3/6/2013, [*] MK
Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Talibã valsam em Teerã |
A
relação entre Teerã e os Talibã sempre foi tema de especulação. Houve quem
dissesse que os Talibã seguem a fé wahhabi e seriam virulentamente antixiitas e,
assim, viveriam às turras com Teerã até o Juízo Final. Jamais foi bem assim.
Em
termos gerais, os Talibã reúnem várias facções e tudo depende de quem esteja
sendo referido, em cada caso. Quanto à
inteligência iraniana, conversariam com o demônio em pessoa, se necessário
fosse, para promover interesses da segurança nacional.
Pode-se supor que, sim, houve
contactos fora do alcance do radar, entre iranianos e os Talibã, ao longo de
toda a década passada. Mas nenhum dos envolvidos jamais divulgou coisa alguma.
Portanto, o evento da semana passada –Teerã hospedou uma delegação de Talibã –
não chega a ser um terremoto. A grande, surpreendente novidade é que os
iranianos divulgaram a
visita, em primeira mão, no sábado.
E
hoje cedo os Talibã
confirmaram a informação. Pode-se
presumir que Mulá Omar resolveu sair das sombras. Agora se sabe que mais de uma
delegação dos Talibã têm visitado o Irã, de tempos em tempos. E também
transpirou que a inteligência do Paquistão sempre soube de tudo.
Interessa
registrar que o Irã recebeu representantes dos Talibã que vivem no Qatar. São a
menina dos olhos de Omar. Daí, sim, se extraem algumas questões realmente
importantes.
Rod Norland |
Depois de usufruir a farta
hospitalidade qatari – segundo Rod Norland do New
York Times – é altamente improvável que os
Talibã tenham feito segredo de suas andanças, para o Emir, em Doha; que tenham
simplesmente dado uma corridinha e tomado o avião para Teerã.
Não,
não senhor. Não é preciso ser muito esperto, para ter certeza de que os qataris
aprovaram a viagem dos quatro principais representantes dos Talibã.
E
é aí que começa a parte mais intrigante: se o Emir do Qatar sabia... teria
guardado o segredo, sem nada dizer ao Big Boss em Washington?
Impossível , inconcebível, implausível, incogitável,
inacreditável, incrível. Cada um escolha a palavra que lhe pareça mais
apropriada.
James Dobbins |
Pode-se dizer então que aí se vê
aquela proverbial ponta do iceberg.
Sim, sim, eu já adivinhara que o presidente Barack Obama
jogava seu jogo, quando nomeou o embaixador James
Dobbins como
novo enviado especial dos EUA para Afeganistão e Paquistão. Que adivinhei,
adivinhei – há um mês.
A
parte curiosa é que Dobbins visitou Islamabad, 5ª-feira passada. Absolutamente
não se falou da visita. Veio, reuniu-se, é claro, com o general Ashfaq Kayani, e
partiu sem alarde. Veio para se informar sobre o que fora discutido
em Teerã? Ou
veio para discutir o passo seguinte?
A
razão pela qual os iranianos decidiram divulgar a reunião também é total
mistério. Talvez temessem que a notícia “vazasse” – o lobby israelense
dedica-se a impedir que assuntos que envolvam o Irã permaneçam secretos por
muito tempo em Washington – o que criaria graves dificuldades para os líderes
iranianos, a poucas semanas das eleições presidenciais de meados de junho.
Hamid Karzai |
Ou,
talvez, alguma facção radical ou elementos do establishment de segurança
iraniana decidiram torpedear todo o projeto, porque odeiam a ideia de o Irã
estar mantendo “conversações” com os norte-americanos? Tampouco se pode
descartar essa possibilidade.
Mas
a questão chave é: o Irã ter-se-á decidido a favor de um “engajamento seletivo”
iniciado por Washington? Minha opinião é que não. Nesse caso, restaria ainda a
Obama a via de admitir os iranianos nas conversações
“Genebra-2”
e estimular, talvez até possibilitar, o início de um engajamento construtivo
entre os dois países.
Verdade
é que todos nos movimentamos sobre chão instável. Dobbins trabalha nas sombras,
à procura de iranianos. Há alguns dias, lendo a notícia de que Dobbins estaria
“na Europa”, ocorreu-me um pensamento estranho. “E se ele reativou seus antigos
contatos iranianos?”.
Younus Qanooni |
Mas,
nessa altura, o que os iranianos poderiam fazer para os americanos? Para
começar, os iranianos têm influência sobre vários grupos afegãos – não
necessariamente xiitas – e podem ser úteis na organização de um consenso afegão
que leve a um governo de base ampla em Cabul.
Não
esqueçamos que essa, precisamente, foi a missão dos diplomatas iranianos na
Conferência de Bonn, agindo em íntima coordenação com Dobbins em dezembro de
2001, quando os EUA precisavam desesperadamente que os rapazes da Aliança do
Norte saíssem de cena, para dar lugar a Hamid Karzai, presidente interino em
Cabul.
Depois,
Dobbins relembrou aqueles dias fatídicos em Bonn, quando ele já perdera todas as
esperanças, mas os seus contatos iranianos, de repente, tiraram, literalmente,
um coelho da cartola e salvaram a posição dos EUA. Os iranianos, parece,
conseguiram dobrar gente realmente difícil, como Younus Qanooni, do qual Dobbins
não estava conseguindo extrair coisa alguma.
Nawaz Sharif |
Vê-se
também, em tudo isso, que, diferente do passado, há hoje muito mais harmonia
entre Irã e Paquistão, graças aos empenhados esforços do presidente Asif Ali
Zardari para melhorar as relações bilaterais. Nawaz Sharif partilhará igual
paixão pelo Irã?
Nawaz
Sharif está sob pesada influência dos sauditas. E os sauditas desejarão manter o
Irã bem longe do tabuleiro afegão.
O
pior pesadelo para os sauditas seria ver desenvolver-se qualquer proximidade
entre EUA e Irã, o que pode acontecer se trabalharem juntos no problema afegão.
Os sauditas temem que qualquer normalização que se construa entre EUA e Irã
abale a centralidade dos próprios sauditas nas estratégias dos EUA para a
Região.
[*] MK
Bhadrakumar
foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista
em questões do
Afeganistão e Paquistão e escreve
sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais The
Hindu, Asia Online e Indian
Punchline. É o filho mais
velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e
militante de Kerala.
A Ásia constrói sua fortaleza para proteger e preservar seus recursos para si mesma, reservando para o ocidente p isolamento e a chantagem.
ResponderExcluirA vitória de Bashar al Assad, que se conigura aós o levante no Levante, destrói os planos da Europa de romper o quadrilátero formado entre Rússia, China, Índia e Irã.
Nenhum canudinho vai drenar gás e óleo da Ásia, sem pagar o preço de seus produtores.
500 anos depois do contorno histórico dos europeus ao bloqueio dos turcos no mediterrâneo, a fatura, a partir de agora, será cobrada.
Com juros históricos
A geopolítica privilegia a ocupação direta e/ou a dominação por elites apátridas e venais em países estratégicos. Isso acontece também aqui na AL,na África, etc.. Sempre aconteceu com o passar da História. Cabe resistir...Ou não
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