quarta-feira, 22 de abril de 2015

EUA respondem com escalada no conflito no Iêmen

Nikolai Bobkin, Strategic Culture
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Consequências do bombardeio saudita em áreas civis em Sanaa, Iêmen
Os EUA estão expandindo sua participação nos eventos no Iêmen. Há notícias de que um porta-aviões norte-americano foi despachado para a costa do Iêmen dia 20/4/2015, para se juntar a outros navios americanos preparados para bloquear quaisquer carregamentos de armas que o Irã envie aos rebeldes xiitas “houthis” que lutam no país. O USS Theodore Roosevelt e seu navio-escolta, o USS Normandy, que transporta mísseis Cruisers teleguiados, deixaram o Golfo Pérsico dia 19/4/2015, em rota para o Mar da Arábia, para ajudar a impor o bloqueio. Os navios vão-se juntar à força naval de sete navios de guerra e três embarcações auxiliares implantados no Mar da Arábia, Golfo de Aden e estreito de Bab-el-Mandeb.

Formalmente, a missão visa a garantir que as rotas marítimas vitais da região permaneçam abertas e seguras. A declaração emitida pelo Centro de Relações Públicas do Comando das Forças Navais dos EUA enfatiza que os Estados Unidos continuam comprometidos com seus parceiros regionais e trabalham para manter a segurança no ambiente marítimo.

Mas o verdadeiro propósito do bloqueio naval é impedir o acesso de navios iranianos aos portos iemenitas e privar o movimento Ansarullah [“houthis”, para os sauditas] de qualquer ajuda que o Irã lhe envie.

A Arábia Saudita não está à altura da tarefa. E mais uma vez, lá estão os EUA postados como reforço, ao lado dos inimigos do Irã. Riad sente-se muito confortável sob a proteção dos EUA.

Essa é evolução perigosa, que pode agravar a situação. A Casa Branca deu mais um passo irrefletido, apressado e temerário, na direção de aprofundar o apoio que dá à Arábia Saudita em seu confronto com o Irã. Por alguma razão, o governo dos EUA parece ter certeza de que as tensões regionais exacerbadas, como resultado do conflito no Iêmen, jamais ameaçarão o acordo nuclear com o Irã. Teerã pensa diferente.

MRE do Irã, Mohammad Javad Zarif
NYTimes - 20/4/2015
É tempo de os EUA e seus aliados escolherem entre cooperação e confrontação – como escreveu o ministro das Relações Exteriores do Irã, Mohammad Javad Zarif, em referência às negociações nucleares em curso, em coluna assinada no New York Times“Mensagem do Irã”, de ontem, 20/4/2015:

Chegamos a um acordo sobre os parâmetros para eliminar qualquer dúvida sobre a natureza exclusivamente pacífica do programa nuclear do Irã” – escreveu Zarif; o povo iraniano fez sua parte para facilitar um acordo; agora, a responsabilidade recai sobre os EUA e seus aliados, para levar o processo à conclusão que interessa a todos.

É hora de os EUA e seus aliados ocidentais escolherem entre cooperação e confrontação, entre negociações e arrogância, entre acordo e coerção – escreveu o ministro iraniano.

Depois de lançada a campanha aérea contra o Iêmen, diminuiu consideravelmente a intensidade dos ataques aéreos contra o Estado Islâmico no Iraque e na Síria. Com a unidade de combate USS Theodore Roosevelt deixando a posição original, o Pentágono realmente parou de lutar contra os militantes islâmicos do Estado, e passa agora a participar da operação contra os xiitas do movimento Ansarullah [“houthis”, para os sauditas]. Aquela unidade de combate naval era a principal força de ataque na operação contra o Estado Islâmico. A Casa Branca prevê que as tensões entre a Arábia Saudita e Irã entrem em escalada.

No Iraque, Riad adotou a política de incitar à violência grupos políticos, tribos e clãs, atiçando uns contra os outros, para assim empurrar o país para um atoleiro de caos e tumultos, depois que as forças norte-americanas partiram.

O presidente Obama diz que os Estados Unidos teriam “renovado nossas alianças da Europa para a Ásia”. Não há motivo algum para considerar que isso seja relevante no caso do Oriente Médio. Como antes, os Estados Unidos baseiam-se em alianças militares com Israel e Arábia Saudita. Nada faz crer que os progressos alcançados nas negociações nucleares com o Irã levarão a reduzirem-se as tensões, no que tenha a ver com outros problemas regionais. Nada há, à vista, que sugira normalização das relações EUA-Irã.

Iêmen: resultado do bombardeio Saudita em Saada
16/4/2015
No Iêmen, o governo dos EUA apoiam a operação militar contra os xiitas que controlam a maior parte do país e dão combate aos terroristas da Al Qaeda. É verdade que os Estados Unidos não põe coturnos em solo, como fazia no início do século. Mas a estratégia não mudou. Apenas que, agora, Washington terceirizou o trabalho sujo.

A perspectiva de algum excelente acordo nuclear com o Irã continua puramente hipotética. Dever-se-iam criar novas formas de cooperação regional, para que o acordo fosse ponto de virada no processo de produzir paz para o Oriente Médio. Os americanos acreditam que conseguiriam levar Teerã a esquecer os seus próprios interesses nacionais. O “ocidente” reluta em está relutante em levantar as sanções, porque sem elas perderia influência sobre Teerã. Todas as propostas e iniciativas do Irã para melhorar a segurança regional são recusadas sem sequer receberem qualquer consideração séria.

Dia 14/4/2015, o Conselho de Segurança da ONU impôs um embargo de armas contra os rebeldes do movimento Ansrarullah (“houthis”, para os sauditas e para a empresa-mídia em todo o mundo) e incluiu em sua lista negra, o nome do filho de um ex-presidente do Iêmen e atual líder dos “houthis”. A resolução insiste que os “houthis”, que têm base no noroeste do Iêmen, para que entreguem as áreas que tomaram, bem como suas armas, inclusive “sistemas de mísseis” (sic). Governos árabes declararam que a resolução teria sido “vitória diplomática”.

A resolução permite aumentar a pressão sobre o movimento Ansarullah. Mas a Rússia não está satisfeita com a tal resolução. De acordo com o Vice-Chanceler russo, Gennady Gatilov, é resolução tendenciosa, que condena muito enfaticamente os “houthis”. Para Moscou, a resolução não facilita nem promove as medidas necessárias para superar a crise no Iêmen. O texto não considerou as propostas da Rússia, não exige um cessar-fogo, não considera devidamente as consequências nem a urgência de declarar-se uma pausa para ajuda humanitária. E não fez adequada referência às sanções.

Ban Ki-Moon e Javad Zarif (E) 19/1/2014
De modo geral, o Irã fez eco à posição dos russos. O governo iraniano enviou carta ao Secretário-Geral da ONU, com propostas sobre a gestão da crise no Iêmen. O Ministro das Relações Exteriores do Irã, dia 17/4/2015, entregou carta ao Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, na qual os iranianos oferecem plano de paz de quatro pontos, para o Iêmen. O plano, que o chanceler Mohammad Javad Zarif anunciou no início deste mês, prega cessar-fogo imediato e fim de todos os ataques militares estrangeiros; assistência humanitária; retomada do amplo diálogo nacional e “estabelecimento de um governo inclusivo, de unidade nacional”.

É imperativo que a comunidade internacional envolva-se mais efetivamente no trabalho de pôr fim aos absurdos ataques aéreos e de estabelecer-se um cessar-fogo, que permita que o povo do Iêmen receba assistência humanitária e médica, e que se restaurem a paz e a estabilidade no país mediante diálogo e reconciliação nacionais sem pré-condições – escreveu Zarif naquela carta.

De modo algum o Iêmen pode tornar-se trampolim para que a Arábia Saudita ataque o Irã. Se os americanos prestassem, pelo menos, alguma atenção ao plano do Irã para uma solução pacífica no Iêmen, não estariam hoje obrigados a dar conta de uma situação criada pelos seus “parceiros” árabes excessivamente agressivos.

  Barack Obama e Salman Al Saud, rei da Arábia Saudita
Os EUA devem olhar para o futuro, não para o passado. Os EUA têm feito mais mal que bem ao Oriente Médio. O presidente Obama gosta de repetir que, quando chegou ao poder, havia mais de 180 mil soldados dos EUA no Iraque e no Afeganistão, e que agora o número de soldados é inferior a 15 mil. Muito mais importante seria reconhecer que nenhum desses países conseguiu, até hoje, pôr fim a guerras civis.

Os EUA gastaram mais de 800 bilhões na “Operação Liberdade Duradoura”. A situação do Iraque não melhorou. Não há, à vista, qualquer possibilidade de normalização. No Iraque, os jihadistas do Estado Islâmico controlam um terço do território do país, além de grandes áreas também em território sírio. É bem real a ameaça de que se alastrem por toda a região os ataques daquele grupo terrorista.

Depois de terem desencadeado mais uma guerra agora no Iêmen, os EUA e seus aliados só fazem acrescentar gasolina ao fogaréu.

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[*] Nikolai Bobkin é Ph.D. em Ciências Militares, professor associado e pesquisador sênior no Center for Military-Political Studies, Institute of the U.S.A. & Canada. Colaborador especialista na revista online New Eastern Outlook. Escreve habitualmente para diversos sites e blogs tais como: Strategic CultureTroubled Kashmir, Make Pakistan Better e muitos outros.

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