domingo, 24 de junho de 2012

Hamás festeja "possível" vitória de Mursi, no Egito


21-27/6/2012, Khaled Amayreh (de Ramallah), Al-Ahram Weekly, n. 1103, Cairo
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu

ATUALIZAÇÃO às 11h30 de 24/6/2012: Mohamed Mursi, da Fraternidade Muçulmana, é declarado vencedor das eleições no Egito [CNN, pela televisão]

Khaled Amayreh
Os palestinos islâmicos, que acompanharam de perto durante a semana o desenrolar das eleições no Egito, reagiram com grande entusiasmo à possível vitória do candidato da Fraternidade Muçulmana Mohamed Mursi, sobre seu adversário secular, Ahmed Shafik, último primeiro-ministro do governo deposto de Hosni Mubarak.

Antes das eleições, dirigentes do Hamás limitaram-se a comentários apenas “diplomáticos” sobre os acontecimentos políticos no Egito, dizendo que se mantinham igualmente distanciados de todos os atores políticos na arena egípcia. Mas já era evidente, nas entrelinhas das declarações oficiais, o partido e o candidato preferidos do Hamás e de outros grupos islâmicos na região.

O Hamás é “filho” político da Fraternidade Muçulmana, com a qual sempre manteve laços estreitos e vitais. Alguns dos principais nomes do Hamás têm cidadania egípcia, como Mahmoud Al-Zahhar, cuja mãe é egípcia.

A mãe do presidente do Parlamento Palestino, Aziz Duweik, atualmente preso em Israel, sem acusação ou julgamento, também é egípcia, o que o qualifica para obter a cidadania egípcia, segundo leis recentemente aprovadas.

Muitos líderes políticos palestinos islâmicos também estudaram, graduação e pós-graduação, no Egito.

Em Gaza, palestinos distribuem doces, sob uma bandeira do Egito, 
frente a um cartaz com foto do candidato da Fraternidade 
Muçulmana no Egito, Mohamed Mursi.
Na Faixa de Gaza, centenas de jovens palestinos tomaram as ruas para celebrar a esperada vitória de Mursi, depois que o candidato da Fraternidade Muçulmana foi à televisão e declarou vitória nas eleições presidenciais. Outros distribuíram doces e trocaram abraços de congratulações.

É vitória da Palestina, tanto quanto vitória do Egito. Esperamos que, com presidente islâmico na chefe do maior e mais poderoso estado árabe, Israel terá de ser menos arrogante” – disse Mohamed Amr, ativista do Hamás em Hebron, no sul da Cisjordânia.

Estamos vivendo um terremoto político de proporções históricas. É a primeira vez que temos presidente islâmico em país árabe. Os efeitos psicológicos e a repercussão psicológica e política desse envento serão imensas, de longo alcance” – disse Amr.

Ismail Haniyeh
Ismail Haniyeh e Moussa Abu Marzouk foram os primeiros dirigentes do Hamás a congratular-se com a Fraternidade Muçulmana pela vitória. Ambos manifestaram esperanças de que o Egito, sob a presidência de Mursi, saberá assumir posição mais firme em relação a Israel.
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Haniyeh, primeiro-ministro do governo do Hamás em Gaza, saudou as eleições como “verdadeiro casamento democrático”; disse que espera que o Egito alcance logo a estabilidade política e a prosperidade econômica. Acrescentou que o povo palestino deposita grandes esperanças no triunfo da revolução egípcia.

O Hamás tem, de fato, boas razões para otimismo, com a ascensão da Fraternidade Muçulmana à presidência do mais importante estado árabe.

Para começar, o Hamás tem certeza de que o Egito, no governo de Mursi, não chantageará o grupo islâmico e os palestinos em geral, a aceitar acordos com Israel que não interessam aos palestinos, como tantas vezes aconteceu durante o reinado de Mubarak, quando o governo egípcio era usado – pelos EUA – como garrote, para obrigar a Autoridade Palestina a fazer concessões a Israel. De fato, a grande maioria dos palestinos sempre consideraram o governo de Mubarak mais como ameaça, do que como aliado da causa palestina. Os que acalentavam alguma esperança foram afinal desiludidas na campanha genocida de Israel contra Gaza, há mais de três anos (“Operação Chumbo Derretido”/ing.: Operation Cast Lead).

Em segundo lugar, o Hamás, que sofreu terrivelmente por causa dos esforços do governo de Mubarak para sufocar economicamente a Faixa de Gaza e, dentre outras medidas violentas, construiu um muro (profundo o suficiente para tentar bloquear a rede de túneis que atravessam a fronteira e é vital para o abastecimento da população da Faixa de Gaza) na fronteira Gaza-Sinai, espera que, com Mursi na presidência, estará acabada a “política” de cerramento das fronteiras e bloqueio a Gaza.

Em terceiro lugar, o Hamás espera que o Egito, doravante, passe a conectar seu compromisso com o Acordo de Paz de Camp David ao modo como Israel se relacione com os palestinos. Vários dirigentes da Fraternidade Muçulmana já se manifestaram favoráveis a essa conexão.

Em quarto lugar, o Hamás espera – e provavelmente já trabalha com essa possibilidade real, no planejamento estratégico dos próximos passos – que o Egito se mostrará mais atento e compreensivo em relação à posição do Hamás vis-à-vis seu adversário local, o Fatah.

Mohamed Mursi, vencedor - Fraternidade Muçulmana
No passado, o regime de Mubarak  sempre foi visto como tendencioso a favor do Fatah, nas conversações de reconciliação e de constituição da frente de unidade nacional palestina, patrocinadas pelo Egito.

O Fatah ainda não comentou oficialmente os resultados das eleições no Egito, à espera do anúncio oficial no Cairo. Porta-vozes do Fatah têm dito que o presidente Mahmoud Abbas não tem preferências em relação às eleições no Egito. Mas, entre os quadros intermediários e inferiores do Fatah, o sentimento era de consternação e, mesmo, de indignação, ante a possível vitória de Mursi. E comentário publicado na página internet do Departamento de Cultura e informação do Fatah dizia que “agora a Fraternidade Muçulmana será desmascarada”. (...)

O autor do comentário, Yehia Rabah, obviamente ignorava que a Fraternidade Muçulmana foi eleita e não usurpou qualquer direito que não lhe caiba por decisão dos eleitores. Rabah continua: “O exército é o único partido qualificado no qual os egípcios podem confiar para garantir a paz e a segurança”.

Secularista anti-islâmico, Rabah escreveu que o Egito sempre esteve “em melhores mãos” enquanto foi comandado com mão de ferro pelo exército, sem considerar as forças políticas populares. (...)

Quanto a Israel, a reação à eleição de Mursi foi sombria. Um deputado do Parlamento de Israel disse que “a chegada dos islamistas ao centro de poder no Egito é ameaça existencial mais grave a Israel, que as bombas atômicas do Irã”.

Alex Fishman, conhecido analista da política de Israel escreveu no jornal Yedith Aharonot, de grande circulação, que Israel terá de aprender a conviver com a perturbadora realidade de um governo hostil, no Egito, governado por islâmicos.

“Nenhum governo egípcio comandado por islâmicos eleitos conseguirá admitir que Israel continue a bombardear Gaza. O dia em que, com Mursi no governo do Egito, os aviões do Exército de Israel atacarem a Faixa de Gaza, destruindo propriedades de palestinos e matando palestinos inocentes será, muito provavelmente, o último dia em que haverá relações diplomáticas formais entre Israel e o Egito” 

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