segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Morte de Sharon: um dilema de realpolitik

12/1/2014, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Charges de Latuff 

Ariel Sharon "higienizado" pela imprensa-empresa...
Duas mortes, de dois líderes estrangeiros, no período de um mês, produziram sentimentos diferentes em Moscou.

A morte de Nelson Mandela foi apenas registrada, em tom de nota rotineira, assinada por funcionária de nível médio do Departamento de Informação do Ministério de Relações Exteriores da Rússia. Mas a morte de Ariel Sharon, ao contrário, foi registrada pelo presidente Vladimir Putin, em pessoa, em mensagem de condolências excepcionalmente elaborada, publicada na página do Kremlin.

Realpolitik? Não, não pode ser, porque não importa o que Mandela tenha defendido, a África do Sul também é país BRICS, e Moscou não se cansa de repetir a alta importância que atribui a esse grupo em suas prioridades de política externa. Então... por quê?

Claro que Sharon era russo de origem, nascido em família de judeus russos, grupo de eleitores aos quais a política russa sempre foi muito sensível, inclusive no período soviético. É verdade também que Sharon reforçou laços de amizade entre Israel e Rússia. De fato, Sharon é visto como herói aos olhos dos israelenses, e a diplomacia russa está jogando para a plateia, num momento em que seus diplomatas trabalham duro para dar conteúdo estratégico aos laços com Israel.

Tudo isso é perfeitamente compreensível. Mesmo assim... Moscou não terá exagerado?

Mais um genocida que não foi sequer julgado...
Para responder, consideremos o que fez o presidente Barack Obama dos EUA, movimento que oferece interessante caso para estudo em contraste: Obama enviou mensagem de condolências sóbria, apropriada ao momento, mas na qual deixa absolutamente claro que, na análise final, nenhuma personalidade interessa ou conta, e – mais importante – sem fingir que ignora a dura realidade conhecida de todos: a opinião pública mundial, hoje (e, provavelmente ainda por muito tempo) só se refere a Sharon como “O carniceiro de Beirute”.

Fato é que Obama não escreveu uma única palavra de elogio a Sharon. Esse é ponto importante, e conta a favor de Obama. A verdade é que, como escreve hoje o jornal porta-voz do governo chinês, China Daily, Sharon foi homem altamente controvertido, com muito sangue (humano) nas mãos.

Não esqueçamos que a comissão de inquérito israelense que investigou o massacre de centenas de palestinos nos campos de refugiados em Beirute em 1983 recomendou a renúncia ou a demissão de Sharon, então Ministro da Defesa. Conta a favor de Israel que aquele relatório daquela comissão de inquérito permaneça disponível, até hoje, na página do ministério de Relações Exteriores.

Disso tudo, nasce uma questão difícil: quem, afinal, Putin ou Obama, está do “lado certo” da história?

O destino de Ariel Sharon
A questão importante aqui é que os povos árabes também estão acompanhando os acontecimentos, o ambiente político do Oriente Médio está em transformação e os povos podem decidir não permanecer como meros observadores por mais muito tempo.

Isso, provavelmente, explica por que Pequim e Nova Delhi ainda não distribuíram qualquer nota de condolências pela morte de Sharon.


[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Irã, Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu,Asia Times Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.



Um comentário:

  1. E eu pensava que Ariel Sharon havia desencarnado há alguns anos.
    Vivendo e se informando.

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