quinta-feira, 19 de julho de 2012

Ordem do dia: Direita, volver



Milicanalhas ex-presidentes golpistas

Publicado em 19/07/2012 por Urariano Motta*

Recife (PE) - Para quem acreditava que a ordem nos quartéis espelharia hoje a democracia do Brasil, para quem pensava que os crimes e torturas teriam ficado lá na ditadura, lugar onde não devem ser tocados ou lembrados, como insistem correntes militares, a notícia que dos jornais correu pela internet, há poucos dias, foi um choque além do pau de arara. Leiam com o sangue gelado, se puderem:

“Soldados do quartel do 1º Batalhão da Polícia do Exército, onde funcionava o DOI-CODI na ditadura militar, corriam ontem pela manhã na rua Barão de Mesquita, no Rio, cantando: ‘Bate, espanca , quebra os ossos. Bate até morrer’. O instrutor então perguntava: ‘E a cabeça?’. Os soldados respondiam: ‘Arranca a cabeça e joga no mar’. No final o instrutor perguntava: ‘E quem faz isso?’. E os soldados respondiam: ‘É o Esquadrão Caveira!’.”

Diante disso, dessa manifestação explícita de terror orientado, autoridades de farda acharam por bem tratar o caso em panos mornos, sob declarações de que um rigoroso inquérito viria, que tamanho absurdo era um fato isolado, que semelhante exibição não é seguido nem preconizado, etc., etc.. E tudo parece que foi resolvido, e por resolução se entenda e imaginamos, por fruto da experiência vivida: subalternos são chamados entre quatro paredes para que não se mostrem assim em público, que se contenham, pois tal acinte é inconveniente agora, que há de ser discreto.

Em círculos democráticos, de históricos resistentes da ditadura, houve sugestões de se pensar um projeto de lei que obrigasse aos quartéis o ensino de respeito a Constituição brasileira, pois dessa maneira cânticos bárbaros como os acima seriam enquadrados como incitação a crimes de lesa-humanidade. Tudo bem, achamos a ideia do projeto de lei ótima, mas o respeito à Constituição poderia terminar por ser um respeito formal para a sala da mídia, enquanto entre muros a música da Constituição entraria por um ouvido e sairia pelo outro. Algo como os dez mandamentos para todo religioso, que os segue pro forma.

Creio que a ideia de proposta que mude esse escárnio deve se dirigir para a reformulação radical do ensino nas Escolas Militares. Como já observei em artigo anterior, nessas escolas de formação há um expurgo, um desaparecimento de vidas democratas, de assassinatos de presos políticos na ditadura. E assim se formam novos oficiais nas três forças, como se fossem a encarnação do Fantasma das histórias em quadrinhos. De geração a geração com o mesmo caráter, com o mesmo papel, a cavalgar em um cavalo branco pelo vazio histórico. De 1964 a 2012.

Nos discursos mais comuns dos oficiais militares que pretendem eternizar uma Escola imune à democracia e à história dos homens, argumenta-se:

a) os jovens brasileiros que não se formaram no Colégio Militar não pensam nem se instruem;
b) a história vivida e produzida por intelectuais e doutores das universidades brasileiras não serve para o ensino militar.

Não seria mais simples que proclamassem, como o general fascista na Espanha, “morte à inteligência”? 

Se aprofundamos a pesquisa, à procura da raiz dos cantos selvagens de mata e corta a cabeça na ordem-unida, podemos ver que a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército também se chama Escola Marechal Castelo Branco, até hoje. O militar golpista assim é apresentado no endereço Clique aqui

“Castello Branco empreendeu todos os esforços contrários à implementação de um regime totalitário no país, sendo um dos líderes da Revolução Democrática de 31 de março de 1964. Eleito Presidente da República pelo Congresso Nacional, em 11 de abril de 1964, três dias depois foi promovido ao posto de Marechal, passando para a reserva”.

Notem, é institucional. Esse perfil está lá na Escola de Comando do Exército brasileiro até esta quinta-feira 19 de julho de 2012. Ali, o governo João Goulart continua a ser chamado pelo codinome de regime totalitário, enquanto o golpe recebe a bela antonomásia de Revolução Democrática. Precisa dizer mais? Está aí uma das raízes do problema. Nas Escolas militares, no Alto Comando a ordem do dia tem sido até aqui: direita, volver. Mas para todos nós que ambicionamos um Brasil civilizado, a ordem deveria ser outra: democracia, volver. Urgente, antes que seja nunca.

Urariano Motta* é natural de Água Fria, subúrbio da zona norte do Recife. Escritor e jornalista, publicou contos em Movimento, Opinião, Escrita, Ficção e outros periódicos de oposição à ditadura. Atualmente, é colunista do Direto da Redação e colaborador do Observatório da Imprensa. As revistas Carta Capital, Fórum e Continente também já veicularam seus textos. Autor de Soledad no Recife (Boitempo, 2009) sobre a passagem da militante paraguaia Soledad Barret pelo Recife, em 1973, e Os corações futuristas(Recife, Bagaço, 1997). 

Enviado por Direto da Redação

Ilustrações catadas na internet: redecastorphoto

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