terça-feira, 30 de setembro de 2014

O Império Anglo-Sionista está em guerra contra a Rússia (Parte 2 de 2)

27/9/2014, The SakerThe Vineyard of the Saker e Information Clearing House
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Continuação de: 29/9/2014, redecastorphoto em: O império anglo-sionista está em guerra contra a Rússia (Parte 1 de 2)

The Saker
A Novorússia está perdida para o resto da Ucrânia. Para sempreNem algum esforço conjunto Putin-Obama poderia impedir que assim seja. De fato, os Ukies sabem disso e essa é a razão pela qual nem se esforçam para conquistar corações e mentes da população local. De fato, estou convencido que a chamada destruição “randômica” ou “ao acaso” da infraestrutura industrial, econômica, científica e cultural da Novorússia foi ato intencional de vingança de ódio, semelhante ao que fazem os anglo-sionistas, que sempre se põem a matar civis quando não conseguem impor-se por meios militares (exemplos disso são a Iugoslávia e o Líbano).

Claro que Moscou talvez possa forçar líderes políticos novorussos a assinar alguma espécie de documento pelo qual aceitem a soberania de Kiev, mas será pura ficção e já é muito, muito tarde para tentar isso. Seja de jure seja de facto, a Novorússia jamais voltará a aceitar ser governada por Kiev, e todo mundo sabe disso, em Kiev, na Novorússia e na Rússia.

Que ares teria uma independência de facto, mas não de jure?

Nenhuma força militar, nem guarda nacional, batalhão de oligarcas ou SBU ucranianos; total independência cultural, religiosa, linguística e educacional; funcionários eleitos localmente e mídia local; só que tudo isso com bandeiras Ukies; nenhum status de independência oficial, nada de Forças Armadas Novorussas (serão chamadas de alguma coisa como “força regional de segurança” ou, até, “força policial"); e nada de moeda novorussa (embora o rublo, assim como o dólar e o euro, seja usado diariamente). Os altos oficiais teriam de ser aprovados oficialmente por Kiev (o que Kiev sempre faria, para não deixar ver a própria impotência). Assim seria um arranjo temporário, transicional e instável de independência de facto mas não de jure, mas suficiente para garantir a Kiev uma saída sem desonra.

Isso posto, raciocino sobre a ideia de que ambas, Kiev e Moscou, têm interesse em manter a ficção de uma Ucrânia unitária. Para Kiev, é um modo de não aparecer completamente derrotada pelos amaldiçoados Moskals. Mas e quanto à Rússia?

E se você estivesse no lugar de Putin?

Faça a você mesmo a seguinte pergunta: se você fosse Putin e seu objetivo fosse conseguir mudança de regime em Kiev, você preferia que a Novorússia fosse parte da Ucrânia ou não? Minha hipótese é que manter a Novorússia dentro da Ucrânia é muito melhor, pelas seguintes razões:

  1. Ela faz parte, ainda que num nível macro, do processo ucraniano, como eleições nacionais e imprensa-empresa nacional.
  2. Força a comparação com as condições no resto da Ucrânia.
  3. Torna muito mais fácil influenciar o comércio, os negócios, os transportes, etc..
  4. Cria um centro político alternativo (livre de nazistas), a Kiev.
  5. Torna mais fácil para os interesses russos (de todos os tipos) penetrar na Ucrânia.
  6. Remove a possibilidade de criar-se um “muro” tipo Guerra Fria ou outro tipo de barreira ou marcador geográfico.
  7. Remove a acusação de que a Rússia desejaria dividir a Ucrânia.

Mapa da Novorússia - WPost, EUA (ago/2014)
Em outras palavras, manter a Novorússia só nominalmente, de jure, como parte da Ucrânia é a melhor maneira de parecer que aceita as demandas anglo-sionistas, ao mesmo tempo em que continua a subverter o governo da Junta nazista que está no poder. Em artigo recente, mostrei em traços gerais o que a Rússia pode fazer sem incorrer em grandes consequências:

  1. Opor-se politicamente ao regime em todas as frentes possíveis: ONU, imprensa, opinião pública, etc.
  2. Manifestar apoio político à Novorússia e a qualquer oposição ucraniana.
  3. Manter a guerra de informação (a imprensa-empresa russa faz belo serviço).l
  4. Impedir que a Novorússia caia (ajuda militar clandestina).
  5. Manter, sem aliviar, a pressão econômica sobre a Ucrânia.
  6. Quebrar, em todos os pontos possíveis, o “arco de gentilezas” entre EUA e União Europeia.
  7. Ajudar a Crimeia e a Novorússia a prosperar economicamente e financeiramente.

Em outras palavras – dar a impressão de estar fora, ao mesmo tempo em que se mantém muito muito dentro.

Seja como for, que alternativa existe?

Já quase posso ouvir o coro dos “oba-patriotas” indignados (é como esse pessoal é chamado na Rússia), a me acusarem de só ver a Novorússia como ferramenta para os objetivos políticos russos, e de ignorar as mortes e o sofrimento pelos quais passa o povo da Novorússia. A isso, só posso responder o seguinte:

  1. Alguém por acaso crê, com seriedade, que uma Novorrússia independente possa viver em paz e segurança, por mínimas que sejam, se não houver mudança de regime em Kiev?
  2. Se a Rússia não pode aguentar uma junta nazista no poder em Kiev, como a Novorússia aguentaria?!

Em geral, os oba-patriotas sonham com o que “poderia” ser feito agora e passam longe de qualquer visão de médio e longo prazo. Assim como os que creem que se poderia salvar a Síria mandando para lá a Força Aérea Russa, os oba-patriotas creem que a crise na Ucrânia poderia ser resolvida mandando-se tanques para lá. São perfeito exemplo do que H. L. Mencken tinha em mente quando escreveu que “para cada problema complexo sempre há uma resposta clara, simples e errada”. 

A triste realidade é que o tipo de pensamento que jaz por trás dessas soluções “simples” é sempre o mesmo: não negocie, não ceda, não conceda, não considere o longo prazo, só e sempre o futuro mais imediato; e em todos os casos use a força.

Bases Aéreas dos EUA-OTAN na Europa
Mas fatos são fatos: o bloco EUA/OTAN é poderoso militarmente, economicamente e politicamente e pode ferir muito gravemente a Rússia, especialmente no longo prazo. Além disso, por mais que a Rússia possa derrotar facilmente os militares ucranianos, dificilmente essa seria “vitória” significativa. Externamente, dispararia massiva deterioração no clima político internacional; e internamente os russos teriam de suprimir pela força os nacionalistas ucranianos (e nem todos eles são nazistas). A Rússia pode fazer isso? Mais uma vez, a resposta é “sim, mas... a que preço?”.

Um dos meus bons amigos foi coronel na unidade das Forças Especiais da KGB chamada “Kaskad” (que, adiante, foi rebatizada como “Vympel”). Um dia ele me contou como o pai dele, que fora operador especial da GRU, combateu contra insurgentes ucranianos, desde o final da IIª Guerra Mundial em 1945, até 1958: quer dizer, durante 13 anos! Stálin e Krushchev precisaram de 13 anos para, afinal, conseguir esmagar os insurgentes nacionalistas ucranianos. Alguém aí, no pleno uso das próprias faculdades mentais, acredita sinceramente que a Rússia moderna poderia repetir aquelas políticas e consumir anos e anos caçando novamente insurgentes ucranianos?

Além do mais, nacionalistas ucranianos conseguiram combater o poder soviético comandado por Stálin e Krushchev durante 13 anos inteiros e depois do final da guerra –, sim, mas não se vê hoje qualquer resistência antinazista em Zaporozhie, Dnepropetrivsk ou Carcóvia. Sim, Luganks e Donetsk levantaram-se e pegaram em armas com grande sucesso, sim, mas, e quanto ao resto da Ucrânia? Se você fosse Putin, você confiaria que forças russas que entrassem como libertadoras nessas cidades fossem recebidas com as mesmas festas que se viram na Crimeia?

Pois mesmo assim os oba-patriotas continuam a clamar por mais intervenção russa e mais operações militares russas contra forças Ukies. Não será já mais que hora de começarmos a perguntar quem se beneficiaria desse tipo de políticas?

Já se sabe do velho truque da CIA-EUA de usar as mídias sociais e a blogosfera, para promover o extremismo nacionalista na Rússia. Maksim Shevchenko, patriota russo e jornalista conhecido e respeitado, mantinha um grupo organizado exclusivamente para rastrear os números de IP de algumas das organizações nacionalistas radicais mais influentes, seus websites, blogs e postados individuais na Internet russa. Assim se descobriu que a maioria daquelas organizações tinham base nos EUA, no Canadá e em Israel.  Surpresa, surpresa. Ou, talvez, surpresa-zero?

Bases militares múltiplas da OTAN na Europa
Para os anglo-sionistas, faz perfeito sentido apoiarem extremistas e nacionalistas doidos-furiosos na Rússia. Ou esses grupos podem ser usados para influenciar a opinião pública ou, no mínimo, podem ser usados para minar o regime que esteja no poder. Pessoalmente, não vejo diferença alguma entre um Udaltsov ou um Navalnii por um lado, e um Limonov ou um Dugin por outro. O único efeito do que esse pessoal faz é enfurecer gente no Kremlin. O pretexto para enfurecer o pessoal do Kremlin não faz diferença – para Navalnyi é a conversa de “eleições roubadas”; para Dugin é “apunhalaram a Novorússia pelas costas”. E não importa se uns ou outros são realmente agentes pagos ou só “idiotas úteis” (Deus os julgará). O que realmente importa é que as soluções que eles pregam absolutamente não são soluções; são sempre, só, pretextos “certinhos” para atacar o regime que esteja no poder.

Entrementes, não apenas Putin não traiu nem vendeu nem entregou nem apunhalou coisa alguma nem abandonou a Novorússia; é Poroshenko que mal se segura na presidência, e é o Banderastão que se liquefaz e desce pelo ralo. Há também muita gente que, sim, consegue ver com clareza através dessa espessa cortina de nonsense, seja na Rússia (Yuri Baranchik) seja fora de lá (M. K. Bhadrakumar).

Mas e quanto aos oligarcas?

Já escrevi sobre essa questão recentemente, mas acho que é importante voltar a ela, porque a primeira coisa que se tem de compreender para compreender o contexto russo ou ucraniano é que oligarcas são uma realidade da vida. Não implica dizer que a existência deles seja boa coisa; só que Putin e Poroshenko e, quanto a isso, qualquer um que queira fazer qualquer coisa por lá tem de levar em consideração os oligarcas. A grande diferença é que, enquanto em Kiev um regime controlado pelos oligarcas foi substituído por um governo dos oligarcas, na Rússia a oligarquia só pode influenciar, não controlar, o Kremlin. Os exemplos de Khodorkovsky ou Evtushenkov mostram que o Kremlin ainda pode derrubar um ou outro oligarca, quando necessário; e derruba.

Mesmo assim, uma coisa é pegar um ou dois oligarcas; outra, muito diferente é remover os oligarcas da equação ucraniana: os oligarcas lá ficarão. Para Putin, pois, qualquer estratégia ucraniana tem de levar em consideração a presença e, francamente, o poder dos oligarcas ucranianos e de seus contrapartes russos.

Putin sabe que os oligarcas só são sinceramente fieis a eles mesmos, e que “meu país”, para eles, é onde estejam as propriedades deles. Como especialista da KGB que trabalhou exatamente com a inteligência externa, essa verdade é absolutamente óbvia para Putin; e a mentalidade dos oligarcas os torna, assim, manipuláveis. Qualquer agente de inteligência sabe que as pessoas podem ser manipuladas por uma lista finita de abordagens: ideologia, ego, ressentimento, sexo, um esqueleto no armário e, claro, dinheiro. Do ponto de vista de Putin, Rinat Akhmetov, por exemplo, é sujeito que emprega coisa como 200 mil pessoas no Donbass; que pode, é claro, fazer o que decida fazer; e cuja lealdade oficial a Kiev e à Ucrânia é só a camuflagem para ocultar sua única lealdade real: ao próprio dinheiro. Claro que Putin não precisa gostar dele ou respeitar Akhmetov (em geral, especialistas em inteligência sempre desprezam esse tipo de gente). Mas isso significa também que, para Putin, Akhmetov é pessoa crucialmente importante, com a qual conversar, explorar e, sendo possível, usar para alcançar o objetivo nacional estratégico russo no Donbass.

Rinat Akhmetov, oligarca baseado no Donbass
Já escrevi muitas vezes: os russos conversam com os inimigos. Com um sorriso no rosto. E vale ainda muito mais para especialista em inteligência externa treinado para mostrar-se comunicativo, compreensivo, acolhedor. Para Putin, Akhmetov não é amigo nem aliado, mas é figura de poder a ser manipulada a favor da Rússia. O que estou querendo explicar é, em outras palavras, o seguinte:

Há muitos rumores sobre negociações secretas entre Rinat Akhmetov e funcionários russos. Alguns dizem que Khodakovski estaria envolvido. Outros falam de Surkov. Não tenho dúvida alguma de que estão acontecendo negociações secretas. De fato, estou convencido de que todos os lados e partes estão conversando com todos os outros lados e partes. Até uma criatura repugnante, do mal, vil, como Kolomoiski. O sinal de que alguém finalmente decida tirá-lo de cena acontecerá precisamente quando ninguém mais conversar com ele. Acontecerá, provavelmente, com o tempo, mas não acontecerá antes de a base de poder em que ele se apoia ser suficientemente erodida.

Um blogueiro russo acredita que Akhmetov já teria sido “persuadido” (leia-se: subornado) por Putin e já estaria disposto a jogar por regras novas segundo as quais “quem manda é Putin”. É possível. Talvez ainda não, mas aconteça em breve. Talvez jamais aconteça. Só quero dizer é que negociações entre o Kremlin e os oligarcas Ukies locais são tão lógicas e inevitáveis quanto os contatos entre EUA e a Máfia italiana, antes de as Forças Armadas dos EUA entrarem na Itália.

Mas... há uma 5ª coluna na Rússia?

Há. Não há dúvida alguma: há. Primeiro e sobretudo, está ativa dentro do próprio governo de Medvedev e até mesmo dentro da administração presidencial. Não se pode esquecer que Putin foi posto no poder por duas forças que competiam entre elas: os serviços secretos e o big money. E sim, sim, por mais que seja verdade que Putin enfraqueceu tremendamente o componente “big money” (que chamo de “os Integracionistas Atlanticistas”), o big Money continua muito ativo, embora hoje mais contido, mais cuidadoso, menos arrogante que no tempo em que Medvedev estava formalmente no poder.

Medvedev e Putin assistem TV (Sochi - Jan/2014)
A grande modificação nos anos recentes é que a luta entre os patriotas (os “Soberanistas Eurasianos”) e a 5ª coluna hoje acontece em terreno aberto; mas está longe de acabar. E absolutamente não se pode nunca subestimar essa gente: eles têm muito poder, têm muito dinheiro e uma capacidade fantástica para corromper, ameaçar, desacreditar, sabotar, ocultar, disfarçar, confundir, etc.. São espertos, sabem encontrar os melhores profissionais em cada campo, e são muito, muito, muito bons, nas campanhas políticas mais imundas.

Por exemplo, os quinta-colunistas tentam furiosamente dar voz à oposição Nacional-Bolchevique (os dois, Limonov e Dugin são presenças regulares na televisão russa) e dizem os boatos que eles financiam também grande parte da imprensa-empresa Nacional Bolchevique (exatamente como os irmãos Koch pagaram para constituir o movimento “Tea Party” nos EUA).

Outro problema é que, por mais que se saiba que esses sujeitos estão objetivamente apostando seu dinheiro nas cartas da CIA, não há provas. Como me disse várias vezes um amigo espertíssimo: a maior parte das conspirações são colusões, e esse tipo de “acerto” entre dois contra terceiro é muito difícil de provar. Mas a comunidade de interesses entre a CIA-EUA e a oligarquia russa e ucraniana é tão óbvia que pode ser considerada inegável.

O real perigo para a Rússia

Agora, afinal, temos o quadro completo. Mais uma vez, Putin tem de enfrentar simultaneamente:

1) uma campanha estratégica de guerra psicológica conduzida por EUA/UK & Co., que combina a demonização de Putin pela imprensa-empresa comercial, e uma campanha pelas mídias sociais para desacreditá-lo pela passividade e ausência de ‘'resposta forte'’ ao ocidente.

2) Um grupo pequeno, mas muito vociferante de (quase todos eles) Nacional-Bolcheviques (Limonov, Dugin & Co.) que encontraram na causa novorussa uma oportunidade perfeita para atacar Putin por não partilhar a ideologia deles e implementar as ‘'soluções'’ deles, todas elas “claras, simples e erradas”.

3) Uma rede de oligarcas poderosos que querem usar a oportunidade apresentada pelas ações dos grupos (1) e (2) acima, para promover seus próprios interesses.

4) Uma 5ª coluna para cujos ativistas, todos os grupos anteriores geraram uma fantástica oportunidade para enfraquecer os Soberanistas Eurasianos.

5) Um senso de desapontamento, em muitos russos que sentem sinceramente que a Rússia está-se deixando tratar passivamente como saco-de-pancadas.

6) Uma grande, ampla maioria de pessoas na Novorússia que quer ser completamente independente (de facto e de jure) de Kiev e que estão sinceramente convencidas de que qualquer negociação com Kiev será prelúdio de traição, pela Rússia, dos interesses da Novorússia.

7) A realidade objetiva de que os interesses da Rússia e da Novorússia não são os mesmos.

8) A realidade objetiva de que o Império Anglo-Sionista é ainda muito poderoso e potencialmente perigoso.

Vladimir Putin no Kremlin
É muito, muito difícil para Putin tentar equilibrar todas essas forças de tal modo que o vetor resultante seja favorável ao interesse estratégico da Rússia.

Minha ideia, que defendo aqui, é que simplesmente só há uma solução para essa charada: separar completamente a política oficial declaratória da Rússia e as ações reais da Rússia.

A ajuda clandestina à Novorússia – o Voentorg – é exemplo disso, mas exemplo limitado, porque o que a Rússia terá de fazer vai além de operações clandestinas. A Rússia terá de parecer que faz uma coisa quando, na verdade, estará fazendo exatamente o contrário.

Nesse momento, é do interesse estratégico da Rússia parecer que:

1) apoia uma solução negociada nas seguintes linhas: uma Ucrânia unitária não alinhada com amplo direito regional a todas as regiões – e, simultaneamente, opor-se politicamente ao regime em todas as frentes, na ONU, na imprensa, na opinião pública, etc. e apoiar os dois lados, a Novorrússia e qualquer oposição ucraniana.

2) Dar aos oligarcas russos e ucranianos uma razão para, se não apoiarem, pelo menos não se oporem à solução acima (por ex.: não estatizar as propriedades de Akhmetov no Donbass) – e, simultaneamente, garantir que conserva suficiente “poder de fogo” para manter os oligarcas sob controle.

3) Negociar com a União Europeia a real implementação do Acordo da Ucrânia com a UE – e, simultaneamente ajudar a Ucrânia a suicidar-se, cuidando para que não falte suficiente poder de estrangulamento econômico, a ser usado para impedir que o regime imploda.

4) Negociar com a União Europeia e a Junta em Kiev a entrega de gás – e, simultaneamente garantir que o regime ucraniano seja obrigado a pagar sempre, até quebrar.

5) Mostrar-se em posição não confrontacional ante os EUA – e, simultaneamente tentar criar a maior quantidade possível de tensões entre EUA e União Europeia.

6) Parecer disponível para tudo e disposta a fazer negócios com o Império Anglo-Sionista – e, simultaneamente, construir um sistema internacional alternativo não centrado nos EUA ou no dólar.

Como se pode ver, é bem mais que programa normal de ação clandestina.

Desdolarização da Economia internacional
Aqui se está lidando com um programa complexíssimo, de várias camadas, programa para alcançar o mais importante objetivo russo na Ucrânia (mudança de regime e des-nazificação), ao mesmo tempo em que se inibem o mais possível as tentativas, pelos anglo-sionistas, para recriar uma crise severa e duradoura entre Oriente e Ocidente, na qual a União Europeia, basicamente, se fundirá com os EUA.

Conclusão: uma chave para políticas russas?

A maioria de nós está habituado a pensar em termos de categorias de super potências. Afinal, o presidente dos EUA, de Reagan até Obama, meteram-nos goela abaixo dieta pesada de declarações altissonantes quase sempre operações militares seguidas por “informes” do Pentágono, ameaças, sanções, boicotes, etc.. Minha ideia é essa sempre foi a marca registrada da “diplomacia” ocidental desde as Cruzadas até a campanha de bombardeio em curso hoje contra o ISIS/ISIL.

Rússia e China têm tradição diametralmente oposta a essa. Por exemplo, em termos de metodologia, Lavrov sempre repete o mesmo princípio:

(...) “queremos fazer de nossos inimigos, agentes neutros; dos neutros, parceiros; e dos parceiros, amigos”.

A função dos diplomatas russos não é preparar guerras e mais guerras, mas evitá-las. Sim, a Rússia combaterá, mas só depois de a diplomacia ter falhado completamente. Se, para os EUA a diplomacia não passa de instrumento para distribuir ameaças, para a Rússia é o principal instrumento para esvaziar qualquer ameaça.

Não surpreende pois que a diplomacia dos EUA seja primitiva a ponto de ser quase cômica. Afinal, quem precisa de sofisticação e inteligência para dizer “aceite ou explodimos você”?! Qualquer punguista de beco sabe fazer isso. Os diplomatas russos são muito mais parecidos com especialistas em descartar explosivos e localizar minas enterradas: têm de ser pacientes, muito cuidadosos e completamente focados. Mas, mais importante, não podem permitir que alguém os tire do jogo, para evitar que a coisa toda voe pelos ares.

A Rússia está completa e absolutamente ciente de que o Império Anglo-Sionista está em guerra contra ela e que já não há, para a Rússia, supondo que algum dia tenha havido, a opção de render-se. A Rússia também compreende que não é superpotência real nem, e ainda menos, um império. A Rússia é apenas um país muito poderoso que está tentando extrair os caninos mais mortíferos do Império, sem disparar guerra frontal contra ele. Na Ucrânia, a Rússia não vê solução que não seja mudança de regime em Kiev. Para alcançar esse objetivo, a Rússia sempre preferirá uma solução negociada a solução obtida pela força, mesmo que venha a usar a força, se não lhe deixarem nenhuma outra solução. Em outras palavras:

1) A meta de longo prazo da Rússia é pôr abaixo o Império Anglo-Sionista.
2) A meta de médio prazo da Rússia é criar condições para mudança de regime em Kiev.
3) A meta de curto prazo da Rússia é impedir que a Junta tome posse da Novorússia.

O método preferido da Rússia para alcançar esses objetivos é negociar com todas as partes envolvidas. Um pré-requisito para alcançar esses objetivos é impedir que o Império seja bem-sucedido na tentativa de criar aguda crise continental (na via inversa, o “estado profundo” do Império compreende perfeitamente tudo isso; daí ter havido duas declarações de guerra: uma, por Obama; a outra por Poroshenko).

Barack Obama e Petro Poroshenko (jun/2014)
Desde que vocês mantenham em mente esses princípios básicos, o que parece ser zigue-zagues, contradições e passividade nas políticas da Rússia, começarão a fazer sentido.

Claro que permanece aberta a questão de se a Rússia alcançará seus objetivos. Em teoria, uma ataque bem-sucedido da Junta contra a Novorússia poderia forçar a Rússia a intervir. Assim também, sempre há a possibilidade de outro “ataque sob falsa bandeira”, possivelmente, ataque nuclear. Creio que a política russa é sólida e a melhor realistamente realizável nas atuais circunstâncias, mas só o tempo dirá.

Lamento que tenha precisado de mais de 6.400 palavras para explicar isso, mas em sociedade na qual a maioria dos “pensamentos” são expressos em pios [orig. tweets], e as análises, em postados no Facebook, não é tarefa fácil lançar alguma luz sobre o que já se vai convertendo num dilúvio de mal-entendidos e mal-explicados, tudo piorado, sempre, pela manipulação das mídias sociais. Sinto que 60 mil palavras ainda explicariam melhor, porque inventar slogans é fácil; difícil é refutar racionalmente os pressupostos e implicações dos slogans.

Minha esperança é que pelo menos aqueles dentre vocês que estivessem sinceramente confusos ante a posição aparentemente ilógica da Rússia tenham agora como ligar os pontos e alcançar o sentido geral de tudo isso.

Cordiais saudações a todos.

The Saker

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.