Genocídio cometido pelos falangistas (direita) libaneses e sionistas de Israel |
Trinta e um anos atrás, mais de 3 mil palestinos foram mortos nos campos
de Sabra e Chatila, em Beirute, onde viviam como refugiados desde a fundação de
Israel em terras palestinas, em 1948. Até hoje não houve punição aos
responsáveis pela chacina: o Partido Falangista libanês e os sionistas
israelenses
Por [*] Baby Siqueira Abrão
Em setembro de 1982 o Líbano vivia uma situação política tumultuada, de
guerra civil. Facções religiosas e partidos políticos libaneses e da Síria -
país ao qual o Líbano esteve anexado até 1943, sob domínio colonial francês -
promoviam atentados; a Organização pela Libertação da Palestina (OLP), à época
fazendo resistência armada à tomada de seus país pelos sionistas europeus,
estava sediada em território libanês; o exército israelense invadira o Líbano em
junho de 1982, com sua habitual violência, e instalara bases operacionais em
vários locais, incluindo a capital, Beirute.
Bachir Jemayel |
Israel dava apoio político e logístico à Falange, partido nacionalista
da direita libanesa que mantinha um braço armado também apoiado pelas
autoridades israelenses. Com os sionistas na retaguarda, a Falange conseguiu
levar seu principal líder, Bachir Jemayel, à presidência do Líbano. Nove dias
antes de assumir, porém, Jemayel foi morto num atentado promovido, de acordo com
a Falange, por forças sírias de inspiração nazista.
Ariel Sharon, então ministro da Defesa de Israel, reuniu-se com a
família de Jemayel dois dias antes do massacre de Sabra e Chatila para conversar
sobre a necessidade de o partido vingar-se do assassinato. A revelação foi
publicada pela revista Time de 21 de fevereiro de 1983, sob a alegação de
que integrava o Apêndice B do relatório final da Comissão Kahane, que investigou
a matança de Sabra e Chatila e considerou o ministro "indiretamente" culpado
pela ação. Sharon processou a Time, mas a revista manteve a veracidade da
informação, dizendo que se enganara apenas quanto à fonte da
notícia.
A reunião entre Sharon e a família Jemayel, porém, foi mero protocolo. O
ataque aos campos de refugiados de Sabra e Chatila, vizinhos um do outro, já
estava acertado. As autoridades sionistas tinham conseguido expulsar dali os
membros da OLP, o que deixou a população sem proteção alguma. Por isso seria
muito fácil atacá-la. Aquelas pessoas desarmadas não ofereceriam nenhuma
resistência, como de fato não ofereceram.
Ariel Sharon |
A participação do exército israelense no massacre foi comprovada. E,
como ele é subordinado ao Ministério da Defesa de Israel, o ministro à época,
Ariel Sharon, não teve como escapar da responsabilidade pelo crime. Mas escapou
da punição. Depois de intermináveis idas e vindas na Justiça da Bélgica - país
que permitia o julgamento de estrangeiros acusados de crimes de guerra, e a
cujos tribunais 23 sobreviventes do massacre apelaram - o caso foi
encerrado.
Por quê? Em entrevista a esta jornalista em 2012, o professor Franklin
Lamb, diretor das organizações Americans
Concerned for Middle East Peace [Estadunidenses interessados na paz para o
Oriente Médio] e The Sabra Shatila
Foundation and Palestine Civil Rights Campaign afirmou que o encerramento se
deveu “à pressão de Israel, por meio de Donald Rumsfeld, então secretário de
Defesa dos EUA. Ele ameaçou tirar de Bruxelas o quartel-general da OTAN se o
caso fosse adiante”. Rumsfeld foi secretário de Defesa dos governos Gerald Ford
e George W. Bush, teve papel destacado na “guerra ao terror” - que eliminou
grande parte dos direitos civis dos cidadãos dos EUA, promoveu guerras contra o
Afeganistão e o Iraque e ameaça o mundo até hoje - e foi um dos fundadores do
PNAC, o Project for the New American
Center, think tank neoconservador de inspiração sionista que no final
dos anos 1990 elaborou um plano, ainda em execução, para manter o domínio do
mundo nas mãos dos Estados Unidos.
Ellen Siegel |
O massacre de Sabra e Chatila indignou também os israelenses. Mais de
400 mil deles foram às ruas protestar, obrigando Sharon a renunciar a seu posto
de ministro da Defesa. Ele, porém, logo depois voltaria à política, como
primeiro-ministro. Em 2006, segundo a versão oficial, sofreu um AVC e desde
então encontra-se internado, em coma.
O drama vivido pelos moradores de Sabra e Chatila - a maioria
palestinos, mas também libaneses e imigrantes pobres de outras nacionalidades -
e a ativa participação dos soldados israelenses ficaram registrados nos relatos
dos sobreviventes e de outras pessoas que, de um modo ou de outro, testemunharam
a chacina, como a enfermeira estadunidense, Ellen Siegel, o jornalista inglês
Robert Fisk, então sediado em Beirute como correspondente no Oriente Médio do
jornal The Independent, a modelo Debbie Jackson e os próprios soldados
israelenses que participaram da ação e que relatam suas experiências no filme
Valsa com Bashir.
Fui atrás de alguns desses testemunhos para dar ao leitor uma ideia do
que foram aqueles trágicos dias de 1982 - do ponto de vista de quem sobreviveu
para contá-los. É estarrecedor, e vem a seguir.
[*]
Baby Siqueira Abrão é jornalista, tradutora, escritora e
pós-graduada em filosofia, é correspondente dos veículos Brasil de Fato e Carta Maior no Oriente Médio, além de ativista por
direitos humanos e justiça social. É autora de dois livros sobre história da
filosofia, para as editoras Moderna e Ática. Eventualmente colabora com a redecastorphoto.
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O Pravda publicará
a matéria, que é grande, em três partes. Esta é a introdução, que indica, de
maneira resumidíssima, o contexto em que se deu o massacre de Sabra e Chatila. A
segunda parte é uma tentativa de reconstruir alguns momentos decisivos da
tragédia, dia a dia, com base nos depoimentos de alguns sobreviventes,
inclusive os que testemunharam no tribunal belga que julgou o caso. Se qualquer leitor tiver mais informações, por favor, envie, para
que possamos, no ano que vem, apresentar um relato ainda mais completo desse
que foi mais um atentado contra o povo palestino.
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