Publicado em 25/09/2011 por *Mário Augusto Jakobskind
A Câmara dos Deputados aprovou a Comissão da Verdade depois de um acordo generalizado com todas as correntes políticas e muito mais ainda nos bastidores. Do jeito que está posta, a Comissão corre o risco de se tornar uma Comissão de meia verdade ou mesmo de mentira.
Ela terá dois anos para realizar seu trabalho. Sete integrantes serão escolhidos para levar adiante o que se propõe e mais 14 servidores auxiliarão nos trabalhos. Já se fala que um dos indicados poderá ser Fernando Henrique Cardoso, pode-se imaginar o resto. Além do mais, sabe-se lá por qual motivo, ficou estabelecido que serão apurados (ou “apurados” entre aspas) as violações dos direitos humanos entre 1946 e 1988, um tempo muito extenso, quando o o motivo da criação da Comissão são os fatos graves ocorridos a partir do golpe civil militar de 1 de abril de 1964. A dotação orçamentária para o trabalho ficará por conta da Casa Civil
Em outros países onde aconteceram Comissões da Verdade, como no Uruguai, por exemplo, o número de investigadores era pelo menos cerca de 30 vezes mais e o tempo para o desenvolvimento do trabalho bem maior. Na África do Sul os acusados reconheciam publicamente os erros cometidos durante o regime do apartheid e assim sucessivamente.
No campo dos direitos humanos o Brasil ficou para trás, Enquanto nossos vizinhos já instalaram comissões do gênero há uns 20 anos, por aqui o parto foi difícil e pode estar nascendo algo para inglês ver, isso sem falar que ninguém será punido porque o Estado brasileiro entende que a lei da Anistia de 1979, sancionada em plena ditadura pelo último general de plantão, é a que vale.
Mesmo violações dos direitos humanos ocorridas depois da anistia assinada por João Batista Figueiredo não foram investigadas como deveriam ser e muito menos alguém foi punido. Os jornalistas argentinos Norberto Haeberger e Horacio Domingo Campiglia desapareceram no aeroporto do Galeão, hoje Tom Jobim, em 12 de março 1980, portanto depois da anistia. O mesmo aconteceu com Mónica Pinus Binstock, Lorenzo Ismael Viñas e o padre Jorge Oscar Adur, não no Rio, mas no Estado do Rio Grande do Sul.
Todos eles despareceram depois da promulgação da lei de anistia, de setembro de 1979, e no âmbito da Operação Condor. Os responsáveis não foram localizados e a impunidade prevaleceu. Nos casos em questão não se pode alegar como justificativa para a impunidade a lei da anistia.
O historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira, quando esteve preso no Cenimar (Centro de Investigações da Marinha), testemunhou a presença de agentes norte-americanos nas dependências daquele organismo da repressão. Quantos brasileiros passaram por lá e qual teria sido a participação de agentes estadunidenses?
E é preciso que os brasileiros saibam os nomes das empresas que finaciaram a repressão para ver que fim levaram as mesmas depois da democratização e se por acaso hoje bancam candidaturas nos pleitos nacionais e regionais.
São perguntas sem respostas até agora e uma Comissão da Verdade para valer poderia responder. Será que vai se ter oportunidade agora de se esclarecer tais fatos com a Comissão recém-aprovada na Câmara dos Deputados e que vai ser votada também no Senado?
Em termos de manipulação da informação, mais uma vez O Globo se supera. Em matéria sobre a participação do presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad na Assembleia Geral das Nações Unidas há um trecho assinalando que ele “voltou a por em dúvida o Holocausto”. Mas ao se ler o restante da “informação” do maior jornal do Rio, constata-se que não há referências à negativa propriamente da tragédia da II Guerra Mundial, mas sim o questionamento de se usar o Holocausto “para dar apoio a Israel na opressão contra os palestinos”.
Não é só Ahmadinejad que tem essa opinião, mas muitos outros que não questionam a existência do Holocausto e sim o seu uso político. É o caso do sociólogo estadunidense Immanuel Wallerstein e o linguista Noam Chomsky, dois importantes pensadores, inclusive de origem judaica.
Na verdade, a direita de Israel, cuja política levou o país ao isolamento, aproveita o sentimento de repulsa natural ao Holocausto para justificar a ação política que levou ao impasse com os palestinos. Figuras como o primeiro-ministro israelense Benyamin Netanyahu e o ministro do Exterior Avigdor Lieberman são exemplos mais notórios de truculência política que querem posar como vítimas, mas na verdade são algozes.
Mahmoud Abbas pediu na Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas o ingresso da Palestina como membro efetivo na entidade. Um pleito justo e que está atrasado no tempo mais de 60 anos. Como resposta obteve a negativa de Barack Obama e ameaças de Netanyahu.
O primeiro ministro israelense ocupou a tribuna da Assembléia e discursou de forma hipócrita falando em paz e negociações quando se sabe que cerca de 500 mil israelenses ocupam terras palestinas e impedem que o novo Estado seja criado.
Netanyahu mente, porque no fundo ele não quer a paz, ou melhor, quer a submissão dos palestinos em terras que sofram solução de continuidade, exatamente por causa dos assentamentos.
Aqui no Brasil, políticos sem bandeiras, como o senador e ex-motorista do guerrilheiro Carlos Marighela, Aloisio Ferreira Nunes, criticaram a presidenta Dilma Rousseff pela posição favorável ao pleito palestino. Se Dilma falasse ao contrário e se alinhasse com Barack Obama seria criticada pela oposição também. É o tipo de posicionamento de quem realmente não tem bandeira.
*Mário Augusto Jakobskind é correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
Enviado por Direto da Redação
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