Delfim Neto
Comentei, num trabalho recente, que a dificuldade que persiste nas economias mais desenvolvidas para se recuperarem da crise é a descrença das pessoas na capacidade de seu governo de convencer o setor privado a investir na produção e a voltar a gerar empregos.
Poucos países elegeram, como primeiro objetivo de enfrentamento da crise, a salvação do maior número de empregos no prazo mais curto possível, como fez o Brasil.
Foi o que deu confiança ao trabalhador, encorajou o empresário a enfrentar a overdose de risco daqueles momentos e manteve o consumidor no circuito econômico.
A maioria dos países comprometeu o que podia e o que não podia na correria para apagar os incêndios no sistema financeiro, algo que se pode compreender, mas não justifica retardar por tanto tempo (dois anos de crise, praticamente) o suporte ao setor real da economia.
O exemplo dos Estados Unidos é o que mais surpreende e sob muitos aspectos decepciona, por se tratar da economia com maior know-how de crise dos tempos modernos.
A atual não difere muito da maior de todas elas (a Grande Depressão de 1929), igualmente produzida pelas "falhas" do mercado financeiro, tornadas possíveis pelas "falhas" dos governos que deixaram de cumprir seu papel regulador.
A "crise" é simplesmente a interrupção do "circuito econômico" produzida por uma incerteza generalizada e pela perda de confiança dos agentes: os banqueiros suspendem seus empréstimos entre si e aos clientes; os consumidores param de consumir porque não têm certeza de que continuarão empregados e os empresários param de produzir e de investir porque têm medo de ver caírem as vendas e aumentarem seus estoques sem que possam financiá-los.
A superação da crise envolve o restabelecimento da confiança, de preferência iniciando pela economia real da produção: os empresários que mantêm o nível da produção, que sustenta os níveis de emprego e o consumo dos trabalhadores.
Quem começou por aí (e foram uns poucos) se deu bem. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo.
Nos Estados Unidos, o presidente Barack Obama fez algumas tentativas na direção de impedir o aumento do desemprego, mas hoje o veem como tendo agradado mais o setor financeiro do que os setores da produção.
Ele gastou boa parte do seu patrimônio político fazendo o Congresso aprovar medidas importantes (busca de energia renovável, saúde, setor financeiro etc.), mas tem perdido o apoio da sociedade.
A verdade é que ele não conseguiu restabelecer a "confiança" do setor privado. A maior prova disso é a existência de mais de dois trilhões de dólares na caixa das empresas não-financeiras aplicados em títulos públicos, não da produção e no aumento do emprego.
Hoje os EUA têm cerca de 27 milhões de desempregados: 14,6 milhões à procura de emprego, 6,4 milhões dos quais há mais de 6 meses; 8,6 milhões que trabalham em tempo parcial; 2,6 milhões que executam tarefas aleatórias ("biscates") e 1,2 milhões que já desistiu de procurar emprego.
Pesquisas mostram que a aprovação da "obamanomics" não é hoje maior do que 30%. Isso ocorre basicamente por conta da fraqueza da recuperação do nível de emprego. Hoje sete em cada dez americanos consultados veem no desemprego o maior problema da economia e têm dúvidas que ele vai melhorar.
Fonte: DCI - de olho na notícia Autor: Delfim Neto
Extraído de SEEB- Garanhuns