sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

“Zero coturnos” dos EUA em solo afegão?!


11/1/2013, MK Bhadrakumar*, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Vivemos mesmo tempos extraordinários, de “todas as opções” sempre “sobre a mesa” – para Irã, Coreia do Norte, talvez Síria. Pois agora o Afeganistão foi acrescentado à lista. As declarações do Vice-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Ben Rhodes, na 3ª-feira, segundo as quais o governo Obama também considera uma “opção zero soldados” no Afeganistão pós-2014 surpreendeu e desestabilizou muita gente.

Ben Rhodes
Será verdade? Rhodes declarou realmente o que se diz que teria declarado? Fará exata ideia do significado do que disse? Obama estaria realmente considerando a tal opção? Vai-se ver nesse caso, a verdade interessa pouco. Em termos políticos, permanece no ar, em todos os casos, uma complexa mensagem política para vários públicos.

Lembremos que o presidente do Afeganistão, Hamid Karzai acaba de pousar em solo norte-americano para confabular com Obama sobre o papel dos EUA no período pós-2014.

Karzai leva com ele uma lista de desejos. Quer 100% de certeza de que o compromisso dos EUA com a estabilização do Afeganistão continuará, mesmo depois da retirada de parte dos soldados prevista para acontecer ao longo desse ano e do próximo.

Por mais que Karzai não perca chance de repetir que é ele quem manda em sua casa, sabe com certeza que, sem o apoio continuado dos EUA, a casa ruirá como castelo de cartas. Nada além de realismo pedestre combinado a agudo instinto de sobrevivência em país difícil.

Não esqueçamos que, das três dúzias de brigadas do exército afegão que a OTAN treinou em todos esses anos, só uma tem competência para não se deixar exterminar, no calor de um confronto com os guerrilheiros Talibã. Vamos e venhamos: é grave.

Mas, dirão os americanos, não há almoço gratuito. Se mesmo assim os soldados dos EUA são necessários no Afeganistão, então... nesse caso... Só se o Pentágono mantiver pleno controle sobre eles e se receberem plena imunidade legal, de forma a que absolutamente não possam ser acusados ou julgados ou condenados por leis afegãs (mesmo no caso de cometerem “transgressões” – por exemplo: estupro coletivo de mulher afegã; urinar sobre o Corão; invadir casas afegãs em missão de busca e destruição de bens e moradores etc., etc.).

Mais importante: Washington quer garantias, preto no branco, escritas e assinadas, documento solene – o que tecnicamente se chama “Acordo sobre a Situação das Tropas” [ing. Status of Forces Agreement, SOFA].

Hamid Karzai
Ora, Karzai sabe que essa é a questão que pode matar todo o negócio. Foi mediante um SOFA, por exemplo, que o primeiro-ministro do Iraque, Nouri al-Maliki conseguiu livrar-se dos soldados dos EUA, ao mesmo tempo em que dava a impressão de que queria mantê-los no Iraque no médio e longo prazo. Mas Karzai não é Maliki, e o Afeganistão não é o Iraque.

Karzai trabalhou muito para conseguir um “consenso” afegão a favor de atender ao que exigem os norte-americanos. Mas essa não é precisamente uma daquelas situações em que um Lawrence da Arábia podia pegar um pedaço de papel e escrever promissória a ser paga por Sua Majestade em Londres, a qual valia aos olhos do chefe beduíno no Golfo de Aqaba como propina paga em moeda de ouro, para “incentivizá-lo” [orig. ‘incentivise’] a envolver-se na “revolta árabe” contra os Otomanos Turcos.

Dito de forma simples, Karzai não tem a necessária capacidade para entregar o seu tal consenso nacional afegão, em bandeja de prata, no Salão Oval. E Rhodes enviou a bola de volta para o campo de Karzai, ao fazê-lo lembrar gentilmente que “Caro presidente Karzai, é tudo ou nada...”.

Ao enunciá-lo a plenos pulmões, Rhodes também espera que suas palavras ecoem no bazaar afegão e ajudem a arregimentar alguma opinião pública naquele país tão gravemente fragmentado, a favor de um acordo Estado das Forças com as feições que o Pentágono exige.

A jogada funcionará? Matéria distribuída pela Radio Free Europe/Radio Liberty  (RFERL, mantida pelos EUA) insiste que sim, que a jogada está dando certo, que Rhodes abalou os nervos afegãos, que os afegãos estão mortos de medo de que os EUA os abandonem lá, atirados aos lobos, adotando sua “opção zero”.

Falando francamente, a farsa é muito flagrante. Os Talibã devem estar rindo às gargalhadas deles todos: de Karzai, de Rhodes e da Radio Free Europe/Radio Liberty.

Do ponto de vista dos Talibã, “opção zero” significa que os EUA estão reduzidos hoje a zero opções no Afeganistão, exceto pôr fim àquela guerra fútil.

Nem qualquer potência regional levará a sério ameaças de Rhodes. Das capitais regionais, só se ouve o mais ensurdecedor silêncio. Rhodes não explicou por que, se realmente há a tal “opção zero” sobre a mesa no Salão Oval, o Pentágono consumiu centenas de milhões de dólares, ano passado, para reformar e remobiliar as bases militares em Bagram, Herat, Kandahar, Jalalabad etc. – que já lá estão, perfeito lar-doce-lar longe de casa para os soldados norte-americanos.



*MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Times Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

Um comentário:

  1. (comentário enviado por e-mail e postado por Castor)

    Senhor Castorphoto, boa-tarde.


    Vinha eu no carro, agora, ouvindo uma tal "Rádio Estadão" FM, pela qual um tal de Celso Ming dizia que a presidenta (mas ele, mal-educado, dizia "presidente", porque, o Estadão se meteu na cabeça que poderia, sem se mostrar MUITO grosseiro e mal-educado, além de brucutu-fascista, escrever "presidente", mesmo depois de a presidenta Dilma ter dito que prefere "presidenta") Dilma reuniu empresários "para saber o que fazer", num momento em que os empresários estariam, segundo o tal Ming, assustadíssimos e preocupadíssimos "porque", sempre segundo o tal Ming, o governo "muda a todo o instante as regras do jogo".

    Não há, aí, questão de o tal Celso Ming tem uma opinião, e eu ter outra: o que se ouviu ali, no ar, pela Radio Estadão FM é um AMONTOADO DE MENTIRAS.


    Foi quando me ocorreu o seguinte pensamento:


    -- se a tal de liberdade de imprensa q o Estadão tanto defende implica apenas defender o direito de mal-informar e desinformar TODO MUNDO, inclusive os empresários que NÃO ESTÃO PREOCUPADOS E QUE ESTÃO TRABALHANDO ALIADOS AO GOVERNO DILMA (e são milhões, a julgar pelos números da avaliação do governo Dilma que se conhecem), e de dar livre voz só a esses 'comentaristas' de araque e 'jornalistas' que só podem ser ou idiotas completos, ou fascistas sinceros... então, eu SOU CONTRA a tal de liberdade de imprensa.


    Nunca ouvi dizer que alguma democracia implicaria garantir direito de bandidagem a bandidos.


    Avisa lá: sou a favor, doravante, de se cassar a palavra do tal Celso Ming.

    Alguém, algum dia, terá de começar a zelar pelo interesse dos empresários brasileiros.

    Celso Ming (pra começar, só porque foi quem me ajudou a DECIDIR que votarei doravante contra a liberdade de imprensa para o Estadão) merece cadeia. É isso.

    ViVu

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