sábado, 3 de setembro de 2011

Manifestações em Israel contra a carestia... E silêncio sobre direitos dos palestinos

31/8/2011, TRNN (The Real News Network
(vídeo e transcrição traduzida das falas)
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu

 
LIA TARACHANSKY, TRNN: Sou Lia Tarachansky, com The Real News em Telavive, onde, pelo quinto fim de semana seguido, dezenas de milhares de israelenses encheram as ruas.

Semana passada, numa conferência de imprensa, manifestantes do coração do movimento de massas distribuíram aos jornalistas rascunho de uma lista de suas reivindicações. Reivindicam reformas tributárias, fim das políticas de privatização, assistência médica, moradia e educação públicas. Mas antes de a lista ser distribuída à imprensa, foram removidas reivindicações já discutidas e aprovadas relacionadas aos cidadãos palestinos-israelenses. Fala aqui o jornalista David Sheen, do jornal Haaretz.

DAVID SHEEN: Foram removidas da relação várias reivindicações que se referiam a minorias. O que você acha disso?

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Acho que o movimento começou por causa da carestia. Chamam de movimento social, mas acho que é movimento econômico. O fato de a oportunidade estar sendo aproveitada... tipo... falar da ‘minha comunidade etíope’, ou outras... é excelente oportunidade.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): As reivindicações da lista não foram discutidas. Alguns líderes do movimento escreveram aquela lista. Não foram aprovadas por todos.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas.): Educação, saúde, sistema mais justo de impostos, moradia. Já tivemos tudo isso.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Sim, mas era estado do bem-estar só para os judeus, basicamente. Muitas outras comunidades não participavam.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Temos de entender que movimentos de protestos vêm como ondas, e quando a onda vem e só quer focar um estado de bem-estar para todos – aliás, havia árabes em todos as manifestações, o que achei excelente. Infelizmente, nada excelente, é que também havia colonos nas manifestações. Não aprovei, mas estão aqui. Quando vem a onda, não posso dizer aos jovens o que devem fazer, como se comportar. Queriam juntar muita gente nas manifestações, para protestar.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): E conseguiram.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Se só aparecessem 20 mil, em vez de 300 mil, não funcionaria.

TARACHANSKY: Joseph Dana é jornalista da revista +972 Magazine. Em artigo com o blogueiro norte-americano Max Blumenthal, Dana critica os movimentos de protesto social em Israel por não se manifestarem contra a ocupação, por Israel, dos territórios palestinos. Analisa a história por trás das políticas separatistas de Israel ao longo da última década. Diz que levaram à construção do muro da separação na Cisjordânia. Dez anos de separação não apenas tornaram os palestinos invisíveis, em sentido físico; também apagaram os palestinos da consciência dos israelenses.

JOSEPH DANA, +972 MAGAZINE: Os palestinos, em termos de segregação no plano legal, vivem o que se pode chamar, no contexto norte-americano, de “discriminação institucionalizada” [estado de apartheid]. Há várias leis no governo de Israel sobre a propriedade da terra e distribuição de recursos, que especificamente discriminam os palestinos que também são cidadãos de Israel.

DAVID SHEEN: Você disse que havia lido a mais recente lista de demandas publicada essa semana. Quer comentar aquela lista, algo que lhe tenha parecido melhor, ou não tão bom?

NÃO IDENTIFICADO: Não. Achei a lista muito impressionante. Estamos avançando. Está tudo lá, praticamente tudo que...

TARACHANSKY: Se esse movimento crescer, será o maior movimento e o primeiro desse tipo em Israel. Você vê algum modo de incluir o tópico que, afinal, você sabe... do qual depende a sobrevivência de metade da população entre o rio e o mar?

NÃO IDENTIFICADO: Acho que não há como... Não há saída. Às vezes alguém tem de dizer alguma coisa sobre isso... Mas tem de ser aos poucos.

SHEEN: Aos poucos.

NÃO IDENTIFICADO: Se acontecer muito depressa, vai [incompreensível] tudo. Porque as pessoas estão aqui porque a vida está difícil, tudo muito caro, e as pessoas estão tentando descobrir outros modos de sobreviver aqui.

NÃO IDENTIFICADO: Perguntei a Dana por que o movimento de protesto social não tocou no problema da ocupação, pelo menos do ponto de vista econômico. Os israelenses pagam mais de 9 bilhões de dólares por ano para financiar as colônias exclusivas para judeus na Cisjordânia, mas os lucros vão para as mesmas mãos privadas que centralizam todo o controle sobre a economia de Israel contra a qual o movimento se opõe.

DANA: É muito verdade. E infelizmente ainda não vi isso dito, com clareza, do modo como se deve dizer em manifestações desse tipo. Estamos falando exatamente sobre isso. Por que não se discutem as coisas nesses termos que você acaba de expor, por que essa questão que você expôs não é abertamente discutida, porque não há matérias nos jornais sobre isso e por que os manifestantes das tendas na praça não estão organizados em torno dessa ideia?

NÃO IDENTIFICADO: Achamos que há um ‘princípio da separação’, uma barreira, que impede que se conectem o movimento que está nas ruas em Telavive e os que montaram as tendas e isso que você acaba de expor tão claramente.

TARACHANSKY: O Real News também conversou com Muhammad Jabali, ativista que parte do movimento social ajudou a iniciar as tendas de protesto em Jaffa, que é cidade mista, palestino-israelense.

MUHAMMAD JABALI (ativista, fundador da ‘cidade das tendas’ em Jaffa): No início desse movimento, as pessoas ouviram diferentes opiniões e pensaram, talvez pela primeira vez, sobre questões que não aparecem no discurso diário em Israel. O movimento não está conseguindo escapar do discurso sionista, para o qual a democracia seria privilégio só dos judeus.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas.): Como se os direitos que se defendem aqui estivessem sendo defendidos para todos os cidadãos.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): É. Por um lado, trata-se de igualdade, e por outro lado, é um estado só para os judeus. Mas não se podem dizer essas duas coisas, numa frase só.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Parece então que é preciso não dizer uma coisa, ou outra?

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): É preciso excluir a outra.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Qual delas?

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Se você quer igualdade, não pode falar de privilégios só para os judeus. Se você quer um estado só para os judeus, não pode falar de igualdade.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Sobre isso, exatamente, há uma nova proposta de lei – exatamente sobre isso –, apresentada por Ze'ev Elkin, deputado do Likud, e se for aprovada...

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Se é deputado do Likud, provavelmente não fala de “igualdade” e só fala de “judeus”.

NÃO IDENTIFICADO (Legendas traduzidas): Isso. Exatamente isso. E a língua árabe deixará de ser língua oficial em Israel.

DANA: ... esse movimento descentralizado, até agora, tem dito muito, muito explicitamente, que não que discutir a ocupação, não quer discutir o princípio da separação e não quer discutir direitos de justiça social para todos que compõem a sociedade israelense. Acho isso muito significativo.

JABALI: Os projetos municipais para as cidades árabes são os problemas mais críticos do estado israelense.

TARACHANSKY: Mas os manifestantes dizem que essas são questões políticas...

JABALI: Pior ainda que isso, eles não se manifestam contra essas questões. Sequer rejeitam os planos que já existem. Por exemplo, [o ministro Eli] Yishai publicou um plano para Harish, que cria uma nova cidade só para judeus ortodoxos, e todos os que protestaram contra o plano só falam de a cidade ser proibida para judeus seculares. Nenhum movimento protesta contra o fato de que, basicamente, é a mesma política de só oferecer soluções de moradia para judeus, com impostos pagos por todos os que vivem em Wadi Ara e no setor árabe.

DANA: Essa semana estamos numa encruzilhada crucial, porque as manifestações esvaziaram-se. Não foi muito grave, mas houve um ataque terrorista no sul, e uma escalada da violência contra Gaza.

TARACHANSKY: Nesse fim de semana, houve mais um ataque terrorista.

DANA: O movimento não está conseguindo trazer o mesmo número de pessoas às ruas, depois dessas coisas. Dizem que no sábado haverá um milhão de pessoas. Acho que será momento decisivo.

TARACHANSKY: Os manifestantes convocaram o que esperam que seja a primeira marcha de um milhão de manifestantes em Israel. Muitos preveem que será grande avanço, se o movimento conseguir acumular energia para crescer.

Um comentário:

  1. (comentário enviado por e-mail e postado por Castor0

    Tsc, tsc... parece que eles entraram na lorota de que judeu é "povo"... Então cristãos também são "povo", protestantes são "povo", ateus são "povo". Aí poderemos até falar em evangélicos seculares...

    Eta pessoalzinho mais desinformado! Não consegue nem perceber que a ocupação da Palestina é a responsável pela "carestia" da classe média israelense!

    Baby Siqueira Abrão

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