31/3/2015, [*] Asa Winstanley, Middle East Monitor
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
A face real do TERRORISMO |
Arábia Saudita e Israel são as duas influências mais maléficas, ativas hoje em todo o Oriente Médio. Numa região assolada por ditaduras (quase todas elas apoiadas pelo “ocidente”), esses dois regimes destacam-se pela forte influência que exercem; são o que chamei de “a contrarrevolução permanente”.
Israel é regime de apartheid, que institucionaliza o racismo exercido contra o povo nativo da Palestina, expulsa palestinos sempre que pode e vive de fazer guerras sangrentas, infindáveis, sempre de agressão e ocupação contra os mesmos palestinos e outros povos da região. Israel governa pela força milhões de palestinos em Gaza e na Cisjordânia, que não votam em eleições democráticas, nem têm qualquer outro espaço para fazer ouvir o que pensam sobre o regime de ocupação, totalmente antidemocrático, que os oprime.
Arábia Saudita é monarquia absolutista que nem finge que realiza eleições de qualquer tipo. Os dois regimes são bastante diferentes em vários sentidos, mas muito semelhantes em alguns aspectos chaves. Os dois são conhecidos abusadores de direitos humanos. Embora por vias diferentes, os dois regimes são erguidos sobre fundamentalismos religiosos incorporados no coração das respectivas instituições do estado. E os dois têm feito tudo que encontraram ao alcance para destruir e sequestrar os levantes democráticos que eclodiram por todo o mundo árabe em 2011.
Os dois regimes são incensados nas capitais ocidentais. E os dois vivem de invadir países vizinhos e iniciar guerras de agressão – embora Israel o faça muito mais frequentemente.
E assim chegamos ao Iêmen, onde a Arábia Saudita, apoiada por outros déspotas regionais, acaba de lançar mais uma guerra de provocação assassina.
Desde 2011, o Iêmen assistiu a levante popular massivo contra o regime ditatorial e corrupto de Ali Abdallah Saleh, apoiado pelo governo dos EUA. Até que, quando seu próprio exército trocou de lado e passou a apoiar os manifestantes, em fevereiro de 2012, Saleh foi obrigado a entregar o poder ao seu vice-presidente Abdrabbuh Mansour Hadi.
Ali Abdallah Saleh (E) e Abdrabbuh Mansur Hadi |
Naquele mesmo mês de fevereiro/2012, em eleições-farsa, nas quais aparecia como candidato único, Hadi obteve 99,8% dos votos – resultado de causar inveja a qualquer Saddam Hussein.
Essa transferência de poder jamais foi aceita por muitos dos que haviam ido às ruas para protestar, nem pelo movimento dos houthis, grupo que há muito tempo mantém uma insurgência armada contra o governo central no norte do país. Incluindo vários membros da seita zaidista, relacionada ao Islã xiita, o movimento combate intermitentemente contra o governo central do Iêmen desde 2004.
Em 2010, os sauditas intervieram ao lado do governo e contra os houthis, que tomaram uma pequena porção do território saudita durante curto período de tempo. Basicamente, os houthis encurralaram o exército saudita, que foi obrigado a retirar-se; mesmo assim, se proclamou vitorioso.
Depois de meses de protestos pacíficos, não armados, organizados pelos houthis e contra o governo de Hadi, outro levante armado dos houthis em 2014 levou à captura de grandes partes do território iemenita. Em janeiro de 2015, Hadi renunciou, mas, antes, entregou uma carta de renúncia. Agora, voltou a apresentar-se como presidente legítimo. Os houthis, enquanto isso, anunciaram que a presidência passaria a ser exercida por um conselho, ao qual caberia negociar o futuro político do país.
Hadi fugiu da capital para Aden, porto no sul, que foi declarada, por alguns dias, capital do Iêmen, antes de que o movimento dos houthis começasse a avançar no sul. Como o ditador tunisiano Zain al-Din Ben Ali antes dele, Hadi também fugiu para a Arábia Saudita, exatamente quando os sauditas começaram a bombardear o Iêmen, semana passada. E lá continua, fingindo que “legitima” a agressão saudita contra o Iêmen.
Mahmoud Abbas, "Autoridade Palestina" |
Outras forças contrarrevolucionárias na região também apoiam a agressão dos sauditas contra o Iêmen: o líder da Autoridade Palestina (e fantoche de Israel) festejou o ataque contra o Iêmen e até sugeriu que ataque semelhante de regimes árabes poderia acontecer contra a Faixa de Gaza, governada pelo Hamás, movimento da resistência islâmica.
Muito se tem falado e escrito sobre um suposto “aspecto sectário” do conflito – mas se trata sempre de grosseiro exagero. A verdade é que a Arábia Saudita é o pior dos agitadores sectários em toda a região (só comparável, na violência sob pretexto religioso, a Israel), e fala nos termos mais agressivos contra o Irã (que a Casa de Saud acusa de estar apoiando os rebeldes houthis).
Mas nada disso significa conflito sectário; a guerra contra o Iêmen é guerra dos EUA, de disputa por poder e pela hegemonia política sobre o mundo; e é guerra também da Arábia Saudita, de disputa pela hegemonia regional (a Arábia Saudita é ditadura cliente chave dos EUA).
Como a Reuters noticiou em janeiro, a rebelião houthi estava aproximando-se perigosamente de ministérios do governo que trabalhavam em íntima convivência com conselheiros militares e agências de espiões norte-americanos. Para o poder imperial, já não era sustentável a situação em que o poder imperial estava sendo tão gravemente ameaçado na região (e pouco importa que as operações do mesmo poder imperial estivessem levando à morte muitos civis iemenitas, vítimas de ataques dos drones).
Hassan Nasrallah, Secretário-Geral do Hezbollah |
Em discurso na 6ª-feira (27/3/2015), Hassan Nasrallah, Secretário-Geral do Hezbollah (movimento da resistência libanesa contra a ocupação israelense) reagiu contra a guerra saudita no Iêmen em termos extraordinariamente fortes:
A verdadeira razão [para a guerra contra o Iêmen] é que a Arábia Saudita perdeu o controle e o domínio que tinha no Iêmen; o objetivo da guerra é restaurar o controle e a hegemonia dos sauditas sobre o Iêmen. Ponto final.
Usualmente, Nasrallah em seus discursos fala em termos velados ao criticar ditaduras do Golfo Árabe, com eufemismos diplomáticos como “alguns governos árabes”. Mas dessa vez não arrastou prisioneiros e atacou frontalmente o regime saudita, acusando-o de ter criado o Estado Islâmico (também conhecido como ISIS ou ISIL) e de ser responsável pelos carros bombas que atormentaram o Iraque durante muitos anos, com civis iraquianos de todas as seitas mortos.
Também criticou os sauditas por jamais terem levantado um dedo para ajudar a Palestina e zombou do nome da campanha de bombardeio contra o Iêmen (“Tempestade Decisiva”). Disse que desde que Israel foi criado em 1948 “nunca houve nem tempestade nem, sequer, alguma brisa que fosse decisiva” para ajudar os palestinos contra a limpeza étnica e as agressões que sofrem dos israelenses.
Nasrallah disse que os sauditas sofrerão “derrota humilhante” ante os iemenitas, se não aceitarem que o conflito político que há no Iêmen seja discutido e superado mediante negociações e diálogo. “A história mostra que invasores e ocupantes sempre são derrotados”.
Bombardeio diuturno da Arábia Saudita |
Na 2ª-feira (30/3/2014), bombas sauditas assassinaram pelo menos 40 pessoas num campo de refugiados no norte do Iêmen.
E assim chegamos a mais uma semelhança entre a Arábia Saudita e Israel. Os sauditas foram derrotados uma vez, em 2010, pelos houthis. Os israelenses foram contidos no verão passado, em Gaza, pelo Hamás. Os dois exércitos – o saudita e o israelense – são muito pouco eficazes em guerras de chão, contra combatentes locais que lutam para defender a própria terra. Só são eficazes numa única coisa: cometer crimes de guerra contra civis, sempre com armas ultra tecnológicas.
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[*] Asa Winstanley, nascido no sul do País de Gales, é um jornalista investigativo que vive em Londres, que escreve sobre a Palestina e no Oriente Médio. Visita regularmente a Palestina e a Cisjordânia ocupada desde 2004.
Escreve para o site de notícias palestina premiado The Electronic Intifada, onde ele é um editor associado. Mantém coluna regular no Middle East Monitor.
Escreve para outras publicações incluindo: Al-Akhbar (Líbano), Middle East Eye, The National, Jacobin, Ceasefire Magazine, New Left Project, Jerusalem Media and Communications Centre, Morning Star e Free Morning Star e Freedom.
Contribuiu com um capítulo de livro para Israel e Gaza: Behind the Media Veil, publicado pelo MEMO em 2014. Junto com Frank Barat, foi editor de Corporate Complicity in Israel's Occupation (Pluto Press) uma coleção de provas escritas e faladas de Sessões do Tribunal Russell, de Londres, sobre a Palestina .
É membro da National Union of Journalists.
Recebe e-mails em: mail@asawinstanley
Twitter: @asawinstanley
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