segunda-feira, 18 de maio de 2015

Pepe Escobar – Obama & Estados do Golfo: Convescote com atlanticistas wahhabistas

16/5/2015, [*] Pepe Escobar, RT – Rússia Today
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Fotos: Kevin Lamarque


Barack Obama reúne-se com representantes do CCG (14/5/2015)
A reunião de cúpula do presidente dos EUA Barack Obama com o Conselho de Cooperação do Golfo – CCG, em Camp David, essa semana, cabe melhor nos anais do surrealismo que da geopolítica.

A gangue do petrodólar do CCG – Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Qatar, Kuwait, Bahrain e Omã – clamava por um “acordo de segurança” com Washington similar àquele “relacionamento especial” com Israel. Bem... Não vai acontecer, porque a coisa teria de ser aprovada pelo Congresso, absoluto não-não, considerando que o lobby pró-Israel controla a maioria do Congresso nos EUA.

Não sendo isso, a segunda opção seria espernear para arranjar alguma aliança formal com a OTAN. Ora, já existe praticamente isso mesmo, como na guerra à Líbia, que foi operação OTAN-CCG de fato. Pode-se chamar de atlanticismo wahhabista.

No final, o que com certeza obterão são mais armas norte-americanas cada dia mais caras. Isso sim, é fato consumado: bonança para o complexo industrial-militar – e mais pilhas de instrutores norte-americanos.

Quanto ao bônus extra, é pouco provável. Os sauditas também estão aos berros, querendo um escudo inexpugnável, feito escudo de mísseis de defesa, invencível, que os proteja da “agressão iraniana” Nonsense. Assumindo-se que haja algum acordo nuclear assinado pelo final de julho entre Irã e o P5+1 – do mais alto interesse para EU, China e Rússia – Teerã não só estará “normalizada” no ocidente, mas também receberá massivo influxo de fundos, logo que as sanções sejam levantadas.

Compare isso com a agenda não-dita – especialmente da Casa de Saud, dos falcões nos Emirados e do duro regime do Bahrain, que querem que o Irã continue sob sanção até o dia do Juízo Final, e que permaneça como estado pária perene no ocidente.

Barack Obama: EUA estarão com os Estados
do Golfo, contra “ataques externos”
O que torna tudo ainda mais absurdo é que os gastos militares dos países do CCG somados são muito mais altos que os do Irã. E também há divisões internas. Omã, menos linha dura que os demais membros do CCG, é amigável em relação a Teerã. E os Emirados Árabes Unidos – sobretudo via Dubai – não podem negar que estão vivendo tempos de vacas gordas em investimentos iranianos.

No final, lá veio o ‘'documento final'’ proverbialmente longo, vago, destacando que as partes devem fazer mais manobras militares conjuntas e cooperar em incontáveis campos, inclusive em matéria de mísseis balísticos de defesa. E há planos, também, para acelerar o armamento generalizado de todos. E repetiram sua “unidade” na luta contra ISISISILDaesh.

Cuidado com vassalos que pedem presentes

Não é mistério que o CCG – conveniente pós-apêndice do extinto Império Britânico – leva a palma no que tange a comprar lixo militar por bilhões de dólares e, no caso da Casa de Saud, também no que tange a fixar o preço do petróleo. Muitos dos membros do CCG recebem massivas populações de trabalhadores migrantes – quase todos vindos do sul da Ásia – que superam em número os locais e mal conseguem sobreviver, naquela armadilha suarenta em que caíram, com zero direitos humanos respeitados.

Absurdo extra aí, é Qatar e Arábia Saudita apoiando suas próprias redes, não necessariamente conflitantes, de jihadistas salafista na Síria. A Casa de Saud também disparou “operação cinética” ilegal ao estilo da “Tempestade Decisiva” do Pentágono, de guerra/bombas contra o Iêmen – operação que, reza a mitologia do Departamento de Estado, em termos os mais orwellianos, seria “esforço” ao qual Washington limita-se a “assistir”.

A proverbial histeria da imprensa-empresa comercial norte-americana decidiu que o ISIS/ ISILDaesh pode estar a alguns passos de tomar o Texas ou bombardear New York. Mesmo assim a maioria dos companheiros associados do CCG continuam paranoicos: naquela sua visão de mundo obtusa, a única coisa indispensável é esmagar o falso Califato que empodera o governo de maioria xiita em Bagdá, liderado por Haydar al-Abadi do Partido Da’wa, que ameaça os wahhabistas por serem o que são: intolerantes, armados e perigosos.

Por tudo isso, certo de que nada como um renovado surto de paranoia, e calculando que não sairia de Camp David com os presentes que foi buscar do governo Obama autodescrito como “Não faça merda coisa estúpida”, o novo capo da Casa de Saud, o rei Salman, deu chilique, resolveu não ir e mandar o seu novo príncipe coroado, príncipe Muhammad bin Nayef. Afinal, esse é o homem da hora, na “nova” Casa de Saud, como examinei aqui.

Presidente Obama olha para o Vice-Primeiro Ministro de Omã, Sayyid Fahd bin Mahmoud Al Said (esq.) e para o Emir do Kuwait, Sheikh Sabah Al-Ahmed Al-Jaber Al-Sabah (2º à esq.), ao receber representantes das seis nações do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) em Camp David, Maryland, dia 14/5/2015
Onde está Osama?

E aí, surge o fantasma de Osama bin Laden.

Recente matéria assinada por Seymour Hersh, em que expõe o saco de mentiras da Casa Branca sobre o fim que deram a bin Laden continua a agitar as águas. Muitas das revelações já haviam sido noticiadas em 2011, por outras fontes.

O que emerge é que bin Laden foi inicialmente capturado pelos serviços secretos do Paquistão (ISI) e mantido sob estrita vigilância em Abbottabad desde 2006. Foi denunciado por um ex-alto funcionário da inteligência paquistanesa, que embolsou uma fortuna em troca da informação e vive hoje amoitado, com a família, na Virginia.

Importante jornal paquistanês dedicou-se à história por algum tempo. Em seguida, outro confirmou a identidade do informante.

Tendo assistido à CIA em ação do Af-Pak ao Iraque, não me surpreendi. A CIA jamais encontraria nem um dos cobertores marrons pashtuns de bin Laden, ao contrário do que ensinam mitos fixados por Hollywood, tipo A hora mais escura.

Quanto ao assassinato, foi – como se diz na gíria dos drones em Nevada – simples assassinato rotineiro, assassinato predefinido. Mais uma vez, diferente do que reza o mito, bin Laden não estava armado com sua Kalashnikov nem usou uma de suas esposas como escudo.

Hersh vai direto ao cerne da questão, quando escreve:

Mas o alto nível de mentiras continua a ser o modus operandi da política dos EUA, além das prisões secretas, ataques de dronesraids noturnos de forças especiais e por aí vai.

E elemento chave de todo o imbróglio é – mais uma vez – a longa mão da Casa de Saud. A citação radicalmente importante do artigo, de fonte top da CIA, falando a Hersh:

Os sauditas não queriam que a presença de bin Laden nos fosse revelada, porque ele era saudita; então disseram aos paquistaneses que o mantivessem fora de circulação. Os sauditas temiam que, se nós soubéssemos, pressionaríamos os paquistaneses para que deixassem bin Laden começar a nos contar o que os sauditas andaram fazendo com a Al-Qaeda. Eles estavam fazendo chover dinheiro – muito dinheiro! Os paquistaneses, por sua vez, temiam que os sauditas dessem com a língua nos dentes sobre [os paquistaneses] estarem com bin Laden. O medo era que, se os EUA soubessem de bin Laden por Riad, seria o inferno. Os EUA terem sabido sobre a prisão de bin Laden por um terceiro não foi a pior solução possível.

Examinei aqui por que toda a “guerra ao terror” é fraude. O que a torna a coisa diferente agora é que parece que os verdadeiros Masters of the Universe que comandam o eixo Washington/Wall Street começam a cansar-se da Casa de Saud.

Barack Obama: Patrocinador do terrorismo wahabbista
Agora, até o New York Times tem licença para publicar que:

Apoio saudita à jihad afegã há décadas ajudou a criar a Al-Qaeda.

Até há bem pouco tempo, essa ‘'notícia'’ seria totalmente inadmissível. A mesma matéria também registra que o novo rei Salman

(...) foi homem de ponta da realeza e levantador de fundos para jihadistas a caminho do Afeganistão, da Bósnia, de vários destinos.

Não é coincidência que esse tipo de matéria apareça exatamente quando Salman “esnobou” Obama ao não dar as caras naquele convescote wahhabista-atlanticista em Camp David.

Assim sendo, eis a conclusão: os que pela primeira vez financiaram Osama bin Laden e depois pagaram aos paquistaneses para que o mantivessem fora de circulação, agora querem que Washington lhes dê todos os tipos de “garantias” de segurança, para terem certeza de que permanecerão para sempre no poder. E continuam a ser a matriz ideológica da qual brotam milhares de novos Osamas.

História assim tão inverossímil, só se for verdade.

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[*] Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: SputinikTom Dispatch, Information Clearing HouseRed Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today, e Al-Jazeera. Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu e João Aroldo, no blog redecastorphoto.
Livros:
− Obama Does Globalistan, Nimble Books, 2009. 
− Adquira seu novo livro Empire of Chaos, publicado no final de 2014 pela Nimble Books.




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