Em busca de fonte alternativa de gás
27/4/2015, [*] Mike Whitney, Counterpunch
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
É essencial reconhecer que o Irã não tem atualmente qualquer programa de
armas nucleares, nem possui arma nuclear.
Dia 26/2/2015, James Clapper, Diretor da Agência Nacional de Inteligência
disse à Comissão das Forças Armadas do Senado que “o Aiatolá Khamenei, Líder
Supremo do Irã, encerrou completamente o programa nuclear de seu país em 2003” e “tanto quanto sei não
tomou qualquer decisão para construir alguma arma nuclear”.
Assim se repete a avaliação “altamente confiável” da Comunidade de
Inteligência (CI) dos EUA, que disse exatamente isso em novembro de 2007
Acordo Nuclear - Irã vs União Europeia/EUA (Suiça) |
Começar com a verdade sempre ajuda, e, no caso do Irã, a verdade é muito simples. O Irã não tem armas nucleares, não tem programa para construir armas nucleares e jamais foi apanhado praticando desvio de combustível atômico, para usá-lo em objetivos diversos do original. O Irã pesquisa e produz tecnologias nucleares exclusivamente para fins pacíficos.
Esses são os fatos. Talvez não confirmem as mentiras propagadas pela imprensa-empresa comercial, mas nem por isso deixam de ser fatos. O Irã não é culpado de crime algum. O Irã é exclusiva e inteiramente a vítima de um atentado praticado pelo poder-alucinado de Washington, obcecado por controlar os recursos vitais que abundam no Oriente Médio e promover a hegemonia regional de Israel. É disso que se trata. Tudo é geopolítica. Nada tem coisa alguma a ver com armas atômicas.
A empresa-imprensa comercial que cobre as chamadas “negociações nucleares” em Lausanne e agora em Viena mantém-se maniacamente focada no “número de centrífugas”, nos programas de monitoramento da AIEA, na capacidade para enriquecer urânio e em miríades de outros tópicos que existem em grande número para, precisamente, afastar a atenção do único fato importante: que o Irã não tem armas atômicas, nem interesse em algum dia vir a tê-las.
Empurrado para uma simulação de afogamento nesse mar de notícias ocas, de questiúnculas sem importância, o leitor é induzido a sentir que o Irã “tem-de” estar escondendo alguma coisa e, portanto, sim, com certeza é ameaça real à segurança nacional dos EUA. Claro que isso, precisamente, é o que os “especialistas” autores desses artigos visam a conseguir. Vivem de meter um saco sobre os olhos do público consumidor de “notícias” e de levá-lo a crer em algo que é demonstrada e comprovadamente falso...
No que tenha a ver com o Irã, o único fato verdadeiro é o que NENHUM veículo da imprensa-empresa noticia: que o Irã não está fazendo nada que seja ilegal ou clandestino. O Irã, simplesmente, demanda o direito de enriquecer urânio para finalidades pacíficas, que o Tratado de Não Proliferação lhe assegura, tratado que o Irã deseja, com toda a razão, ver respeitado. O Irã não se deixará destratar pelos EUA, nem deixará que o tratem como “país de segunda classe”. O Irã sempre se comportou honradamente desde o início – o que está anos-luz à frente do que se pode dizer dos EUA.
A imprensa-empresa comercial não quer discutir os “protocolos adicionais” que o Irã aceitou para construir confiança entre os membros da ONU, porque, se as pessoas forem informadas desse assunto, todos verão que o Irã já concedeu muito mais, além do previsto no início das negociações. Mesmo assim, continua a ser alvo das acusações mais estúpidas e absurdas, com manchetes diárias sobre “a intransigência” dos iranianos, ou o “jogo duplo” dos iranianos. Mas se alguém exige provas da tal intransigência ou da má fé dos iranianos... não há provas. É tudo só opinionismo jornalístico o mais desavergonhado, e a continuada implantação de medo e mais medo na população, quando não é simples e reles maledicência dita “jornalística”. Leem-se páginas e páginas (impressas ou virtuais) de empresas da imprensa comercial, e tudo – literalmente tudo que ali se lê – é mentira integral ou parcial.
NYTimes - especialista em NOTÍCIAS FALSAS |
O mais recente golpe-besteirol da “imprensa de informação” centra-se na questão do “breakout time” [apr. ‘tempo de pausa’], ‘nome’ que foi dado ao tempo necessário para que o Irã consiga construir uma bomba nuclear se decidir fazê-lo, o que já disse que não quer fazer.
“Breakout time” é a nova palavra-propaganda repetida milhares de vezes na imprensa comercial, sempre para sugerir e reforçar que Teerã estaria a poucas horas de concluir a construção de uma bomba atômica a qual ato seguinte, seria lançada para aniquilar Israel. É ridículo. É conto de fadas que assume que – porque os EUA são país homicida que anda pelo mundo a aniquilar qualquer coisa que respire –todos os demais países teriam a máxima pressa para seguir o mesmo modelo, no instante em que tivessem chance. É ideia errada em muito níveis.
Primeiro, que o Irã não quer armas atômicas. Segundo, que nem todos os governantes do mundo são megalômanos, maníacos obcecados por matar-sem-parar, cujo único prazer na vida é reduzir a ruínas fumegantes grandes fatias do planeta. Não. Esse não é comportamento generalizado: esse comportamento é específico de governantes dos EUA. Outros governantes não são doentes pervertidos. Muitos não sofrem dessa doença sociopática em estado tão avançado.
A questão nuclear é só cortina de fumaça. Nada tem a ver com o inexistente programa nuclear iraniano. O verdadeiro problema é que o Irã é país soberano com política externa independente. Washington não gosta de países independentes. Washington gosta de países e calam o bico e fazem o que são mandados fazer. Países que não se deixam mandar são inimigos de Washington e são postos numa lista de matar. E é quando entram em cena as sanções. Sanções são o meio pelo qual Washington enfraquece o inimigo, antes de bombardeá-los até viraram fumaça. São o porrete que os EUA usam para pôr de joelhos os rivais.
Quem tenha acompanhado o noticiário nos últimos dias sabe que alguma coisa muito estranha está acontecendo. Os EUA fizeram como se não estivessem nem-aí e mudaram a política para o Irã. É desenvolvimento chocante. Os EUA mantiveram a mesma política de selvageria contra Cuba durante 60 anos, sem mudar coisa alguma. Que as políticas selvagens de Washington funcionem ou não, nunca fez diferença; o que interessa é causar dano máximo, sofrimento máximo aos povos que os EUA odeiem. Assim sendo, por que a repentina mudança no caso do Irã? Por que Obama tenta agora um acordo com um país que as elites norte-americanas abertamente desprezam?
E não se pode esquecer, que a “abertura” de Obama, hoje, para o Irã, é extremamente impopular também em grupos muito poderosos, no Congresso, nas empresas da mídia, em Israel e entre funcionários do mais alto escalão também no Departamento de Estado dentro do próprio governo Obama. Teria acontecido que os agentes de poder, que mexem o cordame que movimenta Obama e lhe dizem o que fazer, de repente viram a luz e resolveram que é chegada a era da reconciliação e da paz com o Irã? É claro que não. Ninguém acredita nisso.
Obama só assinará acordo com o Irã, se daí puder extrair alguma vantagem. E a vantagem que os EUA querem extrair do Irã chama-se “gás”. Os EUA querem um substituto para o gás russo que chega à Europa, para que possam destruir completamente a Rússia e implementar o tal plano estratégico de estender o poder norte-americano por toda a Ásia, para que as megaempresas norte-americana possam conservar a posição dominante na economia global. Obama faz-se de negociador sensível com o Irã, para poder pivotear-se para a Ásia o mais facilmente possível.
Mas... E é plausível que o Irã venha a substituir o gás russo no lucrativo mercado da União Europeia?
Os EUA querem reviver o Projeto Nabucco... |
Vejam esse trecho de um artigo de 2014 que previa exatamente o cenário que vemos hoje, vale dizer, os EUA tentando impedir que se crie uma zona UE-Rússia de livre comércio que fará encolher o PIB dos EUA e deixará a única potência indispensável em rota de apressado declínio. O título do artigo é “UE busca o Irã como alternativa ao gás russo” [orig. EU turns to Irã as alternative to Russian gas].
A União Europeia está silenciosamente promovendo a necessidade, cada vez mais urgente de um plano para importar gás natural do Irã, ao mesmo tempo em que as relações com Teerã vão sendo descongeladas, e as relações com seu maior fornecedor de gás, a Rússia, entram em processo de rápido resfriamento (...).
“O Irã caminha rapidamente para o topo de nossas prioridades, para adotar medidas de médio prazo que ajudem a diminuir nossa dependência da Rússia, como fornecedora de gás natural” – diz a fonte. “O gás do Irã pode chegar à Europa muito facilmente , e politicamente já se vê clara reaproximação entre Teerã e o ocidente.”
O Irã, que está vivendo sob sanções, tem a segunda maior reserva de gás, só inferior à da Rússia, e é possível alternativa, uma vez que as conversações entre Teerã e o Ocidente cheguem a algum acordo sobre o discutido programa nuclear da República Islâmica.
“Alto potencial para produção de gás, reformas no setor doméstico de gás que estão em andamento e a normalização das relações com o ocidente fazem do Irã alternativa viável à Rússia” – disse uma publicação que circula entre membros do Parlamento Europeu (...).
“O interesse do Irã em entregar gás à Europa é grande. Partes da elite econômica e política iraniana, assim como empresas ocidentais já se preparam para o fim das sanções” – disse Frank Umbach, diretor de pesquisas sobre energia do King’s College em Londres (...).
Há muito tempo o Irã trabalha para conseguir construir um gasoduto que conectaria seu imenso campo Pars Sul, de gás, e os consumidores europeus – o chamado Gasoduto Persa.
“É produto extremamente ambicioso” – disse Handjani. “Mesmo se só se construir metade do projeto, já será imensa realização para a Europa e para o Irã” (...).
Estudos independentes de viabilidade mostram que se as sanções forem levantadas e começarem logo os investimentos, o Irã poderá fornecer 10-20 bilhões de metros cúbicos de gás/ano à Turquia e à Europa, já no início da década dos 2020s” (euractiv.com 25/09/2014, EU turns to Irã as alternative to Russian gas).
- Sr. Presidente, queremos enrigecer sua espinha... |
Por isso Obama tanto quer o fim das sanções. Porque precisa encontrar fonte alternativa de gás para a Europa, ou não terá aliados europeus em sua guerra contra a Rússia. E derrotar a Rússia já está convertida em prioridade estratégica top de Washington.
Os EUA estão dispostos a arriscar tudo – até a guerra nuclear – para manter o monopólio do poder global e para prolongar sua hegemonia até o próximo século.
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[*] Mike Whitney é um escritor e jornalista norte-americano que dirige sua própria empresa de paisagismo em Snohomish (área de Seattle), WA, EUA. Trabalha regulamente como articulista freelance nos últimos 7 anos. Em 2006 recebeu o premio Project Censored por sua reportagem investigativa sobre a Operation FALCON, um massiva, silenciosa e criminosa operação articulada pela administração Bush (filho) que visava concentrar mais poder na presidência dos EUA. Escreve regularmente em Counterpunch e vários outros sites. É co-autor do livro Hopeless: Barack Obama and the Politics of Illusion (AK Press) o qual também está disponível em Kindle edition.
Recebe e-mails por: fergiewhitney@msn.com.
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