Por *Jair Alves
Ao engenheiro civil, Alberto Goldman, Governador do Estado de São Paulo
Neste 21 de setembro último, dia em que o metrô da Capital Paulista parou, finalmente o senhor saiu do ostracismo e a população pode perceber, enfim, que tinha um governador, já que governo ela sabe que não pode contar.
Descobriu, ainda, que ele se chama Alberto, e não Geraldo; muito menos José.
Em sua fala de aparição, utilizando-se de sua tradicional ironia (ou seria cinismo?) disse que iria chamar a polícia para investigar outras possíveis causas, desse lamentável acidente. Correção - a situação requer a Defesa Civil, e não a polícia para “investigar”, e tumultuar, aumentando ainda mais o caos e o abandono onde se encontra esse “estado-locomotiva”; assim como gosta de denominar determinado setor, dominante. E, por falar em Defesa Civil, parece que ela só existe para coordenar a Campanha do Agasalho que, paradoxalmente, pode ter sido uma dessas peças doadas o gatilho dessa confusão.
Caso de polícia (bom que se diga) é a situação em que se encontram os usuários no seu direito inalienável de ter um transporte, público, eficaz e seguro.
Falemos, então, do rotineiro e dos problemas permanentes; e não de situações excepcionais.
A qualquer hora do dia pode ser excitante (para quem gosta de esfregação), entrar em um vagão da linha azul e, principalmente, vermelha.
Falta espaço, sequer, para mover os braços. Falo isso porque sou usuário diário desse transporte, empurrado que fui (como a maioria da população) a morar há trinta quilômetros do centro da Capital.
Faltou competência e sobrou fantasia aos dirigentes da política paulista, nesses anos de democracia, principalmente no que diz respeito ao planejamento de um desenvolvimento econômico inevitável.
Faltou planejamento, por exemplo, para conduzir este desenvolvimento que aumenta, aritmeticamente, o fluxo de usuários.
Por que não promover políticas públicas de crescimento urbano equilibrado, investindo maciçamente para fixar o trabalhador próximo ao seu local de trabalho? Mas tudo isso faz parte de um cardápio de políticas sociais e econômicas, as quais o senhor não está disposto discutir.
Por outro lado, está querendo mesmo falar de política que é o seu ganha-pão, então, falemos.
Ouvi o seu nome pela primeira vez, há muitos anos, quando o senhor atuava pelo antigo Manda Brasa, na Assembléia Legislativa Paulista, e bem próximo dali um amigo seu, o jornalista Vladimir Herzog, ainda sequer tinha sido torturado e posteriormente morto, na Rua Tutóia.
Com a sua tradicional ironia (ou seria cinismo?), hoje o senhor faz chacota da sua própria história.
É o que fizeram, também, seus amigos que se safaram da caça às bruxas, em 75 e 76.
No dia de ontem (22 de setembro), lançaram um manifesto sobre a Liberdade de Imprensa, lançando mão justamente da figura clássica de Vlado enforcado, pendurado num vitraux (não confundir com metrô).
Quando fala que vai chamar a polícia (por sinal, frase muito usada entre os seus, ultimamente), inevitavelmente penso nesses episódios do passado, embora sem ironia, e vejo que não se pode brincar com a liberdade de um povo, muito menos com a ira dos injustiçados.
Faço questão de lembrá-lo de um parco texto, de Maquiavel, sobre a ira incontrolável da população.
O texto diz que a ira da revolução é como um rio em tempos de cheia, desconhece diques e barreiras, levando tudo de roldão.
Isso me fez lembrar àqueles usuários dentro dos vagões, espremidos e sufocados pela ausência de ar, sem qualquer tipo de orientação, a não ser esta, após o acontecido, aonde o senhor insinua (na sua ironia), ser uma ação planejada. E por falar em ironia (ou seria cinismo?), ainda há pouco tempo produziu outra chacota sobre a comparação do ex-operário, Lula, quando este dizia que estava sendo perseguido pela imprensa, da mesma forma que Getúlio Vargas, durante o seu último governo.
Emblemática a sua rara intervenção pública, naquele momento, quando disse que “Lula não conhece a enormidade da pressão sofrida por Getúlio, encabeçada pela UDN”.
Agora, está mais ou menos claro o subtexto desta sua intervenção, algo parecido com “espere e verá, na campanha de 2010, o que a imprensa vai inventar a respeito do seu governo”!.
Mas falemos um pouco mais de política. O competente jornalista Vladimir Herzog foi assassinado, não como comunista (morreu pela ameaça que ele representava, por dizer a verdade nua e crua) porque era peixe pequeno dentro do partido, talvez, apenas um simpatizante. O senhor, diferentemente, atuava dentro do Manda Brasa, mas, de fato, era um dirigente comunista, tanto que mais tarde, nos primeiros passos da Democracia, na campanha pela escolha dos deputados que comporiam a Constituinte, o senhor concorreu pelo Partidão, e não foi eleito. Aliás, nenhum comunista foi eleito, naquela oportunidade. Quanto ao senhor, escorraçado pelas urnas, voltou ao agora PMDB paulista de onde saiu para compor a elite paulistana.
Os seus “correligionários” reclamam que o seu partido não tem capilaridade.
Veja que não estamos falando da falta de cabelo da maioria dos seus dirigentes, e sim da falta de lastro com a maioria da população; mas esse não é o único mal, tem muito mais.
Eu e você, caro governador, não só falamos línguas diferentes, como também vemos o mundo de outro ângulo.
Nunca engoli a propaganda sobre o metrô, até poucos meses atrás, veiculado insistentemente pela tevê, quando o seu governo prometia ser possível fazer um trajeto em quarenta minutos, entre o centro de Santo André (por que esta obsessão por Santo André?) e o espigão da Avenida Paulista. Toda vez que me dirigi ao HC, na expectativa de longínqua Ressonância Magnética (oito meses de espera) ou de uma Audiometria (onze meses de espera) utilizando a linha verde, morria de raiva ao perceber que a referência de seu governo é a Avenida Paulista, e não a linha vermelha que vai do Palmeiras até o Corinthians.
Para finalizar, eu o convido para viajarmos, juntos, num trajeto que vai do Paraíso, com uma pequena escala na Sé, em direção ao ponto final. Nem será preciso ser no horário de pico, Mas não leve segurança, leve um enfermeiro, pois a sua delicada saúde pode correr risco.
Se sobreviver, não se preocupe, a Democracia também sobreviverá.
*Jair Alves - dramaturgo - paulista