23/11/2013,[*] Finian Cunningham, Press TV, Irã
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Mesa de negociações do P5+1 e Irã (Nações Unidas, Genebra em 20/11/2013) |
Algum
possível fracasso para chegar a acordo provisório nas negociações do P5+1 com o
Irã, em Genebra, pode ser atribuído a vários fatores: o grave dano à
confiabilidade dos negociadores, provocado pelo ministro francês, agente de lobby,
ao final da rodada anterior, no início do mês; a consequente falta de empenho e
compromisso dos EUA, que não defenderam o avanço que já havia sido obtido rumo
a um acordo satisfatório para todos; e o sempre intrusivo trabalho de sapa, por
Israel e seus poderosos apoiadores no Congresso dos EUA, ativos para criar
úteis novas tensões nos bastidores.
Mas outro
fator, e importante, é a arrogância do “ocidente”. EUA, Grã-Bretanha e França
ainda agem como potências hegemônicas, cuja arrogância as faz cegas ao próprio
comportamento injustificável, de duplifalar, dois pesos e duas medidas e
deslavada hipocrisia, que as impede de tratar o Irã com o devido respeito.
Sem esse
ingrediente básico de mútuo respeito, não há negociação que frutifique
plenamente.
Dessa vez,
pode-se dizer que a arrogância dos franceses foi a mais saliente. Três dias
antes da abertura da 3ª rodada de negociações do grupo P5+1 em Genebra, o
presidente francês François Hollande visitou Israel, em demonstração de
servilismo patético.
Hollande abraça servilmente Netanyahu em Televive (19/11/2013) |
Na véspera
das super sensíveis conversações em Genebra, a retórica teatral de Hollande
sobre uma sua “posição firme de apoio a Israel contra um Irã armado com bombas
atômicas” foi como “palavra-de-ordem” pró desordem e gesto repugnante para
minar até a confiabilidade de seus próprios negociadores.
Mas, mais
que isso, o presidente francês exibiu a arrogância contraproducente que caracteriza
em geral a atitude do “ocidente” em relação ao Irã. Essa mentalidade
hegemonista está na raiz do atual impasse político e da imposição continuada de
sanções econômicas não éticas contra o povo do Irã.
Por que a
França teria “licença” para manter cerca de 60 usinas nucleares em operação em
seu território, que geram 80% da energia total de que o país precisa? Por que a
França teria”‘licença” para controlar todas as etapas e todos os aspectos do
ciclo do combustível nuclear, inclusive do enriquecimento de urânio, sem
limites de concentração? Por que a França teria “licença” para manter arsenal
de mais de 500 ogivas atômicas? Claro: porque, quando o Irã afirma seu pleno
direito a desenvolver tecnologia atômica para finalidades pacíficas, a França e
outras potências “ocidentais” sempre levantam as objeções mais irracionais
[Objeções que servem para alimentar os discursos
pervertidos da imprensa-empresa e de seus “especialistas” e “jornalistas”, em
todo o mundo (NTs)].
Esse tipo
de pensamento – que a França exibiu há pouco, mas que está ativo também em
outras potências ‘ocidentais’ – é o cúmulo do mais arrogante duplipensar. E,
para que as conversações do P5+1 avancem, é indispensável modificar essa
atitude e esse pensamento arrogantes.
Essa espantosa,
inadmissível, arrogância “ocidental” revelou-se mais uma vez na inaceitável
afirmação do presidente francês, falando ao parlamento israelense, de que seu
país opõe-se à proliferação de armas atômicas.
Como é
possível que um presidente de nação “ocidental” diga tal absurdo, sem que o
ridículo do que diz seja exposto e o autor obrigado a retratar-se? Não há quem
não saiba – é fato histórico! – que a França teve papel crucial na proliferação
ilegal de armas atômicas no Oriente Médio, quando, nos anos 1950/60s construiu
e armou os arsenais atômicos de Israel.
Washington
e Londres partilham também a mesma culpa, por criarem e alimentarem esse
criminoso duplifalar sobre as armas atômicas no Oriente Médio.
Aiatolá Ali Khamenei |
Ainda
assim, as potências “ocidentais” continuam a impedir qualquer progresso na
direção de um acordo. Fazem-no, (a)
ao não reconhecer o direito legal fundamental do Irã a enriquecer urânio, o
mesmo direito que têm todos os países signatários do Tratado de Não
Proliferação; e (b) ao continuar a distribuir
invencionices e mentiras sobre os planos nucleares do Irã.
Essa
atitude das potências “ocidentais” é arrogante e insultuosa, e ofende a
integridade do Irã e de seus governantes; mas essa arrogância é hegemônica e é
ela quem bloqueia, de forma irracional e ilegal, qualquer boa solução para a
disputa.
Lawrence Korb |
As palavras
de Hollande essa semana [e do
presidente Obama, ontem (ver, nos termos do desjornalismo da Rede Globo [1]) (NTs)] são prova
disso. Mas há outra ilustração da arrogância do “ocidente”, e que mostra bem o
quando é profundo e problemático esse modo de pensar.
Num debate
televisionado no início dessa semana, exibido pela Press TV, entre o
professor iraniano Mohammad Marandi e o comentarista norte-americano Lawrence
Korb, viu-se bem o quanto é atrasado e preconceituoso o modo de pensar “ocidental”.
Um dos aspectos mais escandalosos disso, é que parece que o Sr. Korb é tido
como “progressista”, no establishment de Washington e é favorável a uma
reaproximação diplomática com o Irã e a um acordo nas conversações do P5+1 com
o Irã.
Korb começou
por tentar fazer crer que os “dois lados” cometeram erros equivalentes. Citou,
de exemplo, o cerco da embaixada dos EUA em Teerã, há 34 anos, como exemplo das
transgressões iranianas.
Mohammad Marandi |
Em todos
esses crimes cometidos contra a nação iraniana, os EUA contaram com apoio
direto de Grã-Bretanha e França.
O que se vê
é que os norte-americanos, inclusive algumas vozes supostamente “progressistas”,
apagaram de seus discursos a escala do horror que os EUA infligiram ao Irã (e a
outras nações). Essa cegueira seletiva é efeito da corrupção que a arrogância
produz no cérebro do establishment em Washington, Londres e Paris, e de
boa parcela dos respectivos cidadãos.
Os EUA que
tratem de ouvir mais e falar menos. Que tratem de se autoexaminar com seriedade
e dignidade, em vez de tanto pontificarem.
Até que se
erradique essa arrogância criminosa [amplificada
pela imprensa-empresa, para o mundo (NTs)], todas as negociações com essas
potências ‘ocidentais’ serão frustrantes, quando não forem completamente
inúteis.
_____________________
Nota dos
tradutores
[1]
24/11/2013, Globo, G1:
Obama, em uma aparência de fim de noite
na Casa Branca, disse que se o Irã não cumprir os seus compromissos durante um
período de seis meses, os Estados Unidos “iriam desligar” (sic) o alívio das
sanções e “aumentar a pressão.
A redação miserável é
trabalhinho dos “jornalistas” da Rede Globo. A matéria está em: “Acordo
nuclear com Irã é “primeiro passo importante”, diz Barack Obama”.
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[*] Finian Cunningham nasceu em Belfast, Irlanda do Norte, em 1963. Especialista em política
internacional. Autor de artigos para várias publicações e comentarista de
mídia. Recentemente foi expulso do Bahrain (em 6/2011) por seu jornalismo
crítico no qual destacou as violações dos direitos humanos por parte do regime
barahini apoiado pelo Ocidente. É pós-graduado com mestrado em Química Agrícola
e trabalhou como editor científico da Royal Society of Chemistry,
Cambridge, Inglaterra, antes de seguir carreira no jornalismo. Também é músico
e compositor. Por muitos anos, trabalhou como editor e articulista nos meios de
comunicação tradicionais, incluindo os jornais Irish Times e The
Independent. Atualmente está baseado na África Oriental, onde escreve um
livro sobre o Bahrain e a Primavera Árabe.
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