Mauro Carrara
No início de 2008, a campanha de Barack Obama à presidência dos Estados Unidos empinava-se em curva ascendente. A cada dia, o afro-americano ganhava mais admiradores e apoiadores, especialmente entre os jovens.
Até que os jornais publicaram com alarde um sermão do ativista Jeremiah Wright, pastor de sua congregação, a Trinity United Church of Christ.
Sem constrangimento, Wright acusou a sociedade americana de praticar o racismo, afirmou que o terrorismo doméstico era responsável pelos ataques de 11 de Setembro de 2001 e, por fim, sugeriu que os negros amaldiçoassem os Estados Unidos.
Para muitos analistas, essa era a "bala de prata" dos republicanos. Muitos consideraram definitivamente sepultado o sonho democrata de conduzir um negro à Casa Branca.
A reação, no entanto, se deu de maneira imediata, antes que os eleitores pudessem atribuir a Obama o desatino de seu conselheiro espiritual.
Em 18 de março daquele ano, no Centro Nacional da Constituição, na Filadélfia, o candidato proferiu aquele que seria considerado um dos melhores e mais persuasivos discursos da história política do país.
Denominado "Nós, o povo, com o objetivo de formar uma nação mais perfeita", foi composto a partir da arrumação de 4.500 palavras e verbalizado em 37 minutos e 39 segundos.
Por meio de uma análise criteriosa de fatos e ideias, Obama mostrou que não compartilhava das crenças radicais e divisionistas do religioso.
Ao mesmo tempo, evitou condená-lo publicamente, declarando-se ciente da conjuntura histórica que levara o amigo a expor aquele conjunto de opiniões.
Tratando da questão das raças, o democrata admitiu a dificuldade de uma perfeita união, mas defendeu as gestões pelo aprimoramento contínuo.
A mensagem clara, densa e vigorosa anulou imediatamente os efeitos negativos das declarações do religioso. Virou no mesmo dia um megahit no Youtube.
Na época, uma pesquisa da rede CBS mostrou que 69% dos americanos haviam considerado bom o discurso. Dos entrevistados, 71% afirmaram que Obama tinha explicado de maneira satisfatória suas relações com o pastor.
Segundo os especialistas em marketing político, a estratégia obteve sucesso porque a resposta foi rápida e, sobretudo, honesta. Obama não escondeu sua amizade com o pastor, tampouco negou as tensões raciais no país.
Porém, foi capaz de condenar os exageros de Wright e, ao mesmo tempo, explicar as razões desse ressentimento.
Esse é apenas um exemplo do excelente trabalho realizado pelos democratas para proteger o candidato dos ataques da oposição conservadora.
Uma central anti-boatos na Internet funcionou durante todo o longo período de campanha. Tão logo era levantada uma calúnia já se apresentava a correta versão dos fatos.
Uma ágil e organizada equipe de advogados também levou às barras dos tribunais alguns dos terroristas virtuais difusores de hoaxes e outras peças criminosas de ataque à reputação do candidato.
No Brasil, a eleição presidencial tem mostrado cenário semelhante, mas pela metade. Dilma Rousseff vem recebendo há meses as pedradas da grande mídia, dos religiosos caluniadores e dos sabotadores ficcionistas do universo digital.
Aqui, tal como lá.
A diferença é que, neste lado do Equador, não há qualquer defesa estratégica contra o bombardeio diário.
Não há esclarecimento sobre a maior parte das acusações. As respostas eventuais são tímidas e mal divulgadas. Não há notícia de qualquer processo judicial contra os responsáveis por crimes de calúnia, difamação e injúria.
O espaço no horário gratuito da TV e do Rádio jamais tem sido utilizado para desmentir boatos, expor o verdadeiro pensamento da candidata ou para protestar contra o jogo sujo das células underground de envenenamento informativo a serviço da candidatura conservadora.
Noticiou-se que assessores da campanha de Obama, como Ben Self, orientariam seus colegas brasileiros da coligação de centro-esquerda.
Se vieram, esqueceram-se da labuta. Devem estar aproveitando os prazeres dos bares cariocas ou das praias baianas.
Talvez não tenham ainda se reunido com Marcelo Branco, o "responsável" pela campanha de Dilma na Internet. Aliás, na fase decisiva do combate eleitoral, a participação do especialista faz jus a seu sobrenome.
Portanto, considerada a dificuldade do segundo turno, convém convocar o próprio Obama para a tarefa educativa. Depois de ganhar uma camisa autografada da Seleção Canarinho, ele deve essa à torcida do Flamengo, do Corinthians e a todo o povo brasileiro.