domingo, 22 de julho de 2012

COMUNICADO DA VILA VUDU SOBRE O CÂNCER DO JAGUAR


Rimos até as 5 da manhã, ontem, relendo O Pasquim -- votamos e decidimos que temos a coleção completa, somando-se todos os jornais e revistas e livros velhos de todos, por aqui -- pensando no Jaguar.

Lembramos que a mulher do Jaguar que nós conhecemos, bela poeta de haikais e de poesia erótica da boa, chama-se Olga Savary.

Lembramos que um dia, depois de jantar em casa, um dos nossos (de fato, foi uma das nossas), em surto de entusiasmo poético, deu de presente à Olga Savary, arrancado na horinha da própria prateleira, o livro CURTIUS, Ernest Robert. Literatura européia e Idade Média latina. Rio de Janeiro: INL, 1957, magnífico livro, magnífica tradução, magnífica erudição de alemão erudito magnífico, magnífica edição do Instituto Nacional do Livro, que nossa companheira ganhou de presente do namorado que mais amou na vida, com dedicatória e data.

Pela manhã, nossa companheira acordou para o que fizera, mas não antes de suspirar, no café comunitário do domingo:

Ressaca brabésima. Sonhei que dei meu-Curtius-que-o-Marcos-me-deu, prá Olga Savary.

Horas depois, depois de muitas lágrimas, aspirinas e Paul Éluard, por causa do tal namorado & livros ("Elle se penche sur moi / Le coeur ignorant / Pour voir si je l'aime") e , afinal, a pobre rendeu-se ao inevitável:

Pelo menos, dei prá Olga, não prô Jaguar, que perdia o meu Curtius no primeiro taxi. Se dei, tá dado. Foi. Já era. Acabô. Azira. Fudeu.

Vai ver, mudaram, a Olga de marido, ou o Jaguar de mulher, ou todos. Ou, então, o Jaguar tem duas, ou mais, e a Célia é a encarregada de fazer operar maridos com câncer. Tudo bem.

Votamos e decidimos tornar público o seguinte comunicado.


COMUNICADO


Ninguém aqui vai ser operado, quando tiver câncer de fígado. Se alguma Célia aparecer aqui, nessa de operar marido, entenderemos. Mas ninguém nos internará em hospital Sírio-Libanês algum, pra operar câncer de fígado. Núncaras. Transplante pode até ser...

Mas quem pedirá um pedaço do fígado a algum daqueles saudáveis que corre pela praia, na hora em que o Jaguar ainda nem chegou em casa? (“Coitado... O cara já tá correndo amanhã!”) E há o risco de o pedaço de fígado salvar a vida e perder todo o resto do neoportador pressuposto salvo.

OK. OK. Eu não vou procurar, mas, se quiserem, tentem-aí achar alguém que concorde em dar um pedaço do próprio fígado pra mim” [disse o Zé do Ki, sábio e indiscutível completa ruína, hoje. É olhar e ver].

Em todos os casos, considerem seriamente a possibilidade de agradecer e não aceitar a doação. “Esse negócio de alguém querer dar fígado pra mim, ainda vai me sair é caro...” [o Zé do Ki, ruína, mas, comunista, sempre atento ao futuro objetivo]. “E eu não faço check-up, nem amarrado. Quem procura acha. Vejam o Fausto-do-Sukurov: só a luta ensina...” [outro dos nossos, velho macaco velho].

Escrevam pro Lúcio Lisboa (lucio-lisboa@uol.com.br). O Lúcio sabe o que fazer para mandar tratar em Cuba os doentes de câncer que possam ser tratados. Em Cuba, sim, o comunismo cura cânceres curáveis lá, mesmo que incuráveis em outras partes da galáxia do capital. O capital dá câncer. O capital só sabe produzir, produzir, produzir, produzir. O câncer é doença de crise de excesso de oferta: tudo desaba. Taí.

Grande Jaguar. Se segure, mermão. No pasarán. Somos imatáveis.

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A propósito da notícia lida em “O Dia” de 22 de julho de 2012- enviada pelo Urariano Motta e distribuída na redecastorphoto:


Rio - Uma piscina olímpica, no mínimo, foi o que bebi nos últimos 62 anos (completei 80 há 7 meses e bebo desde os 18). Para ficar só nas cervejas, sem falar nos vinhos e nos destilados: cachaça, underberg, bagaceira, grapa, tequila, steinhager, pisco, conhaque, rum, aquavit, gim, sakê, até absinto. E mil coquetéis, do Hi-Fi ao dry-martini. Durante esse tempo todo, consumi no mínimo uns 5 litros por dia da loura gelada, façam as contas. Quem persevera sempre alcança: fui fazer um checape de rotina e deu cirrose em estágio pra lá de avançado e vários cânceres ( tem plural?), no que os antigos boêmios chamavam carinhosamente de figueiredo.

Em linguagem técnica, eu estava com CHC (Carcinoma Hépato Celular). O médico do Chico Caruso aconselhou procurar o maior oncologista (especializado em câncer), com consultório em São Paulo. Ele foi sucinto. “Precisa operar imediatamente”. Levei um susto. Cheguei aos 80 sem um furo no meu corpo, exceto os que já nasci com eles. “E se não quiser operar, doutor ?” “Você vai ter entre 2 a 20 dias de vida, na melhor das hipóteses”. Achei um exagero: “Mas não sinto nada, nenhuma dor”. “ Você é um caso raro. Qualquer um no seu estado teria náuseas, dor e febre”. “Depois da operação posso voltar a beber?”

Como o corvo de Edgar Allan Poe, respondeu: “Nunca mais”. “Então deixa pra lá, o que tinha que fazer fiz e o que não fiz não farei mais”. O resto da vida vendo tevê, lendo jornal ou jogando biriba no Posto 6 com outros velhinhos. Mas não houve jeito de escapar. Célia me internou no Hospital Sírio-Libanês, o mesmo onde estiveram Lula e a Presidenta.

Antes almoçamos no Gero com dry-martinis, vinho e underberg. Pelo menos minha presumida última refeição foi bem melhor que a de Cristo. Quando chegamos, havia uma multidão de fotógrafos e cinegrafistas. “Como descobriram? Só os médicos, Célia e eu sabíamos”. Ledo Ivo engano (licença, Sérgio Porto). Estavam na porta do hospital para cobrir a saída de Pedro, filho do cantor sertanejo Leonardo. No meu tempo era cantor caipira, com chapéu de palha e botina. Agora é chapéu texano, muita joia e botas de grife. [continua, mas não sabemos onde, nem quando]

3 comentários:

  1. (comentário enviado por e-mail e postado por Castor)
    Vem cá: o SUS paga a ida a Cuba que o Lúcio sabe articular?
    Baby Siqueira Abrão

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    1. (comentário enviado por e-mail e postado por Castor

      Atenção: Não escrevi que o Lúcio "sabe articular"

      Escrevi que o Lúcio "sabe o que fazer para mandar tratar em Cuba os doentes de câncer que possam ser tratados" -- como escrevi.

      Evidentemente cada pessoa é que tem de articular a própria ida.

      Cuba só trata casos que Cuba selecione, e só seleciona casos que considere tratáveis.

      Antes de qquer decisão sobre tratamento, o doente tem de mandar pra Cuba uma VAAAAAAAAAAAAASTA documentação médica, que Cuba exige, para avaliar o caso médico.

      (2) Cuba decide o que cada um tem de pagar, em cada caso.

      VV

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  2. (comentário enviado por e-mail e postado por Castor)

    Bacana, valeu! O Pasquim surgiu e desenvolveu-se durante meus longos e prolongados exílios. Mas como era bom lê-lo em detalhes, na Polônia de Gomulka e Cyrankiewicz, na Itália de Fanfani e Moro, no Vaticano de Paulo V e Karol WojtylaI, no Mághrebe e no Máchirek, no Rio de minhas férias e funções provisórias (numa destas, o Jaguar pediu ao David e a mim escrevesse umas crônicas cinematográficas: ficamos naquela, até quase o fim, mas já não era a mesma coisa...). Já em Brasília, só se falava no Golden Days, um milico figeiredoista, ridículo e fascista como o Starace mussoliniano, chamado Dias Dourado, que beixice! Jaguar vive e vai, sim viver. Que inveja daqueles dry martinis no Gero paulistano, nada melhor, putz! Quanto ao livro de Ernst Robert Curtius, só nas boas e raras bibliotecas, vero?

    Abraços do
    ArnaC

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