quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Iraque: EUA estão bombardeando as próprias armas

11/8/2014, [*] Peter Van Buren − Ghosts of Tom Joad
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


ISIL desfila tanque T62 "Made in USA" - Raqqah, Iraque

Agora, vocês já devem estar-se perguntando “Como aconteceu de a situação no Iraque piorar tanto e ficar ainda mais horrível e absurda?” Pois lhes digo: parece que boa parte do material que os EUA estão bombardeando hoje no Iraque é o mesmo material que os EUA levaram para lá para explodir iraquianos em 2003, depois doaram aos iraquianos, quando os EUA cansaram-se de bombardeá-los e saíram de lá em 2011... E o mesmo material que alguns iraquianos largaram por lá, no campo de batalha mês passado, para que o material fosse recolhido pelo ISIL esta semana, evento que levou os EUA a bombardearem tudo outra vez, hoje.

É tudo coisa nossa [deles!]

Quando a 2ª Divisão do Exército Iraquiano rachou e fugiu, só de ouvir dizer que colunas de combatentes do ISIL avançavam contra eles perto de Mosul no início desse verão, deixaram para trás uma montanha de equipamento militar fornecido a eles pelos EUA. Foram centenas de Humvees, armas leves e munição (inclusive 4.000 metralhadoras que disparam até 800 tiros por minuto), e nada menos que 52 sistemas de armas móveis howitzer norte-americanos M-198 – as mesmas armas que dois F/A-18s da Marinha dos EUA detonaram com bombas teleguiadas a laser de 300 kg na 6ª-feira (8/8/2014).

Howitzers M-198 "Made in USA"
Obama deu luz verde para atacar em qualquer ponto do Iraque onde houvesse “cidadãos norte-americanos” em perigo; então o comandante do Centcom, Lloyd Austin, deu ordem para atacar na 6ª-feira (8/8/2014), quando se soube que a cidade de Erbil estava ao alcance das armas que os EUA “perderam” lá.

Todos os “cidadãos norte-americanos” que os canhões estão protegendo contra as balas em Erbil só estão em Erbil porque o governo dos EUA os pôs lá, inclusive pessoal de um Consulado e Forças Especiais. Claro que todos poderiam ter sido evacuados, o que evitaria o bombardeio.

Fabricantes de armas alcançam estado de perfeição kármica

Mas a notícia boa no caso é para a indústria da “Defesa” dos EUA que, no Iraque, está alcançando estado de perfeição kármica. As armas que venderam aos EUA uma vez, estão sendo destruídas por outras armas que também venderam aos EUA, e, claro, terão de ser repostas. UAU! É situação de ganha-ganha para quase todo mundo!

Dezenas de Humvees "Made in USA" capturados pelo ISIL
Não é por falta de aviso

Os EUA sabiam que o ISIL controlava os Howitzers desde pelo menos meados de julho. Mas não significa que já não se pudesse prever, desde muito antes de meados de julho, o que viria. Chris Coyne, professor de economia do Mercatus Center na George Mason University,  em entrevista que me concedeu, previu exatamente esse cenário, muito antes, neste verão:

Chris Coyne
O governo dos EUA forneceu quantidades significativas de equipamento militar ao governo do Iraque, com a intenção de que fosse usado para o bem (segurança nacional, policiamento, etc.). Mas durante a ofensiva do ISILmuitos iraquianos fugiram, deixando para trás todo o equipamento fornecido pelos EUA. O ISIL prontamente passou a mão em tudo e agora está usando o mesmo equipamento como parte do esforço mais amplo de ofensiva, em que estão empenhados. Essa catarata de armas pode alterar ainda mais a dinâmica na Síria. E agora o governo dos EUA quer fornecer ainda mais equipamento militar e armas ao governo iraquiano, para combater o ISIL.

Mas ainda não ouvi muita gente reconhecendo isso, muito menos discutindo a questão, as potenciais consequências negativas de fazer o que os EUA estão fazendo. Como sabemos se as armas e equipamentos militares serão usados para os fins que nos interessam? E se quem recebe vira as costas e deserta e deixa todas as armas para o inimigo? E se as armas são roubadas? Em resumo, o que nos leva a confiar que equipamento militar que fornecemos a um ou outro país não levará um ou outro governo disfuncional e inefetivo a usá-lo para suas próprias finalidades, no Iraque ou em área mais ampla?


[*] Peter van Buren é um ex-funcionário do United States Foreign Service que escreveu os livros: Tom Joad Ghosts: A Story of the # 99% e We Meant Well: How I Helped Lose the Battle for the Hearts and Minds of the Iraqi People. Nasceu em New York (1960); é um veterano com 24 anos de serviços prestados ao Departamento de Estado dos EUA. Passou um ano no Iraque. Depois de seu segundo livro,We Meant Well: How I Helped Lose the Battle for the Hearts and Minds of the Iraqi People, tornou-se altamente crítico dos Provincial Reconstruction Teams no Iraque e por esta razão o Departamento de Estado iniciou um processo contra ele. Através dos esforços do Government Accountability Project e da ACLU, Buren aposentou-se do Departamento de Estado com todos os benefícios inerentes. 
Desde que deixou o governo, tornou-se comentarista político e seus comentários foram destaques no The New York TimesSalonNPRAl JazeeraHuffington PostThe NationTomDispatchAntiwar.comAmerican Conservative MagazineMother Jones,  Michael Moore.comLe MondeAsia TimesThe Guardian (Reino Unido), Daily KosMiddle East OnlineGuernica e outros. Foi entrevistado em várias estações de TV como a BBC World Service, NPR’s All Things Considered and  Fresh AirCurrentTV,  HuffPo Live,  RT – Rússia Today,  ITVBritain’s Channel 4 Viewpoint,  CCTV,  Voice of America, e  muito mais.

Um comentário:

  1. É o Complexo Industrial-Militar como diz uma popular giria literalmente bombando.

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