sábado, 25 de fevereiro de 2012

Pepe Escobar: “Obama anda mesmo cantando o ‘blues’?”


23/2/2012, Pepe EscobarAsia Times Online
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Pepe Escobar
Não é fácil ser POTUS (President of the United States). Corãos queimados no Afeganistão, Líbia “liberada” governada por milícias, Síria caindo em guerra civil, o psicodrama sem fim em torno do Irã. Onde buscar alguma consolação? Simples: se o POTUS não consegue escapulir até a Casa do Blues – o Serviço Secreto não permitiria – o blues vem à Casa (Branca).

Performance at the White House: Red, White and Blues, foi um concerto doméstico gravado no Salão Leste, em homenagem ao blues e ao Mês da História Negra nos EUA, parte de uma série musical com POTUS (Barack Obama) e FLOTUS (First Lady of the United States, Michelle Obama) como anfitriões. Irá ao ar na 2ª-feira, pelo PBS, Sistema Público de Broadcasting  [1].

E então aconteceu o momento mágico; arremedo de bluezeiro, Mick Jagger passa o microfone para POTUS – e o resto é história (veja o vídeo [2] ). Houve o precedente (veja o vídeo remixado [3]), quando POTUS enviou mensagem nada sutil de campanha, em código “Let's Stay Together” [Fiquemos juntos].

Mas foi para valer: POTUS assumindo o espírito de Robert Johnson via “Sweet Home Chicago”. E que cast de apoio! Incluindo o “Rei do Blues” em pessoa, BB King, 86, apresentado por POTUS; Mick Jagger (ainda em forma em “Can't Turn You Loose”; Buddy Guy; Jeff Beck; e Booker T Jones, lenda viva da gravadora Stax – que já deveria ter sido canonizado – como band leader e diretor musical. Gol de placa, o do cantor-em-chefe.

POTUS até fez uma declaração oficial elogiando o blues; que “nos ensina que quando nos descobrimos numa encruzilhada, não nos escondemos dos nossos problemas. Nós os encaramos. Lidamos com eles. Cantamos sobre eles. Os convertemos em arte”.  [4]

Bombatômica-em-mim, baby, até o sol raiar 

Por que um negro não poderia brincar com o blues na Casa Branca? Afinal, a economia dos EUA vai – lentamente voltando a girar (mais ou menos) apesar daquela canção pungente “16 trilhões/O que mais você quer?”, que ainda se ouve do coro, ao fundo.

O desemprego cai – devagar. E os ex-talvez candidatos Republicanos que ainda se arrastam ou são doidos ou batem todos na mesma tecla “Jesus!; e Mulá (Rick) Santorum apresenta-se ele mesmo como o homem que salvará os EUA, de Satã.

A turma do Tea Party pirou. Newt Gingrich, em desespero, diz que POTUS é “o mais perigoso presidente de todos os tempos”. Mitt Romney – num debate da campanha para presidente – diz que o Irã dá uma bomba atômica ao Hezbollah no Líbano; o Hezbollah traz a bomba para o México; em seguida a bomba atravessa a fronteira disfarçada como imigrante ilegal e explode em Ohio.

E o pior de tudo: em matéria de música, esse pessoal aí, pior, impossível. Não cantam blues – nem soul, nem jazz, nem gospel, nem country – nem se a vida (paranóica) deles depender disso.

Seja como for, o cantor-em-chefe não estava exatamente bluezando quando assinou a National Defense Authorization Act [Lei de Autorização da Defesa Nacional] na noite de Ano Novo – quando ninguém estava prestando atenção. O guerreiro-em-chefe, de fato, legalizou a conversão dos EUA em estado policial militarizado – onde o Pentágono pode mandar prender norte-americanos sem acusação e sem julgamento durante “toda a duração das hostilidades” na imatável-imorrível “guerra global ao terror”.

No fim da semana que vem, POTUS tampouco estará cantando blues quando discursar na convenção anual do Comitê EUA-Israel de Assuntos Públicos [American Israel Public Affairs Committee (AIPAC) – ante milhares de apostadores de jogo de alto risco, num salão de baile em Washington, todos berrando em uníssono pela destruição do Irã.

Mas a véspera do discurso parece saída diretamente de “Hellhound on My Trail” (Há um cão do inferno no meu encalço [5]) de Robert Johnson [1937]: é quando POTUS recebe o primeiro-ministro de Israel Benjamin “Bibi” Netanyahu em visita a Washington, o qual todos os grãos de areia do deserto do Negev sabem que quer livrar-se de POTUS e instalar na Casa Branca um seu fantoche pessoal de doido-por-guerras.

Afinal, Bibi já esbravejou até contra o general Martin Dempsey, Chefe do Comando do Estado-Maior das Forças Armadas dos EUA, porque o campeão do Pentágono atreveu-se a manifestar algum bom senso e disse que qualquer ataque de Israel ao Irã seria “desestabilizador” e “imprudente”.

POTUS prefere cantar o blues a ir à guerra; quanto ao resto dos norte-americanos médios, parecem absolutamente confusos, ou absolutamente anestesiados pelo ruído ambiente. Segundo a mais recente pesquisa CNN/Gallup, quase 80% deles acreditam que ou o Irã tem armas nucleares ou pode arranjar uma amanhã mesmo; ao mesmo tempo, 63% preferem a diplomacia à guerra, como meio para dissuadir o Irã de converter-se em país nuclear. Então, como é que fica? Convencer o Irã a desistir de bombas inexistentes que eles talvez tenham?

O Supremo Líder do Irã Aiatolá Ali Khamenei talvez considere o blues música do demônio – mas já disse, pelo menos uma vez oficialmente, que “o Irã não tem arma nuclear”. Simultaneamente encoraja os cientistas nucleares iranianos a prosseguir no seu trabalho “fundamental” para “os interesses nacionais iranianos”.

Em meio a toda essa loucura, pelo menos o seriado Mad Men  [6] estará de volta, nos idos de março [7].

E enquanto seus opositores afundam-se nos pântanos do apocalipse, POTUS – que as pesquisas informam que pode derrotar qualquer deles – parece andar, cantando blues diretamente para a zona de conforto.

C'mon/baby don't you wanna go/back to that same old place/Sweet Home[8] Casa Branca.





Notas dos tradutoires

[1] Sobre o show, ver:


[2] Assista Blues night at the White House, February 21, 2012,

[3] Assista:

[4] 29/5/2004, Asia Times, em: “Highway 61 revisited”.  Uma olhada retrospectiva à encruzilhada de Robert Johnson, de 2004, apenas algumas semanas antes de POTUS irromper na paisagem política dos EUA, feito o Hoochie Koochie Man [tema clássico do blues, escrito por Willie Dixon e apresentado pela primeira vez por Muddy Waters, em 1954. Pode ser ouvido, em gravação posterior, a seguir:


[5] Letra (mal) traduzida e som em: Hellhound On My Trail


[6] Sobre o seriado, clique em “Mad Men.

[7] O anúncio que já está no ar, assista:

[8] “Vamos... Baby, você não quer voltar para aquele velho lugar, doce lar, Chicago?” É o verso que Obama canta, de “Sweet Home Chicago” (em nota 2).

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