sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Yanis Varoufakis: “Vamos destruir o sistema da oligarquia grega”

23/1/2015, [*] Yanis Varoufakis, entrevistado por Paul Mason, 4th channel, Londres, UK
Vídeo (5’14”) traduzido pelo pessoal da Vila Vudu da transcrição em francês do Blog de Jean-Luc Mélenchon


"Acabamos por herdar o desafio envenenado de ter de fazer coisas básicas essenciais que até os partidos burgueses teriam de ter feito, mas nem isso fizeram".
Yanis Varoufakis



Paul Mason: O que fará nos primeiros 100 dias, um governo da coligação Syriza?

Yanis Varoufakis: Três coisas. Primeiro, temos de nos ocupar da crise humanitária. É grotesco que, em 2015, tenhamos na Grécia gente que há bem pouco tempo tinha trabalho, casa – muitos tinham seu comércio – e que hoje estejam dormindo na rua, sem ter o que comer. É inaceitável que as crianças façam a lição de casa à luz de velas, porque a eletricidade foi cortada, porque o estado foi induzido a impor impostos sobre a propriedade baseado nas contas de luz, santo deus! São coisas que custam pouco dinheiro e que têm impacto simbólico, social – e moral – forte. É um dos três pés [de nossa política].

A segunda coisa que temos de fazer nesse país é reformar. Reformar em profundidade e reformar de um modo que dê conta dos problemas do que chamamos de “o triângulo do crime”.

Na Grécia, o “triângulo do crime” compreende (I) a ‘'mão do estado'’, quando fornecedores do estado cobram fortunas pelos serviços e bens. Por exemplo, o metro linear de estrada construída na Grécia custa duas vezes mais caro que na França, o que é inaceitável. Em segundo lugar, o segundo pé do triângulo, (II) é formado dos banqueiros sem escrúpulos que extorquem o máximo de dinheiro possível. E em terceiro lugar (III), temos de dar conta das empresas de imprensa de massa, que estão sempre à beira de falir. Trata-se pois de fazer as perguntas certas, como perguntar-se o que fazer para que essas duas pontas se encontrem, quando até hoje não geraram nenhum benefício para a sociedade.

PM: Até já se escutam os centristas europeus, aos gritos de “partido de esquerda chega ao poder e imediatamente já ataca a liberdade de expressão”!

YANIS VAROUFAKIS: É o contrário. O contrário. Somos absolutamente defensores da liberdade de expressão, e a liberdade de expressão na Grécia foi sempre agredida por essa aliança contra-natureza entre banqueiros sem escrúpulos, promotores sem escrúpulos e donos de jornais e redes de televisão que se convertem em voz dos que vivem de parasitar os esforços produtivos de todos os demais braços da sociedade, dos que vivem sobre as costas dos que produzem.

PM: O que, concretamente, seu governo fará contra a oligarquia?

YANIS VAROUFAKIS:  Vamos derrubar os fundamentos sobre os quais a oligarquia construiu, anos após ano, década após década, um sistema e uma rede que sugam doentiamente a energia e a potência econômica de todos os demais, dentro da sociedade.

PM: O senhor não é apenas professor de economia. O senhor conhece a história do seu país. O senhor sabe o que aconteceu da última vez que alguém tentou tirar o poder das mãos da oligarquia grega …

YANIS VAROUFAKIS: É preciso lutar o bom combate, sem pensar muito no quanto pode nos custar.

PM: O custo pode ser que, de repente, o governo do Syriza dê-se conta de que a democracia foi-lhe arrancada...

YANIS VAROUFAKIS: Não há alternativa para nós. Só nos resta fincar pé na nossa oposição contra essas forças que esvaziam e essencialmente esterilizam a democracia, que lhe extraem qualquer substância.

Mas, quanto ao terceiro pé do tripé de nossa política: resolver a crise, reformar a Grécia, destruir a oligarquia, abolir e imunidade fiscal. Afinal, nem é tanto um problema de evasão fiscal: o problema é, mais, de imunidade fiscal [risos]. O que tem de ser feito, claro é renegociar os acordos dos empréstimos com nossos parceiros europeus, acordos que, no conjunto,foram prejudiciais à própria Europa em seu conjunto.

PM: O senhor viveu anos longe da política. Que sente, agora que o senhor está às portas do poder?

YANIS VAROUFAKIS: É assustador. A palavra é só uma: assustador. Além do mais, nas universidades onde vivi toda a minha vida – na Grã-Bretanha e em outros países – sempre vivi convencido que professor que vivesse ‘'articulando'’ para tornar-se chefe de departamento a qualquer custo deveria ser imediatamente desqualificado e demitido, porque os cargos da burocracia acadêmica são atividade contraditória com a própria ideia de serviço público. Portanto, também somos candidatos ‘'em contradição'’, aqui, como professor candidato ao governo da Grécia.

Mas infelizmente a própria história dessa crise nos empurrou para o centro do palco. Acabamos por herdar o desafio envenenado de ter de fazer coisas básicas que até os partidos burgueses teriam de ter feito, mas nem isso fizeram.

PM : E quando se encontrar com um de seus contrapartes, em duas semanas o senhor será membro do Eurogrupo, o que dirá a eles?

YANIS VAROUFAKIS: É hora de dizer a verdade sobre a insustentabilidade e responsabilidade gravíssima dos que adotaram nas assembleias a posição de negar, de fazer como se não estivessem vendo, a falência da Grécia. É hora de dizer a verdade sobre a arquitetura problemática do sistema do euro.

PM : Na sua avaliação, qual a probabilidade de que a Grécia seja expulsa da Eurozona?

YANIS VAROUFAKIS: Zero.

PM : O que acontecerá à Eurozona se continuar como foi até agora?

YANIS VAROUFAKIS: Se não reformarmos o sistema do euro, se não criarmos amortecedores e o que chamo de um mecanismo de reciclagem dos excedentes no seio da Eurozona, tudo ruirá dentro de poucos anos.

PM: Por quê?

YANIS VAROUFAKIS: Ora... Porque não se pode ter uma união monetária que vive de fingir que sobrevive a uma enorme crise financeira simplesmente emprestando mais e mais dinheiro aos países em déficit, sob a permanente exigência de que eles gerem cada vez menos riqueza.

[*] Yanis Varoufakis é um economista e político grego, membro da Coligação Syriza, vencedora das últimas eleições gregas (25/1/2015). É o atual Ministro da Economia da Grécia.

Um comentário:

  1. cómo hacer para conseguir un ministro así?

    dos, uno para argentina y otro para el brasil.

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