Brasileiros obtiveram muito do que esperavam da eleição de Rousseff
2/10/2014, [*] Mark Weisbrot, The Guardian, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
A explicação para a re-eleição de Dilma Rousseff com certeza deve ser buscada na evidência de que a maioria da população brasileira examina os 12 anos de governo do Partido dos Trabalhadores. Para os que tenham idade para lembrar ou interesse em comparar os números de hoje e os dos Brasil de antes, as mudanças para melhor são muito visíveis (para os dados, vide The Brazilian Economy in Transition: Macroeconomic Policy, Labor and Inequality”, Mark Weisbrot, Jake Johnston and Stephan Lefebvre, Center for Economic and Policy Research, outubro-2014 em .pdf).
Dilma e os trabalhadores |
Quando a candidata desafiante Marina Silva apareceu nas pesquisas, há algumas semanas, à frente da presidenta Dilma Rousseff do Brasil, houve grande excitação aqui em Washington, na imprensa-empresa do business e nos mercados financeiros brasileiros. O partido de Rousseff, Partido dos Trabalhadores (PT) está no governo há 12 anos e muita gente rica e poderosa – no Sul e no Norte – muito apreciaria uma mudança. Chegou a parecer que a sorte os ajudaria: a economia brasileira consideravelmente desacelerada nos anos recentes teria entrado oficialmente em recessão esse ano – detalhe que, em tese, apressaria o fim de muitos governantes. Antes disso, houve protestos de rua a propósito de um aumento do preço do transporte público e dos gastos do governo na Copa do Mundo; até o próprio futebol parecia conspirar, sobretudo quando a seleção do Brasil perdeu por humilhantes 7-1, destroçada pelos alemães.
O que se viu, contudo, foi que Dilma superou cada um e todos esses golpes e aparece agora posicionada em primeiro lugar, com reais chances de vencer no primeiro turno e já dada por re-eleita, se houver segundo turno nas eleições. Por que e como aconteceu?
A explicação para a re-eleição de Dilma Rousseff com certeza deve ser buscada na evidência de que a maioria da população brasileira, sim, examina os 12 anos de governo do Partido dos Trabalhadores. Para os que tenham idade para lembrar ou interesse em comparar os números de hoje e os dos Brasil de antes, as mudanças para melhor são muito visíveis (para os dados, vide “The Brazilian Economy in Transition: Macroeconomic Policy, Labor and Inequality”, Mark Weisbrot, Jake Johnston and Stephan Lefebvre, Center for Economic and Policy Research, outubro-2014” (.pdf).
Brasil com Dilma superando a pobreza extrema |
Apesar de o ritmo ter diminuído em anos recentes, e da recessão mundial de 2009, o PIB per capita do Brasil cresceu em média 2,5% por ano, de 2003-2014. Foi mais que três vezes a taxa de crescimento que se viu durante os dois governos do presidente Fernando Henrique Cardoso, que implementou as políticas do “Consenso de Washington” e ainda é o estadista “preferido” na capital dos EUA. (Antes de Cardoso, houve uma década e meia de fracassos econômicos ainda maiores, ocasião em que Washington teve ainda maior influência na política econômica e quando a renda per capita real diminuiu no Brasil).
A volta do crescimento, mais o uso pelo governo de Rousseff do aumento de renda, para ampliar o investimento social, fizeram cair a pobreza no Brasil em quase 55%; e a pobreza extrema, em 65%. Para os que viviam em pobreza extrema, o programa brasileiro de transferência de renda mundialmente reconhecido (“Bolsa Família”), garantiu 60% de sua renda (em 2003, foram 10%).
Aumento consistente no salário mínimo – aumentou 84% desde 2003, ajustado pela inflação – também ajudou muito.
O desemprego caiu ao número recorde de 4,9% (chegava a 12,3% quando Lula da Silva chegou à presidência, em 2003. A qualidade dos empregos gerados também aumentou: a porcentagem de trabalhadores presos no setor informal da economia caiu de 22% para 13%.
Variação da Taxa de desemprego no Brasil |
A distribuição de renda no Brasil ainda é uma das mais desiguais do mundo, mas também aí houve melhora significativa. De 2003-2012, os 40% da população imediatamente abaixo da média quase dobrou sua participação na riqueza do país, em comparação com os dez anos anteriores. Aconteceu às expensas dos 10% mais ricos.
Os pobres muito obviamente se beneficiaram dessa transformação na economia brasileira – e isso é o que se vê refletido nas pesquisas de intenção de voto. Mas não só os pobres beneficiaram-se com as condições melhoradas de bem-estar: com renda média familiar de apenas US$ 800, a vasta maioria dos brasileiros também se beneficiou com salários mais altos, desemprego em queda e aumento significativo nas aposentadorias, que também aconteceu na última década.
Para as elites, é claro, essas melhorias na vida do trabalhador comum não são boa notícia. Uma nova lei que exige que trabalhadores domésticos (o que há em grande número no Brasil, por causa da desigualdade ainda enorme) sejam oficialmente tratados como empregados formais, com horário máximo de trabalho e direito à assistência social, é o mais recente incômodo a atormentar os endinheirados no Brasil.
A mídia no Brasil tem candidato |
A chamada “mídia” brasileira operando contra o governo e com candidato próprio tornou-se veículo de uma contranarrativa, segundo a qual o Brasil governado pelo PT estaria a caminho da ruína – contranarrativa que se viu também na mídia internacional. Para as empresas de imprensa no Brasil, a economia estaria declinante porque o governo não é suficiente “amigo do mercado” e do business. A inflação (que está hoje no topo da meta fixada de 6,5%) seria insuportavelmente alta, empurrada para cima por mercado de trabalho “muito regulado”; e o governo teria de “cortar gastos”. E sim, sim – o governo tem também de ser “mais amigo” dos EUA e da política dos EUA para a região (que é altamente impopular em toda a América Latina). Foi um dos temas de campanha para as eleições de 2010, que foi agora ressuscitado.
A realidade da política econômica é praticamente o contrário do que se lê na imprensa brasileira: de fato, mesmo, desde o final de 2010 o governo tem dado o que parece a muitos ser excessiva atenção à Big Finance, aumentando taxas de juros e cortando gastos em momentos em que a economia pareceu fraca demais. Esperemos que esses erros não se repitam.
Se Dilma vencer, terá sido porque a maioria dos brasileiros obtiveram, sim, muito dos objetivos para os quais a elegeram. O mais provável é que queiram mais, e certamente querem. O mais improvável é que os brasileiros votem por um retrocesso.
[*] Mark Weisbrot é economista e co-diretor do Center for Economic and Policy Research em Washington DC.. É coautor, com Dean Baker, de Social Security: the Phony Crisis. Criticou a privatização do sistema norte-americano de seguridade social (hoje um dos mais precários do mundo) e foi um grande crítico da globalização e do FMI. Os trabalhos de Weisbrot a respeito dos países latino-americanos (incluindo Argentina, Bolívia, Brasil, Equador e Venezuela) atraíram interesse nacional e internacional. É comentarista de política econômica internacional com artigos publicados, p.ex., no New York Times (USA) e no The Guardian (UK).
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