terça-feira, 11 de março de 2014

UCRÂNIA E BRASIL


[*] Adriano Benayon  — 09.03.2014

Guerra e depressão

1. O móvel da oligarquia financeira para desencadear guerras em grande escala, bem como conflitos localizados, é ganhar mais poder, subordinando países e regiões ao império e enfraquecendo os que poderiam conter essa expansão.

2. Nas Iª e IIª Guerras Mundiais, respectivamente França versus Alemanha e Alemanha versus Rússia (União Soviética), as potências angloamericanas só se engajaram, com intensidade, no final das mesmas para ocupar espaços estando aqueles contendores desgastados.

3. As duas grandes conflagrações eclodiram após longos períodos de depressão econômica e serviram como manobra de diversão em face das consequências sociais e políticas da depressão.

4. No Século XXI, os conflitos armados grandemente destrutivos estão tornando-se mais frequentes após o golpe preparatório: a implosão das Torres Gêmeas, em setembro de 2001.

5. Os principais alvos têm sido países islâmicos, envolvendo a geopolítica da energia. Desde 2001 o Afeganistão está sob agressão. Em 2003, destruição e ocupação do Iraque. Ataques a Sudão, Somália e Iêmen. Em 2011 a brutal agressão e intervenção da OTAN na Líbia. Durante todo o tempo, pressão e hostilização a Síria e Irã.

6. Em 2013, a agressão à Síria foi intensificada com a invasão por mercenários e extremistas, grandemente armados, com participação das monarquias petroleiras do Golfo Pérsico, lideradas pela Arábia Saudita, e colaboração da Turquia e de outros membros da OTAN.

7. Mas, na Síria, o governo conseguiu resistir, com seus recursos e disposição e com apoio militar e político da Rússia e da China, inclusive no Conselho de Segurança da ONU.

Yulia Timoshenko e Vitali Klitschko, dois dos títeres do ocidente na Ucrânia

Ucrânia

8. O êxito, até o momento, dessa resistência, levou a potência hegemônica retornar a ataques mais incisivos contra a ex-superpotência, que busca reconstruir-se. Daí, o recente golpe de Estado na Ucrânia.

9. Ademais, Putin fortaleceu os laços econômicos e políticos da Rússia com a China e países da Ásia Central, frustrando a estratégia angloamericana de manter divididas e vulneráveis as potências capazes de alguma resistência a seu projeto de governo mundial absoluto.

10. Claro que os EUA nunca deixaram de reforçar o cerco à Rússia, desde a desmontagem da União Soviética, instalando bases de mísseis em ex-aliados de Moscou, com destaque para a Polônia. Teleguiaram a “revolução laranja” na Ucrânia, em 2004, mais um marco no enfraquecimento desse país de consideráveis dimensões e recursos naturais e população em grande parte russa.

11. Ao verem contida a intervenção na Síria — e presenciar o Irã muito pouco abalado pelas sanções e incessantes hostilizações — os EUA trataram de atingir o flanco da própria Rússia.

12. Instaram a União Europeia (UE), sua satélite, a fazer ingressar nela a Ucrânia, visando pô-la na OTAN, colocando bases militares contra a Rússia virtualmente dentro desta.

13. Entretanto, o presidente da Ucrânia, Yanukovich, constitucionalmente eleito, não concordou em aderir à UE sem discutir as draconianas condições impostas: adotar as medidas econômicas do figurino do FMI: cortar pela metade o valor das pensões, suprimir benefícios sociais, demitir funcionários, privatizar mais patrimônio público em favor de plutocratas, tudo para pagar dívidas com bancos ocidentais.

14. Essas são as medidas às quais estão amarrados os pífios empréstimos que UE e EUA acabam de conceder após o golpe, desencadeado sob comando da Subsecretária de Estado dos EUA, Victoria Nuland, e seu Embaixador na Ucrânia.

15. Utilizaram-se de redes sociais e outros meios para arrebanhar “forças políticas descontentes” e as levaram à Praça Maidan, ignorando elas que suas lastimáveis condições de vida vão piorar muito após o golpe.

16. A polícia foi acusada de autora dos disparos feitos por gangs neonazistas e outras extremistas (as tais “forças políticas descontentes”), como foi constatado pela chefe das relações exteriores da União Europeia e pelo ministro do exterior da Estônia, conforme conversação telefônica entre ambos, cuja autenticidade foi confirmada pelo ministro.

17. Isso é evidentemente omitido pela grande mídia (imprensa-empresa), que só publica o que interessa aos governos dos EUA, aliados e satélites, todos subordinados à alta finança e ao big business.

18. Ninguém deveria desconhecer que a grande mídia (imprensa-empresa) mente, 24 horas por dia, e ainda mais, desde a destruição, por dentro, das Torres Gêmeas em New York, golpe a partir do qual os EUA institucionalizaram mais instrumentos totalitários de repressão.

19. Golpe engana muita gente, mesmo após ter sido desmascarada inúmeras vezes, como quando se comprovou ter o Secretário de Estado de Bush, Colin Powell, mentido descaradamente sobre a existência de armas de destruição de massa no Iraque, negada pelo próprio observador das Nações Unidas.

20. É ao big business que agrada o golpe na Ucrânia, após já vir lucrando, antes dele, em negócios com os oligarcas corruptos atraídos para a órbita da oligarquia financeira, principalmente britânica.

21. De fato, anunciam-se novos acordos com as petroleiras angloamericanas (Chevron, Exxon, Repsol etc.) para extrair xisto, pelo processo altamente poluente de fracking, bem como a cessão de terras ao agronegócio norte-americano, Monsanto à frente, com intenso uso dos letais transgênicos e agrotóxicos, nas grandes extensões férteis da Ucrânia.

22. O destino dos ucranianos, se confirmado o ingresso na UE, não diferirá do que assola a Grécia, Portugal, Espanha, etc. e se abaterá também sobre os russos e outras nacionalidades que vivem em territórios cedidos à Ucrânia por  Khustchev.

23. Putin está agindo com extrema cautela, tendo-se limitado a apoiar o parlamento da Crimeia em seu desejo de unir-se à Rússia, reforçando efetivos militares na península, no Mar Negro e no Mediterrâneo.

24. A China manifestou-se solidária à Rússia, inclusive por estar investindo na Ucrânia, como faz em todo lugar suscetível de exportar alimentos e outras matérias-primas.

25. A renda por habitante da Ucrânia equivale a 1/3 da russa, que não é alta, e a Rússia já acolheu três milhões de ucranianos em seu território. O agravamento das condições sociais levará a maior êxodo para a Europa Ocidental, que já tem enorme desemprego.

O Brasil está na fase dos quebra-quebras e arruaças...
Brasil

26. O processo aqui em curso tem semelhanças com o da Ucrânia: insatisfação com as condições de vida e com a corrupção; e a ignorância das causas desses males.

27. Na nova ágora da internet e redes sociais, circulam versões absurdas como a de que o governo petista tem por objetivo implantar o comunismo.

28. Na realidade, esse governo, como seus predecessores, depende do big business transnacional, cujo domínio intensifica os problemas do País: concentração, desnacionalização e desindustrialização da economia; dependência tecnológica.

29. Difundiu-se muito no Brasil vídeo em que uma jovem ucraniana defende liberdade e democracia no errado contexto das massas iludidas na Ucrânia pelos mobilizadores do golpe. Na realidade, uma peça produzida por empresa de marketing político, sob os auspícios da agência norte-americana NED — National Endowment for Democracy — patrocinada pelo governo e o Partido Republicano dos EUA.

30. Este e outros braços do império acionaram as ONGs a seu serviço, a par dos nazistas, conforme a tradição da CIA, desde o final da 2ª Guerra Mundial.  O que se vê na Ucrânia são   homicídios, vandalismo e torturas, reiteradas agora com tiros sobre manifestantes pró-Rússia.

31. O objetivo da oligarquia financeira angloamericana no Brasil, até para prosseguir apropriando-se de seus recursos de toda ordem, é intensificar a desnacionalização e demais instrumentos para enfraquecê-lo.

32. Os meios de controle da informação − inclusive espionagem eletrônica, hacking − combinam-se com a corrupção de todo o sistema institucional. A presidente é acuada para aumentar o ritmo das concessões através, principalmente, de juros escorchantes (Taxa SELIC) e remessa de lucros e dividendos para matrizes das empresas internacionais.

33. Estão presentes as consequências das falhas estruturais da economia brasileira, que venho, de há muito, denunciando, as quais se poderão manifestar de forma aguda após julho, apesar de haver eleições em outubro.

34. A crise brasileira tem face interna − física e financeira − como o serviço da dívida: R$ 900 bilhões para 2014; e face externa: déficit nas transações correntes com o exterior acumulando US$ 188,1 bilhões em três anos (US$ 81,4 bilhões só em 2013).

35. Além disso, seus efeitos econômicos e sociais podem ser agravados pelas repercussões do colapso financeiro no Hemisfério Norte, próximo de ressurgir.

[*]Adriano Benayon: Consultor em finanças e em biomassa. Doutor em Economia, pela Universidade de Hamburgo, Bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Diplomado no Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, Itamaraty. Diplomata de carreira, postos na Holanda, Paraguai, Bulgária, Alemanha, Estados Unidos e México. Delegado do Brasil em reuniões multilaterais nas áreas econômica e tecnológica. Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na área de economia. Professor da Universidade de Brasília (Empresas Multinacionais; Sistema Financeiro Internacional; Estado e Desenvolvimento no Brasil). Autor de Globalização versus Desenvolvimento, 2ª ed. Editora Escrituras, São Paulo.


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