sexta-feira, 3 de abril de 2015

Israel e Arábia Saudita: A Contrarrevolução Permanente

20/9/2013, [*] Asa WinstanleyMiddle East Monitor
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Primavera árabe, manifestação de 1 milhão na Praça Ibrahim al-Qaed em Alexandria, Egito
O que o saldo dos levantes árabes de 2011 nos ensinou até aqui? Podem-se listar muitas coisas, mas, para mim, o que mais chama a atenção é a natureza, agora já completamente exposta e visível, da aliança entre Arábia Saudita e Israel.

Essa aliança representa uma contrarrevolução permanente que domina, em conjunto, a região – plenamente apoiada pela hegemonia imperial em ruínas de Washington DC.

Os dois regimes são ambos ditaduras militares, embora de modos diferentes. E os dois regimes são também teocracias, cada um a seu modo. A visão wahhabista extremista da família saudita que domina o país poderia levar alguém a supor que os sauditas detestariam o autodeclarado “estado judeu”. Nada disso.

Conquanto a mídia-empresa do regime saudita volta e meia exiba o mais escandaloso antissemitismo, o movimento sionista jamais deu qualquer importância a antissemitismos, exceto como chibata para vergastar os inimigos do sionismo. Nada disso. A verdade é que se vê com muita frequência, na mídia-empresa de Israela Arábia Saudita apresentada como “regime moderado”.

Esse regime “moderado” é monarquia absolutista cruel, que sequer se dá ao trabalho de fingir que realiza eleições – a família real, com seus milhares de príncipes senis, simplesmente governa o país com mão de ferro, encarcerando os opositores.

Zein eldin Ben Ali
De fato, para onde fugiu o ditador tunisiano Zein eldin Ben Ali, depois de derrubado do poder pelos levantes populares de 2011? Para a Arábia Saudita, onde foi recebido de braços abertos pelo rei. Desde então, o reino tem recusado todos os pedidos de extradição do governo da Tunísia.

Os sauditas, apoiados na sua aparentemente ilimitada riqueza em petróleo, exportam morte e destruição para toda a região. Na Síria, os sauditas comandaram o movimento pró-guerraonde, de fato, os sauditas fazem guerra à distância.

No Líbano, os sauditas estão entre os principais suspeitos de uma recente [em 2013] onda de explosões de carros-bombas cujo objetivo provável parece ter sido incitar e incendiar oposições sectárias subjacentes. O dinheiro saudita circula fartamente pela região, pelos bolsos de “jornalistas” estenógrafos da corte, que usam suas plataformas para papagaiar os objetivos da política externa dos sauditas e disseminar sempre mais o ódio e o sectarismo.

Falando recentemente ao New York TimesAlon Pinkas, ex-cônsul geral de Israel em New York, assim resumiu a atual [em 2013] política israelense na Síria:

Deixar os dois lados sangrarem, hemorragia, até a morte: eis o pensamento estratégico por aqui. Enquanto durar [a guerra na Síria], não há ameaça real a temer da Síria.

Michael Oren
Mas essa semana [em 2013] o embaixador de Israel à ONU, Michael Oren, disse que o pensamento israelense era mais complexo, naquela questão:

Sempre quisemos que Bashar al-Assad saísse, sempre preferimos bandidos que não fossem apoiados pelo Irã, a bandidos apoiados pelo Irã.

Nada estará algum dia mais alinhado com os objetivos políticos da Arábia Saudita, de derrubar o presidente Assad – apesar de uma curta entente em 2009, quando o rei Abdullah visitou Damasco.

Qualquer que tenha sido o pensamento estratégico prevalecente na cúpula israelense, fato é que a aliança sauditas-israelenses, que antes foi tácita, agora já se deixa ver abertamente declarada.

Oren esclareceu tudo:

(...) nos últimos 64 anos provavelmente jamais houve mais ampla confluência de interesses entre nós e vários estados do Golfo. Com esses estados do Golfo, temos acordos sobre a Síria, o Egito e a questão palestina. Evidentemente, também temos acordos sobre o Irã. É uma das boas oportunidades criadas pela Primavera Árabe.

No Egito, os sauditas realmente lideraram diretamente a contrarrevolução – com apoio diplomático de Israel – encorajando autoridades norte-americanas a apoiar fortemente o ditador Hosni Mubarak quando enfrentava pressão máxima em 2011. Os sauditas parecem não ter gostado da relutância do governo de Barack Obama, apanhado no contrapé, sempre sem saber como reagir aos levantes árabes.

Egito - golpe MILICANALHA (julho 2013)
A partir dali, o Egito foi dominado por uma contrarrevolução. O golpe militar do general Sisi, que tomou o poder em julho/2013, foi e continua a ser totalmente apoiado pelos sauditas. A monarquia prometeu bilhões de ajuda ao regime, no caso de a ajuda militar dos EUA vir a ser suspensa (possibilidade muitíssimo improvável).

Escrevendo em Jewish Chronicle mês passado (agosto/2013), o correspondente em Londres do jornal Haaretz, Anshel Pfeffer, disse que o governo de Israel está satisfeitíssimo com o golpe, embora se mantenha em silêncio. “Conhecemos al-Sisi e se pode fazer negócios com ele” – escreveu Pfeffer, citando uma alta autoridade da segurança de Israel.

No Bahrain, outro levante popular em 2011 foi esmagado mais diretamente – por tanques e soldados sauditas.

O papel dos sauditas no financiamento da contrarrevolução e da violência política tem longa história – e não só na região. Eis aí mais um aspecto em torno do qual há perfeita harmonia entre Israel e a monarquia saudita.

Nos anos 1980s, durante algum tempo, o Congresso dos EUA bloqueou as tentativas, do governo Reagan, para financiar e armar os “Contras” – esquadrões da morte que a CIAestava usando para combater o governo democrático de esquerda na Nicarágua (esquadrões da morte que, segundo a mídia-empresa nos EUA, seriam constituídos de “revolucionários” e “combatentes da liberdade”).

A quem a CIA recorreu, para resolver o caso? À Arábia Saudita e a Israel. De fato, o mesmo príncipe saudita encarregado de armar os esquadrões da morte na Nicarágua é hoje (2013) encarregado de contrabandear armas para a Síria – o príncipe Bandar bin Sultan – mais uma vez com a ajuda da CIA (e de espiões britânicos).

Bandar (Bush) bin Sultan
Enquanto o despótico regime saudita continuar a exportar petróleo e violência política para toda a região, praticamente não há qualquer possibilidade de genuína mudança democrática no mundo árabe – e nada existe que meta mais medo a Israel, que democracia no mundo árabe.

Apesar da onda de guerras civis, quase guerras civis ou estados já virtualmente falidos ou colapsados, só uma coisa parece absolutamente inalterada: a impopularidade de Israel. Quando baixar a poeira, Israel ainda será impopular.
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[*] Asa Winstanley, nascido no sul do País de Gales, é um jornalista investigativo que vive em Londres, que escreve sobre a Palestina e no Oriente Médio. Visita regularmente a Palestina e a Cisjordânia ocupada desde 2004.
Escreve para o site de notícias palestina premiado The Electronic Intifada, onde ele é um editor associado.Mantém coluna regular no Middle East Monitor.
Escreve para outras publicações incluindo: Al-Akhbar (Líbano), Middle East Eye, The National, Jacobin, Ceasefire Magazine, New Left Project, Jerusalem Media and Communications Centre, Morning Star e Free Morning Star e Freedom.
Contribuiu com um capítulo de livro para Israel e Gaza: Behind the Media Veil, publicado pelo MEMO em 2014. Junto com Frank Barat, foi editor de Corporate Complicity in Israel's Occupation (Pluto Press) uma coleção de provas escritas e faladas de Sessões do Tribunal Russell, de Londres, sobre a Palestina .
É membro da National Union of Journalists.
Recebe e-mails em: mail@asawinstanley
Twitter: @asawinstanley

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