Diário Liberdade - [Laerte Braga] Marina Silva não vai ao segundo turno, mas acabou sendo a principal protagonista das eleições presidenciais no Brasil ao obter um percentual de votos que evitou a vitória de Dilma Rousseff, candidata de Lula e do PT, já no primeiro turno.
A senadora pelo estado do Acre (região Norte do Brasil) votou em seu estado pela manhã, perdeu as eleições ali e viajou num jato particular (de empresário) para São Paulo onde, além da entrevista coletiva, ligou para o candidato da extrema-direita José "Arruda" Serra (*) e afirmou – "eu cumpri minha parte, agora é com você" –. Com muito cuidado, na entrevista, a candidata evitou declarar apoio explícito a "Arruda" Serra, mas sabe que seu partido vai marchar com a coligação tucana.
O PV – Partido Verde –, ao contrário dos seus similares no resto do mundo, no Brasil, com raras exceções, não tem compromissos com o meio ambiente. É um partido "cartorial" (jornal O GLOBO, extrema-direita, edição de segunda-feira, 4 de outubro) e abriga desde figuras rejeitadas ou sem espaço em outros partidos, a grupos empresariais (como os que financiaram Marina), numa salada que não é verde, tem laivos marrom e laranja.
Ao revés dos chamados candidatos nanicos, como Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), Ivan Pinheiro (PCB) e José Maria (PSTU), Marina Silva desde o primeiro momento de sua campanha deixou claro que queria forçar um segundo turno das eleições presidenciais. Plínio, Ivan e José Maria buscaram promover um debate sobre questões básicas para o Brasil e oferecer um projeto socialista. A diferença entre dignidade e propósitos, ou indignidade e despropósitos (Marina Silva).
A senadora foi acusada por seringueiros do Acre de abandoná-los, ter se tornado "paulista" e cumprir o execrável papel de permitir à direita espaços políticos como esse de levar as eleições para o segundo turno.
Foi ministra de Lula por quase sete anos e, segundo Plínio de Arruda Sampaio, "não aprendeu a pedir demissão". É que ao sair do governo fez críticas a atos do governo e isso soou como puro oportunismo político.
Da mesma forma que há quatro anos atrás com a ex-senadora Heloísa Helena (não conseguiu voltar ao Senado, perdeu as eleições em Alagoas, seu estado), a glória de Marina segundo a maioria dos observadores é transitória, quinze minutos de fama.
Sem mandato (o de senadora termina em janeiro de 2011) e mesmo na remota hipótese de vitória de José "Arruda" Serra, dificilmente sobreviverá politicamente. É algo como um vendaval que vem e passa. O ostracismo, na opinião de muitos analistas, será o seu futuro.
Como disse em telefonema ao candidato José "Arruda" Serra, "cumpri a minha parte, agora é com você". O "serviço" foi feito.
Outro fator decisivo para que Dilma Rousseff não fosse eleita no primeiro turno foi a agressiva participação de dignatários católicos contra a candidata do PT, aliados a líderes neopentecostais (extrema-direita). No estado do Rio de Janeiro, 8,5% do eleitorado do País, no último momento pastores e bispos se uniram em torno de Marina. A candidata superou "Arruda" Serra ali e foi a segunda colocada. Dilma perdeu pontos preciosos, exatamente os previstos em pesquisas eleitorais e que lhe garantiriam a vitória já no primeiro turno.
Foi a reação a supostas declarações de Dilma (não existiram) sobre o aborto e sobre "nem Jesus Cristo me tira essa eleição". O Rio de Janeiro é um estado onde a população evangélica é maioria, o único aliás no Brasil. Aliada a esses ingredientes, Marina Silva roubou votos de Dilma na classe média.
A eterna sedução da classe média por brasões e títulos de nobreza, por poder, por sentir-se dirigente levou vários segmentos do eleitorado dessa classe a optar por Marina nos últimos momentos. Não percebeu que com "Arruda" Serra será esmagada como foi no governo de Fernando Henrique Cardoso.
A campanha eleitoral no segundo turno deverá colocar nas ruas o dilema avanço ou retrocesso. Em termos políticos Dilma mantém as políticas de Lula e "Arruda" Serra retoma o projeto de privatizações (Petrobras inclusive) e as políticas ditadas por Washington e Wall Street.
Com "Arruda" Serra o Brasil deixa de ser protagonista de sua própria história, na América Latina e no mundo, e passa ser coadjuvante.
Ou, volta à posição de coadjuvante.
Por último, algumas das alianças feitas pelo presidente Lula com o maior partido do Brasil, o PMDB, não surtiram o efeito desejado. Em muitos estados, como o próprio Acre, o PT elegeu o governador e Dilma não venceu ali.
No Rio de Janeiro o eleitorado evangélico aliado ao católico mudou o rumo das eleições.
Ah! Ia me esquecendo. O papel da mídia privada nas duas últimas semanas. Uma série de denúncias infundadas e inconsequentes abalou a candidatura Dilma. Essa tática vem desde a primeira eleição direta em 1989 com o término da ditadura militar e o governo de transição (eleito indiretamente) de José Sarney.
Para Lula só existe uma opção e parece que o presidente vai tomar essa direção. Percorrer o País e alertar os brasileiros sobre os riscos que corremos se José "Arruda" Serra vier a ser eleito presidente da República.
A tendência, se observarmos as eleições anteriores, é Dilma vencer. Mas nesse cipoal de arranjos e artifícios tudo é possível.
A propósito do termo "paulista", usado por grupos de seringueiros no Acre (onde Marina despontou politicamente), ele caracteriza um sentimento que permeia os brasileiros não nascidos ou residentes no estado de São Paulo, o mais rico do Brasil. Para boa parte dos brasileiros, São Paulo é um país vizinho que fala português.
(*) Nota de esclarecimento: O sobrenome "Arruda" é uma referência àquele que seria o candidato a vice-presidente na chapa de José Serra, Roberto Arruda, ex-governador do Distrito Federal preso pela Polícia Federal por corrupção.