Há três décadas emiti uma corrente de Arte Postal com o título “O País da Saudade”, onde os artistas interferiram e devolveram com imagens do Brasil de suas lembranças antes de 1964. Na justificativa eu lembrava que nós tínhamos sido o país do futuro, do carnaval, do futebol, mas naquele momento éramos o país da saudade.
A ditadura passou e a democracia começou a nascer no horizonte. As primeiras decepções nas urnas também passaram, chegou o bom tempo em que vivemos com fé e coragem no aqui/agora e no depois, e neste momento, quando a democracia amadurece, nossa memória se converte num leme que pode nos velar para um futuro que justifique todos nossos anseios, nossas lutas nossa garantia de um futuro brilhante.
Este futuro está em Dilma.
O artista, o intelectual e o empresário cultural brasileiro de minha geração - tenho mais de seis décadas de vida das quais há cinco me dedico exclusivamente à arte – jamais presenciou tamanho desenvolvimento em nossa política cultural, embora tivéssemos no passado momentos brilhantes.
Somos herdeiros da Lei Rouanet, que é filha da Lei Sarney, e isto já é um avanço social e político considerável, mas também sempre foi, na forma em que foi implantada, uma lâmina de dois gumes quando possibilitou também a formação de verdadeiros cartéis de empresas com o objetivo de arrebanhar o maior número de recursos advindos da renúncia fiscal federal e concentrá-los na linha de “produtos culturais” que interessam à empresa, sem garantir a divisão equitativa dos patrocínios com o mapa dos produtores culturais – artistas, intelectuais e empresários culturais – distribuídos por todo o País.
O governo Lula compreendeu desde o início que a cadeia produtiva da cultura é maior do que se pensava antes, quando seus integrantes chegavam a ser massa de manobras para empresários que lucravam com a formação e manutenção de sua imagem gratuitamente.
Ora, se a renúncia fiscal é uma opção gratuita, porque seu retorno em forma de imagem social? Poder-se-ia dizer que esta é uma troca natural, faz parte da ética do mercado, mas também podemos dizer que isto provoca demandas, pois podem ser avaliadas pela ótica do gosto de quem decide no nível da empresa que em geral é seu departamento de marketing.
O Governo Lula não só compreendeu como está agindo no sentido de desmanchar esses gargalos na direção da simplificação e transparências de todo o processo. Pode-se hoje acompanhar virtualmente todos os passos de qualquer projeto aplicado na Lei Rouanet.
Recentemente a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura lançou novas instruções normativas que tornam o acesso aos recursos muitíssimo mais simples, economizando em cada processo centenas de folhas de papel, diminuindo assim as exigências de documentos, vias, carimbos, etc., etc., etc., procedendo atalhos e simplificando a linguagem burocrática.
Mas para se ter chegado a este ponto foi preciso uma verdadeira operação de limpeza e resgate desde o primeiro mandato, sob o ministério de Gilberto Gil, e continuado – para não dizer ainda finalizado, pois todo processo é dinâmico – pelo Ministro Juca Ferreira.
Assistimos o aprimoramento das Representações Regionais do MinC. No Recife, por exemplo, a instalação da Sala Nordeste, com a magnífica exposição de José Rufino, enriqueceu sobremaneira nosso território expositivo e trará ao nosso público um programa de exposições do mais alto nível.
É sabido o resgate da FUNARTE, e o sucesso de seus editais em todas as áreas, na de artes visuais temos agora um edital de apoio a ensaios críticos de nível acadêmico. A Rede Nacional de Artes Plásticas é sabidamente um sucesso de ação oficial.
A Secretaria de Diversidade Cultural, por sua vez, contempla paritariamente e no mesmo nível de importância das outras Secretarias, as minorias culturais do País, como índios, quilombolas, religiões africanas, ciganos, idosos, portadores de necessidades especiais, homossexuais, doentes mentais, presidiários, artesãos e artistas periféricos ainda chamados de “artistas populares”. Com suas ações esta secretaria tem diminuído as diferenças, incluído e revelado talentos e aspectos novos e surpreendentes de nossa expressão cultural.
A rede de Pontos de Cultura espalhada por todo o Brasil tem mostrado uma quantidade surpreendente de manifestações culturais em todas as áreas, a maioria delas periférica, e criando uma integração “nunca antes vista neste País”.
Sobre cinema e áudio visual nem é necessário falar muito, pois os resultados “estão na tela” e ecoam pelo mundo nesta nova era do cinema brasileiro que vem resgatar e justificar todo esforço que o setor empreendeu no passado com o sonho mágico que sempre norteou nossos cineastas.
Isto tudo, e muito, muito mais que está por vir, precisa peremptoriamente, absolutamente, conscientemente, brasileiramente ter continuidade. Mas será necessária uma continuidade uma continuidade que não seja de cargos e programas, mas de políticas sócio-culturais longe do neoliberalismo que nos assolará se Dilma não for eleita.
Somente para lembrar, o perigo neoliberal é este processo de tanto sucesso deixar de ver o homem que faz a cultura, para ver somente o produto mercantilizado deste homem; é ver o espetáculo do ponto de vista da bilheteria, não dos artistas e técnicos que nele trabalharam; é ver os quadros na galeria como objetos de decoração ou mobília, não como novos signos de conhecimento; é ver o disco, não a música, muito menos o músico; ver o Best Seller, não o escritor e seu objeto; é ler crônica social, não crítica de arte; é apresentar o kitch, não o design e o seu designer.
De Norte a Sul as mulheres e os homens de cultura estão mobilizados, certamente, para nesta eleição trabalhar no sentido de Dilma para Presidenta de todos os brasileiros. Certamente, porque se pressupõe que as pessoas da arte e da cultura têm memória, cultivam a memória, têm noções da política e desejam o melhor para todos.
Neste momento estamos num limite entre o abismo cultural, de novo, e o campo arado, adubado, e próprio para a cultura.
Que venham bons tempos com Dilma no Planalto!