Praça Tahrir à noite de 27/11/2011 |
Publicado em
27/11/2011 por Mário
Augusto Jakobskind
Os
egípcios voltaram às ruas para manifestar oposição aos militares que tentam se
perpetuar no poder depois da derrubada de Hosny Mubarak. Foram duramente
reprimidos no que resultou em mais de 30 mortos.
Os
militares, na verdade “militares s.a”, porque controlam setores mais lucrativos
da economia egípcia, imaginavam que com alguns paliativos conseguiriam iludir o
povo que derrubou Mubarak. O povo mostrou que não é bobo.
Como
se o controle da economia pelos militares não bastasse, o Estado egípcio é
contemplado com mais de 1,2 bilhão de dólares anuais pelos Estados Unidos,
exatamente para manter o principal país árabe em sua área de influência. Os
militares pediram desculpas pela repressão, mas não se comprometeram a abandonar
o poder mesmo depois das eleições, até porque temem perder as bocas conquistadas
nas últimas décadas.
É
este verdadeiramente o contexto egípcio, que não pode ser ignorado e para que se
julgue o pronunciamento quase diário de líderes ocidentais como Nicolas Sarkozy
e Barack Obama ora em apoio às “reformas” (entre aspas mesmo) ou até mesmo nas
eventuais críticas à violência. O nome disso é hipocrisia.
Em
suma: palavras são palavras, mas a prática é que determina a verdade. Por estas
e muitas outras, a chamada Primavera árabe só pode ser considerada primavera se
prevalecer a vontade do povo. Com o controle dos militares s.a. no Egito, o
outono prevalece, não mais a primavera.
Enquanto
isso, na Líbia, o governo que tomou o poder com a derrubada de Muammar Kadafi,
está preparando um espetáculo midiático que antes de começar já se sabe qual
será o desfecho. Não é preciso nenhuma bola de cristal para prever que Saif al
Islam Kadafi será condenado à morte pelas acusações que serão apresentadas no
julgamento. O governo líbio avisou que não o entregará ao Tribunal Penal
Internacional de Haia. Estão preparando um novo show midiático que será
apresentado ao mundo e internamente.
O
filho de Kadafi foi preso no deserto quando tentava ir para Niger. A prisão só
foi possível graças à delação de um integrante de sua guarda pessoal,
devidamente recompensado com 1 milhão de euros, segundo
informações.
Por
ironia da história, Saif al Islam foi o responsável pela anistia de integrantes
da al Qaeda que cumpriam pena na Líbia, inclusive o que posteriormente veio a se
tornar o comandante militar do grupo que tomou Trípoli e produziu um espetáculo
midiático ao entrar no local onde vivia Kadafi. Saif era cotado como o sucessor
político do pai.
Resta
agora aguardar o desenrolar dos acontecimentos para conhecer melhor como será a
Líbia, o país com o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do continente
africano (0,755), superior inclusive ao do Brasil (0,699).
Aguarda-se
também constatar se esse índice utilizado pelas Nações Unidas para verificar
como se encontra um país em termos de bem-estar de sua população será mantido. O
tempo dirá.
Já
em Portugal...
Em
Portugal, o socialista Mario Soares, 86 anos, que já exerceu os mais variados
cargos, de presidente a primeiro ministro, reapareceu assinando um manifesto
conclamando o povo a reagir ao neoliberalismo que está sendo imposto goela a
dentro aos portugueses. Os trabalhadores, como em outras partes da Europa,
reagem com uma greve geral, enquanto a mídia de mercado faz a apologia dos
“técnicos” impostos pelo capital financeiro.
Por
aqui a mídia não é muito diferente, embora a crise ainda não tenha aparecido com
a intensidade dos países europeus e dos Estados Unidos. Os articulistas de
sempre torcem desbragadamente por soluções contrárias aos interesses nacionais e
do povo. Silenciam totalmente sobre um grave problema que vem se arrastando há
anos, o da dívida pública. São 1 bilhão de reais por dia gastos para o pagamento
dessa dívida. E nada comentam sobre o que está na Constituição cidadã de 1988 e
não foi cumprida até hoje: a realização de uma auditoria dessa
dívida.
Na
Quarta-feira...
Na
quarta-feira, 23 de novembro, por iniciativa do Deputado Paulo Ramos (PDT), a
combatente latino-americana Soledad Viedma, assassinada pela ditadura
brasileira, recebeu a Medalha Tiradentes pós morte, entregue à filha
Ñasaindy.
Paraguaia
de nascimento, Soledad engajou-se na luta dos povos contra o autoritarismo e
injustiças sociais. Esteve no Uruguai e em determinado momento foi vítima da
violência de grupos de extrema direita, que ao detê-la queriam que fizesse uma
saudação a Hitler. Soledad se negou a fazê-lo e teve pintada uma suástica em
parte do corpo, além de ter sofrido atos de violência
física.
O
poeta e escritor uruguaio Mario Benedetti a homenageou com um poema musicado
pelo cantante e compositor Daniel Viglietti.
Em
Recife, na década de 70, a equipe de bandidos do delegado
Sergio Fleury a matou depois de ter sido delatada por Anselmo dos Santos, o
agente da CIA que ganhou o título de cabo da Marinha sem
sê-lo.
A
solenidade na Alerj foi importante não apenas como reconhecimento a Soledad
Viedma como também para que as novas gerações sejam informadas sobre quem lutou
para que o Brasil alguma dia pudesse ser um país mais justo e
solidário.
E,
não podemos deixar de dizer sempre que crimes contra a humanidade cometidos de
64 a 85,
que a recém-criada Comissão da Verdade vai investigar, são imprescritíveis. E
isso, apesar de a lei de anistia promulgada ainda no período da ditadura e por
pressão de grupos que nunca foram julgados, dizer ao
contrário.
Mário
Augusto Jakobskind é
correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do
Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da
Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor,
entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes -
Fantástico/IBOPE
Enviado
por Direto
da Redação
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