanções. Tratam de conter
o crescimento da população mundial, do modo mais macabro possível.
Os
políticos que iniciaram essas políticas assassinas talvez nem saibam, por
argumentos e análises sérias, por que fazem o que fazem. Mas sabem, sim, que é
culturalmente confortável persistir nas políticas de assassinato em massa. Eles
têm sua superficial convicção ideológica, segundo a qual sempre tem de haver um
inimigo, do mal, a ser combatido; na comparação com tal inimigo, eles mesmos
sempre são “os mocinhos” do filme.
Muitos
vivem também da noção simplória segundo a qual a propriedade de armas é tão
essencial para a liberdade individual de cada cidadão, quanto o poder militar é
essencial para a liberdade nacional. Assim como o norte-americano médio crê que
tem em casa aquele rifle semiautomático para proteger o lar e a propriedade,
assim os políticos norte-americanos armam (e nunca se cansam de superfinanciar)
o arsenal nacional.
Essa
gente tem poder e vai usar o poder que tem. Creem – e são provavelmente sinceros
– que continuam na fronteira, defendendo a civilização contra o avanço dos
bárbaros.
A situação econômica-financeira dos EUA está tão ruim, o american way of life escorreu pelo esgoto, onde atualmente e literalmente habitam pessoas (diversos videos disponíveis)que acredito muito mais num receio de um levante da população contra o governo e seu protecionismo bancário.
ResponderExcluirPrezada Regina,
ExcluirA situação interna dos EUA não está tão ruim como se imagina ou se crê. É um país extremamente rico e com imenso potencial criativo, além do fato de não haver potência que lhes faça frente na área militar. Na verdade só os EUA podem derrotar os EUA. E isso tá muito, mas muito mesmo, longe de acontecer...
Abração
Castor
Cara Regina,
ResponderExcluirInfelizmente, sou obrigado a concordar c o Castor...
Assino embaixo, embora c pesar, tudo q ele escreveu...
Eu queria q os EUA, explodisse, o q ocorrerá, como a todos os impérios...
No momento, nesta conjuntura, 'só os EUA podem derrotar os EUA' - gostei da frase, Castor...
Um abraço e beijo socialistas, respectivamente, a cada um...
Boa madrugada...
Grato Silva
ExcluirAcrescento. O contingente interno dos verdadeiramente pobres e miseráveis nos EUA é, ainda, relativamente pequeno. Não passa de de 12%/15% da população (Pew Institute)e seus movimentos políticos já estão devidamente criminalizados por Leis recentes editadas por Obama/Bush. A caminhada será longa e difícil...
Castor